Discurso no Senado Federal

INCIDENTES ENTRE OS SEM-TERRA E POLICIAIS RODOVIARIOS FEDERAIS NA LOCALIDADE DE NOVA XAVANTINA-MT. URGENCIA DE UMA DEFINIÇÃO DO GOVERNO FEDERAL SOBRE A QUESTÃO DA REFORMA AGRARIA.

Autor
Carlos Bezerra (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MT)
Nome completo: Carlos Gomes Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA.:
  • INCIDENTES ENTRE OS SEM-TERRA E POLICIAIS RODOVIARIOS FEDERAIS NA LOCALIDADE DE NOVA XAVANTINA-MT. URGENCIA DE UMA DEFINIÇÃO DO GOVERNO FEDERAL SOBRE A QUESTÃO DA REFORMA AGRARIA.
Aparteantes
Ademir Andrade, Flaviano Melo, Jader Barbalho, Marina Silva, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DCN2 de 14/09/1995 - Página 15766
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, OCORRENCIA, VIOLENCIA, POLICIA RODOVIARIA FEDERAL, AGRESSÃO, TRABALHADOR, SEM-TERRA, MUNICIPIO, NOVA XAVANTINA (MT), ESTADO DE MATO GROSSO (MT), AUSENCIA, CONHECIMENTO, GOVERNO ESTADUAL, SECRETARIA DE SEGURANÇA PUBLICA.
  • DEFESA, NECESSIDADE, URGENCIA, GOVERNO FEDERAL, UTILIZAÇÃO, RECURSOS EXTERNOS, EFICACIA, IMPLANTAÇÃO, REFORMA AGRARIA, GARANTIA, APOIO, SEGURANÇA, PRODUÇÃO, TRABALHADOR.

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT. Como Líder, pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, essa madrugada, em Mato Grosso, na localidade Nova Xavantina, em uma ponte sobre o rio das Mortes, houve um fato lamentável. A Polícia Rodoviária Federal - veja bem, a Polícia Rodoviária Federal - atacou e atirou em trabalhadores sem-terra. Temos lá três trabalhadores gravemente feridos e dois desaparecidos. Esse ato foi praticado sem o conhecimento do Governo do Estado, sem o conhecimento das demais autoridades que atuam naquela região, que atuam na questão da reforma agrária, e sem conhecimento da Secretaria de Segurança Pública do Estado. Um ato de vandalismo sem precedentes.

Em Mato Grosso tem havido vários casos de ocupação de propriedades. E este é um movimento nacional articulado dos sem-terra para pressionar o Governo em favor da questão da reforma agrária. Porém, o Governo e as Lideranças políticas têm feito tudo para evitar que a violência ocorra em Mato Grosso, para que fatos abomináveis como o ocorrido em Rondônia não aconteçam naquele Estado. Tenho me envolvido pessoalmente nesse sentido, indo aos acampamentos, conversando com os trabalhadores, encaminhando a solução mais adequada para o problema.

No caso do rio das Mortes, os trabalhadores que tinham feito reféns, ocupado a ponte e impedido o trânsito, anteontem ligaram para o meu Gabinete. Afirmei-lhes que desaprovava esse comportamento e não conversaria mais com eles enquanto os reféns e a rodovia não fossem liberados. O Governador enviou os secretários para negociarem, e eles concordaram em libertar os dois reféns e a rodovia ontem, depois de longa negociação entre o Governo e os trabalhadores. Para surpresa de todos, nessa madrugada, aconteceu esse fato aterrador.

Há poucos dias - vejam bem como é errada a visão do Governo -, quando ocupada uma outra propriedade em Mato Grosso, em Pedra Preta, estava eu no gabinete de um Ministro que queria responsabilizar o Governo do Estado e o INCRA por aquela ocupação. Disse-lhe que estava equivocado porque nem o INCRA nem o Governador são culpados por isso. O Governador defende a reforma agrária mas não defende a baderna, a desordem no Estado; o culpado por isso é o próprio Governo, que não faz com que o Programa de Reforma Agrária avance, já que há uma situação de desespero e agonia no campo.

