Pronunciamento de Guilherme Palmeira em 03/10/1995
Discurso no Senado Federal
SITUAÇÃO DIFICIL DO ESTADO DE ALAGOAS, EM VIRTUDE DO PLANO REAL. NECESSIDADE DE URGENTES REFORMAS FISCAL E TRIBUTARIA E DO PLANO SOCIAL DE EMERGENCIA.
- Autor
- Guilherme Palmeira (PFL - Partido da Frente Liberal/AL)
- Nome completo: Guilherme Gracindo Soares Palmeira
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
REFORMA TRIBUTARIA.:
- SITUAÇÃO DIFICIL DO ESTADO DE ALAGOAS, EM VIRTUDE DO PLANO REAL. NECESSIDADE DE URGENTES REFORMAS FISCAL E TRIBUTARIA E DO PLANO SOCIAL DE EMERGENCIA.
- Aparteantes
- Bernardo Cabral, Lauro Campos.
- Publicação
- Publicação no DSF de 04/10/1995 - Página 124
- Assunto
- Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. REFORMA TRIBUTARIA.
- Indexação
-
- ANALISE, DIFICULDADE, SITUAÇÃO, ESTADOS, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE ALAGOAS (AL), RESULTADO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO, IMPLANTAÇÃO, PLANO, REAL, ESTABILIDADE, ECONOMIA.
- QUESTIONAMENTO, EFICACIA, PROGRAMA DE GOVERNO, ESTABILIDADE, ECONOMIA, REALIZAÇÃO, SANEAMENTO, FINANÇAS, UNIÃO FEDERAL, PROVOCAÇÃO, AUSENCIA, VIABILIDADE, GOVERNO, ESTADOS, MAIORIA, MUNICIPIOS, PAIS.
- ANALISE, CRITICA, INCOERENCIA, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, EXECUTIVO, PROPOSIÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, PRORROGAÇÃO, VIGENCIA, FUNDO SOCIAL DE EMERGENCIA.
O SR. GUILHERME PALMEIRA (PFL-AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vou abordar tema sobre o qual já se tem falado em várias oportunidades, mas com a responsabilidade de ser Senador por um pequeno Estado, que está sofrendo, pouco ou muito, em função do encaminhamento do Plano Real. Não poderia deixar, realmente, de abordar esse tema da reforma fiscal, da reforma tributária e do Plano Social de Emergência, que, na verdade, nunca foi social.
O Plano Real, concebido, elaborado, negociado e posto em prática pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, quando titular da Pasta da Fazenda, no Governo Itamar Franco, constituiu e constitui, sem dúvida, uma etapa decisiva, vital - e quero crer definitiva - para a estabilidade política e institucional do País. A espiral inflacionária foi revertida e, ainda que tenhamos taxas elevadas para os padrões mundiais, não há riscos iminentes que ameacem o processo de contenção em que estamos todos empenhados. Os êxitos até agora conseguidos adquirem maior expressão quando se considera que os instrumentos de política econômica com que conta o Governo são extremamente frágeis e limitados, na medida em que se cingem ao manejo da taxa de juros, à dosagem do crédito e à manipulação das tarifas que permitem regular a oferta de bens e produtos estrangeiros, para estabilizar a demanda interna. É uma situação que persistirá enquanto não adotarmos as reformas estruturais e os mecanismos definitivos que permitam o controle do déficit público.
