Discurso no Senado Federal

DANDO CONHECIMENTO A CASA DE CORRESPONDENCIA RECEBIDA DO SENHOR PRESIDENTE DA REPUBLICA, EM RESPOSTA A QUESTIONAMENTOS SOBRE A PRIVATIZAÇÃO DA CAMPANHIA VALE DO RIO DOCE.

Autor
Jader Barbalho (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PA)
Nome completo: Jader Fontenelle Barbalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • DANDO CONHECIMENTO A CASA DE CORRESPONDENCIA RECEBIDA DO SENHOR PRESIDENTE DA REPUBLICA, EM RESPOSTA A QUESTIONAMENTOS SOBRE A PRIVATIZAÇÃO DA CAMPANHIA VALE DO RIO DOCE.
Aparteantes
Edison Lobão, Eduardo Suplicy, José Eduardo Dutra.
Publicação
Publicação no DCN2 de 16/09/1995 - Página 15916
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • LEITURA, AGRADECIMENTO, CARTA, AUTORIA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, RESPOSTA, QUESTIONAMENTO, ORADOR, RELAÇÃO, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), INFORMAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, SENADO, FISCALIZAÇÃO, ACOMPANHAMENTO, PROCESSO, DESESTATIZAÇÃO.

O SR. JADER BARBALHO (PMDB-PA. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho à tribuna, em nome da Liderança do PMDB, para dar conhecimento à Casa de correspondência do Senhor Presidente da República, vazada nos seguintes termos:

      "Bruxelas, 14 de setembro de 1995.

      Ao Excelentíssimo Senhor

      Senador Jader Barbalho

      Prezado Senador,

      Acuso com satisfação o recebimento de sua carta de 31 de agosto último. Nela identifico a mesma disposição construtiva que tem pautado as atitudes de V. Exª como Senador da República, Líder do PMDB e um valioso aliado de meu Governo.

      Considero pertinentes as preocupações manifestadas por V. Exª acerca da privatização da Companhia Vale do Rio Doce.

      Minha decisão de incluir a CVRD no Programa Nacional de Desestatização atendeu a duas ordens de considerações.

      Por um lado, trata-se de possibilitar que a Companhia mantenha a posição de liderança que hoje detém, como bem enfatiza V. Exª, num mercado altamente competitivo. Para tanto ela deve realizar, nos próximos anos, investimentos em patamares muito superiores aos atuais. Acontece que o Estado brasileiro não dispõe de recursos suficientes para financiar tais investimentos, nem se mostra factível mobilizá-los, na escala necessária, através de parcerias com a iniciativa privada.

      A gestão privada permitirá à CVRD utilizar plenamente sua reconhecida capacidade empresarial, hoje limitada pelos entraves administrativos e orçamentários típicos de uma empresa estatal. Mantê-la sob controle do Estado, nessas condições, significaria comprometer suas perspectivas de expansão futura, com graves prejuízos para a posição estratégica desfrutada pelo Brasil nos mercados internacionais de minério de ferro e de ouro. Não posso, em sã consciência, compactuar com tamanho equívoco.

      Em suma, estou atento à importância estratégica da CVRD e vejo aí, precisamente, a principal razão para privatizar a Companhia. Dentro, é evidente, de um modelo que preserve e na verdade fortaleça o controle do Estado nacional sobre os recursos de subsolo que, por disposição constitucional, são de propriedade exclusiva da União.

      Por outro lado, a decisão de privatizar a CVRD responde a uma clara opção deste Governo pelo combate às desigualdades sociais e regionais como eixo da ação do Estado - opção esta em favor da qual não me faltou até hoje o respaldo de V. Exª e de seu partido, como o da maioria da Nação.

      Em face dessa opção, não se justifica manter uma imensa soma de recursos públicos aplicada numa empresa que, se não é deficitária, também não recolhe ao Tesouro Nacional dividendos nem de longe condizentes com o valor das ações. Isto, enquanto faltam ao setor público recursos para financiar adequadamente a educação, a saúde e obras essenciais para o desenvolvimento regional, e o mesmo Tesouro é obrigado a tomar recursos no mercado a taxas de juros elevadíssimas para rolar a dívida interna!

