Discurso no Senado Federal

SUCATEAMENTO DAS FORÇAS ARMADAS E BAIXOS SALARIOS DOS MILITARES.

Autor
Valmir Campelo (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/DF)
Nome completo: Antônio Valmir Campelo Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SALARIAL.:
  • SUCATEAMENTO DAS FORÇAS ARMADAS E BAIXOS SALARIOS DOS MILITARES.
Aparteantes
Edison Lobão, Humberto Lucena, Jefferson Peres.
Publicação
Publicação no DCN2 de 05/09/1995 - Página 15411
Assunto
Outros > POLITICA SALARIAL.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, NIVEL, SALARIO, MILITAR, FALTA, INVESTIMENTO, GOVERNO, FORÇAS ARMADAS.
  • APOIO, INICIATIVA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONCESSÃO, AUMENTO, SALARIO, MILITAR, BRASIL.

O SR. VALMIR CAMPELO (PTB-DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os militares brasileiros têm revelado uma extraordinária capacidade adaptativa. Aquilo que conseguem nossos servidores da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ou seja, fazer chegar ao fim do mês o seu minguado soldo, provendo habitação e alimentação a sua família, é uma façanha comparável aos feitos heróicos nos tempos de guerra. Os militares brasileiros figuram entre os mais mal pagos do mundo.

Apesar dessa espantosa capacidade de adaptação dos nossos militares, cuja paciência e disciplina lhes permitem sobreviver nestes tempos difíceis, com vencimentos insuficientes para fazer face às suas despesas mais elementares, não podemos fazer ouvidos de mercador às suas reivindicações salariais.

O Governo não pode, com a obsessão da estabilidade monetária, descuidar dos seus objetivos permanentes de crescimento econômico e justiça social, e por aí passa, indiscutivelmente, o estabelecimento de uma política de remuneração justa para os servidores, sejam eles civis ou militares.

Quero me deter hoje no caso dos militares, que tiveram seus soldos literalmente aviltados nos últimos anos, levando nossos oficiais - e o pessoal subalterno, em particular - a uma situação vexatória e humilhante, com muitos deles tendo que fazer "biscate", "bico", para não permitir que suas famílias passem por privações.

Creio não ser necessário me alongar demasiado acerca da insatisfação dos nossos militares com os soldos que recebem, porque toda a imprensa vem expondo, quase que diariamente, a indignação que tomou conta desse importante segmento da vida nacional.

O Brasil é um dos países que menos investe em suas Forças Armadas. Nossos gastos militares não passam de 0,8% do PIB, percentual muito inferior ao que gastam o Chile, com 2.7%, a Argentina, com 1.7%, para citar apenas nossos parceiros latino-americanos.

A indústria de material bélico nacional, que chegou a figurar como a quinta maior do mundo, hoje não consegue suprir as forças de seu próprio País. É o resultado da lamentável falta de investimentos nas nossas Forças Armadas.*

O Sr. Edison Lobão - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Valmir Campelo?

O SR. VALMIR CAMPELO - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Edison Lobão - Senador Valmir Campelo, creio que V. Exª procede muito bem quando analisa esse importante tema: o soldo dos militares brasileiros neste momento. Quem conhece os militares sabe a vida regrada que eles levam. Os militares têm seus vencimentos muito aquém das mínimas necessidades. Observa-se que um General de quatro estrelas, ao chegar a este posto, permaneceu mais de 40 anos nas Forças Armadas, a serviço da Pátria, sem poder exercer outra atividade, senão essa exclusivamente. Todavia, a sua remuneração é abaixo da crítica, realmente. O sucateamento das Forças Armadas é outra questão que precisa ser observada pelo Governo. Temos aproximadamente 800 aviões na Força Aérea Brasileira, dos quais mais da metade não pode sair dos aeroportos porque foram canibalizados para que os outros pudessem voar. O mesmo ocorre à Marinha de Guerra, aos tanques do Exército. Tal situação não pode prosseguir. Faz V. Exª uma idéia nítida, com o seu discurso, daquilo que está acontecendo, de fato, na intimidade das nossas Forças Armadas. Estou inteiramente solidário com o Presidente da República na sua intenção de elevar, ainda que em níveis ainda baixos, os vencimentos dos militares das Forças Armadas Brasileiras, assim como com a iniciativa de V. Exª, em exaltar o papel que elas exercem na nossa sociedade. Obrigado.

