Discurso no Senado Federal

DEFESA DE MAIOR AUTONOMIA DO BANCO CENTRAL. REFUTANDO INFLUENCIA DA MIDIA NO COMPORTAMENTO DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, NO EPISODIO DO BANCO ECONOMICO.

Autor
José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • DEFESA DE MAIOR AUTONOMIA DO BANCO CENTRAL. REFUTANDO INFLUENCIA DA MIDIA NO COMPORTAMENTO DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, NO EPISODIO DO BANCO ECONOMICO.
Aparteantes
Jader Barbalho, Jefferson Peres.
Publicação
Publicação no DCN2 de 19/08/1995 - Página 14119
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • DEFESA, ATUAÇÃO, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, SENADOR, VONTADE, PROTEÇÃO, SOCIEDADE, ESTADO DA BAHIA (BA), EFEITO, INTERVENÇÃO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), BANCO PARTICULAR, MOTIVO, SIMILARIDADE, PROCEDIMENTO, ORADOR, GESTÃO, JOSE SARNEY, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, REFERENCIA, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS).
  • DEFESA, APROVAÇÃO, DESARQUIVAMENTO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, CESAR MAIA, EX-DEPUTADO, FRANCISCO DORNELLES, DEPUTADO FEDERAL, OBJETIVO, GARANTIA, INDEPENDENCIA, AUTONOMIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN).

O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o assunto que me traz à tribuna, nesta manhã, é bastante semelhante àquele abordado pelo Senador Jefferson Péres. Creio que esse é um assunto que merece profunda reflexão, uma análise percuciente, demorada desta Casa, porque é o Senado quem aprova o Presidente do Banco Central. Será o Senado, no futuro, quem aprovará a nomeação do Presidente do Banco Central e poderá destituí-lo se este Banco Central for independente. Portanto, o Senado tem a responsabilidade "fulcral" pela questão financeira do País.

Penso que o episódio recentemente vivido merece várias reflexões. Temos que extrair lições desse episódio e dar conseqüência a tudo aquilo que daí pudermos extrair. Em primeiro lugar, deixo bem claro que ninguém, e muito menos eu, pode atirar pedras no Sr. Antonio Carlos Magalhães. Digo muito menos eu, porque fiz, em 1985, exatamente aquilo que fez o Sr. Antonio Carlos Magalhães. Não tivemos a mesma repercussão jornalística porque não éramos o Sr. Antonio Carlos Magalhães e nem tínhamos o apoio jornalístico que tem S. Exª. Mas evidentemente procuramos fazer a mesma coisa.

Quando houve a liquidação do Banco Sul Brasileiro, a comunidade gaúcha reagiu, através de seus representantes no Congresso. Se alguém quiser fazer um levantamento dos Anais vai fazer com muita facilidade. Estão lá pronunciamentos ferozes, duros, contra o então liquidante, Ministro da Fazenda Delfim Netto. E depois contra, ou pelo menos em relação a, o primeiro Ministro da Fazenda do Governo Sarney, hoje Deputado Francisco Dornelles. Agimos exatamente como agiu o Sr. Antonio Carlos Magalhães: em defesa dos interesses de sua comunidade. Quando um banco desse porte quebra, vão com ele as empresas que ali têm depósito, milhares de pequenas, médias e grandes empresas, os pequenos e médios depositantes; é toda uma comunidade que é atingida. Logo, não há um interesse individual ou um interesse menor em jogo; há um interesse coletivo, um interesse comunitário que se vê, num determinado momento, desprotegido, sem meios de ação e apela para os recursos que lhe são disponíveis. Como nesse caso não há recursos técnicos, não há recursos financeiros, apela-se para os recursos políticos.

E foi mea-culpa, a máxima culpa; foi o que fiz, Sr. Presidente, em 1985. A diferença é que naquele período havia outra visão, outro enfoque político em torno da questão da moeda. Os nossos economistas do PMDB apregoavam que emissão de moeda não significava dano à economia. A visão estruturalista da economia apregoava a idéia de que emitir moeda é sempre bom para dinamizar o processo econômico, crescer e distribuir riquezas. Em 1985, o então Deputado José Fogaça era um deles, e nisso ele acreditava e por isso ele brigou e lutou.