      A forma pela qual os recursos provenientes da privatização da CVRD reverterão em benefícios sociais terá de ser, é claro, cuidadosamente estudada pelo Governo, em conjunto com o Senado e em especial com os representantes das regiões onde atua a Companhia. Recolho, nesse sentido, a preocupação de V. Exª com o Fundo de Desenvolvimento hoje mantido por uma fração do lucro líquido da CVRD. O modelo de privatização a ser adotado pode e deve preservar esse instrumento de apoio a projetos de interesse das comunidades locais.

      Quanto à área de preservação do Projeto Carajás no Estado do Pará, mencionada por V. Exª, sua incorporação ao patrimônio da CVRD, embora autorizada pelo Senado, aguarda, para ultimar-se, manifestação da Secretaria do Patrimônio da União, que evidentemente tratará de adaptar os termos do contrato com a Companhia ao modelo de privatização que venha a ser adotado.

      Por todas essas considerações, decorrentes da magnitude e complexidade da Companhia, os estudos preliminares com vistas à privatização da CVRD têm se revestido das maiores cautelas. O Termo de Referência aludido em sua carta foi concluído dentro do prazo estipulado e aprovado pelo Conselho Nacional de Desestatização. Com base nele, o BNDES deve selecionar, a partir de 10 de outubro próximo, os dois consultores especializados que submeterão ao Governo, no ano vindouro, um modelo de privatização específico para a Companhia, incluindo definições sobre avaliação, patrimônio mineral, forma de venda e participação dos empregados e da sociedade no processo.

      Parece-me mais sensato, em vista disso, deixar que os estudos avancem até o ponto em que o Executivo e o Senado possam se debruçar sobre uma proposta de modelo de privatização claramente definida.

      Tenho plena convicção de que todas as precauções estão sendo tomadas, para que a privatização da CVRD se dê sob condições que assegurem seu desenvolvimento, com maiores benefícios para a economia nacional e reflexo direto sobre as regiões em que a Companhia atua, respeitando, ao mesmo tempo, os legítimos interesses de seus acionistas minoritários e empregados e o interesse nacional acima de tudo.

      Agradeço a V. Exª a valiosa contribuição que vem oferecendo ao exame deste assunto. O que mais uma vez confirma a disposição do Senado Federal de continuar emprestando ao processo das reformas nacionais o concurso insubstituível de sua atenção, serenidade e patriotismo.

      Atenciosamente,

      Fernando Henrique Cardoso - Presidente da República Federativa do Brasil."

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, registro, da tribuna do Senado, o meu agradecimento ao Presidente da República, pela consideração dispensada à carta que lhe enviei no dia 31 de agosto.

Devo registrar esse agradecimento por essa deferência especial e cumprimentar Sua Excelência por se estabelecer uma relação respeitosa com o Congresso Nacional e, particularmente, com o Senado da República. E o faço, Sr. Presidente, muito à vontade, porque o Presidente da República, com esta, é a terceira vez que o faz em relação à Liderança do PMDB e à Bancada do PMDB no Senado - enfim, ao Senado Federal. A primeira vez foi com relação à questão do Projeto SIVAM, quando tivemos oportunidade de enviar uma missiva ao Presidente da República, que acolheu pontos de vista esboçados naquela oportunidade, e o projeto está sendo reformulado. A segunda vez, quando a Bancada do PMDB, em conseqüência do parecer do Senador Ronaldo Cunha Lima, apresentou questões que o PMDB considera fundamentais a serem preservadas no processo relativo à PETROBRÁS, e agora em relação à Companhia Vale do Rio Doce.

Ao fazer a leitura dessa carta, portanto, de início, registro o meu agradecimento ao Presidente da República pela deferência pessoal para comigo e, em segundo lugar, pelos cumprimentos em relação ao Senado Federal, pelo acolhimento manifestado pelo Presidente, levando em conta as ponderações apresentadas.