No entanto, Sr. Presidente, há aspectos da política econômica que exigem medidas de ajustamento mais rápidas e em alguns casos até urgentes. Como assinalam os Ministros do Planejamento e da Fazenda, na Exposição de Motivos que acompanha a proposta de prorrogação do Fundo Social de Emergência, o superávit do Tesouro Nacional, em 1994, foi de mais de R$14 bilhões, o que permitiu que o do Governo Federal fosse a metade desse montante, ou seja, mais de R$7 bilhões. Nos primeiros sete meses do atual exercício, a situação não foi muito diferente. O superávit do Tesouro foi de mais de R$8 bilhões, e o do Governo de quase R$2 bilhões, a preços de julho do corrente ano. Mantida a mesma proporção observada até agora, o desempenho apresentará resultados muito diferentes. Embora o superávit primário do Tesouro seja virtualmente o mesmo - cerca de R$13,9 bilhões -, o do Governo baixará para menos da metade, passando de R$7 bilhões para R$3,3 bilhões. Isso, no entanto, é apenas uma expectativa, já que o resultado efetivo será menor, em face da circunstância de se ter transferido a liquidação de 60% da folha de pagamento do Executivo, do dia 25 ou do último dia útil de cada mês para o dia 5 do mês seguinte. De tal sorte que a de dezembro de 1995 só sofrerá liquidação efetiva em janeiro de 1996. É um artifício contábil, que, sem dúvida, afetará os resultados deste ano, muito embora ainda se possa esperar, se não déficit, pelo menos um precário equilíbrio das contas públicas do Governo Federal. Essa situação só será corrigida com uma reforma tributária que aumente a arrecadação em termos reais e uma reforma administrativa que diminua, também em termos reais, as despesas da União. Com o patamar atual de juros que incidem sobre a dívida interna, é pouco provável que se alcancem os dois resultados simultâneos, tendo em vista, sobretudo, o alcance muito limitado das propostas de mudanças do que poderíamos chamar a reforma patrimonial; isto é, as mudanças no sistema tributário e no âmbito fiscal.
De qualquer maneira, podemos dizer que tanto a situação do Tesouro quanto a do Governo Federal são substancialmente melhores do que em qualquer outra época dos últimos 30 anos. Mantida a inflação sob controle, levado a bom termo o processo de privatização e adotadas as medidas de racionalização tributária, mesmo limitadas como as da emenda constitucional em curso de apreciação no Congresso Nacional, é lícito se esperar um êxito incontestável do programa econômico decorrente do Plano Real.
No entanto, outra é a situação dos Estados - aí, sim, a grande preocupação, a preocupação maior -, vergados sob o peso das dívidas de seus respectivos Tesouros e do desequilíbrio crônico de seus respectivos orçamentos. Pode-se dizer que, virtualmente, não há exceção à regra. Nós, aqui no Senado, estamos sendo chamados a aprovar sucessivos aumentos dos limites de endividamento, sem os quais torna-se impossível até mesmo a rolagem das dívidas das Unidades da Federação, para as quais têm sido autorizados esses aumentos. Não seria demais dizer que a situação financeira da União pode ser circunstancialmente boa, mas a dos Estados é estruturalmente má. Minha dúvida, Sr. Presidente, se cinge a uma só indagação: Pode ter êxito um programa econômico que, saneando as finanças da União, inviabilize as finanças dos Estados e da maioria dos Municípios do Brasil?
Se somarmos a essa dúvida razoável a circunstância de que são imprevisíveis, até agora, as repercussões financeiras para os Estados da proposta de emenda constitucional que altera o sistema tributário isentando do ICMS os produtos exportados e os da cesta básica, o mínimo que se pode esperar é um agravamento da situação financeira da maioria, para não dizer da totalidade dos Estados brasileiros. Algo que afeta não cada um dos Estados, individualmente, ou o conjunto deles, coletivamente, mas a própria estrutura, a existência e o funcionamento do sistema federativo, consagrado em nossas Constituições desde 1891.
O Sr. Bernardo Cabral - Permite-me V. Exª um aparte?
O SR. GUILHERME PALMEIRA - Pois não, com muita honra, Senador Bernardo Cabral.
O Sr. Bernardo Cabral - Senador Guilherme Palmeira, V. Exª tem razão. A equipe econômica teima em desconhecer as desigualdades regionais, o histórico de cada município, a pobreza que avassala cada um e torna inexeqüíveis os planos que são feitos, porque cada região é uma região. Aliás, o nosso País tem várias frentes. De modo que, quando V. Exª toca num assunto como esse, que conhece bem - V. Exª foi Governador do seu Estado; portanto não está ocupando a tribuna de forma leviana para fazer uma restrição ao Governo -, quero me associar a V. Exª nessa espécie de denúncia, que eu considero mais uma crítica construtiva.
