Discurso durante a 156ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

REGISTRANDO REUNIÃO DO GOVERNADOR DO ESTADO DO PARA, ALMIR GABRIEL COM A BANCADA FEDERAL, QUANDO SE COMPAROU O PLANO PLURIANUAL DO GOVERNO DO ESTADO COM O PLANO PLURIANUAL DO GOVERNO E FORAM DEBATIDAS QUESTÕES DA REFORMA TRIBUTARIA E DO FUNDO SOCIAL DE EMERGENCIA. CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROJETO DE REFORMA TRIBUTARIA DO GOVERNO.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • REGISTRANDO REUNIÃO DO GOVERNADOR DO ESTADO DO PARA, ALMIR GABRIEL COM A BANCADA FEDERAL, QUANDO SE COMPAROU O PLANO PLURIANUAL DO GOVERNO DO ESTADO COM O PLANO PLURIANUAL DO GOVERNO E FORAM DEBATIDAS QUESTÕES DA REFORMA TRIBUTARIA E DO FUNDO SOCIAL DE EMERGENCIA. CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROJETO DE REFORMA TRIBUTARIA DO GOVERNO.
Aparteantes
Jefferson Peres, Josaphat Marinho.
Publicação
Publicação no DCN2 de 27/09/1995 - Página 16767
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, REALIZAÇÃO, REUNIÃO, PARTICIPAÇÃO, ALMIR GABRIEL, GOVERNADOR, SECRETARIO DE ESTADO, PLANEJAMENTO, FAZENDA PUBLICA, CONGRESSISTA, BANCADA, ESTADO DO PARA (PA), EXAME, PLANO PLURIANUAL (PPA), DEBATE, PROPOSTA, REFORMA TRIBUTARIA, GOVERNO, FUNDO SOCIAL DE EMERGENCIA.
  • ANALISE, CRITICA, DEFEITO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, REFORMA TRIBUTARIA, GOVERNO, FALTA, ABRANGENCIA, NEUTRALIDADE, POLITICA SOCIAL, DEMOCRACIA.

O SR. ADEMIR ANDRADE - (PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero, em primeiro lugar, registrar uma reunião havida na manhã de hoje, realizada com o Governador do Estado do Pará, Almir Gabriel, com a sua equipe técnica, os seus Secretários de Planejamento e Fazenda, com todos os Senadores e Deputados Federais do Estado do Pará.

Quero louvar a atitude do Governador do Estado, ao trazer até nós o seu Plano Plurianual e fazer uma comparação com o Plano Plurianual do Governo Federal, unindo toda a Bancada do Pará, independente das suas posições políticas ou ideológicas, no sentido de que todos trabalhem unidos para fazer com que o Plano Plurianual do Governo do Estado possa ser aquinhoado no Plano Plurianual do Governo Federal. Além disso foram debatidas as questões da Reforma Tributária do Governo e a do Fundo Social de Emergência.

Na questão da Reforma Tributária, há uma discordância clara da parte do Governador Almir Gabriel e de sua equipe técnica em relação à proposta do Governo federal.

É a respeito dessa questão da reforma tributária que quero, a partir deste momento, antecipar o debate nesta Casa do Senado Federal, até para que não aconteça no futuro aquilo que ocorreu com as cinco emendas do Capítulo da Ordem Econômica que vieram prontas e acabadas da Câmara Federal, e o Senado não pôde fazer em nenhuma delas uma única emenda.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desejo apresentar neste pronunciamento algumas considerações iniciais com relação ao projeto de reforma tributária encaminhado ao Congresso Nacional pelo Governo e manifestar nossas preocupações sobre alguns pontos, que considero bastante falhos.

A proposta de emenda à Constituição enviada pelo Presidente da República, que remaneja e conturba extensamente o capítulo tributário da Constituição, é um longo rol de promessas, ameaças, de pontos negativos e, alguns, positivos. Seus principais defeitos são, entretanto, de natureza estrutural. O primeiro defeito remonta ao fato de a Emenda não poder ser apreciada como política tributária, já que isso só seria possível de ser feito se a analisássemos em conjunto com o Fundo Social de Emergência, com as propostas de reforma do Imposto de Renda de pessoas físicas e jurídicas com que o Governo vem acenando e, finalmente, com as próprias leis complementares exigidas pelo teor da Emenda.

