Discurso no Senado Federal

SITUAÇÃO DEPLORAVEL DA EDUCAÇÃO NO ESTADO DE SERGIPE.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • SITUAÇÃO DEPLORAVEL DA EDUCAÇÃO NO ESTADO DE SERGIPE.
Publicação
Publicação no DCN2 de 07/09/1995 - Página 15573
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, EDUCAÇÃO, AMBITO ESTADUAL, ESPECIFICAÇÃO, MUNICIPIO, AQUIDABÃ (SE), PORTO FOLHA, ESTADO DE SERGIPE (SE), OCORRENCIA, FECHAMENTO, ESCOLA PUBLICA, FALTA, PROFESSOR.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, SECRETARIA DE ESTADO, EDUCAÇÃO, ESTADO DE SERGIPE (SE), ATENDIMENTO, INTERESSE, POLITICO, DESVIO, FUNÇÃO, PROFESSOR, OCUPAÇÃO, ASSESSORIA, AUXILIO, CAMPANHA ELEITORAL, CANDIDATO, PARTIDO POLITICO, GOVERNO.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, JOSE RONI SILVA ALMEIDA, PROMOTOR DE JUSTIÇA, MUNICIPIO, PORTO FOLHA, ESTADO DE SERGIPE (SE), IMPETRAÇÃO, AÇÃO CIVIL PUBLICA, ARGUIÇÃO, RESPONSABILIDADE, GOVERNO ESTADUAL, OFENSA, DIREITOS, CRIANÇA, ADOLESCENTE, RELAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, GRATUIDADE, OFERECIMENTO, ENSINO, EXIGENCIA, ALBANO FRANCO, GOVERNADOR, RETORNO, PROFESSOR, EXECUÇÃO, FUNÇÃO, ESCOLA PUBLICA.

O SR. VALMIR CAMPELO (PTB-DF. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, 3 milhões de meninos e meninas, com menos de 14 anos de idade, saem de casa todos os dias, não para ir à escola, como deveriam, mas para trabalhar nas grandes cidades ou em propriedades rurais. Se incluirmos nesse universo todos os menores de 14 a 17 anos, o número sobe para 7 milhões e 500 mil trabalhadores, ainda crianças ou adolescentes, que ocupam 11,6% dos empregos disponíveis no País.

Esses e outros dados, divulgados desde o ano passado, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE, são vergonhosos. O último levantamento nacional realizado por esse órgão revelou que, na área rural, mais de 42% dos menores de 10 a 17 anos trabalham; no setor urbano, esse número cai para cerca de 24%.

Em vez de estarem na escola, estudando e se preparando para a vida, esse imenso contingente de pequenos brasileiros já são trabalhadores e equivalem a quase 12% da nossa população economicamente ativa.

Segundo o Diretor da Organização Internacional do Trabalho, José Carlos Alexim, "é difícil encontrar, no Brasil, uma mercadoria que, na cadeia produtiva, não tenha por trás a marca da mão de uma criança.

Srªs e Srs. Senadores, há sem dúvida, em nosso País, uma verdadeira exploração da mão-de-obra infantil. O trabalho precoce queima uma etapa fundamental da vida de milhões de brasileiros, comprometendo-lhes irremediavelmente o futuro. O trabalho precoce é também um dos principais responsáveis pela preocupação evasão escolar detectada no País.

É para falar sobre este problema social gravíssimo que ocupo hoje a tribuna desta Casa.

O menor que trabalha geralmente abandona a escola. Pelo menos quatro milhões de crianças em idade escolar estão fora das salas de aula. Quase a metade das crianças e adolescentes que trabalham no Brasil - 46% delas, para sermos precisos - têm apenas quatro anos de escolaridade. Mesmo quando não estão fora da escola, a maior parte dessas crianças e adolescentes apresentam uma defasagem que varia entre 2 e 4 anos em relação à série em que, por faixa etária, deveriam estar. Segundo os dados do IBGE, apenas 39 em cada 100 crianças que trabalham terminam o 1º grau.

É lamentável que essas estatísticas sejam verdadeiras. E a pobreza em que vive grande parte da população brasileira é o fator que empurra tantos menores para o mercado de trabalho, sobretudo no interior do País.

É muito fácil encontrar crianças e adolescentes trabalhando como se fossem adultos, em todo o território nacional. Trabalham no corte da cana-de-açúcar, do sisal ou de outras culturas, em olarias, serrarias, oficinas, fábricas, tecelagens, minas de carvão, salinas, pedreiras, e atividades diversas, na cidade e no campo, submetendo-se a riscos diários, muitas vezes em condições atrozes, em ambientes insalubres, despendendo um esforço físico incompatível com o seu organismo em fase de crescimento.

É evidente, porém, que nenhuma criança trabalha porque quer. Trabalha para garantir a própria sobrevivência ou para complementar o orçamento familiar, pois o trabalho dos pais é insuficiente para suprir as necessidades da família. É difícil a fiscalização do trabalho desses menores, Sr. Presidente. Os próprios pais são coniventes com a situação e chegam a esconder os filhos quando aparecem os fiscais do Ministério do Trabalho.

Não tenho dúvida, Sr. Presidente, de que a situação dessas milhares de crianças pertencentes às camadas mais carentes da nossa população é a manifestação mais cruel e contundente do vergonhoso quadro de exclusão social que caracteriza o Brasil. O Sociólogo Herbert de Souza, articulador nacional da Ação da Cidadania contra a Miséria e pela Vida, afirmou que a situação de milhões de crianças exploradas no Brasil "é seguramente a expressão mais profunda e escandalosa do grau de indigência a que chegamos neste País, que faz das crianças suas primeiras vítimas, diante da passividade da sociedade".

