Discurso no Senado Federal

REFLEXÕES SOBRE A MEDIDA PROVISORIA 1.110/95, PELA QUAL O GOVERNO BUSCA RECEBER, DE UMA UNICA VEZ, DIVIDAS DA INICIATIVA PRIVADA.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • REFLEXÕES SOBRE A MEDIDA PROVISORIA 1.110/95, PELA QUAL O GOVERNO BUSCA RECEBER, DE UMA UNICA VEZ, DIVIDAS DA INICIATIVA PRIVADA.
Aparteantes
Casildo Maldaner.
Publicação
Publicação no DCN2 de 26/09/1995 - Página 16594
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO FEDERAL, MANUTENÇÃO, EXCESSO, TAXAS, JUROS, PREJUIZO, EMPRESARIO, PEQUENA EMPRESA, MICROEMPRESA.
  • CRITICA, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), GOVERNO, IMPEDIMENTO, PARCELAMENTO, DIVIDA, NATUREZA TRIBUTARIA, EMPRESA PRIVADA, REGULARIZAÇÃO, SITUAÇÃO, RELAÇÃO, FISCO, POSSIBILIDADE, FECHAMENTO, EMPRESA, AUMENTO, DESEMPREGO, AGRAVAÇÃO, RECESSÃO, ECONOMIA.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no momento em que economistas, empresários e demais segmentos sociais discutem se o Brasil encontra-se ou não em recessão, alguns indicadores econômicos e sociais combinados com as duras medidas fiscais adotadas pelo Governo, por meio da Medida Provisória nº 1.110, de 30 de agosto passado, conduzem a reflexões que gostaria de partilhar com os companheiros desta Casa.

Antes mesmo de iniciar essas reflexões, quero dizer aos Srs. Senadores, meu Pares, que me vejo como homem de um Partido que luta pela defesa do Governo, no entanto isso não pode e não deve embotar meu raciocínio e minha consciência. Principalmente, não devo deixar de colocar sempre as dúvidas que me assolem, para que nesta Casa o debate permita a clarificação de alguns pontos.

Em sua coluna de hoje na Folha de S.Paulo, o jornalista econômico Luis Nassif alerta para o que ele pensa que são alguns equívocos da política monetária. Por exemplo:

- reservas cambiais de mais de US$50 bilhões, fazendo explodir a dívida interna e impondo custos desmesurados ao Tesouro Nacional;

- taxas de desemprego em níveis crescentes; e

- aperto do torniquete em cima da economia, com o Banco Central aumentando as taxas de juros reais - as mesmas taxas que, há poucos minutos o Senador Francelino Pereira alertava que estão multiplicando, colocando em progressão geométrica a dívida dos estados, dos municípios e da própria Federação.

1. A política monetária que deveria funcionar como um complemento da política fiscal simplesmente não existe. Funciona por espasmo e sempre asfixia o empresariado, principalmente os microempresários, os micros, os pequenos e os médios que buscam o capital de giro no mercado a juros hoje escorchantes. Procuram esse capital para honrar débitos contraídos, não o conseguem por causa desse aumento das taxas de juros e, conseqüentemente, buscam soluções que reduzem ao mínimo os quadros de pessoal, gerando mais desemprego, e adiam ou rolam, como podem, as obrigações fiscais.

2. Agora, o Governo resolveu, sem uma reforma tributária consistente, arrecadar R$60 bilhões em impostos atrasados. Para tanto, o editou a Medida Provisória nº 1.110, de 30 de agosto de 1995. Segundo este instrumento, a Fazenda Nacional institui as seguintes modificações no já extremamente complicado portfólio do empresariado brasileiro:

2.1. Não serão mais concedidos parcelamentos nos débitos relativos a:

- IPI faturado e recebido de terceiros e não recolhidos ao Tesouro Nacional;

- IR retido na fonte ou descontado de terceiros e não recolhidos ao Tesouro Nacional;

- IOF retido e não transferido ao Tesouro Nacional;

- IR decorrente da realização de lucro inflacionário ou devido mensalmente;

- outros valores arrecadados e não recolhidos ao Tesouro Nacional.

É óbvio que, em uma situação de normalidade, teria que estar sendo recolhido imediatamente, mas não estamos atravessando uma situação normal. Isso significa que as empresas que têm débitos referentes a esses tributos terão de pagá-los de uma só vez para regularizar sua situação perante o Fisco. Quem não o fizer dentro do prazo de 40 dias terá o nome inscrito no Cadastro Informativo de Créditos Não-Quitados do Setor Público Federal - CADIN, e não poderá receber incentivos fiscais e financeiros do Governo. Ou seja, o processo de asfixia atual conduzirá fatalmente à morte por insuficiência respiratória.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de maneira nenhuma defendo a atitude do empresariado quando faz isso, mas muitas vezes essa é a única solução encontrada para continuar sobrevivendo com a empresa. E sobreviver com a empresa significa manter os empregos, pagar impostos.

Se resolvermos ter duas dúzias de ovos de uma galinha que está pondo diariamente, certamente não teremos os ovos e a galinha morrerá. É exatamente assim que entendo essa medida provisória. Se esses empresários já estão atravessando dificuldades sérias e o Governo obriga o pagamento imediato de todos os impostos atrasados sem parcelamento, além da inscrição para que não mais consiga crédito, vamos ter um quadro de fechamento de empresas e de desemprego muito mais negro do que o que estamos vivendo hoje.