O segundo defeito estrutural da Emenda é aquele a que já me referi: ela passa ao largo, é praticamente irrelevante, diante das brutais deformações e injustiças do nosso sistema fiscal. Efetivamente, o que salta o olhos, quando se obtém uma visão geral do quadro tributário brasileiro, é a medida da proteção estendida aos poucos privilegiados e a dimensão do prejuízo imposto à grande maioria da população.

Consideramos importante, a título de melhor compreensão da questão, fazer algumas comparações entre os nossos parâmetros fiscais e os dos países mais adiantados. Os países mais industrializados da América do Norte, Europa e Japão estão congregados na OCDE - Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Pois bem, na OCDE a alíquota efetiva média incidente sobre o capital é 38%. No Brasil, pasmem, é de somente 8%, em números arredondados. Na OCDE, a participação dos tributos, incluindo contribuições sociais, na arrecadação total mostra que rendimentos e lucros ocupam 38%, enquanto a taxação sobre bens e serviço participa em apenas 30%.

No Brasil, essa ordem se inverte: rendimentos e lucros participam com apenas 17%, enquanto bens e serviços entram com 52%, um valor altíssimo. Isso demonstra que no Brasil não se taxa renda, taxa-se consumo, e em alíquotas altas. Isso leva a uma das nossas grandes injustiças tributárias: os pobres pagam mais impostos que os ricos, porque como os assalariados obrigatoriamente dedicam uma proporção maior de sua renda ao consumo, e como o consumo é fortemente tributado em impostos indiretos, nossa curva de carga tributária por faixa de renda tem uma forma invertida e portanto perversa.

Mais algumas comparações entre Brasil e a OCDE. Na OCDE, a taxação sobre propriedade participa com 5%; no Brasil, com apenas 2% (principalmente IPTU e ITR). Apesar dessa deformação, não temos ouvido nada do Governo quanto a impostos sobre patrimônio. O ex-Senador Fernando Henrique Cardoso já foi defensor desse imposto e pelo visto ele mudou de opinião. Já não é mais!

Há dois valores, no entanto, que se aproximam na OCDE e no Brasil: é a participação das contribuições sociais na arrecadação total, respectivamente de 23% e 19% - e aqui se configura uma situação irônica, pois o peso das contribuições sociais são semelhantes para situações de seguridade social tão dramaticamente diferentes. Na OCDE, serviços e benefícios satisfatórios são facilmente acessíveis para qualquer um do povo. No Brasil está aí a miséria que conhecemos na saúde pública e na aposentadoria, por exemplo. Entretanto, não se ouve nenhuma sugestão do Governo no sentido do óbvio: qual seja o de reforçar os recursos da previdência e da saúde com tributos arrecadados do lucro, do capital.

Das dezenas de quesitos e alterações introduzidas pela Proposta de Emenda à Constituição do Governo, dois ou três têm concentrado as atenções. Um, é a maior facilidade de impor empréstimo compulsório (art. 148). Vê-se aí, mais uma vez, o Governo preocupado em fazer caixa e em governar por atos unilaterais. Outro, é a possibilidade da quebra de sigilo bancário pela autoridade fiscal (art. 145), com o qual, evidentemente, estamos de acordo.

Nesse ponto, levanta-se o coro das forças conservadoras em protesto, pois os privilegiados, que há séculos vêm pilhando o Brasil, se identificam afetivamente com as contas bancárias de sonegadores e traficantes. Seu coração está com essas contas, e não com uma estrutura tributária que sirva ao interesse da maioria do povo.

A questão da sonegação e do crime que se escondem em contas bancárias mal explicadas está estritamente ligada a outro grande defeito estrutural do sistema tributário brasileiro, principalmente da União: a ineficiência e a ineficácia da máquina arrecadadora. De fato, a União tem poucos fiscais, mal equipados, mal articulados e mal remunerados. A arrecadação do Imposto de Renda de pessoas jurídicas e de pessoas físicas não assalariadas é uma fração do que se poderia ser. É impressionante como o grosso da Proposta do Governo sobre reforma tributária simplesmente escamoteia esse grave problema.