Não quero falar nos nossos outros representantes, porque não fui autorizado por eles, mas todos fizeram o mesmo discurso e todos tiveram o mesmo posicionamento. E mais: fomos vitoriosos. Fomos aos cofres públicos da União, sacamos os recursos e demos cobertura para o rombo da incompetência e da corrupção de diretores do então Banco Sul Brasileiro. E o que se vê? O que se vê é que tudo aquilo que aconteceu está-se reproduzindo hoje na tentativa, ou nas incursões, do Sr. Antonio Carlos Magalhães. A diferença entre 1985 e 1995 é que não só mudaram os governos; mudaram as pessoas e felizmente, Sr. Presidente, mudou também o Brasil. Posso dizer com toda a tranqüilidade, portanto, que o Sr. ACM está fazendo o que deve fazer. Criticá-lo por agir da maneira que age, creio que é um equívoco. No entanto, atendê-lo em seus propósitos, aí vai uma outra, uma enorme e uma abissal distância.

O Sr. Jefferson Péres - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Senador Jefferson Péres, concedo o aparte a V. Exª, mas peço que seja breve, porque eu gostaria de desenvolver um pouco mais meu raciocínio. O meu objetivo - quero que V. Exª saiba - não é abordar a questão do Sr. Antonio Carlos Magalhães. Isso é apenas um início, um introdutório ao que eu pretendo dizer, que é outra coisa absolutamente diferente.

O Sr. Jefferson Péres - Essa passagem do pronunciamento de V. Exª me ajuda a fazer uma retificação e um acréscimo ao meu pronunciamento anterior. O Sr. Antonio Carlos Magalhães e os demais políticos baianos estão fazendo o que devem.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Creio que sobre isso não há dúvida alguma.

O Sr. Jefferson Péres - Se o banco fosse do Amazonas, também eu estaria lutando por ele, talvez não utilizando os mesmos métodos do Sr. Antonio Carlos Magalhães. Não com o estilo de S. Exª - é um estilo dele, não é o meu -, mas eu estaria denodadamente e de todas as maneiras tentando salvar o banco. No entanto, não se pode admitir que todos gritem, esbravejem e lutem. O que precisamos é, institucionalmente, colocar o Banco Central a salvo disso. Muito obrigado a V. Exª pela oportunidade.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Sou eu quem agradece, nobre Senador.

Creio que, realmente, estamos em uma linha de raciocínio muito semelhante, muito próxima e absolutamente confluente. Vamos chegar sempre à mesma conclusão, que é a necessidade de um Banco Central independente.

Há um projeto de um dos Senadores mais íntegros desta República, um dos homens públicos mais íntegros deste País, que é o Senador Pedro Simon, que proíbe que o Presidente do Banco Central venha do sistema financeiro e que possa depois voltar para ele. Trata-se rigorosamente de um cuidado necessário. Mas sempre que o Senador Pedro Simon e o Senador Roberto Freire falam sobre o poder dos banqueiros sobre o Banco Central, acrescento, com a mesma ênfase, que pior do que o poder dos banqueiros sobre o Banco Central é o poder dos políticos. Quem puxa para baixo a moeda, quem descontrola, quem manda, desmanda e desmoraliza o Banco Central são os políticos! Portanto, o Banco Central tem que estar a salvo dos banqueiros e tem que estar a salvo dos políticos.

Defendo, há mais de seis anos, o projeto do então Deputado César Maia, um belo projeto, que dorme nas gavetas da Câmara, sobre a independência do Banco Central. No entanto, creio que é preciso passar por episódios como esse. Estamos vivendo, agora, simplesmente o seguinte: se o Sr. Gustavo Loyola não for um homem coerente; se o Sr. Gustavo Loyola não for um homem firme; se o Sr. Gustavo Loyola não for, na sua personalidade individual, na sua característica e na sua linha de conduta pessoal, um homem íntegro, reto, o País está "ferrado", Senador Jefferson Péres.

Portanto, do jeito que a coisa está, estamos, rigorosamente, na dependência de quem é, que personalidade tem, que figura está na Presidência do Banco Central. Isso não pode acontecer. É preciso que o sistema instituído, estabelecido e consolidado lhe dê garantias para essa autonomia, para essa intangibilidade das suas decisões.

