Discurso no Senado Federal

PAPEL DO SENADO FEDERAL NA BUSCA DE SOLUÇÕES PARA A IMPLEMENTAÇÃO DE UMA OCUPAÇÃO RACIONAL E PRODUTIVA DA AMAZONIA.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • PAPEL DO SENADO FEDERAL NA BUSCA DE SOLUÇÕES PARA A IMPLEMENTAÇÃO DE UMA OCUPAÇÃO RACIONAL E PRODUTIVA DA AMAZONIA.
Publicação
Publicação no DCN2 de 13/09/1995 - Página 15727
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • CONSCIENTIZAÇÃO, NECESSIDADE, RACIONALIZAÇÃO, OCUPAÇÃO, EXPLORAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, PRIORIDADE, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, RESGATE, CIDADANIA, HOMEM, REGIÃO.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, SENADO, DEBATE, PROPOSIÇÃO, VIABILIDADE, IMPLEMENTAÇÃO, RACIONALIZAÇÃO, OCUPAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a situação da Região Amazônica tem sido profundamente modificada. Com a abertura de incontáveis estradas na década de setenta, a imigração intensa fez crescer de forma impressionante a população.

Só para se ter uma idéia desse crescimento, basta mencionar que, de 1950 para 1991, a população da Amazônia saltou de um milhão oitocentos e quarenta e cinco mil para dez milhões duzentos e noventa e sete mil habitantes. Portanto, em apenas quarenta e um anos, o crescimento foi da ordem de quatrocentos e cinquenta e seis por cento.

De 1970 para cá, gigantescos projetos econômicos lá se instalaram. Podemos citar Grande Carajás e Jari, bem como as colossais hidrelétricas de Balbina e Tucuruí.

Foi justamente em função dessa ocupação tão acelerada quanto caótica que a Amazônia ganhou triste projeção internacional - em especial nos anos oitenta - como a área do planeta que estava sendo devastada de forma mais implacável, colocando em risco até mesmo o clima da Terra.

No entanto, estudos técnicos recentes mostram que o número de queimadas na região é hoje muito menor do que no final da década passada. Levantamento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, feito através de fotografias de satélites, mostra que o desmatamento caiu de dois milhões de hectares em 1988 para um milhão em 1991.É um número ainda considerável mas que tende a decrescer.

Da mesma forma, foram desmentidos ou contraditados, pelos técnicos, estudos alarmistas que acenavam com um elevado aquecimento da temperatura do planeta em função da destruição da floresta Amazônica.

Na verdade, nos últimos tempos, o que existe é uma acirrada guerra de informações sobre a Amazônia. Ora fala-se que há interesse dos Estados Unidos e das grandes potências ocidentais em tomar para si aquela região; ora anuncia-se que há geólogos de empresas multinacionais infiltrados em missões religiosas no meio das selvas para verificar as riquezas minerais das terras dos índios.

O certo é que a Amazônia tem um potencial tão grande - seja em minérios, seja na possível exploração de seu banco genético - que nem a imaginação mais arrojada consegue projetar o futuro daquela região, uma das mais ricas do planeta. Talvez não estejam exagerando os que acham que a Amazônia pode ser a redenção econômica do Brasil. Sua riqueza incomensurável, se bem explorada, poderá contribuir grandemente para retirar o País da situação falimentar em que se encontra.

Estudos recentes indicam que as áreas cobertas por florestas tropicais representam apenas dois vírgula quatro por cento da superfície total do globo terrestre. No entanto, nessa percentagem mínima concentra-se metade das espécies vivas, cifra que pode se elevar na medida em que avançarem as pesquisas científicas. Assim, o potencial da Amazônia, só no que tange à diversidade biológica, é fantástico.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os números da Amazônia são tão grandiosos que mexem com as pessoas e, assim, quase sempre as discussões sobre o futuro daquela área descambam para o tom emocional, apaixonado, beirando o irracional.

Como se sabe, o movimento ecológico - que, por sua vez, teve origem no movimento hippie, do final dos anos sessenta - ganhou tanta força na década de oitenta que se transformou numa quase seita com adeptos espalhados pelo mundo todo. E aí virou moda defender a preservação pura e simples, ou seja a intocabilidade, de certas regiões. Amazônia despontou então como a menina dos olhos dos ecologistas.

Aos poucos, no entanto, o debate sobre o potencial amazônico começou a ganhar racionalidade. Hoje, estamos todos conscientes de que o modo de ocupação desencadeado nos anos setenta foi deletério, insensato e improdutivo. Não se pode mais pensar naquela vasta área como mero objeto de saque. Não basta simplesmente abrir estradas e jogar colonos à sua própria sorte. Do mesmo modo, não adianta erguer projetos gigantescos que, apesar de um tremendo impacto ambiental, geram número reduzido de empregos.