Outro ponto polêmico da Proposta é a compensação provisória a ser dada aos Estados pela perda de arrecadação resultante da isenção sobre a exportação. (art. 12 da Emenda). Aqui, como em outros pontos da Emenda, peca o Governo por não explicar, não justificar, não apresentar dados, comprovações, projeções, simulações que dêem credibilidade a sua Proposta. Os jornais anunciaram, há algumas semanas: "FHC acha fácil governar o Brasil". Pois está patente que, para este Governo, governar o Brasil não é fácil. Os fatos o provam: o Governo não consegue conversar, não consegue convencer, comunicar-se com sua base política e parlamentar. As suas propostas geram tumultos e incompreensões, conforme se pode observar dos próprios debates sobre o assunto travados neste plenário do Senado Federal, e conforme pude comprovar hoje com a equipe do Governador do meu Estado Almir Gabriel.

A principal feição da Emenda é a unificação do IPI, Imposto sobre Produtos Industrializados, da União, com o conhecido ICMS estadual. O ICMS passaria a agregar uma parcela da União, administrada pela União. Inovação que é um perigoso salto no escuro. Teoricamente, é uma simplificação que pode vir a ser útil. Mas como confiar nesse exercício futurista? O Deputado Francisco Dornelles, que apóia, no geral, a Emenda e que passou a vida estudando e administrando tributação, declarou que não consegue imaginar como seria possível cobrar esse imposto.

Examinemos outras feições de destaque da Emenda tributária. Um pequeno inciso, o de nº V, do art. 150, ao modificar a redação atual para permitir a cobrança generalizada do pedágio, mostra a obsessão deste Governo com a privatização da infra-estrutura. Logo adiante, no art. 150, §6º, a Proposta, pretendendo impedir a guerra fiscal entre os Estados, o faz eliminando a ação do CONFAZ e um aspecto importante da autonomia estadual que é o de dar subsídios fiscais.

A transferência do ITR, Imposto Territorial Rural, da competência da União para a dos Estados (art. 153, inciso VI), é altamente polêmica, pois pode significar o enfraquecimento de políticas fundiárias progressistas.

O art. 156 desfere vários importantes golpes a favor de uma proteção ao capital maior ainda do que a hoje existente. Passariam a ser isentos de ICMS: o ativo imobilizado, qualquer bem exportado e não só produtos industrializados como hoje; e insumos para uso agropecuário.

Srs. Senadores, aqui vale ressaltar que na Constituição de 88, com muita luta e sacrifício, conseguimos submeter os produtos semi-elaborados para exportação à taxação de impostos. É evidente que queremos industrializar os produtos de uma maneira geral na nossa Nação, gerando aqui emprego, mão-de-obra, capitalização de recursos etc. Queremos dificultar a exportação de produtos in natura ou de produtos semi-industrializados. E a forma de não permitir tamanha exportação desses produtos, essencialmente madeira e minérios, é a taxação para exportação, que agora, inexplicavelmente, o Governo Fernando Henrique quer tornar isenta total e absolutamente. Quer dizer, agora vamos exportar madeira em tora; agora vamos exportar minérios brutos e não teremos aqui a siderurgia e a industrialização desses minérios porque o Governo quer isentar essas exportações que hoje existem, que hoje beneficiam os Estados com o ICMS; é extremamente lamentável a proposta do Governo.

O Governo propala que a reforma é neutra em seus efeitos. Mas tudo indica que com essas medidas vai mudar para pior a relação hoje existente entre as taxações sobre capital e trabalho assalariado. Como a confirmar tal suspeita, as primeiras notícias divulgadas sobre as futuras reformas do Imposto de Renda a serem propostas pelo Governo dão conta de que, de um lado, pretende-se reduzir de 43% para 30% a alíquota máxima sobre o lucro das empresas; de outro lado, fala-se em aumentar o número de trabalhadores sujeitos ao Imposto de Renda, ampliando-se a base da pirâmide taxavel, isto é, atingindo-se os salários menores. Essa é verdadeiramente a própria imagem deste Governo.

Portanto, Sr. Presidente, na Proposta de Emenda do Governo que trata da reforma tributária faltam abrangência, coerência, nitidez, transparência, política social e democracia. Está muito desprotegido o povo brasileiro. Precisa do esforço denodado de quem possa auxiliá-lo. Uma boa ajuda neste momento é estarmos nós, no Congresso Nacional, atentos ao que se pretende alterar no sistema tributário atual que é imperfeito, evidentemente imperfeito nós o sabemos. O sistema tributário atual facilita, de um lado, o sonegador e, de outro, o fiscal corrupto que existe por este País afora. Mas esse que está se pretendendo fazer pode ser ainda pior do que o que se tem hoje.