Talvez essa mesma interpretação errada de que o Governo Estadual não iria agir deve ter originado - até agora não sei quem é o responsável - essa ordem absurda da Polícia Rodoviária Federal, que chegou em um ônibus lotado da própria Polícia e três carros pequenos, de madrugada, sorrateiramente, naquela localidade, atirando. Houve um trabalhador que recebeu cerca de doze tiros, todos pelas costas.

A Srª Marina Silva - Permita-me V. Exª um aparte?

O SR. CARLOS BEZERRA - Ouço V. Exª com muito prazer.

A Srª Marina Silva - Em primeiro lugar, quero parabenizar V. Exª por trazer a esta Casa a preocupação com esse episódio ocorrido em seu Estado, ao mesmo tempo em que faz alusão a outros ocorridos recentemente no Estado de Rondônia, Pará e que já foi tema de debate nesta Casa. Em segundo lugar, quero colocar algo que no mínimo deveria servir para uma reflexão nossa, do Governo brasileiro e dos Governos estaduais: a ação da polícia militar de forma a extrapolar em muito a orientação dada por seu comandante em chefe - que, às vezes, nem as dá - que é o Governo do Estado, e encaminhar certos procedimentos que têm como produto final essas tragédias que V. Exª acaba de narrar. Eu me pergunto, Senador, se não está havendo uma ação combinada entre alguns setores da Polícia Militar, juntamente com interesses contrários à reforma agrária, numa tática de intimidação ao movimento dos sem-terra, que ocupa terras improdutivas para pressionar o Governo a fazer a reforma agrária. Concordo inteiramente com V. Exª quando diz que em função da morosidade, da falta de agilização do processo de reforma agrária por parte do Governo brasileiro esses episódios vêm acontecendo. Penso que pode estar ocorrendo, em vários Estados, essa ação articulada entre setores da Polícia Militar e setores bastante conservadores, contrários à reforma agrária, como uma tática de intimidar o movimento dos sem-terra e as próprias autoridades que estão empenhadas, hoje, em fazer a reforma agrária neste País. Não pode ser um episódio apenas casual o fato que ocorreu em Rondônia, com a presença da Polícia Militar; fatos ocorridos no Pará, fatos ocorridos agora, narrados por V. Exª, onde não houve uma determinação e já havia até a transigência, por parte dos trabalhadores, de aceitar liberar os reféns, desobstruir a estrada federal. Por que essa ação da Polícia? Na verdade, acho que deveríamos ter o cuidado de investigar se tudo isso não é uma ação entre setores do latifúndio, articulado com alguns profissionais que deveriam fazer a segurança e que acabam se prestando a este tipo de serviço: o de jagunço de latifundiário. Muito obrigada.

O SR. CARLOS BEZERRA - Nobre Senadora, quero dizer a V. Exª que não foi a Polícia Militar quem atirou, foi a Polícia Rodoviária Federal. Aliás, essa foi uma ação inédita da Polícia Rodoviária Federal do Brasil, que sempre vi como pacata, orientadora e que, agora, pela primeira vez, foi solicitada para um ato dessa natureza.

A Srª Marina Silva - O que torna mais grave ainda!

O SR. CARLOS BEZERRA - E ela é ligada ao Ministério da Justiça. O Ministro da Justiça está fazendo um grande trabalho pelos direitos humanos no Brasil, que louvo e aplaudo. S. Exª, inclusive, é meu companheiro de Partido. E, agora, exatamente um órgão ligado ao seu Ministério, que é a Polícia Rodoviária Federal, pratica um ato dessa natureza sem o conhecimento do Ministro, segundo o Sr. Milton Seligman, Secretário-Geral do Ministério. Não pude falar com o Ministro porque S. Exª está no Estado do Amazonas, mas o Secretário me garante que o Ministro não tem conhecimento desse ato e não o autorizou.

O Sr. Ademir Andrade - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. CARLOS BEZERRA - Pois não. Ouço o aparte de V. Exª, nobre Senador.