O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Jader Barbalho?

O SR. JADER BARBALHO - Com a maior alegria, Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy - Senador Jader Barbalho, ouvindo com atenção a leitura da carta do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que procurou esclarecer diversos pontos que haviam sido levantados por V. Exª, notei que o Presidente ali menciona, explicitamente, que o Senado vai decidir junto com o Executivo a questão relativa à forma do processo de privatização. Parece-me, com clareza, que o Presidente Fernando Henrique Cardoso, nesse ofício a V. Exª, está considerando adequado aquilo que tem sido objeto de reflexão na Casa, ou seja, que o Senado Federal participe da decisão sobre a privatização da Companhia Vale do Rio Doce, tema que tem estado em pauta, em razão do projeto do Senador José Eduardo Dutra, e que tem ganho forte repaldo nesta Casa. Gostaria de registrar isso que me pareceu bastante claro, ao ouvir as palavras que V. Exª aqui pronunciou.

O SR. JADER BARBALHO - Senador Eduardo Suplicy, o Presidente informa que o Senado não ficará ausente do acompanhamento desse processo. Informa ainda que dois consultores estão sendo contratados para definir o processo de privatização da Vale.

Desde o início, registro que não estou ainda convencido, mesmo com a carta do Presidente da República, com respeito à privatização da Vale. Mas considero um avanço o Presidente declarar que nada será feito com relação a esse assunto sem que o Senado seja ouvido.

Confirmo: a interpretação que dou à carta é exatamente esta, de que o Senado acompanhará o processo e que ainda não há uma definição. Mais do que isso, em ponto aqui levantado por diversos Srs. Senadores em debate anterior, com respeito à questão do patrimônio mineral da Vale, o Presidente deixa bem claro que este pertence à União e, portanto, nesse processo terá que ser definido como vai se privatizar a Vale e como ficarão as jazidas que a Vale detém como concessão.

Portanto, essa carta enviada pelo Presidente da República terá que ser examinada, meditada, em diversos dos seus pontos, mas é um avanço que o Executivo reconheça a necessidade de ter toda cautela na questão da privatização da Vale e não exclua o Poder Legislativo, particularmente o Senado, de acompanhá-la de perto, razão pela qual nos manifestamos solidários ao projeto do Senador José Eduardo Dutra, com respeito a essa questão, quando o mesmo foi objeto de discussão no plenário do Senado.

O Sr. Edison Lobão - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JADER BARBALHO - Ouço V. Exª com alegria, Senador Edison Lobão. Posteriormente, ouvirei os Senadores José Roberto Arruda e José Eduardo Dutra.

O Sr. Edison Lobão - Senador Jader Barbalho, desde logo, os meus cumprimentos a V. Exª, por ter contribuído, de maneira significativa, para o esclarecimento dessa questão transcendental para a vida político-econômica deste País. A minha posição é também conhecida: sempre me manifestei contrário à privatização da Companhia Vale do Rio Doce, exatamente em razão do patrimônio mineral, cujo valor eu desconheço. De modo geral, sou inteiramente favorável à privatização, mas, no que diz respeito à Vale do Rio Doce, tinha e tenho essa preocupação. Penso que o momento que o mundo inteiro está vivendo é o da privatização, e não o da estatização. Não apenas no mundo ocidental, mas eu até diria que sobretudo nos países socialistas, nos países da antiga Cortina de Ferro, promove-se uma privatização em massa, como mecanismo de recuperação da sua economia. Não pode ser diferente aqui no Brasil. Estou plenamente na linha da completa privatização. No que diz respeito à Vale do Rio Doce, porém, com essas preocupações, que são também as de V. Exª. A carta do Presidente da República, que responde a uma iniciativa de V. Exª, é bastante esclarecedora. Anoto dois pontos fundamentais: primeiro, que o Senado da República participará com o Governo Federal dessa operação; segundo, a preservação do patrimônio mineral deste País. Penso que são dois cuidados muito importantes. V. Exª propõe que se leia a carta mais detidamente, que se analise melhor o documento, para que se tome posteriormente uma decisão. Cumprimento V. Exª pelo seu pronunciamento, e ao Presidente da República, por ter tomado também essa posição de solidariedade às preocupações do Senado Federal.