O Sr. Josaphat Marinho - Permita-me V. Exª um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE - Ouço V. Exª com muito prazer.

O Sr. Josaphat Marinho - Com surpresa, não se lê na proposta do Governo nenhuma referência, quer para aplicá-lo, quer para extingui-lo ou por que extingui-lo, sobre o imposto relativo a grandes fortunas.

O SR. ADEMIR ANDRADE - Exatamente, nobre Senador. Isso eu expus em nossa manifestação e gostaria de acrescentar algo que fere especialmente os interesses dos amazônidas, dos nordestinos e das pessoas que moram no Centro-Oeste do País. Essa emenda tributária do Governo, Senador Jefferson Péres, quer pegar o FNO e colocá-lo para financiar a infra-estrutura do Poder Público - o mesmo FNO, que não é suficiente para atender à necessidade do setor produtivo de nossa região, ainda querem tirar para atender ao setor público.

O Sr. Jefferson Péres - Permita-me V. Exª um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE - Ouço V. Exª com muito prazer.

O Sr. Jefferson Péres - Senador Ademir Andrade, V. Exª tem razão na maioria das críticas que faz, e eu as endosso, inclusive essa a respeito do FNO, que foi instituído para amparar, financiar pequenas e médias empresas e não para substituir investimentos em infra-estrutura e outros que o Estado brasileiro, a União deve buscar de outras fontes. Gostaria de fazer um pequeno reparo no que tange ao Imposto de Renda das empresas. Nesse ponto discordo de V. Exª e me parece estar acontecendo algum equívoco. A proposta reduz a alíquota e extingue a correção do ativo, o que implicará em pagamento maior do Imposto de Renda. No último número da revista Exame, o ex-Ministro Mário Henrique Simonsen comenta exatamente isso em nome das empresas e protesta porque entende que vai aumentar a carga tributária das empresas no Imposto de Renda.

O SR. ADEMIR ANDRADE - Além disso, pretende-se aumentar a contribuição do assalariado; ele fala claramente em aumentá-la.

Assim, Sr. Presidente, creio que essa questão deve ser pensada por todos nós porque interfere na vida deste País, interfere na vida dos Municípios que são unidades menores desta Nação, interfere na vida dos Estados brasileiros, e é preciso levantar essa discussão.

Pelo que sentimos até agora, há um posicionamento generalizado de Governadores e Prefeitos contra essa reforma tributária da forma como está sendo conduzida porque não está sendo apresentada com a clareza necessária.

Chamo a atenção deste Senado no sentido de que é preciso aprofundar a discussão de imediato sobre essa questão para que não aconteça - repito - aquilo que aconteceu com as outras emendas constitucionais do Capítulo da Ordem Econômica que vieram da Câmara e que não puderam receber uma contribuição do Senado Federal.

O Sr. Josaphat Marinho - Permite-me V. Exª nova intervenção?

O SR. ADEMIR ANDRADE - Com prazer, ouço V. Exª.

O Sr. Josaphat Marinho - Exatamente na linha do seu raciocínio, quero manifestar a expectativa de que algum Líder ocupará a tribuna para explicar a nota hoje publicada, segundo a qual teria ocorrido um pacto entre o Presidente da República e os Governadores. Que pacto? Em que termos? Com que pormenores? Porque é tudo genérico na nota publicada. Mas somos nós, da Câmara e do Senado, que vamos transformar esse pacto em lei. Precisamos ser devidamente informados. Muito obrigado.

O SR. ADEMIR ANDRADE - Esse pacto, Senador Josaphat Marinho, se refere ao Fundo Social de Emergência. Parece-me que se referiu especificamente à aprovação da prorrogação do Fundo Social de Emergência, cujos detalhes também não conhecemos. O próprio Governador Almir Gabriel apenas nos justificou que a permanência do Fundo Social de Emergência levaria a um equilíbrio do plano econômico e que, mesmo sacrificando os Estados, valeria a pena mantê-lo, solicitando e incentivando os Parlamentares que votassem a favor da permanência desse plano social de emergência.

Da nossa parte, vamos discutir o assunto com os Governadores Miguel Arraes e João Alberto Capiberibe, que são do nosso Partido e que estiveram presentes nessa reunião, ouviram opiniões, discutiram o assunto e, evidentemente, tomaram uma posição sobre essa questão.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 27/09/1995 - Página 16767