O Sr. Ademir Andrade - Nobre Senador, veja bem, ontem, estávamos na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e V. Exª fez todo o relato, dizendo do esforço, de V. Exª e do Governador do Estado, no sentido de impedir que atrocidades como a de Rondônia e como as que aconteceram no Pará não ocorressem no seu Estado. E, hoje, somos surpreendidos por essa notícia realmente absurda. Também desconhecíamos essa possibilidade de ação da Polícia Rodoviária Federal, uma Polícia que sempre respeitamos e consideramos, ao longo de toda a sua história, pelos enormes serviços que tem prestado a este País. É lamentável! Creio que temos que averiguar de onde partiu essa ordem, quem é o responsável para que a Polícia Rodoviária Federal se arme para atacar trabalhadores rurais. Por outro lado, como concluímos ontem na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, quando ouvíamos o Presidente do INCRA e o Diretor-Geral da Polícia Federal, todos nós nesta Casa devemos nos unir, porque temos agora em mãos o Orçamento da União de 96 e é nossa responsabilidade garantir os recursos suficientes para que se faça a reforma agrária no nosso País, para que se atenda à necessidade dos trabalhadores rurais da nossa Pátria. Todos estamos convencidos da importância e da necessidade da reforma agrária para a Nação. Muito obrigado.

O SR. CARLOS BEZERRA - Quero aproveitar esse fato para fazer algumas colocações a respeito da reforma agrária. Acredito que alguns setores ainda insistem em transformar a reforma agrária num instrumento de luta ideológica e de forma errada conduzem o movimento.

Por outro lado, acredito que o Governo insiste em querer fazer o mesmo tipo de reforma agrária que outros Governos tentaram, no passado, e fracassaram; não fizeram nada. E se este Governo continuar no rumo que tomou vai fracassar também.

Essa reforma tem que ser replanejada, rediscutida, reencaminhada. É preciso somar mais recursos, mais forças, para que a reforma agrária realmente aconteça no Brasil. E não aconteça de forma errada, paternalista, colocando o trabalhador na terra sem condições de produzir, sem apoio, sem estrutura e sem dar a ele uma política agrícola. É necessário uma reforma agrária que dê segurança à produção.

Há condições plenas de se fazer um programa dessa natureza; há condições e é necessário. Mas estamos assistindo ao mesmo discurso dos últimos anos dos outros Governos, com os quais não se chega à solução nenhuma.

Há hoje uma pressão grande, cada vez maior, legítima dos trabalhadores no que concerne à questão da terra. E, então, acontecem fatos como esse que vimos nessa madrugada, em Rondônia, em Mato Grosso, no sul do Pará e em outras localidades do Estado.

O Sr. Flaviano Melo - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. CARLOS BEZERRA - É com prazer que ouço V. Exª.

O Sr. Flaviano Melo - Senador Carlos Bezerra, V. Exª denuncia hoje um fato que está se tornando corriqueiro no nosso País. Estão aí os exemplos que aconteceram em outros Estados. Na parte final do seu pronunciamento, V. Exª aborda o assunto com muita clareza, e é nesse ângulo que quero solidarizar-me com V. Exª. Quando o Presidente da República, no começo do ano, anunciou que iria assentar 40 mil famílias em 1995, no dia seguinte vim à tribuna desta Casa para elogiar esse procedimento e cobrar que não se deveria apenas assentar as famílias - exatamente o que V. Exª disse - mas dar condições para que o homem pudesse produzir. Caso contrário, ele assentaria 40 mil, e 80 mil trabalhadores deixariam a terra. O que temos que analisar é a existência de dois grandes problemas. O primeiro refere-se ao caráter emergencial: os sem-terra existem, a Polícia de vez em quando comete essas atrocidades e vemos o Ministro da Agricultura dizer que o INCRA não tem que mediar esse processo. Entendo, contudo, que o INCRA tem que estar próximo, tentando mediar os conflitos existentes. Em segundo lugar, é necessário fazer de fato reforma agrária neste País; senão, vamos continuar ouvindo, a cada mês, um dos Senadores fazer denúncias como a que V. Exª faz agora. Quero me solidarizar com o seu pronunciamento e cobrar, mais uma vez, do Governo Federal o discurso do início do ano: a realização da reforma agrária neste País.

O SR. CARLOS BEZERRA - Acredito que o Presidente quer realmente fazer a reforma agrária, só não tem como encaminhar o problema.

Na verdade, o Governo Federal quer ficar no "arroz com feijão" do passado. Assim, não vai conseguir fazer qualquer reforma agrária. Precisa ser mais criativo e repensar o assunto.

