Discurso no Senado Federal

PREMENCIA DE UMA POLITICA DE REFORMA AGRARIA NO PAIS.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • PREMENCIA DE UMA POLITICA DE REFORMA AGRARIA NO PAIS.
Aparteantes
Benedita da Silva.
Publicação
Publicação no DCN2 de 16/08/1995 - Página 13920
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, REUNIÃO, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, CAMARA DOS DEPUTADOS, PARTICIPAÇÃO, DEPUTADO FEDERAL, ORADOR, SENADOR, MEMBROS, SUBCOMISSÃO, SENADO, APROVAÇÃO, RELATORIO, VISITA, ESTADO DE RONDONIA (RO), DISCUSSÃO, PROBLEMA, POLITICA AGRARIA, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, EXECUÇÃO, REFORMA AGRARIA, REALIZAÇÃO, JUSTIÇA SOCIAL.

A SRª MARINA SILVA (PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como havia anunciado ontem, hoje, a partir das 16h, estaremos reunidos na sala da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, juntamente com os membros daquela Comissão e com os da Subcomissão do Senado da República, composta pelo Senador Romero Jucá, Senador José Bianco e por mim. Eu, inclusive, juntamente com o Senador Beni Veras, farei um convite ao ilustre Senador Pedro Simon, para que S. Exª também, se assim o desejar, faça parte dessa Subcomissão, na qual trataremos não apenas sobre o episódio de Rondônia e do Pará, mas de questões mais amplas, no que se refere ao problema de uma política de reforma agrária para este País e, mais especificamente, sobre uma política que defina o acesso à terra de uma forma justa e democrática.

Os 32 milhões de famintos deste País, com certeza, teriam sua fome aplacada, teriam acesso a algum tipo de renda se o Governo assumisse a sua responsabilidade de fazer a democratização da terra em nosso País.

Todos os países desenvolvidos que experimentam o crescimento econômico e a justiça social fizeram reforma agrária. Portanto, a reforma agrária não é uma bandeira apenas de socialistas, mas de pessoas de bem, inclusive dos que gostariam de ter um mercado consumidor interno capaz de fazer face às grandes demandas que temos, porque realmente fica muito difícil, com 32 milhões de indigentes, criar um mercado consumidor interno. O indigente mal consegue o suficiente para continuar a sobreviver, quanto mais para ser um consumidor em potencial.

Então, nesse sentido, a política de reforma agrária, longe de ser uma bandeira ideológica, é, acima de tudo, uma bandeira histórica de todos os países desenvolvidos, até mesmo dos países capitalistas mais ferrenhos.

Dessa forma, a Comissão de Direitos Humanos, já com uma peça produzida, que é o relatório sobre a visita ao Estado de Rondônia, estará aprovando esse relatório a partir das 16h. E eu, juntamente com os demais Senadores, estarei acompanhando os trabalhos como representante da Comissão de Assuntos Sociais.

Quero repetir que a Comissão de Assuntos Sociais irá referendar, posteriormente, o nome desses Srs. Senadores, para que, oficialmente, possam fazer parte do grupo de Parlamentares que irá levar esses problemas ao Presidente, ao Ministro da Agricultura, ao Presidente do INCRA, enfim, a todos os setores responsáveis pela questão agrária no nosso Estado.

Como não tivemos tempo hábil para fazê-lo antes de nomearmos esses Parlamentares, assim estamos procedendo, mas com a certeza de que deveremos passar pelo referendo da Comissão de Assuntos Sociais.

O Senado não poderia ficar omisso diante de fatos tão alarmantes, tão tenebrosos como os acontecimentos no Estado de Rondônia, no Estado do Pará, e de tantos outros que estão ocorrendo, muitas vezes sem a mesma publicidade, sem a mesma divulgação na mídia nacional, por serem casos isolados, com pouca condição de repercussão. Mas morte é sempre morte e, nesse caso, o mais estarrecedor é que houve várias mortes, várias pessoas feridas.

Há uma denúncia, feita pelos grandes jornais, de que um dos líderes do movimento, que está internado em estado de coma, teria sofrido um atentado, mesmo estando em coma, dentro de um hospital.

A Srª Benedita da Silva - V. Exª me concede um aparte?

A SRª MARINA SILVA - Concedo um aparte à Senadora Benedita da Silva.