O que faz o Presidente do FED, Federal Reserve Bank, dos Estados Unidos? O que faz o Presidente do Deutsche Bank, o Banco Central da Alemanha? Favorece os banqueiros? Nunca ouvi falar que os Presidentes dos Bancos Centrais independentes do mundo fossem acusados de favorecimento a banqueiros. Favorecem os políticos? Também nunca ouvi falar. Tanto é verdade que o atual Presidente do Deutsche Bank está há mais de uma década no exercício da Presidência. O marco é a moeda mais sólida do mundo, e tem mostrado uma vitalidade que, por certo, durará muitas e muitas décadas. O grande problema dos outros países, como a Itália, por exemplo, na União Européia e no estabelecimento de uma moeda comum, é que os outros países não conseguem ter a estabilidade monetária que tem a Alemanha, e por isso não podem se integrar num processo de formalização por uma moeda comum.

De modo, Sr. Presidente, que eu creio que essa é uma conclusão inevitável e necessária. Mas há outras que devemos retirar desse episódio. Na última terça-feira, o nosso Líder do PMDB, Senador Jader Barbalho, fez um pronunciamento vigoroso e correto neste plenário, dizendo duas coisas importantes: primeiro, que o Presidente da República assegurava que não iria colocar dinheiro no Banco Econômico; e segundo, que era preciso caminhar para a consolidação de um Banco Central independente. Isto não foi ouvido pelo Plenário da Casa. O pronunciamento do Senador Jader Barbalho, mesmo com a vitalidade, o vigor e exuberância que teve, não teve ouvidos na Casa. É como se S. Exª não tivesse falado. A frase: "O Presidente não vai colocar recursos federais no Banco Econômico" - que S. Exª trazia diretamente de uma audiência com o Presidente da República -, aqui não foi ouvida, muito menos o pronunciamento do Senador Elcio Alvares. O que me pergunto é se nós vamos ter neste momento, se vamos ter num futuro imediato, ou se vamos ter nos próximos dias alguma iniciativa, algum momento de lucidez em torno dessa questão, que é desengavetar os projetos que existem aí, inclusive, sim, o do ex-Senador Itamar Franco, que se dirige apenas para a questão de o Presidente do Banco Central não trabalhar no sistema financeiro. Tudo bem, também este. Desengavetamos este, desengavetamos o projeto do Deputado César Maia, do Deputado Francisco Dornelles, e vamos trabalhar na questão de um Banco Central independente, porque nem sempre teremos um Gustavo Loyola na Presidência do Banco Central. É sobre isso que acho importante refletirmos.

Veja, Sr. Presidente: o Presidente da República fez o acordo com o Sr. Antonio Carlos Magalhães na segunda-feira, durante o dia. À noite, chamou o Ministro da Fazenda, que estava fora do País, reuniu-se com o Presidente do Banco Central e, naquela noite, Sua Excelência comunicou: "Eu permiti que as ações do Banco Econômico fossem desapropriadas e transferidas para o Governo do Estado da Bahia, para que eles, lá na Bahia, com a sua comunidade econômica, financeira, produtiva, tentassem buscar uma saída." Esta decisão garantiu a intocabilidade da decisão do Sr. Gustavo Loyola de intervir no Banco Econômico, não afetou em nada a decisão, e demonstrava uma extraordinária firmeza e uma extraordinária coerência do Presidente da República. Na tarde de terça-feira, o Ministro da Fazenda e o Presidente do Banco Central, por volta das 16h, comunicaram isto à imprensa; e, no Palácio, o Chefe do Serviço de Divulgação, o Secretário de Imprensa, o Embaixador Sérgio Amaral, fez também esta comunicação à imprensa. E aqui no Congresso, tanto o Senador Elcio Alvares quanto o Senador Jader Barbalho, em veemente pronunciamento, faziam também esta comunicação.

No entanto, o mundo virtual se sobrepôs ao mundo real. O mundo do imaginário se sobrepôs, inapelavelmente, ao mundo da realidade. E o imaginário coletivo é uma coisa poderosa, Sr. Presidente!

Hoje, tanto a imprensa quanto os políticos - e entre eles eu me encontro - estão tomados por esse poderoso efeito do imaginário coletivo.