Uma alternativa seria buscar recursos externos. Existem os programas bilaterais, que dispõem de abundantes recursos, bastando que o Brasil monte um programa bem feito e o apresente a outros países, como Japão, Itália, Espanha, que estão prontos a financiar programas dessa natureza. Programas ambientais e similares receberão apoio internacional com facilidade.

Mas o Governo não tem dinheiro - sabemos disso; os recursos são irrisórios. Querem, apenas com recursos da União, realizar um programa dessa monta, dessa natureza. Não vai conseguir, porque não existe dinheiro para isso.

Então, deve-se limitar a reforma agrária; não dá para fazer no Brasil inteiro. Por que tentar fazer reforma agrária em São Paulo, no Sul do Brasil? Limitem as áreas! Em duas regiões do Centro-Oeste vamos fazer. Aqui é prioridade; esqueçamos as outras regiões. Aqui poderemos garantir um pedaço de terra ao trabalhador, quando a terra é mais barata e o programa fica mais barato.

Temos que pensar nesse assunto e viabilizá-lo de modo exeqüível. Não se deve falar algo no discurso que não condiz com o que está acontecendo na prática, o que desgasta o Governo, a autoridade e todos nós.

Ora, diariamente a questão da reforma agrária é solicitada no meu gabinete. É uma loucura! Durmo pensando nisso e amanheço pensando nisso. É sindicato, são federações, todo mundo; prefeitos, vereadores, líderes; é uma gritaria geral! Daqui a pouco, terei de trabalhar exclusivamente para a reforma agrária. Não posso fazer mais nada na minha atividade política porque esse assunto está cada dia mais tomando conta do meu gabinete.

Com relação ao INCRA, quero dizer o seguinte: o Presidente do INCRA está em Mato Grosso mediando essa questão. Ele está tendo um comportamento que, apesar de contestado por alguns, está correto. Ele não é um homem "fantasiado" de Esquerda, mas que, até agora, nessa gestão, tem tido um comportamento exemplar e está em Mato Grosso ajudando a resolver o problema.

O Sr. Romeu Tuma - V. Exª me concede um aparte?

O SR. CARLOS BEZERRA - Concedo o aparte ao nobre Senador Romeu Tuma.

O Sr. Romeu Tuma - Eu peço um aparte para concordar em gênero, número e grau com V. Exª. Gostaria de esclarecer que a colocação da Senadora Marina Silva sobre o uso indevido da PM, por pessoas ligadas a empresários da terra, preocupa-me um pouco. Eu não estou discordando da colocação da nobre Senadora, mas é difícil entender que a PM haja por conta própria, por iniciativa pessoal do seu comandante ou do comandante de grupo. Há uma responsabilidade no emprego desta força; é preciso apurar se houve ou não desvios de ação da Polícia Militar. Se houve uma ação ilegal, não podemos ficar aqui apenas na discussão. Outro susto foi ouvir V. Exª se referir à Polícia Rodoviária Federal. A Polícia Rodoviária foi criada por este Congresso e ratificada pelo art. 144 da Constituição como um dos órgãos da Segurança Pública, pois não tinha poder de polícia, era uma ação fiscalizadora de trânsito. Ela passou a ser polícia, mas mantida - eu acredito - a sua missão: fiscalizar e punir os infratores nas estradas federais. Uma ação repressiva em cima de um problema de terras, assusta-me, e não posso isentar ninguém do Ministério da responsabilidade sobre esta ação. Se a Polícia Rodoviária Federal teve a iniciativa de uma ação, por conta própria, todos já deveriam ter sido demitidos.

O SR. CARLOS BEZERRA - Foi o que cobrei do Secretário.

O Sr. Romeu Tuma - Não posso aceitar isso. É a preservação da própria instituição que está em jogo; se tem o poder de, por iniciativa própria, desviar-se do seu comportamento legal, ela não precisaria existir. Ontem, durante as discussões a que o Senador Ademir Andrade se referiu com o coordenador central policial e o Presidente do IBAMA, V. Exª propôs a criação de uma subcomissão para rever e auxiliar o Governo nesse projeto de como deve ser feita a reforma. Não podemos ficar numa guerra de secessão em que se invade, mata, atira. Fiquei na Polícia Federal, Senador, durante oito anos e meio; de lá saí há quase quatro. Desde o primeiro dia no cargo, observei que houve problemas de invasão de terras pelos sem-terra; empresários se armaram durante o período. O maior contrabando de armas foi em razão da aquisição dessas armas pelos empresários, que tinham medo que suas terras fossem invadidas. Parece-me que isso está voltando a acontecer. Vamos transformar o Brasil numa praça de guerra permanente, onde vai-se socorrer a cada instante vítimas inocentes. Concordo com V. Exª, mas acho que temos de partir do discurso para a ação. Acredito na comissão que V. Exª propôs.