O SR. VALMIR CAMPELO - Obrigado a V. Exª pelo aparte que demonstra, nobre Senador Edison Lobão, o conhecimento que tem V. Exª sobre o problema; e esta é a realidade. Não me refiro apenas ao aumento, que, para mim, é irrisório, é pequeno, demasiadamente pequeno. Quando logo mais começarmos a discutir o Orçamento do próximo ano na Comissão de Orçamento e aqui no plenário do Congresso Nacional, teremos condições de fazer justiça e de destinar recursos exatamente às três Forças Armadas do nosso País. Em termos de investimentos, elas estão totalmente sucateadas, e nós teremos que, realmente, dar as mínimas condições de trabalho para os militares, não só da Aeronáutica, como da Marinha e do Exército Brasileiro. Obrigado a V. Exª.

O Sr. Humberto Lucena - V. Exª me permite um aparte?

O SR. VALMIR CAMPELO - Ouço com muito prazer o Senador Humberto Lucena.

O Sr. Humberto Lucena - Senador Valmir Campelo, desejo partilhar com V. Exª essas idéias relacionadas com as atividades daqueles que integram as Forças Armadas brasileiras. Realmente, tratam-se de funcionários que servem mais ao Estado do que aos Governos, porque o Estado fica e os Governos passam. Há um detalhe que precisa ser acentuado, no caso dos que integram as Forças Armadas: esses servidores exercem seus afazeres administrativos em tempo integral e estão proibidos de ter qualquer outra atividade, por exemplo, na iniciativa privada, a não ser quando passam para a reserva; isso realmente lhes dá uma condição sui generis. Portanto, deve haver uma preocupação grande por parte do Governo Federal, no sentido de lhes assegurar remuneração condigna, para que possam realmente servir aos interesses da Pátria com amor, dedicação e exclusividade, como acabo de dizer, salientando sobretudo as tarefas de proteção maior à segurança nacional nas zonas de fronteira. Mas se esse é meu ponto de vista quanto aos militares, não posso deixar de salientar também a necessidade imperiosa que temos de olhar também para os servidores civis, que estão em situação de dificuldades muito grandes, principalmente aqueles que integram sua grande massa e compõem o Poder Executivo. Vejo, por exemplo, com certa preocupação, a idéia da reforma administrativa na parte em que se pretende pôr fim à isonomia entre os Poderes, porque esta seria a única maneira de fazer justiça aos que estão no Poder Executivo. Sabe V. Exª que os servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário têm, realmente, remuneração bem acima à daqueles que trabalham em atividades idênticas no Poder Executivo. Quero, portanto, aplaudir o discurso de V. Exª em relação aos militares e chamar a atenção do Governo para a situação de penúria em que se encontram os servidores civis da União, notadamente aqueles que são a imensa maioria.

O SR. VALMIR CAMPELO - Muito obrigado pelo aparte, nobre Senador Humberto Lucena. Como V. Exª ouviu, no início de meu pronunciamento, referi-me tanto ao servidor militar quanto ao civil, porque entendo que os salários são, realmente, indignos para ambas categorias. Enfoco principalmente os militares hoje em função das recentes medidas provisórias que foram baixadas pelo Presidente da República, mas estamos atentos e consideramos de inteira justiça que os servidores civis tanto quanto os militares tenham um salário digno, que possa, pelo menos, atender às necessidades básicas de suas famílias.

O Sr. Jefferson Péres - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. VALMIR CAMPELO - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Jefferson Péres - V. Exª, Senador Valmir Campelo, traz a debate um tema realmente atual, importante, qual seja, a baixa remuneração da grande maioria dos servidores públicos civis e militares, estes últimos com a desvantagem, como salientou o Senador Humberto Lucena, de serem servidores de tempo integral e dedicação exclusiva, o que não ocorre com os civis, que podem desenvolver legalmente atividades paralelas e complementar seu salário. Tenho conhecimento, Senador Valmir Campelo, pelo contato com famílias de militares, das dificuldades que eles enfrentam atualmente; alguns experimentam situações humilhantes. Mas o pior, além do soldo baixo em termos absolutos, é a injustiça em termos relativos. Sabemos que existem servidores ativos e, principalmente, inativos, percebendo salários astronômicos - R$10 mil a R$20 mil por mês. O Governador Mão Santa, que administra um Estado paupérrimo, o Piauí, teve que ir ao Supremo Tribunal Federal argüir a inconstitucionalidade de leis que permitiam esses escandalosos proventos num Estado tão pobre. O Governador Vítor Buaiz, do Espírito Santo, segundo li nos jornais, ficou tão revoltado, rebelou-se e declarou que não vai cumprir lei tão iníqua; recusa-se a pagar proventos de R$21 mil a um servidor aposentado do Espírito Santo. No meu Estado, o Amazonas, há funcionários inativos que ganham R$15 mil. Creio que já é tempo de o Congresso Nacional por um cobro, um paradeiro nisso. Entendo que a Constituição, contra a qual não existem direitos adquiridos, tem que estabelecer um teto inultrapassável que seria o vencimento de presidente da República e mandar rebaixar aqueles que o excederem. É absolutamente insustentável, inadmissível, Senador Valmir Campelo, que um oficial general ganhe R$3 mil ou R$4 mil, enquanto há servidores que não prestaram, absolutamente, os mesmos serviços ao País e ganham três, quatro ou cinco vezes mais. Creio que o Congresso Nacional precisa, via Constituição, acabar com esse estado de coisas lamentável. Muito obrigado.