O que que é hiperdramático e o que que é emotivamente arrebatador? É que neste País existe uma eminência parda todo-poderosa, na figura do Sr. Antonio Carlos Magalhães, que manipula, como marionete, o Presidente da República. Isto é um arquétipo profundo que está na história da dramaticidade humana. Nós não só vivemos isso historicamente como temos volúpia, fascínio e desejo da reprodução desses arquétipos. Queremos ver sempre isso ser repetido; é isso que propõe; isso é que traz hiperdramaticidade; e é isso que é delicioso. Porque o jornal Folha de S.Paulo, Sr. Presidente, publicou, na primeira página, o artigo de um humorista em cima de fatos que não existiam! O jornal e o humorista caíam, às gargalhadas, em cima de coisas que não havia e que não tinha ocorrido! Então, o mundo virtual se sobrepõe ao mundo da realidade.

Assisti, há alguns dias, uma palestra do Professor Nícolas Negroponte, de Massachusetts, promovido por um órgão de imprensa, RBS, do Rio Grande do Sul, em que ele disse uma coisa extraordinária: "o espaço cibernético, o espaço virtual é ilimitado, enquanto que o espaço aéreo é limitadíssimo." Alguém lhe perguntou: "Quando é que as comunicações de cabo, de dados, de computadores vão vir pelo espaço aéreo, e não por fibra ótica?" Ele respondeu: "Não diga essa bobagem. Nunca! Porque o espaço aéreo é extremamente limitado. As ondas aí se batem, se conflagram, se misturam. O espaço aéreo é limitado. Agora, uma fibra ótica pode transmitir um bilhão, três ou quatro bilhões de bytes. Não há limite. O volume de informações desse mundo virtual é incalculavelmente ilimitado. Logo, a fibra ótica, o espaço cibernético, é muito maior do que o espaço aéreo."

E nós vivemos nestes dias nesse espaço cibernético. Imaginou-se que o Sr. Antonio Carlos Magalhães manda no Presidente da República; imaginou-se que Sua Excelência é um Presidente submisso, e a partir daí estampou-se na primeira página de um jornal um artigo de um humorista em cima dessa suposta virtual e imaginária realidade.

Na verdade, Sr. Presidente, isso produziu discursos inflamados, no Senado, de indignação; isso produziu artigos de humoristas, que caíam, às gargalhadas, em cima do fato de que o Sr. Antonio Carlos Magalhães manda no Presidente da República. Porque o que tem graça é isso. Não tem graça, por exemplo, que se tenha um Presidente que é um homem coerente, que tem o centro das suas decisões absolutamente sob controle. Isso não tem graça alguma, isso não dá humor em uma primeira página de jornal, isso não dá notícia em lugar nenhum do mundo. O que dá texto hiperdramático ou humorístico é exatamente o contrário: um Presidente submisso sob as mãos de uma eminência parda todo-poderosa.

Creio que esta é uma outra reflexão que tem que se fazer neste País.

O mundo político, o mundo das decisões políticas não pode caminhar em cima do espaço cibernético, virtual ou do imaginário coletivo. O desejo folclórico de que haja neste País um homem com tanto poder na sua figura que possa ascender sobre o Presidente, comandá-lo, dirigi-lo e arrancar dos cofres públicos nada mais que 1 bilhão e 800 milhões de dólares. Mas há um desejo, um fascínio, uma volúpia, uma ânsia para que isso fosse verdade, para se poder publicar um texto humorístico na primeira página. E a ânsia era tanta, o desejo tão forte, que se acreditou nisso, se viu isso, se enxergou isso, e se produziu material jornalístico caro, pois a edição de uma jornal que publica e vende - não sei - 500, 600, 1 milhão de exemplares por dia é algo caríssimo.

Imagino que poderíamos ter suprimido da história do Brasil o dia que foi a nossa última terça-feira. Se o suprimíssemos e passássemos da segunda para a quarta-feira imediatamente, o País nada perderia, Sr. Presidente, uma vez que a terça-feira foi um dia virtual na história do Brasil. É o espaço cibernético de Nicholas Negroponte, autor do Mundo Digital.

O Sr. Jader Barbalho - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Ouço com prazer V. Exª.