Agora, o que se quer para a Amazônia é uma ocupação racional. Todos os potenciais econômicos da região devem ser explorados, sim, porém dentro de cuidados estritos com a manutenção do meio ambiente. Mas é preciso que o Governo e as forças da nação estabeleçam de imediato as metas para o crescimento futuro.

Lamentavelmente, durante as acesas polêmicas travadas ora sobre o intocabilidade da Amazônia ora sobre sua possível devastação, quase nunca se falou no homem, no habitante das selvas e dos pequenos vilarejos ribeirinhos, que vive hoje em condições das mais precárias, nem nenhum dos benefícios da civilização. Jogado á própria sorte, sem um treinamento que lhe permita racionalizar seu trabalho e elevar sua remuneração, vive à míngua. O grande esquecido nesse debate foi, sem dúvida, o cidadão da Amazônia.

Não há dúvida de que a grande maioria dos que defendem a preservação da Amazônia como ela está - ou seja totalmente estagnada - é movida por sentimentos nobres. Mas, claramente, essas pessoas exageram toda vez que se propõem a projetar os possíveis impactos de uma ocupação da floresta. Quase sempre apontam para um mais do que improvável holocausto biológico.

Acontece, porém, que esses mesmos cidadãos, com suas denúncias muitas vezes inconsistentes, acabam desviando a atenção do mais importante, ou seja, do fato de que a maior parte da poluição do meio ambiente do planeta Terra é causada pelos países mais ricos, com suas incontáveis fábricas e suas imensas frotas de automóveis.

É preciso considerar também que a ocupação maciça, sem critério, de partes da Amazônia para a expansão da fronteira agrícola teve origem na concentração da posse de terra nas demais regiões brasileiras. Em outras palavras, essa ocupação foi mais um subproduto da falta de reforma agrária no País.

Desordenada, caótica, movida pelo imediatismo, a ocupação dos anos setenta significou muitas vezes apenas a destruição da mata para venda de madeiras nobres e, posteriormente, o rápido esgotamento de terras que não receberam tratamento adequado. Nada mais.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, está na hora de deixarmos de lado o maniqueísmo que aflora toda vez que se fala em Amazônia. Não é sensato que se continue a colocar como liminarmente excludentes conceitos como ocupação e preservação. A ocupação pode ocorrer sem devastação. Da mesma forma, nem toda exploração da floresta será predatória, já que poderá ser tocada com tecnologia, bom senso e eficiência.

Em suma, o que se quer é uma ocupação racional, que leve em conta as exigências ambientais, mas também as sociais. Freqüentemente, ouve-se dizer com ironia que o animal mais ameaçado da região é o bicho homem, que está à mercê da miséria, das doenças e da ignorância. O objetivo número um deve ser, portanto, o resgate da cidadania dos amazônidas.

Quanto à geopolítica, temos que considerar prioritariamente os interesses brasileiros na área, mas isso não significa esquecer que a Amazônia, sem dúvida, é importante para todo o planeta. Abandonada como está hoje, a região é um terreno propício aos que contrabandeiam ouro e pedras preciosas. Já se fala que a Amazônia virou um corredor seguro para os traficantes de droga. Ou seja, sem a presença do Estado é abrigo seguro para aventureiros e bandidos.

Acho que já existem hoje as condições necessárias a uma ocupação racional. Creio que os organismos oficiais brasileiros já têm hoje informações suficientes para desencadear um equilibrado zoneamento ecológico-econômico, indicando áreas que devem ser preservadas e as que podem ser usadas para atividades produtivas. O Governo brasileiro certamente já possui instrumentos para saber qual a vocação natural de cada área. O que falta é vontade política para levar adiante esse projeto.

Só quando partir para uma ocupação racional e produtiva o Brasil vai deixar bem claro - para o seu povo e para o resto do mundo - que a Amazônia realmente é nossa.

De outro lado, na verdade, existem hoje fartos recursos, disponíveis em organismos internacionais, para investimentos em projetos de cunho ecológico.

Do mesmo, quando definirmos o que deve ser explorado e de que forma, certamente surgirão investidores privados interessados em atuar na região.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, creio que, trazendo ao debate desta Casa a questão amazônica, estou contribuindo para a busca de soluções, que não devem tardar. Há muito a Amazônia espera que o Brasil se volte para ela. O Senado da República deve desempenhar um papel de destaque na ocupação da Amazônia, seja cobrando ações por parte do Poder Legislativo, seja debatendo aqui as proposições que vão permitir a implementação segura dessa velha aspiração nacional.

Era o que tinha a dizer. Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 13/09/1995 - Página 15727