Discurso no Senado Federal

SOLICITANDO QUE SEJA ESCLARECIDO, O MAIS BREVE POSSIVEL, O EPISODIO DA APREENSÃO DE UM BOEING 727, ENVOLVENDO O NOME DO GOVERNADOR DO ESTADO DO ACRE.

Autor
Flaviano Melo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Flaviano Flávio Baptista de Melo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO ACRE (AC), GOVERNO ESTADUAL.:
  • SOLICITANDO QUE SEJA ESCLARECIDO, O MAIS BREVE POSSIVEL, O EPISODIO DA APREENSÃO DE UM BOEING 727, ENVOLVENDO O NOME DO GOVERNADOR DO ESTADO DO ACRE.
Aparteantes
Nabor Júnior.
Publicação
Publicação no DCN2 de 19/08/1995 - Página 14127
Assunto
Outros > ESTADO DO ACRE (AC), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, URGENCIA, ESCLARECIMENTOS, APREENSÃO, CARGA, CONTEUDO, CONTRABANDO, AERONAVE, IMPUTAÇÃO, PROPRIEDADE, ORLEIR CAMELI, GOVERNADOR, ESTADO DO ACRE (AC).

O SR. FLAVIANO MELO (PMDB-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, nos últimos dias, a imprensa tem noticiado a apreensão de um Boeing 727-200, no Aeroporto de Cumbica, em São Paulo, procedente de Miami, nos Estados Unidos, que estaria transportando mercadorias estrangeiras ilegalmente e garante que o avião é do Governador do Acre, Orleir Cameli.

As versões dadas pelo Governador e seus assessores se contradizem, tornando o caso muito nebuloso, conforme alguns fatos que passo a relatar nesta Casa, para meditação de todos e mostrar mais uma vez a necessidade de um rápido e amplo esclarecimento a respeito dos fatos por parte das autoridades competentes. Afinal, o avião e a sua carga foram apreendidos há 12 dias. Há informações de que pertence ao Governador de um Estado e, até agora, não se têm explicações claras sobre o assunto.

Vou relatar aqui todas as informações que consegui ao longo dos últimos 40, 50 dias, para que se notem as contradições a respeito do caso.

No princípio de julho deste ano, o Governador Orleir Cameli pediu licença à Assembléia Legislativa do Estado do Acre e foi aos Estados Unidos, alegando que iria tentar recursos junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento. O Governador, ao chegar dos Estados Unidos, não fez qualquer anúncio sobre verbas; alegou à imprensa do Acre que os recursos do Banco Interamericano não seriam para nenhum Estado da Amazônia.

Nesta mesma época, no Estado do Acre, começou a surgir um boato de que o Governador Orleir Cameli estaria comprando um Boeing 727-200. A confirmação veio no dia 14 de julho, através de uma entrevista do Governador ao jornal A Gazeta, confirmando a compra da aeronave, alegando que o avião fora adquirido pela família e que os recursos para isso teriam sido conseguidos através de financiamento de um banco americano.

No dia 21 de julho, o Governador, no mesmo jornal, A Gazeta, confirma a compra do Boeing 727-200 americano. Mas diz que a transação foi através de um leasing.

No dia 6 de agosto, esse avião é apreendido em São Paulo com produtos estrangeiros sem documentos fiscais.

No dia 19 de agosto, 4 dias depois, a Receita Federal envia ofício à Polícia Federal pedindo providências necessárias nesse caso e cópias de documentos correlatos às ações fiscais desenvolvidas em relação à carga apreendida em situação irregular na aeronave da Tropical Airlines.

No dia 12 de agosto, último sábado, o jornal Correio Braziliense publica uma nota, em sua segunda página, dizendo que o avião com a carga apreendida é do Governador do Acre, Sr. Orleir Cameli.

No dia 16 de agosto, o jornal O Estado de São Paulo estampa, em sua primeira página, a seguinte manchete: "Avião retido é do Governador do Acre". A chamada é ilustrada com uma foto do avião, onde aparece o nome "Marmud Cameli", pai do Governador do Estado.

Na página 7, o mesmo jornal assegura que o avião carregava aparelhos eletrônicos sem guia de exportação e, além disso, diz que a tripulação do Boeing 727/200 deu à Receita Federal um endereço falso da empresa - Av. Rio Branco, 156, Rio de Janeiro.

A reportagem garante mais à frente:

      Documentos apresentados pela tripulação do avião permitiram descobrir que a TCA adquiriu o Boeing por meio de contrato de leasing com a empresa de Miami, identificada apenas por três letras: IAE. Uma empresa da família do Governador Marmud Comeli Companhia Ltda. é a fiadora da TCA no contrato de leasing.

Diz ainda a matéria:

      O Assessor de Comunicação do Governo do Estado do Acre, Emilson Brasil, confirmou que o Boeing é da empresa do Governador. Segundo Brasil - diz a matéria -, o avião estaria alugado para a Equatorial Transporte Ltda. de Manaus, por um período de 200 horas de vôo e, por isso, o Governador não teria nada a ver com a apreensão do avião e a suspeita de contrabando.