O SR. GUILHERME PALMEIRA - Muito obrigado, Senador Bernardo Cabral. A minha impressão é que é uma obrigação que está acima dos interesses partidários, políticos, porque somos, na verdade, os Representantes dos Estados e precisamos defender os Estados, os Municípios. É isso que procuro fazer, modestamente. Como eu disse no início do meu discurso, eu não poderia deixar de transmitir aquilo que penso, que sinto e que tenho percebido no dia-a-dia do meu Estado e de outros Estados que tenho a oportunidade de visitar. Sou grato a V. Exª, que ilustra o meu pronunciamento.
Como eu dizia, as dúvidas suscitadas, no entanto, são ainda bem mais amplas. Paralelamente à proposta de emenda constitucional de revisão do sistema tributário, propõe o Executivo a prorrogação da vigência do Fundo Social de Emergência até o exercício de 1999, até quase o ano 2000. Deixo de lado as incertezas quanto à constitucionalidade - aqui poderia falar o nosso jurista Bernardo Cabral - de uma emenda que pretende alterar uma disposição transitória do texto constitucional, não só porque poderia parecer preciosismo jurídico, como também porque não é esta a dúvida central de minhas indagações. A preliminar que levanto quanto à conveniência e oportunidade da aprovação simultânea das duas propostas de emenda constitucional é de razão lógica e parece-me que também de fundamento legal. Se a reforma tributária resolve o problema das contas públicas, incluídas aí as do Tesouro e as do Governo, tenho entendido que a prorrogação do Fundo Social de Emergência seja, mais do que dispensável, ociosa. E não se legisla ociosamente ou sem fundadas razões de interesse público. Esta é a primeira hipótese. Se a resposta for negativa, isto é, se a pretendida reforma tributária não equaciona o problema das contas públicas, então ociosa posso entender que seja, não a proposta de prorrogação do FSE - Fundo Social de Emergência, mas a própria reforma. Haveria uma terceira hipótese. A prorrogação do Fundo, segundo o Governo e segundo o meu pensamento, é necessária para a hipótese de não aprovação, no atual exercício, da reforma tributária. Nesse caso, também posso presumir, como na segunda hipótese, que ambas são ociosas, a não ser que se inclua na prorrogação do Fundo dispositivo que preveja sua vigência apenas até o exercício em que entre em vigor a reforma tributária. Creio que existe ainda uma quarta hipótese: a de que a aprovação da reforma seja condição necessária mas não suficiente para equilibrar as contas públicas. A condição suficiente seria a prorrogação do FSE. Neste caso, é ociosa a disposição que prevê a sua vigência apenas até 1999.
Parece-me lógico e racional concluir, portanto, que as duas propostas, nos termos em que estão formuladas, ou são notória e conclusivamente incompatíveis, ou contêm disposições que, num e noutro caso, pecam, no mínimo, repito, por ociosidade. Não vejo como aprová-las na forma como estão concebidas. O que tem o Plano Real de lógico, de coerente e de consistente, têm essas duas proposições de ilógicas, incoerentes e inconsistentes. A não ser que o Executivo tenha razões que a própria razão desconhece.
Conhecendo o Presidente Fernando Henrique Cardoso como conheço, confiando em seu governo como confio, e acreditando em seu espírito público como acredito, recuso-me a crer que haja razão de Estado, motivação política ou fundamento de racionalidade econômica que justifique a simultaneidade dessas duas proposições sobre as quais estamos sendo chamados a decidir.
O Sr. Lauro Campos - Permite-me V. Exª um aparte?
O SR. GUILHERME PALMEIRA - Pois não, com muita honra, Senador Lauro Campos.