O Sr. Jader Barbalho - Senador José Fogaça, em primeiro lugar, desejo agradecer a referência que V. Exª faz ao pronunciamento que proferi na última quarta-feira. Compartilho das preocupações de V. Exª em relação a esta questão que está na pauta, não só da imprensa, mas da sociedade brasileira. Comungo, mais do que nunca, com o fato de que essa comédia de erros deva fazer que com que todos nós que temos responsabilidades no País, a partir do Presidente da República e incluindo, evidentemente, o Congresso, meditemos sobre a necessidade da independência do Banco Central. Tive oportunidade, no encontro que tivemos com o Presidente da República, de manifestar à Sua Excelência o nosso ponto de vista de discordância com o que havia acontecido. O Presidente poderia ter sido poupado do episódio. Acredito que, de certa forma, falta ao Presidente melhor cerco político. O Presidente da República jamais deveria ter sido envolvido tanto num episódio que entendo ser um episódio de natureza eminentemente técnica. Ou um banco merece ou não ser liquidado, ou um banco merece ou não a intervenção, e isto, no meu entendimento, não deve passar pelo Presidente da República, deve ficar restrito às autoridades responsáveis pela área econômica e financeira do Governo. O Presidente foi envolvido nesse episódio e acabou pagando as conseqüências de ter permitido o envolvimento, quando este assunto, no máximo, deveria ter chegado a tratativas com o Ministro da Fazenda, e não mais do que isto. Esse episódio poderá redundar, por ter sido grave, exatamente numa consciência da necessidade da urgência dessa legislação, fazendo com que o Banco Central efetivamente seja independente, tenha autonomia, de tal ordem que haja segurança para o Sistema Financeiro e, em conseqüência, para a própria sociedade. Outro aspecto que me parece relevante, a ser meditado, é a questão do seguro para os depósitos. A imprensa vem registrando essa questão e citando, inclusive, legislação existente há muito tempo nos Estados Unidos. Ainda ontem a Gazeta Mercantil, em editorial, frisava isso. Oitenta por cento, Senador José Fogaça, - essa foi a informação transmitida pelo Governo - dos depósitos no Banco do Brasil não ultrapassam a R$ 5 mil. Pelo menos esses correntistas deveriam ter a segurança, estar cobertos por um seguro. Dois aspectos são relevantes e devem motivar providências urgentes: a autonomia do Banco Central e o seguro em relação aos depósitos. Isso daria, de certa forma, a estabilidade necessária. Eu gostaria de cumprimentar V. Exª pelas considerações que faz. Compreendo, de certa forma, a angústia de V. Exª, angústia de pessoas que estão preocupadas com a vida brasileira, e até daqueles que não têm função pública, daqueles que não têm mandato, daqueles que não têm tribuna, mas não compartilho, apesar de compreender, com essa censura que V. Exª faz aos humoristas. Essa foi uma comédia de erros. Uma comédia lamentável, uma comédia que quase se transforma, na verdade, num grande dramalhão. Mas gostaria de fazer referência também, Senador José Fogaça, no momento em que cumprimento V. Exª - V. Exª é uma das pessoas que merece nosso maior respeito, pela seriedade com que sempre atuou em todos os episódios no Senado e, enfim, na sua vida pública -, ao fato de que, ao lado da preocupação com essa questão do humor, de qualquer maneira prejudica a imagem da autoridade. Pode faltar a um Governo quase tudo, só não pode faltar autoridade. A um governo pode-se imputar várias coisas, mas se lhe for imputada falta de autoridade, e a sociedade perceber isso, o governo faliu. Compreendo, portanto, as preocupações, mas quero fazer justiça a jornalistas, a analistas políticos que têm nesses dias compartilhado, como V. Exª, das preocupações em relação a este episódio, que, sem dúvida nenhuma, é um episódio grave sob o aspecto econômico e financeiro, sob o aspecto administrativo e sob o aspecto de natureza política. Ao findar este meu aparte, cumprimento V. Exª, fazendo apenas este reparo, apesar da compreensão; e espero - tantas vezes esse tema de autonomia do Banco Central já foi tratado no Senado nesses meses que aqui estou - que nos unamos e que seja possível, de fato, materializar, inclusive aproveitando esse ambiente. Logo mais essa coisa se esvazia; outro episódio virá; mudam as manchetes da imprensa; e fica como mais um episódio lamentável na vida brasileira. Acho que este é o momento oportuno para que aproveitemos a oportunidade de mudar as regras relativas ao Banco Central e criar um seguro sobre os depósitos. Muito grato pelo aparte que V. Exª me concedeu.