      O gerente comercial da Equatorial, Celso Luís Francisconi, negou que tenha qualquer negócio com a empresa Cameli e disse que a operação teria sido feita com outra firma, a Di Gregori, que também negou ligação com a Cameli.

O jornal O Globo, no mesmo dia, também noticia o fato com a seguinte manchete: "Receita apreende carga no avião do Governador". Um trecho da reportagem, na página 8, garante:

      Assessores do Governador e um funcionário da Marmud Cameli operaram ontem um verdadeiro pouso de barriga.

Cita, também, a frase do Chefe da Representação do Acre em Brasília, Ludgero Santos de Paiva:

      Essa aeronave é a primeira de uma frota que o Governador e sua família pretendem construir. Só que o Governador não tem qualquer responsabilidade pela carga apreendida. O avião está alugado a uma empresa de turismo que tem o direito de voar 200 horas por mês, disse Ludgero.

O jornal diz ainda:

      Duas horas mais tarde, Brasil e Paiva mudaram a versão, oferecendo um contato com o gerente da Marmud Cameli Ltda., Antônio Malheiros. Por telefone, de Manaus, Malheiros afirmou que o boeing estacionado em Cumbica, apesar de batizado com o nome do pai do Governador, não pertence à empresa de Cameli, que se limitou a avalizar o leasing do avião, desembolsando U$150 mil para a empresa americana IAC Inc. E alegou: "A Marmud Cameli não tem autorização do DAC para operar. Em agradecimento ao aval, os donos da TCA Tropical batizaram o avião com o nome do pai do Governador.

No dia 16 de agosto, tive a oportunidade de conversar por telefone com o Secretário da Receita Federal, Everardo Maciel. Segundo informações prestadas por ele, havia suspeita de que esse avião estava com o chassis adulterado, razão pela qual havia pedido uma perícia para confirmar se esse fato era verdadeiro. Ontem, dia 17, o Superintendente Regional da Polícia Federal de São Paulo, Arthur Lobo Filho, enviou ao Diretor-Geral da Polícia Federal, Vicente Chelotti, um documento, mediante o qual historiava o fato, colocando, inclusive, que a documentação recebida sobre o caso não é suficiente para que se possa abrir um inquérito policial e solicitando outros documentos.

Veja bem, Sr. Presidente, quanta contradição! O caso está nebuloso e exige esclarecimento por parte das autoridades.

Primeiro, o Governador disse que o avião foi comprado por sua família; depois seus assessores desmentem, dizendo que a empresa do Governador apenas avalizou. Segundo, assessores do Governador dizem que o avião está alugado para a Equatorial Transporte de Manaus. Todavia, negam isso, afirmando que a nave está alugado para a Di Gregório, que também nega. Terceiro, assessores dizem que o avião está alugado para uma empresa de turismo; duas horas depois, contradizem-se, falando que o Governo só avalizou o leasing. Realmente são muitas as contradições. Solicito que a Receita Federal envie imediatamente esses documentos para a Polícia Federal, para que se possa abrir o inquérito policial que esclareça o caso definitivamente.

Ressinto-me, como Senador, de instrumento mais ágil para que possamos acompanhar casos como esses com mais rapidez. O pedido de informações requerido nesta Casa pelo Senador Nabor Júnior, pela Senadora Marina Silva e por mim tem um prazo longo para ser respondido, e esses fatos precisam ser elucidados o mais rápido possível. O povo do Acre, Sr. Presidente, é um povo carente, que necessita de ajuda do Governo Federal. Quantas vezes, Sr. Presidente José Sarney, quando V. Exª estava na Presidência da República, pedi audiências para tentar, como governador do meu Estado, viabilizar alguns programas para desenvolver o Estado do Acre, que é muito pequeno e quase não tem como caminhar sozinho. Um governador sob a suspeição de ter um avião preso com contrabando realmente não vai ter credibilidade em órgão nenhum do Governo Federal para solicitar recursos, tão necessários ao Estado do Acre.

O Sr. Nabor Júnior - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. FLAVIANO MELO - Ouço V. Exª, com muita honra.