O Sr. Lauro Campos - V. Exª tem demonstrado, através de seu discurso, uma preocupação muito justa com o destino final que a reforma tributária pretendida pelo Governo terá sobre a questão da discriminação, sobre a questão da repartição do bolo fiscal entre Estados, Municípios e União. Preocupa-me, por outro lado, que aquilo que Adam Smith dizia em 1776 ainda tenha razão: "O Governo jamais pagou a dívida pública, é sempre uma classe social que a paga". Não serão os governos municipais nem os estaduais nem o federal quem pagará essa dívida e a dívida externa. Foi, é e continuará sendo a classe trabalhadora quem a pagará. Através do fenômeno da repercussão, o aumento da carga tributária vai obviamente constituir um ônus a mais que os trabalhadores deverão pagar. Por outro lado, é pelo menos estranho que o Governo, que pretende colocar o combate à inflação como uma de suas metas-sínteses principais, venha a aumentar a carga tributária, porque nenhum Governo, dos muitos que conhecemos, por mais insano que seja, jamais pretendeu fazer uma reforma tributária para reduzir a carga tributária, para reduzir a arrecadação, a receita. Logo, o que nós podemos recear é que, através do fenômenos da repercussão, será repassado para os preços o aumento do custo da tributação e logo haverá esse ingrediente a mais para fazer reacender, reavivar a taxa de inflação, que foi anestesiada a um custo social tão grande como esse trazido no bojo do Plano Real. Muito agradecido, Senador.
O SR. GUILHERME PALMEIRA - Muito obrigado a V. Exª. É aquilo que ressaltava no decorrer do meu discurso, o importante é estarmos atentos, acompanharmos os acontecimentos e procurarmos soluções independentes das posições políticas, partidárias ou ideológicas.
Vou tentar rapidamente concluir o meu pronunciamento, porque todos nós estamos ansiosos por ouvir o brilhantismo e a palavra sempre sábia do nosso Senador Darcy Ribeiro.
Srªs e Srs. Senadores, fosse esta minha única dúvida, poderia até considerar a hipótese de que o Executivo pretendesse, com as duas emendas, obter do Congresso uma carta de crédito, uma espécie de seguro, fundado em suas próprias incertezas quanto à eficácia dos resultados que podem ser obtidos de sua proposta de reforma tributária. Minhas indagações, porém, vão além. Leio, na Exposição de Motivos que acompanha a proposta de prorrogação do Fundo Social de Emergência, a afirmação peremptória de que a adoção desse instrumento "não ocasionou qualquer prejuízo para os Estados e Municípios, vez que não incidiu sobre os recursos que compõem o FPE, o FPM, os Fundos Constitucionais do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste e a Cota-parte dos Estados exportadores na arrecadação do IPI, como explicitamente previsto no § 4º do art. 72 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias". Ao contrário, ali se afirma categoricamente que "as medidas adotadas juntamente com a edição do FSE permitiram elevação substancial da arrecadação das receitas federais, o que se refletiu em crescimento real de 35% nos Fundos de Participação dos Estados e Municípios no período de janeiro a julho de 1995, comparado com igual período do ano anterior".
Em contraposição, leio também nos votos em separado dos nobres Deputados Nilson Gibson e Jarbas Lima, prolatados na Comissão de Constituição, Justiça e Redação da Câmara, que as perdas efetivas dos Estados e Municípios atingem, apenas no primeiro semestre de 1995, a razoável importância de R$801 milhões e 200 mil.
É possível até, Sr. Presidente, que se trate das conhecidas "falácias estatísticas", decorrentes da aplicação de critérios idênticos para importâncias e períodos comparativos diferentes, ou, se quisermos, de critérios diferenciados para períodos iguais ou diversos. Como as ressalvas desses dois votos em separado referem-se ao mérito da proposta e o parecer do relator cinge-se à admissibilidade da proposição, não há, na manifestação deste último, qualquer esclarecimento quanto à notória divergência entre o que afirma a Exposição de Motivos e o que dizem os dois eminentes Deputados. Tenha-se em conta ainda que a ressalva do § 4º da Emenda Constitucional de Revisão nº 01/94, que criou o Fundo Social de Emergência, efetivamente estipula que a parcela de 20% do produto da arrecadação de todos os impostos e contribuições da União, a que alude o § 3º da mesma emenda, não se aplica aos recursos previstos no art. 159 da Constituição, ou seja, aos percentuais do Imposto de Renda e IPI que constituem o FPE, o FPM ao Fundo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Mas não podemos esquecer que o próprio art. 71 do
Ato da Disposições Constitucionais Transitórias que criou o FSE prescreve que seus recursos serão aplicados especificamente no custeio "das ações dos sistemas de saúde e de educação, benefícios previdenciários e auxílios assistenciais de prestação continuada, inclusive liqüidação de passivo previdenciário e outros programas de relevante interesse econômico e social". Como é notório, porém, o Fundo tem servido a todo e qualquer custeio do Governo e não exclusivamente aos fins previstos na Constituição.