O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - Ilustre Senador José Fogaça, a Mesa lembra a V. Exª que o seu tempo está esgotado.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Senador Jader Barbalho, antes de mais nada, não posso deixar de perguntar a V. Exª o seguinte: onde V. Exª ouviu, no pronunciamento, alguma censura aos humoristas? Posso fazer humor com os humoristas, posso ter rido dos humoristas, mas não fiz censura a eles. Portanto, peço que V. Exª retifique essa situação.

O Sr. Jader Barbalho - Senador José Fogaça, retifico com a maior tranqüilidade. Eu disse que eu compreendia, eu quis foi fazer com que as pessoas não tivessem dúvidas.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Com um ou dois humoristas, não com os humoristas.

O Sr. Jader Barbalho - Porque V. Exª está muito preocupado, e sei que a sua preocupação é com a imagem que possa restar de tudo isso para a sociedade brasileira, essa é a preocupação, por isso mesmo, quis fazer a ressalva dizendo que compreendia. Sei que V. Exª faz um pronunciamento sério neste momento, de quem está efetivamente angustiado e preocupado com o episódio. O que quis foi dar destaque a essa parte, para que não parecesse que V. Exª estaria fazendo uma censura, porque a Folha de S.Paulo publicou na primeira página. Sei que não é esse o seu interesse. V. Exª está preocupado em que esse episódio não fique apenas como uma comédia de erros.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - V. Exª acha que não tenho direito de comentar esse fato, de criticá-lo e de até de rir dele? Eu me caí às gargalhadas sobre o fato, sobre o erro cometido, e isso não é censura. Não estou proibindo que o façam. Podem cometer esse erro quantas vezes quiserem. Ninguém vai impedir.

O Sr. Jader Barbalho - Quem cometeu o erro?

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Quem cometeu o erro foi quem praticou esse tipo de coisa, quem publicou fatos que não existiam.

O Sr. Jader Barbalho - Não é quanto a isso. Nem sei a que V. Exª está se referindo desse fato. Estou falando do humor dos humoristas. Ainda hoje vi mais uns três, nesse episódio. Lamento. Os humoristas estão cumprindo o seu papel, estão retratando essa comédia de erros. Nem consigo imaginar o que seja aquilo a que V. Exª se refere, especificamente. Se não fui compreendido por V. Exª, mil perdões.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Só não compreendi a expressão que V. Exª usou, de que eu estaria fazendo censura aos humoristas. Essa é a única coisa que não compreendi.

O Sr. Jader Barbalho - Retiro-a, até porque não imagino. Se usei a expressão, mil perdões, até porque a minha intenção, ao apartear V. Exª, foi exatamente ...

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Ou seja, quando alguém recebe críticas, está sendo democraticamente criticado. Quando critica os críticos, isto é censura?

O Sr. Jader Barbalho - Em absoluto.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Não! Criticar os críticos não é impedi-los de se pronunciar.

O Sr. Jader Barbalho - Meu caro Senador José Fogaça, se usei a expressão, mil perdões.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Estou criticando os críticos. E garantindo, até a morte, o direito de nos criticarem, quando quiserem.

O Sr. Jader Barbalho - Mil perdões. O que pretendia era fazer este registro, até em homenagem à imprensa - homenagem que V. Exª sempre faz -, no sentido de que, sejam os cronistas de natureza econômica ou política, sejam os humoristas, eles estão fazendo o seu trabalho, retratando, lamentavelmente, esse episódio.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Foram vítimas, Senador Jader Barbalho, e, ao mesmo tempo, agentes dessa volúpia, dessa ânsia e desse desejo de que a versão se impusesse aos fatos.

O Sr. Jader Barbalho - Não foram eles que criaram o episódio e nem que inventaram a versão. V. Exª sabe disso. Há pessoas que vieram a esta tribuna e, não sei quantas vezes, já levantaram a questão, da tribuna ou em entrevista, se o Presidente exerce ou não a sua autoridade, dizendo que esperam que este a exerça. Então, não é a imprensa que está inventando. Aliás, todos esperamos - e estamos certos - que o Presidente exerça a sua autoridade, porque a autoridade da Presidência não é uma preocupação apenas do Senhor Fernando Henrique Cardoso. O exercício da autoridade da Presidência é uma preocupação da sociedade brasileira.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Senador Jader Barbalho, se V. Exª, no seu pronunciamento, me der um espaço, vou lhe dizer o seguinte: ...