O Sr. Nabor Júnior - Senador Flaviano Melo, temos o dever, como representantes do Acre no Congresso Nacional, de nos empenhar para que esse episódio seja devidamente esclarecido, até porque sua repercussão na sociedade é no sentido de que o governador do Acre é um contrabandista: comprou um avião cuja documentação é insuficiente para provar-lhe a propriedade, avião que é apreendido no aeroporto de Cumbica, em São Paulo, desacompanhado da guia de importação dos produtos que transporta, o que caracteriza o contrabando. Ora, não podemos ter o primeiro mandatário do nosso Estado sob a suspeição de ser patrocinador de contrabando. Fica muito mal para nosso Estado. Por essa razão, interessa-nos esclarecer essa questão. Se ficar comprovado que, na verdade, o governador nada tem a ver com isso, muito bem. Até desejamos que isso venha a ocorrer; não queremos cometer a injustiça de estar acusando o primeiro mandatário do Acre de contrabandista. O problema é muito sério e precisa de análise rigorosa por parte das autoridades do Ministério da Fazenda e da Polícia Federal, para que posa ser levada à opinião a verdadeira realidade dos fatos. O Governador, em entrevista concedida ontem a TV Bandeirantes, em determinado momento, negou que a empresa à qual pertence seja proprietária do avião. S. Exª disse que apenas tinha oferecido aval a outra empresa, provavelmente do Estado do Amazonas, que adquiriu a aeronave. O Governador concedeu entrevista a Luís Cláudio Moreira Jorge, da TV Gazeta e jornal Gazeta de Rio Branco, à qual V. Exª reportou - é bom que se leia na íntegra, para conhecimento dos Srs. Senadores e de toda a nação -, onde declara o seguinte:

      Mais uma vez, Orleir Cameli confirma a história de que sua família teria comprado um boeing americano para fazer vôos charters. Disse ainda que a intenção é comprar outro.

Não só confirmou a compra do primeiro como também demonstrou interesse em adquirir um segundo.

      Porém negou que tivesse comprado uma fazenda nos EUA com 100 mil cabeças de gado.

V. Exª sabe que a imprensa do Acre também divulgou que nessa sua estada nos Estados Unidos teria adquirido também uma fazenda com 100 mil cabeças de gado. Isso ele negou.

      Ele explicou que a Marmud Cameli - que é a firma da qual ele foi gerente, até bem pouco tempo - fez um leasing (espécie de aluguel por tempo determinado) de um boeing 727-200 usado, que fará 200hs de vôo por mês, o que dever sair em torno de R$80 mil a cada mês. Disse ainda que foram investidos cerca de R$500 mil na reforma e pagamento de seguro do avião que chega hoje a Manaus e em seguida será levado a São Paulo.

São palavras textuais do Governador. Vejam bem, no momento em que S. Exª diz que foi a firma dos irmãos e do pai que comprou, quer isentar-se dessa responsabilidade. Mas, logo a seguir, usa o plural: "Iremos fazer vôos charters a princípio para Buenos Aires". Iremos fazer; ou seja, S. Exª se inclui. "Foi um negócio legal." "Nós investimos..."; novamente usa o plural... "nesse avião com o nosso dinheiro, não foi dinheiro público". Prossegue: "Não há razão para esconder isso. Foi um negócio feito com o nosso suor. E a nossa intenção é fazer mais três, quatro, dez negócios deste tipo se aparecer uma boa oportunidade". Veja V. Exª que ontem mesmo o Governador negava que o avião fosse dele ou de sua família. Disse apenas que tinha sido avalista na transação. Mas no dia 14 - e V. Exª se reportou a isso no jornal A Gazeta -, S. Exª confirmou; e no dia 21 foi publicada entrevista, que S. Exª concedeu à TV Gazeta do Acre, na qual confessa que foi a dele família quem comprou. Um outro aspecto que deve ser esclarecido, Senador Flaviano Melo: se é um problema tão corriqueiro e diz-se que o avião foi apreendido porque estacionou no pátio destinado a aeronaves que fazem vôos domésticos e não vôos internacionais - já que o avião vinha de Nova Iorque, e com isso despertou realmente a suspeita da Receita Federal que o apreendeu -, se fosse simplesmente o fato de o avião ter estacionado em lugar inadequado, por que, passados doze dias, esse avião ainda continua retido e a sua carga, transportada de Miami para São Paulo, também? O problema é sério. É preciso que as autoridades, principalmente as da Receita Federal, as do Ministério da Fazenda as da Polícia Federal esclareçam à opinião pública sobre a realidade dos fatos, já que isso está causando uma preocupação muito grande para todos nós representantes do Estado do Acre, assim como para a população acreana de modo geral.

O SR. FLAVIANO MELO - Muito obrigado, Senador Nabor Júnior, pelo seu aparte, que o incorporo ao meu pronunciamento. Gostaria inclusive de dizer-lhe que esse episódio já repercutiu enormemente na imprensa nacional. Caso não houvesse acontecido no mesmo momento do episódio do Banco Econômico, essa repercussão seria muito maior, o que seria muito mais desastroso do que já está sendo para a população do nosso Estado. Porque ter um Governador e o seu governo sob suspeita realmente tira toda a credibilidade de possível pedido de recursos para o Estado do Acre.

Concluo o meu pronunciamento, Sr. Presidente, solicitando à Polícia Federal e à Receita Federal que elucidem esse caso o mais rápido possível, acabando de um vez por todas com essa dúvida em relação ao Governador do Acre, Sr. Orleir Cameli.

Muito Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 19/08/1995 - Página 14127