Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM POSTUMA AO EX-SENADOR E GOVERNADOR DA PARAIBA, ANTONIO MARIZ.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM POSTUMA AO EX-SENADOR E GOVERNADOR DA PARAIBA, ANTONIO MARIZ.
Publicação
Publicação no DCN2 de 19/09/1995 - Página 16056
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, ANTONIO MARIZ, EX SENADOR, GOVERNADOR, ESTADO DA PARAIBA (PB).

O SR. EDUARDO SUPLICY (PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores,

      "A verdade é filha legítima da justiça, porque a justiça dá a cada um o que é seu. E isto é o que faz e o que diz a verdade, ao contrário da mentira. A mentira, ou vos tira o que tendes, ou vos dá o que não tendes; ou vos rouba, ou vos condena."

Com estas palavras do Padre Antônio Vieira, no Sermão da Quinta Dominga de Quaresma, em 1654, o então Relator da Comissão Especial criada para opinar sobre a denúncia por crime de responsabilidade contra o ex-Presidente Fernando Collor de Mello, o Senador Antonio Mariz, abriu seu parecer final sobre o impeachment do ex-Presidente da República. A verdade e a justiça sempre foram os nortes perseguidos pelo saudoso Governador e ex-Senador pelo Estado da Paraíba.

O Governador Mariz teve um papel fundamental no processo de impeachment de Fernando Collor. Como promotor de formação, examinou com propriedade e isenção toda a documentação encaminhada à Comissão para evitar que qualquer injustiça fosse cometida. Em 30 de setembro de 1992, o primeiro parecer do ex-Senador como Relator, após a apreciação da denúncia, do relatório circunstanciado e demais documentos encaminhados pela Câmara, concluiu que deveria ser instaurado processo por crime de responsabilidade contra o ex-Presidente de acordo com as provas contidas na denúncia e no relatório. Nesse momento, já estava convencido de que havia fortes indícios da responsabilidade de Fernando Collor nos crimes que lhe eram imputados.

Quase dois meses depois, Antonio Mariz pôde demonstrar, em seu parecer final, a materialidade dos delitos descritos na denúncia, dizendo:

      "Existem suficientes indícios de autoria, incriminando o Presidente da República".

O parecer do Relator foi aprovado na Comissão por 16 votos contra um. O processo de impeachment do Presidente da República, exemplo único na história política do Ocidente, serviu para consolidar a democracia no País.

Isso ficou claro nas palavras finais do Relator:

      "Destes acontecimentos e deste tempo, renasce a lição às gerações presentes e à posteridade, do imperativo da honra e da dignidade da vida pública brasileira, pedra angular da construção democrática". Fazendo uma alusão a Schiller, concluiu:

      "Indigna é a nação que não aceita com alegria tudo sacrificar à sua honra".

Sua preocupação com a justiça social está traduzida em toda sua atividade pública. Na Assembléia Nacional Constituinte, por exemplo, foi Presidente da Subcomissão dos Direitos e Garantias Individuais. Durante seu mandato no Senado, foi membro titular da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Nessa trajetória, lutou por melhorias das condições de vida dos trabalhadores rurais, quando empenhou-se em estudo para uma aposentadoria decente para esses trabalhadores. A falta de uma política para as minorias também era objeto de sua preocupação. Defendia uma política brasileira de proteção aos direitos da mulher. Em seu Estado, deu especial atenção a um grupo de trabalhadores ciganos, chegando a redigir uma emenda à Constituição em que propunha política nacional de proteção aos trabalhadores nômades.

É lamentável para a Nação a perda prematura de uma exemplar figura política como Mariz, que deixa viúva a senhora Mabel Dantas Mariz e as filhas Adriana e Luciana, além de sua mãe, dona Noemi.

O Brasil e a Paraíba perderam com o desaparecimento de Antonio Mariz, que exerceu apenas quatro meses de mandato como Governador de seu Estado. Apesar da frustração com a sua morte, não se deve ter o sentimento de mágoa como o demonstrado por uma senhora de 50 anos que disse, na Paraíba, "quando vamos ter um homem honesto no governo, ele morre".

Temos certeza que seu exemplo frutificará.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Senador Ronaldo Cunha Lima, que aqui colocou tão bem o sentimento do povo da Paraíba, gostaria de dar meu testemunho pessoal.

Desde que aqui cheguei, em 1991, pude ver no Senador Antonio Mariz exemplo de retidão, busca da justiça e preocupação com os trabalhadores. Tive por ele especial admiração. Sempre prestava atenção em suas palavras, nas lições como jurista, em todas as ocasiões em que resolvia usar da palavra, tantas vezes aqui no plenário ou no âmbito das comissões.

Certo dia, a emissora de rádio de Sousas pediu-me que desse uma entrevista. Resolvi falar - e muito bem - daquele que eu sabia que havia sido prefeito de Sousa, sobretudo relativo a seus passos aqui no Senado. Alguns companheiros do Partido dos Trabalhadores me ligaram e disseram: "Como é que você fala bem do nosso adversário?" E eu, obviamente, reiterei aos meus companheiros que, por tudo o que eu conhecia do Senador Antonio Mariz, só tinha que falar bem a seu respeito. E não me arrependi disso. Falei inclusive com meus companheiros que vieram à rádio, no diálogo ocorrido no programa ao vivo.

Quando o Senador Antonio Mariz foi operado no Hospital Oswaldo Cruz, em São Paulo, por duas vezes fui visitá-lo. Conversei com ele, aprendendo mais uma vez inúmeras lições. Recordei, então, palavras que ele próprio me havia dito, no dia seguinte à aprovação do Programa de Garantia de Renda Mínima, aqui no Senado Federal, quando fiz um pronunciamento de agradecimento aos Senadores pela aprovação daquela matéria.

Hoje, estava lendo o aparte que ele me fez naquela oportunidade e passo a lê-lo para recordar um pouco suas palavras, o seu jeito. Disse-me ele:

      "O Sr. Antonio Mariz - Permite-me V. Exª um aparte?

      O SR. EDUARDO SUPLICY - Com muito prazer, Senador Antonio Mariz, V. Exª foi um dos que também contribuíram com proposições ao projeto (ele de fato havia feito diversas sugestões).

      O Sr. Antonio Mariz - Muito obrigado, Senador Eduardo Suplicy. Quero, antes de tudo, congratular-me com V. Exª pelo êxito, pela vitória que obteve com a aprovação do Programa de Garantia de Renda Mínima, projeto endossado pelo Senado, como V. Exª assinala agora, e que esperamos seja igualmente endossado pela Câmara dos Deputados e, posteriormente, sancionado, de tal modo que o País possa ter uma lei como essa, que começa a abordar de forma objetiva a questão da pobreza, especialmente da pobreza absoluta no Brasil. O projeto de V. Exª é tanto mais importante quanto se observam os dados do documento que foi lido na ocasião em que V. Exª encaminhava a sua proposta, esse documento do IBGE que realizou a pesquisa nacional, por amostragem a domicílio".

S. Exª, no caso, descreve o número de pessoas que acabariam sendo justificados.

Naquela oportunidade da visita no hospital, falou-me longamente de seu projeto e da história relativa a sua preocupação com os trabalhadores nômades, com os ciganos, porque havia tido um contato especial com eles no Estado da Paraíba. É sempre muito importante para um País, para um Estado, ter uma pessoa que para nós é um exemplo, uma pessoa que ilumina, que faz pensarmos como é importante seguir suas recomendações de buscar a justiça, a integridade, a verdade.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 19/09/1995 - Página 16056