O SR. CARLOS BEZERRA - Obrigado pelo seu aparte.

O SR. PRESIDENTE (Levy Dias) - Senador Carlos Bezerra, a Mesa avisa que o seu tempo está esgotado.

O SR. CARLOS BEZERRA - A Polícia Militar tem de obedecer o comando, e o comando é o político, é o do governador, que é o chefe da Polícia Militar.

Como Governador, não permiti que em meu Estado se fizesse um despejo sequer; fui negociar pessoalmente todas as ordens judiciais.

Não houve necessidade de nenhum despejo, de nenhuma violência, porque o governo tinha um compromisso com essa questão. Desse modo, depende do compromisso do Governador de cada Estado.

O Sr. Jader Barbalho - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. CARLOS BEZERRA - Ouço com prazer o nosso Líder Jader Barbalho.

O Sr. Jader Barbalho - Senador Carlos Bezerra, cumprimento V. Exª pelo tema, apesar de o mesmo versar sobre luto. Digo a V. Exª que o Governo tem que encarar essa questão da reforma agrária como um projeto econômico e social. Jamais pode ser encarado como um projeto de Segurança Pública; além disso, há um dado fundamental. Não é possível implantar-se um projeto de reforma agrária, como bem disse V. Exª - posso dizer com um certo conhecimento de causa, porque fui Ministro da área - sem recursos. Quer-se fazer reforma agrária, no Brasil, somente com decreto de desapropriação, com mero ato de arbítrio. Enquanto não se fizer a descentralização, será impossível; a tarefa do assentamento deve ficar com os Estados. Não é possível, num País de dimensões continentais como o nosso, um problema de assentamento no Mato Grosso ter que ser resolvido em Brasília. A questão da desapropriação deveria ficar com a União em um fundo de recursos. Há dinheiro para a SUDENE financiar projetos com incentivo fiscal para Imposto de Renda; há dinheiro na SUDAM para financiar projetos de pecuária com dinheiro do Imposto de Renda; existe uma política de incentivo fiscal para concentrar a renda neste País. Não é possível dar mais dinheiro para quem já o tem, e não se ter a coragem de abandar uma quantia desse dinheiro e se criar um fundo para a reforma agrária no Brasil. Há necessidade, portanto, de decisão política. V. Exª fala que não há dinheiro. Mas se abandássemos um pouco de incentivo fiscal, destinado à concentração de renda, neste País, em favor da reforma agrária, se criássemos um fundo para as desapropriações e, outro, para financiar os Estados, objetivando o assentamento - não creio que seja factível, porque em Brasília o INCRA dá assistência para o assentamento em Rondônia, no Pará, em Goiás, enfim, no Paraná nesse imenso território - distribuindo a tarefa, estabelecendo um sistema de co-responsabilidade para com os Governos estaduais, seria possível encontrarmos o caminho. Concordo com V. Exª. Enquanto alguns setores entenderem o assunto simplesmente como uma bandeira ideológica, e o Governo não encará-lo como um projeto econômico e social, carreando recursos para o programa, lamentavelmente, iremos continuar assistindo discursos como o de V. Exª no sentido de registrar fatos dolorosos como esses que acabaram de ocorrer no seu Estado.

O SR. CARLOS BEZERRA - Agradeço o aparte de V. Exª. O nobre Senador tem toda a razão. Lembro que os grandes países do mundo só se desenvolveram quando fizeram a modificação agrária. O próprio Estados Unidos, berço do capitalismo, depois de fazer uma mudança agrária é que pôde desenvolver a contenda.

Aqui fica registrado o meu repúdio a esse ato de violência ocorrido, nesta madrugada, no meu Estado.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 14/09/1995 - Página 15766