O SR. JADER BARBALHO - Agradeço a V. Exª pelo seu aparte. Concordo que o Presidente registrou, de forma pontual, na sua carta, que o processo de privatização terá que ser detalhado em várias etapas, sendo uma delas em relação ao patrimônio mineral. O mesmo deve ocorrer com a forma de venda e com a situação dos empregados da Vale do Rio Doce.

Senador Edison Lobão, continuo com o meu ponto de vista de que a Vale não deveria ser privatizada. Contudo, a carta do Presidente da República merece profunda reflexão, que haverei de fazer, bem como o Senado. O que festejo na manifestação do Presidente é o fato de Sua Excelência reconhecer, primeiro, que a Vale há de ter um tratamento especial no que se refere à questão da privatização e, mais do que isso, que o Senado Federal deverá acompanhar de perto e estar ciente de todos os passos desse processo.

O Sr. José Eduardo Dutra - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JADER BARBAHO - Ouço V. Exª, Senador José Eduardo Dutra.

O Sr. José Eduardo Dutra - Nobre Senador Jader Barbalho, gostaria de registrar a importância do papel que V. Exª tem desempenhado nesse debate sobre a privatização da Companhia Vale do Rio Doce. Em diversas ocasiões, tenho dito que não encaro a questão da privatização ou da estatização do ponto de vista ideológico. Tenho dito, inclusive, que não quero ser rotulado como defensor de um modelo de Estado em cuja construção o meu Partido e eu, dentro da linha de pensamento em que me enquadro, não tivemos a mínima responsabilidade. Em princípio, sou contra a privatização da Companhia Vale do Rio Doce, pelos argumentos já dispendidos por V. Exª e por outros que tenho colocado. Poderia, inclusive, ter inicialmente apresentado um projeto simplesmente excluindo a Companhia Vale do Rio Doce do Programa Nacional de Privatização. Mas meu objetivo principal não era abortar a discussão sobre matéria tão importante, o que, na prática, seria feito, se apresentasse um projeto simplesmente excluindo a Vale. O princípio do meu projeto está relacionado com a própria questão suscitada pelo Presidente na sua carta, quando diz que, de acordo com o art. 176 da Constituição, os recursos minerais são patrimônio, são propriedade da União. Porém, quando da discussão das emendas constitucionais, particularmente a que tratava do conceito de empresa nacional e modificava esse artigo, acabando com aquela discriminação que existia anteriormente em relação ao capital estrangeiro, eu dizia que a grande questão a ser discutida não era se o capital estrangeiro deveria ou não participar da mineração brasileira, mas, principalmente, a forma de controle da União sobre esse capital. Porque, infelizmente, Senador Jader Barbalho, embora o art. 176 da Constituição brasileira diga que a propriedade dos recursos minerais brasileiros é da União, a legislação ordinária, o modelo de administração dos recursos minerais do Brasil, que é datado de 1934, através de concessões cartoriais, através inclusive de um modelo de concessão que não existe em praticamente nenhum país do mundo, que é a concessão por tempo indeterminado, faz com que, na prática, a propriedade dos recursos minerais do Brasil só seja da União até o momento em que estes são descobertos, porque, a partir daí, eles passam a ser propriedade de quem o descobriu, inclusive os da Vale do Rio Doce. Tenho certeza, também - como já registrei diversas vezes -, de que a Vale do Rio Doce só recebeu a concessão da totalidade da província mineral de Carajás - que é a maior província mineral do mundo - porque era uma empresa estatal. Em função disso e em função até de que a Constituição reza que "cabe ao Congresso Nacional se manifestar sobre a alienação de patrimônio da União", é que apresentei o projeto no sentido de que ele dê a palavra final sobre a privatização da Companhia Vale do Rio Doce. Inclusive, na semana passada, quando me pronunciei sobre essa questão, o Senador Humberto Lucena lembrou-me do fato de que a atual Lei de Privatização nº 8.031, quando aprovada no Congresso Nacional através do projeto de conversão, tinha um parágrafo que previa que o Congresso Nacional poderia avocar para si a decisão sobre privatização de empresas quando entendesse haver um caráter estratégico. Infelizmente, o então Presidente Fernando Collor de Mello vetou esse parágrafo e o Congresso Nacional não derrubou o veto. Então, esse meu projeto, na verdade, retoma uma decisão que já havia sido tomada pelo próprio Congresso, no caso específico da Companhia Vale do Rio Doce. Portanto, entendo que deveríamos debater, principalmente quando esse projeto voltar à pauta do Senado, se caberá ou não ao Congresso Nacional, ou até ao próprio Senado - porque poderá ser objeto de emenda nesse sentido - dar a palavra final sobre a privatização da Companhia Vale do Rio Doce.

