Discurso no Senado Federal

SITUAÇÃO CAOTICA DA SAUDE PUBLICA NO PAIS.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • SITUAÇÃO CAOTICA DA SAUDE PUBLICA NO PAIS.
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares, Epitácio Cafeteira, Humberto Lucena, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DCN2 de 31/08/1995 - Página 14840
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, DIFICULDADE, SITUAÇÃO, SISTEMA NACIONAL DE SAUDE, NECESSIDADE, RECURSOS, SOLUÇÃO, PROBLEMA, SETOR, SAUDE, ESPECIFICAÇÃO, FECHAMENTO, HOSPITAL, ESTADO DA PARAIBA (PB).

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os dois oradores que me antecederam teceram, ambos, comentários sobre a situação econômica do País. Lamentavelmente, não vou fazer diferente.

A situação do País é difícil. Ainda há pouco dava um aparte ao nobre Senador por Sergipe, Antonio Carlos Valadares, e dizia que os Estados que estão com dívida mobiliária, realmente, estão sem condições sequer de pensar no futuro. E citei como exemplo o caso do Rio Grande do Sul que, no começo do ano, em janeiro, devia R$3,3 bilhões de dívida mobiliária. Pagou cerca de R$380 milhões, e deve para este mês de agosto R$4,3 bilhões. Um crescimento gigantesco da dívida mobiliária que a torna impagável. Se olharmos Estado por Estado, constataremos que são apenas três os que não estão numa situação de endividamento que os levaria à bancarrota. Dei também o exemplo de São Paulo, que hoje está arrecadando R$1,2 bilhão e está gastando R$1,8 bilhão só com folha e serviço da dívida. Então, a situação é genérica. É preciso que se encontre uma solução. Se olharmos a União, também esta não está diferente. A União pagou, neste semestre, R$9 bilhões de juros da dívida, e não tem outra solução senão apelar para o Fundo Social de Emergência.

Mas o tema que me traz hoje, dentro deste quadro, à tribuna, é a saúde. Esta, meus senhores, está numa situação dificílima. Imaginem V. Exªs que hoje, no sistema de saúde, está-se pagando R$2 por uma consulta médica e R$5 por uma internação.

Ainda ontem à noite o Ministro Adib Jatene conversava com um grupo de Parlamentares e contava, com tristeza, que um médico foi a um engraxate e, quando foi pagar, o engraxate disse que eram R$2. E o médico lhe disse: "Nós somos colegas, eu também cobro R$2 na Previdência". O engraxate, que era esclarecido, disse: "O senhor está equivocado, os meus R$2 são à vista, e eu ainda ganho gorjeta, e o senhor só vai receber daqui a sessenta dias". Esta é a situação da saúde: R$2 por uma consulta e R$5 por uma internação. E quando fez o Ministro a comparação com o engraxate é porque S. Exª deve estar se referindo ao interior do País, porque um engraxate no aeroporto do Rio de Janeiro custa R$4, exatamente o dobro.

Apesar de ser tão pouco o pagamento, o orçamento do Ministério não cobre o pagamento real dos orçamentos deste ano. Ele teve diminuído da sua conta R$3 bilhões. Ele precisava desses R$3 bilhões e de mais R$3 bilhões para implementar o sistema e fazer modificações para sua melhoria. Ele precisaria de R$6 bilhões para colocar a saúde em ordem. Lamentavelmente, ele não dispõe desse dinheiro.

A situação é caótica em todos os Estados. O Ministro tem uma tarefa sobre-humana tentando organizar, criando os agentes de saúde, implementando os médicos de família, buscando fazer a triagem do sistema de modo a aprimorá-lo, enfim, vem conseguindo bons resultados, mas o sistema continua caótico, porque no todo essa experiência ainda é muito pequena.

Na Paraíba, desde ontem, terça-feira, todos os hospitais estão fechados. E vejam V. Exªs que a Paraíba sempre foi, nessa região, um Estado privilegiado. Recebemos pacientes de todos os demais Estados de regiões mais pobres do que a nossa e que fazem fronteira conosco. Estamos com os hospitais fechados, porque se reduziu o orçamento anual da Paraíba para Saúde em quase R$2 bilhões. É uma situação extremamente difícil.