O SR. VALMIR CAMPELO - Agradeço o aparte de V. Exª. Creio mesmo, Senador, que o militar não é sequer servidor público; no meu entendimento, é um servidor do País, diante da responsabilidade que tem na defesa do nosso País; ele não tem um compromisso maior com o Governo, mas sim com a Nação.

Agradeço a V. Exª pelo aparte.

A indústria de material bélico nacional, que chegou a figurar como a quinta maior do mundo, hoje não consegue suprir as Forças do seu próprio País. É o resultado da lamentável falta de investimentos nas nossas Forças Armadas. E, apesar disso, é preciso mencionar que além de suas obrigações constitucionais, as Forças Armadas prestam uma extensa folha de serviços comunitários, principalmente em seus postos mais avançados, junto às fronteiras distantes dos centros urbanos, com atividades assistenciais de caráter indiscutivelmente social.

Nossas Forças Armadas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, precisam e devem ser providas dos recursos necessários para realizar a segurança do País e desenvolver-se tecnológica e materialmente até o nível em que se encontram as forças militares mais avançadas do Planeta. Por que não? Afinal, não estamos destinados a nos tornar um País de Primeiro Mundo, com justiça social, alta tecnologia e outros pressupostos da globalização?

"Se queres a paz, prepara-te para a guerra", ensinaram os extraordinários generais prussianos do passado.

O Brasil não pode permitir o sucateamento e a deterioração de seu aparelho militar. Não pode permitir, acima de tudo, o aviltamento, a humilhação dos brasileiros que se dispuseram a integrar nossos contingentes de Marinha, de Exército e de Aeronáutica, como se fossem cidadãos de segunda classe, indignos de receberem uma remuneração justa, capaz de lhes garantir o sustento de suas famílias.

Não podendo mais ignorar a realidade vergonhosa do soldo de nossos militares, o Presidente da República assinou, na semana passada, medida provisória concedendo reajuste médio de 20% nos vencimentos do pessoal da ativa e da reserva. Na verdade, a MP cria duas gratificações para os militares: a Gratificação de Condição Especial de Trabalho, que varia conforme o posto ocupado e é retroativa a 1º de agosto, e a Gratificação Temporária, que terá vigência apenas no intervalo entre 1º de agosto e 31 de dezembro deste ano.

A Gratificação Temporária vai permitir um aumento de aproximadamente R$450 para as patentes mais elevadas e de cerca de R$15 para os soldados, corneteiros e assemelhados.

Já a Gratificação de Condição Especial de Trabalho será incorporada definitivamente à remuneração dos militares e será calculada por um valor multiplicado sobre o soldo de cada posto da hierarquia.

Na MP são elencadas as características próprias que justificam a Gratificação Especial: obrigatoriedade de dedicação exclusiva; trabalho em regiões inóspitas e distantes; exercício do cargo sem horário fixo de trabalho e sem direito a horas extras.

Com esse aumento, um general passará a receber apenas perto de R$3.600 mil por mês, o que continua sendo muito pouco diante das responsabilidades que lhe são acometidas.

De qualquer forma, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é muito positiva essa decisão do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Já não era sem tempo atender às justas reivindicações das nossas Forças Armadas. Embora seja um reajuste modesto, irá permitir aos nossos militares ao menos tomar fôlego no meio desse "sufoco" que atinge o assalariado brasileiro como um todo.

Quero declinar o meu integral apoio a essa iniciativa do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que faz justiça a um dos segmentos mais sacrificados da sociedade brasileira. O aumento concedido aos militares é justo e vem no momento oportuno. Esse pequeno reajuste dos soldos será de grande valia para o pessoal da ativa e também para os que já se encontram na reserva.

Conclamo os meus nobres Pares a apreciarmos, com a maior brevidade possível, essa medida provisória, que, repito, faz justiça para com os valorosos brasileiros que integram nossas Forças Armadas.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 05/09/1995 - Página 15411