Uma vez que não se modifica a sua destinação, na proposta que o prorroga, é de se supor que esse desvio de finalidade continuará a ser praticado, no caso de sua aprovação. Se não se cumpre o art. 71, é uma suposição lícita que também possa não ser cumprido o § 4º do art. 72.
Acredito, Sr. Presidente, que todas essas seriam razões suficientes para que dedicássemos às duas propostas de emenda constitucional, a da reforma tributária e a da prorrogação do FSE, nossa melhor atenção, nosso criterioso exame e nosso acurado julgamento. Nos termos em que se encontram, não são passíveis de aprovação. Lamentavelmente, nem o Regimento da Câmara, nem o do Senado permitem a apreciação conjunta das duas iniciativas, o que seria lógico e mais consentâneo com o interesse nacional.
A meu juízo, porém, embora me pareçam suficientes as razões que venho de expor, há outros ponderáveis motivos que exigem a reflexão do Senado, como foro adequado e como instituição responsável pelo equilíbrio federativo. Tanto na proposta de reforma tributária como na de prorrogação do Fundo Social de Emergência, vejo ameaças concretas à viabilidade financeira das administrações estaduais. Pode-se até alegar que o equilíbrio das contas dos Tesouros dos Estados e de seus Governos seja matéria de sua privativa competência. Não podemos nos esquecer, porém, que as duas emendas alteram a equação tributária da Constituição, o que é, inquestionavelmente, um problema político de toda a Nação. Nos níveis em que se encontram, o aumento vegetativo dos encargos financeiros tornam as dívidas estaduais inadministráveis. É uma questão que não afeta apenas os Estados economicamente mais frágeis e vulneráveis, mas atinge, com igual intensidade, até mesmo os mais fortes, como não se cansa de proclamar, por exemplo, o Governador Mário Covas. A alteração da estrutura tributária de todo o País não pode, por conseqüência, deixar de levar em conta, já não digo a adesão, mas pelo menos a aceitação e a ratificação dos Governos Estaduais e Municipais.
Suponho que isto é o que vêm de fazer os Governadores que na última semana se reuniram, em fórum nacional, com o Presidente da República. A nota que todos subscreveram não deixa dúvidas de que S. Exªs, independentemente de suas posições e de sua postura partidária, estão solidários com a necessidade de se aprovar no Congresso as emendas constitucionais ora em tramitação. Mas também são incontestáveis as preocupações manifestadas por todos - todos, repito - em relação às dúvidas por mim levantadas quanto a duas questões vitais. A primeira se relaciona com as perdas decorrentes do Fundo Social de Emergência - que, é claro, o Governo nega -, que deverá merecer um levantamento e, presumo, um laudo do Tribunal de Contas da União. Isso demonstra que há dúvidas, portanto, e dúvidas ponderáveis, sobre a efetividade das perdas financeiras dos Estados e Municípios.
SR. PRESIDENTE (Levy Dias) - A Mesa deseja informar a V. Exª, Senador Guilherme Palmeira, que o seu tempo já foi ultrapassado em 5 minutos.
O SR. GUILHERME PALMEIRA - Não precisarei mais que 2 minutos, Sr. Presidente.
A segunda diz respeito às compensações financeiras prometidas aos Estados, em decorrência da isenção tributária para os produtos de exportação e da cesta básica. Segundo se divulgou após a reunião, as estimativas com o aumento do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas deverá proporcionar uma arrecadação adicional de cerca de R$3 bilhões, suficientes, segundo os cálculos da área financeira, para compensar as perdas estaduais, estimadas em torno de R$2,5 bilhões, na hipótese mais pessimista.