O SR. JADER BARBALHO - Agradeço o aparte de V. Exª, Senador José Eduardo Dutra.

Creio que a carta do Presidente da República é uma aprovação à idéia de V. Exª, quando sua Excelência se refere à apreciação, sendo que, no caso, se restringe ao Senado Federal.

Em verdade, o que o projeto de V. Exª deseja é o acompanhamento por parte do Congresso Nacional. Então, V. Exª, em princípio, com o seu projeto, admite a privatização. O que V. Exª deseja é que esse processo seja acompanhado pelo Congresso Nacional. Então, penso que a manifestação do Presidente da República em relação ao projeto de sua autoria, que tramita no Senado e que agora é objeto de apreciação da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, tem um papel importantíssimo para a definição dos rumos que o Senado tomará em relação a isso.

O Sr. José Roberto Arruda - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Jader Barbalho?

O SR. PRESIDENTE (Bello Parga. Fazendo soar a campainha.) - Advirto o orador de que o seu tempo já se esgotou.

O SR. JADER BARBALHO - Sr. Presidente, pediria benevolência para que pudesse ouvir o aparte do Senador José Roberto Arruda, antes de concluir o meu pronunciamento.

O Sr. José Roberto Arruda - Muito obrigado. Penso, Senador Jader Barbalho, que está acontecendo, neste momento, na sessão do Senado, um episódio até mais importante que a discussão especificamente da Companhia Vale do Rio Doce. E penso que isso merece a reflexão de nós todos. Na sessão de ontem do Senado Federal, tivemos um momento de dificuldade, porque, nitidamente, o Governo Federal encaminhou um assunto da maior relevância para o País, mas, por um problema qualquer de um órgão da burocracia estatal, esse encaminhamento veio de forma intempestiva, exatamente no dia da decisão, e não tiveram, os Líderes dos Partidos desta Casa, condições de fazer uma análise mais detida do assunto. Ainda assim, o Senado aprovou a matéria para que aquele descuido de uma área técnica do Governo não viesse a representar um prejuízo para o País como um todo. Mas ficou claro, na sessão de ontem, que tivemos um problema na relação do Executivo com o Senado Federal. Neste momento, temos o inverso: um momento extremamente positivo, exemplar até, de como podem e devem ser as relações do Governo com o Congresso Nacional. Em primeiro lugar, porque se há, nesse assunto Vale do Rio Doce, um pensamento majoritário no Senado Federal - e recolho isso do meu sentimento pessoal, de que esta Casa especificamente, por representar o espírito federativo, não pode ficar ausente, no mínimo, do acompanhamento de um processo de discussão, porque ainda é de discussão, sobre o futuro da Vale do Rio Doce -, tivemos pelo menos duas ações práticas para enfatizar esse pensamento majoritário: a primeira delas é a do projeto do Senador José Eduardo Dutra; e, a segunda, a ação política de V. Exª, como Senador de uma região diretamente afetada pela ação de desenvolvimento regional da Vale do Rio do Doce e como Líder do PMDB. Muito bem! Parece-me que essas duas ações tinham, em princípio, o mesmo objetivo. E penso que a ação de V. Exª mais rapidamente alcançou o objetivo pretendido por todos nós, através desse compromisso político, dessa prova de que o Congresso Nacional e o Governo Federal podem trabalhar juntos num novo projeto de país, dessa franqueza com que V. Exª, num documento público, colocou as suas posições e as suas preocupações no caso específico; e pela maneira também clara, politicamente