3. Para os pequenos e médios empresários, a solução passa evidentemente pelas modificações da política monetária com o alívio de taxas de juros e, principalmente, novas e melhores regras de crédito.

4. Para os empresários de maior porte, credores do Governo, cuja inadimplência, além de pública e notória, é histórica, a solução mais recomendável contempla, a meu ver, o mecanismo do Encontro de Contas, tantas vezes sugerido por especialistas sérios dentro e fora do Governo, e jamais realmente implementado. Os benefícios são óbvios para os dois lados da inadimplência: o Governo se livraria dos encargos decorrentes do não-cumprimento de suas obrigações sem realizar desembolso. Esse seria um passo importante para o saneamento das finanças públicas e um marco referencial para as novas relações que se pretende entre os setores público e privado.

O Sr. Casildo Maldaner - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Ney Suassuna?

O SR. NEY SUASSUNA - Pois não, nobre Senador Casildo Maldaner.

O Sr. Casildo Maldaner - Acompanho atentamente o pronunciamento de V. Exª e a preocupação que externa, na tarde de hoje, pela situação em que se encontram pequenos e médios empresários, inclusive os de maior produção. É necessário haver um plano de estabilidade? É. Atinge o setor produtivo, os Estados, os Municípios e o País como um todo? Atinge. Agora, há que se avaliar que, dentro da preocupação de V. Exª, quando é muito forte o choque, não há quem resista. Portanto, o recolhimento deve ser paulatino. Até o exemplo que V. Exª cita, da galinha e das duas dúzias de ovos, tem que ser paulatino. Num dia só, seria forçar e se tornaria inviável. Entendo que, pelo sistema que se adotou, é forte demais. O choque tem que ser de acordo com a resistência. Em Santa Catarina, por exemplo, a voltagem de energia elétrica é de 220 volts; se aplicarmos mais do que isso, não há como resistir. Acima disso, acaba-se sucumbindo. Com o setor produtivo é o mesmo caso. Os que contribuem são da mesma forma. É necessário saber aferir essa possibilidade de resistência, porque, do contrário, não se consegue nem os ovos e nem os tributos das empresas. Por isso tem que ser dentro de uma resistência passível e possível de se admitir. Daí, então, a procedência da preocupação de V. Exª em relação aos contribuintes deste País. Não há como se exterminar a fonte, pois, se o fizermos, não teremos nada. Cumprimento, portanto, V. Exª na tarde de hoje.

O SR. NEY SUASSUNA - Muito obrigado, Senador Casildo Maldaner. A minha preocupação é exatamente a de um homem que defende o Governo e que tem, neste momento, a dúvida se esse é o remédio correto. O Governo quer arrecadar e nós entendemos. São R$60 bilhões que precisam vir para casa, mas é melhor que venham aos poucos, dentro da medida do possível, do que de uma vez, custando uma hecatombe à nossa economia.

Quando falo do Encontro de Contas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, refiro-me às inúmeras empresas que estão devendo. Sei de uma, por exemplo, que o Governo deve a ela R$400 milhões e ela deve ao Governo R$600 milhões. Por que não zerar as cifras, sendo que essa empresa ficaria em condições de continuar sua vida e o parcelamento seria de R$200 milhões, a crédito do Governo, simplificando a contabilidade e tudo o mais?

O mesmo se passa entre os Municípios e os Estados e entre os Estados e Municípios. Por isso, estamos aqui, desta tribuna, defendendo o Encontro de Contas, que seria salutar para toda a economia, seja ela entre entes públicos, ou entre entes públicos e privados. Simplificaria sobremaneira a nossa economia, permitindo que o Governo continuasse arrecadando sem levar ao extermínio, à exaustão, ao desemprego, sem levar, com toda certeza, a uma crise econômica de maior monta.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. Fazendo soar a campainha) - Consulto o Plenário sobre a prorrogação do Expediente, por 8 minutos, para que o orador conclua a sua oração. (Pausa)

Não havendo objeção do Plenário, está prorrogado o Expediente.

O SR. NEY SUASSUNA - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os empresários poderiam quitar suas obrigações sem o recurso temerário dos empréstimos bancários, que hoje são inteiramente insuportáveis, via essa, aliás, bastante comprimida após a edição da referida medida provisória, que veda o acesso ao crédito de bancos oficiais àqueles que já não tiverem com a sua situação regularizada.

5. Finalizando, gostaria de reiterar que essa idéia do Encontro de Contas não é nova. Essa idéia foi defendida no século passado pelo Visconde de Mauá, numa tentativa de entendimento com o seu maior devedor, o Império, com o qual mantinha atualíssimas relações simultâneas de devedor e credor.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, essa a preocupação que trago nesta tarde, quando, desta tribuna, peço ao Governo que preste muita atenção à Medida Provisória nº 1.110, que busca receber de uma só vez R$60 bilhões de dívidas da iniciativa privada, não permitindo mais o parcelamento. Com toda certeza, isso pode fazer com que, nesta Nação, haja uma grande onda de fechamentos e falências.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 26/09/1995 - Página 16594