Todos nós sabemos que se trata de um falso argumento. Os Estados e os Municípios participam, através do FPE e do FPM, da arrecadação desse tributo. Logo, parte do aumento verificado já lhes pertence, constitucionalmente. Não será, jamais, uma compensação pelo ICMS que deixará de ser arrecadado. Sem dúvida, há um argumento lógico e um fundamento técnico incontestável, na necessidade de se desonerar as exportações, pelo princípio universal de que os impostos não podem nem devem ser exportados. Mas há também uma razão de conveniência política que exige que os Estados exportadores sejam compensados por essa perda, não com o tributo que parcialmente já lhes pertence. Se prevalecer essa alternativa, haverá uma perda irremediável e não substituída da receita estadual.
A conclusão inevitável é que o saneamento financeiro das contas da União está sendo feito à custa do equilíbrio financeiro dos Estados e Municípios.
A proposta de reforma tributária, mesmo tímida e incipiente como sabidamente é, gera incertezas e provoca ameaças que são ainda mais agravadas quando se considera a vigência simultânea da prorrogação pura e simples do FSE até 1999. Entendo que seria uma atitude prudente e recomendável que o Senado, manifestando sua preocupação com as repercussões em toda a Federação, ouvisse em foro próprio a opinião, as sugestões e as propostas alternativas que sobre ambos os assuntos possam ter os Governadores. Estaríamos não apenas nos habilitando a exercer o nosso papel revisor em ambas as matérias, na hipótese de sua aprovação pela Câmara, mas também exercitando nossa prerrogativa constitucional de apreciarmos as alterações do texto constitucional. Faculdade, por sinal, que o Presidente Fernando Henrique Cardoso tem reiteradamente lembrado, quando afirma receber como colaboração indispensável as mudanças que o Congresso, em sua soberania, entende necessário introduzir nas propostas de reforma institucional do Executivo.
Sou o primeiro a reconhecer que não podemos interromper, frustrar ou adiar indefinidamente transformações que são indispensáveis para a inserção do Brasil no contexto da economia mundial e para a reforma do Estado. Elas têm o respaldo da sociedade brasileira e a solidariedade do Congresso. Pesquisa divulgada no dia 16 de setembro, com o resultado de levantamento realizado em 8 países latino-americanos, que representam 76% da população do Continente, mostra que os brasileiros são os que mais acreditam na possibilidade de melhorar suas condições de vida em decorrência das reformas. Nada menos de 64% acreditam nessa possibilidade, seguida pelos chilenos com 58% dos entrevistados, enquanto no México, em decorrência da crise de dezembro, essa proporção é de apenas 35%. A opinião pública do país empresta igual importância tanto ao combate à inflação, quanto às medidas de combate ao desemprego, manifestações que mereceram a preocupação, respectivamente, de 48% e 49% dos que foram consultados.
Mas também reconheço que não podemos, em nome do interesse legítimo da União, afetar o interesse não menos legítimo de toda a Federação. Isso não significa que os Estados devam simplesmente transferir seus problemas, suas dívidas e seus déficits para o Tesouro Nacional. Significa, no meu entendimento, que é preciso, como no caso das reformas já aprovadas pelo Congresso, realizarmos um pacto de Estado que represente uma solução simultânea, razoável e racional, para o equilíbrio das contas públicas tanto da União quanto dos Estados. Já dispomos das propostas do Governo Federal. Precisamos, agora, conhecer a dos Governos Estaduais, que nessa matéria têm muito a dizer e muito a propor.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vou concluir obedecendo à determinação do Sr. Presidente da Mesa em pouquíssimas palavras.
Não advogo uma volta à famosa "política dos Governadores", do Presidente Campos Sales, sintetizada na histórica epígrafe "o que querem os Estados, quer a União". Mas também não defendo que a União sobreponha os seus interesses aos interesses de todos os Estados. Harmonizá-los, preservá-los como legítimos que são e viabilizar sua harmônica convivência não é apenas nosso dever constitucional, mas nossa razão de ser institucional.
Esta, Srªs e Srs. Senadores, não é uma questão partidária, não é um princípio doutrinário, nem um problema ideológico. É um desafio nacional que, juntos - Legislativo e Executivo, União e Estados -, teremos que resolver se não quisermos produzir uma grave, insólita e inédita fratura na harmonia entre os Poderes e na indispensável cooperação que faz do princípio federativo uma conquista histórica de toda a Nação.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Muito obrigado.