O Sr. Jader Barbalho - Com a maior alegria.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - V. Exª entende que o Presidente não está exercendo a sua autoridade nesse episódio?

O Sr. Jader Barbalho - Não; mas há pessoas, reiteradamente, colocando isso em dúvida. E não é a imprensa que está inventando isso.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Esse é um outro problema. Creio que não é essa a discussão, aqui. O que estamos discutindo é se quem precisa checar, conferir, avaliar os fatos na sua realidade são aqueles que informam. Portanto, quem produz a versão, quem produz a informação, são as pessoas que informam. E o direito à informação é um direito constitucional de todo o cidadão brasileiro. O direito à informação não é um direito dos jornais, não é um direito dos jornalistas. O direito à verdade, o direito à informação - está na Constituição - é um direito do cidadão.

No momento em que o cidadão não recebe a informação verdadeira, esse direito está sendo vilipendiado, Senador Jader Barbalho.

O SR. PRESIDENTE  (Nabor Júnior) - Pediria ao Senador José Fogaça que encerrasse o seu pronunciamento, porque ainda há vários oradores inscritos para falar no decorrer desta sessão.

Pediria a compreensão de V. Exª e dos nobres Senadores aparteantes.

O SR. JOSÉ FOGAÇA - Sr. Presidente, lamento apenas que o Líder do meu Partido talvez não tenha entendido completamente o meu pronunciamento. De qualquer maneira, reafirmo o que disse.

Sobretudo neste momento, creio que as palavras do Presidente da República devam ser salientadas, porque há aqueles que entendem que a bazófia, que jogar para o cenário, jogar para a platéia, produzir cenas dramáticas, seja a melhor forma de se fazer política. O Presidente apenas não fez isso. E o País precisa aprender que tem um Presidente que não gosta de jogar para a platéia, que não gosta de produzir cenas de hiperdramaticidade para informar a população. Sua Excelência toma as decisões e as comunica, mas essas informações não são ouvidas.

O Presidente disse, na segunda-feira: "não haverá recursos públicos para salvar o Banco Econômico". Do outro lado, o que se ouviu? "O Sr. Antonio Carlos Magalhães manda no Presidente, estadualizou o Banco Econômico e vai colocar dinheiro do Governo Federal para salvá-lo." Foi isso o que se ouviu do outro lado. Mas quem traduziu isso? Quem fez essa versão? Se não foi o Congresso, se não foram os políticos, se não foi a imprensa, se não foram os transmissores de opinião pública, quem foi, então? Preciso saber! O Presidente tomou a decisão na noite de segunda-feira e o Líder, na terça-feira à tarde, comunicou aqui: "Não vai haver." Na quarta-feira, ainda se produz no noticiário a versão de que os recursos do Governo Federal iriam fechar o rombo do Banco Econômico. Mas quem está alimentando isso, quem está insistindo, quem está produzindo essa versão dos fatos?

Não tenho dúvida alguma de que isso merece reflexão. O mundo virtual não pode comandar o mundo real. O imaginário coletivo é rico, é criativo, mas não pode controlar a vida e a realidade.

Por outro lado, esse episódio nos ensina que Banco Central não pode ser controlado por políticos e nem por banqueiros. Se o Presidente se envolveu, como disse o Senador Jader Barbalho, na matéria, se o Presidente se viu, de repente, imiscuído na questão, é só por uma razão, Senador Jader Barbalho, é porque o Banco Central não é independente, é porque o Presidente do Banco Central é demissível ad nutum pelo Presidente da República. Conseqüentemente, essa é uma matéria que acaba caindo e batendo na mesa do Presidente! Isso não tem jeito, é inescapável!

Se o Presidente do Banco Central tiver apenas que cumprir o papel de guardião da moeda - da moeda estável, da moeda que garanta ao salário mínimo, ao salário dos pequenos, ao salário daqueles de baixa renda, que esse salário tenha o mesmo valor durante todo o mês -, esse Presidente do Banco Central estará cumprindo a tarefa mais social e mais importante que um Presidente de Banco pode cumprir.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 19/08/1995 - Página 14119