A Srª Benedita da Silva - Senadora Marina Silva, estou atenta ao pronunciamento de V. Exª e gostaria de dizer que, na sexta-feira passada, tive a oportunidade de, no mesmo enfoque, manifestar-me neste plenário sobre a necessidade da reforma agrária. Entendo, como V. Exª, que esse não é um assunto da esquerda ou da direita, do partido "x" ou "y"; é uma questão de direitos humanos. Na nossa população, identificamos mais de 32 milhões de pessoas em estado de miséria absoluta; sabemos que, no nosso País, existe um grande índice de desemprego, de analfabetismo e de tantas outras situações que, do ponto de vista social, poderiam ser amenizadas se houvesse o implemento da reforma agrária. Longe de nós querer que a reforma agrária seja feita com o viés ideológico, porque, nesse caso, ela não seria consciente. Outros países já tiveram oportunidade de fazê-lo sem necessariamente entrarem, como fazemos em nosso País, em debates e discussões ideológicas que não levarão evidentemente a nada no que diz respeito à reforma agrária. Sabemos perfeitamente que o homem e a mulher do campo sofrem porque têm, na sua cultura profissional, intimidade com a terra; eles sabem produzir, podem e querem produzir, e lhes falta espaço. Há também a questão da habitação. É lógico que já avançamos o suficiente com relação à questão da reforma agrária para entendermos que ela não pretende impedir o homem do campo de chegar às grandes cidades; pretende garantir-lhe a produção para que, com ela, possa encher a barriga das pessoas que estão nas grandes cidades. Sabemos que isso é importante. Há também a questão da educação, que, a meu ver, não deve ser desigual, e sim diferenciada. A cultura absorvida não pode ser essa mistura que constatamos - cultura urbana e cultura rural -, pois existem dois valores, e eles são importantes para nós. Quanta coisa a reforma agrária provocaria: riqueza para este País, alimentação para o povo, política habitacional para os trabalhadores rurais. Poderíamos, mediante a ação desta Comissão que está sendo constituída, garantir um seminário para a discussão da reforma agrária, não mais por uma medida do ponto de vista constitucional, mas por uma medida de respaldo ao Governo Federal. Mediante a realização desse seminário, portanto, poderíamos colocar, na mesa de debates, as várias tendências existentes não apenas em nível de representação político-partidária no Congresso Nacional, mas da sociedade como um todo: daquele que detém a terra, daquele que produz na terra, daquele que precisa da terra para viver, daquele que mora nessa terra e de nós, que somos responsáveis em garantir uma política de reforma agrária que dê sustentação ao Governo para algumas medidas que consideramos necessárias e imediatas. Não dá para esperar mais. Pode parecer, quando falamos, que se trata apenas de um discurso de esquerda; mas não: é um discurso dos que querem a verdadeira modernidade das relações e dos direitos humanos. V. Exª coloca que esta Comissão constituída discutirá o tema na Comissão de Direitos Humanos, da Câmara dos Deputados. Penso que isso é saudável, e devemos respaldar. Apelo a esta Casa no sentido de que, agora, na mudança do seu Regimento Interno, seja garantida para o Senado Federal, uma comissão - não subcomissão - que trate, ainda que funcione com outra, dos direitos humanos. Todos os Parlamentos, na sua inovação, na sua modernidade, na sua flexibilidade de discutir políticas internacionais de direitos humanos têm garantido o funcionamento de comissões que tratem dos direitos humanos. Portanto, seria interessante que também pudéssemos fazê-lo. A iniciativa e a participação de V. Exª, sem dúvida nenhuma, será por nós respaldada, para que possamos ajudar o Governo Federal a implantar, de imediato, reforma agrária neste País. Muito obrigada.

A SRª MARINA SILVA - Agradeço a V. Exª pelo aparte e parabenizo-a pela iniciativa de sugerir a esta Casa a criação de uma comissão de direitos humanos. Isso acontece na Câmara dos Deputados e em várias assembléias legislativas, como, por exemplo, a Assembléia do Estado do Rio Grande do Sul. Lá, o Deputado Estadual Marcos Rolim tem feito excelente trabalho à frente da Comissão de Direitos Humanos.

O Senado da República deve constituir a sua comissão, para que temas relativos aos direitos humanos e cidadania possam ser debatidos e possam receber nossa contribuição. Muito justa a preocupação de V. Exª.

Para finalizar, ressalto que o Governo brasileiro deve promover o êxodo ao contrário. Aqueles milhares de brasileiros que saíram do campo com o sonho da cidade, hoje, desencantados, vivem em favelas, barracos cobertos por papelão, sem emprego, sem as mínimas condições de sobrevivência. Eles merecem o retorno, merecem fazer esse êxodo ao contrário, ou seja, voltar a terra prometida.

No entanto, para que se trate realmente de uma terra prometida, é preciso que essa volta seja acompanhada de algumas medidas, como, por exemplo, acesso ao crédito para financiamento da produção, aos benefícios de saúde, de educação, fundamentais para que os trabalhadores possam se fixar no campo.

O Governo brasileiro deve isso aos trabalhadores, até porque se trata de um compromisso de campanha do Presidente da República, um compromisso contido no programa de governo. Para se fazer frente à fome, à miséria e ao desemprego tem que se ter uma política ousada de geração de emprego e renda. E geração de emprego e renda passa necessariamente por uma política corajosa de reforma agrária para este País.

Era o que tinha a dizer. Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 16/08/1995 - Página 13920