Apresentamos ao Ministro a situação da Paraíba, mas vimos que os outros Estados também estão assim.

O Sr. Epitacio Cafeteira - Permita-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA - Ouço V. Exª com muita satisfação.

O Sr. Epitacio Cafeteira - Nobre Senador Ney Suassuna, vejo o cuidado e a atenção que V. Exª e toda a Casa têm em relação à situação difícil da Saúde no Brasil. Creio, todavia, que foi mal colocado esse Sistema Único de Saúde, na medida em que, ao ser implantado, se proibiram os hospitais do Estado, das prefeituras, de participar do sistema, recebendo a participação das AIHs. Há bem pouco tempo, resolveram fazer isso com os hospitais oficiais, mas nessa ocasião os hospitais já estavam sucateados; nessa ocasião já havia uma equipe tomando conta da Saúde no Brasil. Isso me preocupa. Há pouco, V. Exª dizia que são necessários R$6 bilhões e que cada médico só recebe R$2,00 para atender o cliente. Ora, R$6 bilhões, se for para atender 60 milhões de brasileiros, caberia a cada um R$6 mil. Ou seja, daria para cada um desses brasileiros fazer 3 mil consultas. Então, há alguma coisa errada, alguma coisa que não bate. Temos hospitais, inclusive no meu Estado, que atendem mensalmente mais do que a população do Município. É isso que o Ministério da Saúde ainda não conseguiu encontrar: a maneira de tapar o ralo. Enquanto não se tapar o ralo, não há dinheiro que segure. É preciso encarar essa situação. Os jornais já deram mil e uma notícias daquelas de primeira página: "operação cesariana em homem", "mulher teve 8 filhos em um ano só". Então, fazem-se declarações dessa natureza, mas não se apura. Há necessidade de se examinarem esses recursos. Se eles são poucos, aí é que devemos ter maior cuidado no exame. A mim me preocupa, eu que lutei pela seguridade social, já mostrei mais de uma vez que usaram o dinheiro da Previdência Social para a seguridade social. É preciso que se encontre uma nova incidência, já que se adotou a abrangência total. Se todo o povo tem direito ao tratamento de saúde, tem que haver uma forma de imposto que dê para assegurá-lo, na seguridade social e até na aposentadoria de quem não contribui. O que não se pode fazer é ter várias posições, tirando de vários lugares. Tenho o maior respeito e admiração pelo Ministro Adib Jatene, como tenho por V. Exª, como tenho pelo nobre Senador Antonio Carlos Valadares, que é o autor da emenda, mas a minha pergunta é esta: até onde se apurou o que estava errado? Onde estão os punidos por terem levado o dinheiro da Saúde? Essa é a colocação que faço para meditação da Casa. No Senado, essa emenda pode e deve passar até com alguma folga, porque aqui há cliente que já foi operado pelo Dr. Adib Jatene, ou há uma porção de candidatos a isso; mas na Câmara é diferente: lá não existem tantos safenados e nem candidatos à safena. Então, precisamos olhar isso para chegarmos à conclusão de que vai ser muito difícil a emenda constitucional passar pela Câmara.

O SR. NEY SUASSUNA - Senador Epitacio Cafeteira, se existem fatos apurados como esse que V. Exª citou, isso decorre exatamente das auditorias oriundas do Ministério da Saúde. Estão sendo feitas auditorias, e esses dados são exatamente retirados delas.

O Ministério tem feito uma triagem e, hoje, a quantia per capita é de US$80 por brasileiro. Nunca daria a cifra que V. Exª referiu, porque tem que se pensar na manutenção do quadro dos hospitais, enfim, de toda a área de Saúde. Inclusive dentro desse Orçamento, para nossa tristeza, entra muito dos aposentados que consomem, hoje, praticamente, mais do que a metade dos orçamentos.

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA - Ouço o aparte de V. Exª, nobre Senador Antonio Carlos Valadares.