eficaz, com que o Presidente da República respondeu a V. Exª. Desta forma, no momento em que ocupa a tribuna do Senado Federal para tornar pública a carta do Presidente da República, Sua Excelência, pela via correta, pela via política que V. Exª inaugurou, responde às preocupações de todos nós e não apenas às suas. Isso, portanto, transcende o aspecto específico da Vale do Rio Doce. Particularmente, não quero, neste momento, nem em meu nome nem em nome da Liderança do Governo, sequer entrar no conteúdo especificamente do assunto que se trata, ou seja, o futuro da Vale do Rio Doce. Nem falo em privatização. Falo no futuro da Vale do Rio Doce, porque ocorre uma coisa muito mais importante, que é a inauguração de um canal político sério, do qual as duas pontas trabalham com seriedade, defendendo suas convicções e pensando no interesse nacional. Esse canal atingiu, antes de qualquer outra iniciativa congressual, o objetivo de que todos os cuidados sejam tomados nos estudos preliminares e de que esta Casa participe não só do eventual processo de privatização - e esse é um ponto da carta de V. Exª e da resposta do Presidente que gostaria de sublinhar na utilização dos eventuais recursos. É claro que, no conteúdo especificamente - e o Senado vai discutir muito isto -, a primeira empresa "estatal" que explorou o nosso subsolo e as nossas riquezas minerais gerou Tiradentes, e sabemos a utilização que se deu ao ouro das Minas Gerais quando o Estado brasileiro, à época vinculado a interesses colonialistas, explorava o nosso subsolo de forma monopolista, para que essas riquezas fossem para Portugal. Mas não vou entrar nesse contexto, até porque não firmei convicção pessoal da oportunidade, da necessidade e do interesse maior do País no que diz respeito à Companhia Vale do Rio Doce. E seria prematuro, porque, claramente, o Presidente da República diz na carta a V. Exª que serão iniciados, ainda, os estudos preliminares, com duração mínima de seis meses, que poderão até, teoricamente, concluir pela inviabilidade do processo. De tal sorte que penso que o mais importante é a negociação política, é o canal político de alto nível, inaugurado por essa ação.

O SR. JADER BARBALHO - Acolho o aparte do Senador José Roberto Arruda e suas considerações, que me parecem da maior pertinência.

Ao encerrar, agradeço todos os apartes feitos ao meu pronunciamento e ressalto ainda as observações que o Senador José Roberto Arruda acaba de fazer, de que o importante, Sr. Presidente, é entender que a democracia é feita do contraditório, do contraditório até, eventualmente, feito com veemência e com entusiasmo, como tem sido a minha prática nesta Casa e, às vezes, aqui e ali possa ser confundido.

Recolho desse episódio a satisfação de que o entusiasmo com que defendi o projeto do Senador José Eduardo Dutra - que não é do meu Partido, é do PT - acaba de resultar não só nesse canal político a que se referiu o Senador José Roberto Arruda, mas, acima de tudo, Sr. Presidente, faz com que o Governo reflita sobre um tema da maior importância; faz, seguramente, com que a sociedade brasileira esteja segura de que, na questão da privatização da Vale do Rio Doce, haverá os maiores cuidados.

E o Senado da República cumpre o seu dever para com a sociedade brasileira, fiscalizando e acompanhando os atos do Executivo e, fundamentalmente, defendendo o interesse nacional.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 16/09/1995 - Página 15916