A brutal concentração de renda existente em nosso País o coloca em penúltimo lugar nesse quesito das estatísticas mundiais, sendo a responsável direta pela miséria em que vivem mais de trinta milhões de pessoas. Cinqüenta e oito por cento das crianças e adolescentes brasileiros vivem em famílias cuja renda per capita não ultrapassa meio salário mínimo, segundo a Pesquisa Nacional de Amostragem Domiciliar, realizada em 1990.

Aliada à desassistência no que diz respeito à educação, à saúde, e a tantos outros direitos elementares que integram o conceito de cidadania, está, sem dúvida, a miséria em que vivem tantas famílias em nosso País e que empurra para o mercado de trabalho, ou, o que é ainda pior, para as ruas grande número de jovens e crianças.

O trabalho precoce deixa sempre alguma seqüela irrecuperável, resultando não só no impedimento dos estudos como também no comprometimento da saúde e do desenvolvimento físico e mental de grande parte de nossa população infanto-juvenil.

Conscientes do problema, muitos movimentos sociais vêm transformando em bandeira de luta os direitos da criança à educação, à saúde, enfim, a uma vida melhor. Felizmente, hoje já é bem maior o engajamento da sociedade e de instituições na luta pela redução da mortalidade infantil por doenças evitáveis, pela redução da desnutrição, do analfabetismo e da violência que, muitas vezes, marginalizam e comprometem o futuro de nossa população mais jovem. Como exemplo, gostaria de citar o excelente trabalho que a Força Sindical vem desenvolvendo e que poderia servir de modelo para tantas outras entidades.

Em fins de 1992, a Força Sindical assinou um convênio com a Organização Internacional do Trabalho para o desenvolvimento do IPEC - Programa Internacional de Erradicação do Trabalho Infantil - e vem obtendo êxito na luta em defesa dos direitos das crianças e adolescentes em nosso País, com o apoio de órgãos nacionais que trabalham em prol dos menores e da UNICEF. A primeira fase do projeto atingiu cerca de oitocentos sindicalistas, em quatorze cursos realizados nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Ceará, Santa Catarina e Paraná.

Sras. e Srs. Senadores, mais do que conseguir informar ou conscientizar significativos segmentos da sociedade sobre os direitos das crianças e adolescentes e sobre a realidade aqui existente, cursos e trabalhos como esses têm o mérito de produzir um efeito positivo e multiplicador, gerando desdobramentos ou ações diretas envolvendo a sociedade na luta em defesa de nossa população infanto-juvenil.

Essa informação e conscientização são extremamente necessárias. A sociedade não pode mais ficar passiva diante de um problema social de tal gravidade. A realidade vem demonstrando que, na prática, os direitos garantidos pela Constituição Federal e regulamentados no Estatuto da Criança e do Adolescente não são respeitados.

Segundo a legislação brasileira, até os doze anos de idade a criança deve ser protegida do trabalho. Entre doze e quatorze anos deve-se conciliar, quando necessário, educação e trabalho, por meio da iniciação em regime de aprendizagem ou da inserção em programas que tenham por base o trabalho educativo. Somente após os quatorze anos os programas nessa área devem visar a capacitação profissional, o encaminhamento adequado e a proteção dos adolescentes no ambiente e nas relações de trabalho.

Os dados aqui mencionados anteriormente demonstram o fosso existente entre a teoria e a prática. Sete milhões e quinhentos mil trabalhadores de até dezessete anos ocupam 11,6% dos empregos disponíveis no País. São quase 12% de toda a nossa população economicamente ativa, Sr. Presidente.

Certamente, projetos como o IPEC, da Força Sindical, são extremamente importantes. Porque geram conhecimento, sensibilizam e conscientizam centenas de pessoas para a problemática do trabalho de crianças e adolescentes, tornando-as multiplicadores qualificados e preparados para o debate e a ação referente ao trabalho infanto-juvenil. Quero mais uma vez dizer que a Força Sindical desenvolve esse trabalho fundamental, atendendo aos preceitos constitucionais.

Precisamos estimular a consciência da sociedade como um todo sobre o grave problema da exploração da mão-de-obra infanto-juvenil em nosso País. Ao mesmo tempo em que temos que pressionar as autoridades para que busquem alternativas para acabar de uma vez por todas com a vergonhosa e trágica realidade social do Brasil, que empurra nossas crianças para o mercado de trabalho.

Os programas de trabalho e de geração de renda devem ter como alvo a família e não a criança. Todos concordamos, Sr. Presidente, que lugar de criança é na escola. Mesmo em caso de absoluta necessidade, é preciso que o trabalho infantil se desenvolva de forma a não impedir o acesso da criança à escola e, sobretudo, evitar que ela se transforme em mão-de-obra explorada.

Apesar de reconhecer que de nada adianta proibir a criança de trabalhar, quando essa é o único meio para que ela morra de fome. Condeno, veementemente, o trabalho infantil, em virtude das conseqüências negativas que ele tem sobre a formação de nossas crianças, alijando-as da escola, comprometendo não só o futuro de milhões de pequenos brasileiros, mas também o futuro do nosso País. Para evitar que a situação atual continue, é urgente a implementação de uma política econômica de redistribuição de renda.

Ao concluir meu pronunciamento, gostaria de conclamar os Srs. Parlamentares e as autoridades governamentais a lutarmos sem tréguas para pôr fim ao trágico problema da exploração da mão-de-obra infantil em todo o território nacional. Precisamos encontrar, urgentemente, soluções para minorar os problemas que atingem as camadas mais carentes, sobretudo as camadas mais jovens da nossa população.

O tempo é agora. As crianças não podem esperar. É preciso resgatar a imensa dívida social que o Brasil tem para com elas.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 07/09/1995 - Página 15573