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Nobre Senador Ney Suassuna, V. Exª traz à discussão um assunto da maior importância, que merece a nossa consideração, inclusive a consideração de apoiar de forma intransigente as suas reflexões. Aproveito o ensejo para dizer ao nobre Senador Epitacio Cafeteira, do Maranhão, que a minha pressão é 12 por 8 e que, pelo menos na lógica do meu passado de saúde, não existe qualquer propensão para que, apesar das vicissitudes e das agruras da política, venha a subir acima de 12 por 8. De modo que eu não irei, se Deus quiser - para isto estou torcendo -, precisar do Ministro Adib Jatene para o caso de uma operação cirúrgica do coração ou das coronárias. Mas mesmo que estivesse na perspectiva de precisar do Ministro Adib Jatene, tenho absoluta certeza de que S. Exª, mesmo que eu votasse contra o seu desejo, mesmo que eu não estivesse ao seu lado nessa causa legítima em favor da Saúde no Brasil, o Ministro Adib Jatene faria a operação em Antonio Carlos Valadares e não iria passar na cara: "o senhor votou contra a minha emenda e agora está precisando de mim". O que sobra no Ministro Adib Jatene é, acima de tudo, bom caráter, posição política definida, não partidária, porque S. Exª não é um homem partidário, recusa-se a sê-lo; mas posso dizer que a emenda que apresentei, inspirada no sofrimento do povo no setor Saúde e na pregação que foi feita pelo Ministro Adib Jatene, tem um fundo nobre, porque apesar do descontrole que houve realmente no setor, como acentuou o Senador Epitacio Cafeteira, não podemos partir da premissa falsa de que, como não há controle e nem fiscalização na Saúde, não se pode nela injetar dinheiro. Acredito que seja uma premissa errada e que se devam fazer as duas coisas: controlar o dinheiro que é injetado na Saúde e dar dinheiro para a manutenção do sistema para a preservação de milhares de vidas e para o atendimento a mais de 100 milhões de brasileiros que dependem do Sistema Único de Saúde. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. NEY SUASSUNA - Obrigado a V. Exª. Além de sermos irmanados na nordestinidade, ambos temos um voto nesta Casa, também temos a mesma pressão e a mesma idéia a respeito da Saúde. Muito obrigado.

O Sr. Romeu Tuma - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Ney Suassuna?

O SR. NEY SUASSUNA - Concedo o aparte ao nobre Senador Romeu Tuma.

O Sr. Romeu Tuma - Agradeço a V. Exª a oportunidade de aparteá-lo. O projeto do nobre Senador Antonio Carlos Valadares, discutido hoje na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, é um projeto bombeiro, ou seja, em socorro da saúde, a fim de apagar um incêndio que vem consumindo as suas entranhas. Precisamos salvar alguma coisa, e esse projeto é oportuno. Infelizmente, não pudemos contar com a sua presença na CCJC, pelo motivo de V. Exª estar discutindo um projeto em outra Comissão. Mas queria mencionar que na reunião levantou-se o problema das fraudes, com o qual V. Exª se preocupa. Invoquei o meu testemunho de quando dirigia a Polícia Federal. Hoje, existem mais de cem mil processos na Justiça aguardando, tranqüilamente, a prescrição, pois o Ministério Público não tem capacidade de oferecer denúncia nem a 10%. Assim, podemos dizer que é uma anistia permanente, fazendo com que os fraudadores, diante da impossibilidade de a Justiça de condená-los, continuem abusando da facilidade que encontram, talvez pelo preço vil que se paga às consultas médicas e a determinados serviços prestados pela Previdência Social. É uma tabela injusta que, quando aceita, na maioria das vezes, traz consigo a obrigatoriedade da fraude. Isso é um crime e nos entristece. Foi discutido e aprovado o projeto na CCJC, não se abrindo mão de se discutir, com maior profundidade, uma forma de se gerenciarem os recursos da Saúde; nem se pode anistiar o Governo pela responsabilidade do estado em que se encontra hoje a Saúde. Como disse o nobre Senador Pedro Simon com respeito à discussão e aprovação do projeto: votação para Adib Jatene não inocenta e nem tira a responsabilidade do Governo pelo caos em que se encontra a Saúde. Cumprimento V. Exª por trazer à Casa as aflições do sistema de Saúde do seu Estado, que não é diferente nos Estados dos outros Senadores. Estão acabando com o que era bom; inclusive as Casas de Misericórdia, que atendiam tão bem, estão todas falidas.

O SR. NEY SUASSUNA - Muito obrigado, Senador. Em apoiamento ao que V. Exª acabou de comentar, diria que há punições, sim, tanto que no meu Estado dois hospitais foram fechados, por não estarem sendo honestos em relação ao sistema.

O Sr. Humberto Lucena - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA - Senador Humberto Lucena, tem V. Exª o aparte.

O Sr. Humberto Lucena - Congratulo-me com V. Exª por repercutir na tribuna do Senado a excelente gestão do Ministro Adib Jatene na Pasta da Saúde, de cunho nitidamente técnico. Já foi dito aqui, e é verdade, que S. Exª não tem compromisso político-partidário; tem procurado, ao longo do tempo, servir ao País com a sua experiência de médico, sendo de salientar que, apesar da sua dedicação ao Ministério, tanto da primeira vez como agora, nunca se afastou do centro cirúrgico do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas, nem tampouco do Hospital do Coração, ambos em São Paulo. O Ministro Adib Jatene tem feito um esforço para balancear a situação da Saúde pública no Brasil e ontem já nos mostrou, numa reunião, em boa hora promovida por V. Exª, o retrato fiel de como se encontra, no momento, esse importante setor social em nosso País. Quero crer, nobre Senador Ney Suassuna, que o nobre Senador Epitacio Cafeteira tem razão num ponto; inclusive, já tive a oportunidade de falar com o Ministro Jatene a esse respeito. Infelizmente, na execução do SUS - Sistema Único de Saúde -, os hospitais públicos têm sido sucateados. V. Exª é paraibano e vai sempre à Paraíba, mas é também um dublê de carioca, pois mora no Rio de Janeiro e conhece a situação dos hospitais dessa cidade. Sabe V. Exª, por exemplo, que o Hospital dos Servidores do Estado, que sempre foi um centro de excelência de Saúde pública no Rio de Janeiro, estava inteiramente abandonado. Agora, o Ministro, atendendo a apelos do Governador e da comunidade, está tentando recuperá-lo. Da mesma maneira, os outros hospitais públicos também se encontram em situação difícil. Hoje, no Brasil, praticamente em apenas um Estado a Saúde pública encontra-se à altura do atendimento das necessidades da população - no Estado de São Paulo. Porém, acredito que, com os recursos que advirão da Contribuição sobre as Operações Financeiras - CMF -, o Ministro Jatene e os que vierem a sucedê-lo nessa Pasta terão os recursos indispensáveis para que realmente possamos dar ao povo brasileiro uma melhor situação do ponto de vista da Saúde pública, não apenas da Saúde pública curativa, mas da Saúde pública preventiva. Era o que tinha a dizer nesse aparte, nobre Senador.

O SR. NEY SUASSUNA - Muito obrigado, Senador. As colocações de V. Exª engrandecem a minha oração.

O SR. PRESIDENTE (José Sarney) - Senador Ney Suassuna, o tempo de V. Exª está esgotado.

O SR. NEY SUASSUNA - Sr. Presidente, ainda havia um aparteante ao meu discurso, o Senador Sebastião Rocha, a quem peço desculpas.

Concluo dizendo que, lamentavelmente, o sistema de Saúde do País não vai bem, embora o trabalho do Ministro seja o melhor possível. Espero que seja rápida a aprovação do projeto do nobre Senador por Sergipe, Antonio Carlos Valadares, de forma a que possamos ter, em curto prazo, recursos para o sistema e sanar problemas como os que hoje está vivendo a população da Paraíba, cujos hospitais estão em greve desde a última terça-feira, lamentavelmente, levando mais uma aflição a uma grande parte dos seus habitantes, num país já tão tumultuado.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 31/08/1995 - Página 14840