Discurso durante a 155ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

QUESTÃO FUNDIARIA E INVASÃO DE TERRAS NO PAIS. NECESSIDADE DE UMA POLITICA DE PROTEÇÃO AS TESTEMUNHAS.

Autor
Romeu Tuma (S/PARTIDO - Sem Partido/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • QUESTÃO FUNDIARIA E INVASÃO DE TERRAS NO PAIS. NECESSIDADE DE UMA POLITICA DE PROTEÇÃO AS TESTEMUNHAS.
Aparteantes
Ademir Andrade, Bernardo Cabral, Ernandes Amorim, Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DCN2 de 26/09/1995 - Página 16693
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, APREENSÃO, ORADOR, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, VIOLENCIA, INVASÃO, TERRAS, PAIS, REFERENCIA, MOVIMENTAÇÃO, TRABALHADOR, SEM-TERRA, FUGA, CONTROLE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).
  • DEFESA, POSIÇÃO, LEGISLATIVO, EMPENHO, OBTENÇÃO, GOVERNO, AGILIZAÇÃO, PROPOSTA, REFORMA AGRARIA.
  • COMENTARIO, PROGRAMA, TELEVISÃO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DENUNCIA, DIFICULDADE, SITUAÇÃO, TESTEMUNHA, HOMICIDIO, AUSENCIA, PROTEÇÃO.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), INEFICACIA, PUNIÇÃO, CRIMINOSO, AUSENCIA, PROTEÇÃO, TESTEMUNHA, HOMICIDIO.

O SR. ROMEU TUMA ( -SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que me traz a esta tribuna é uma grande preocupação com os problemas que vêm surgindo na esfera do Ministério da Justiça.

Prendi-me à leitura dos dois grandes jornais de São Paulo, de sábado e do domingo, Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo. Poderão verificar V. Exªs a grande angústia que deve estar tomando conta da população. A Folha publicou: "Os sem-terra fogem ao controle do PT". O Estado diz que "o Ministro da Justiça vê com preocupação a reação da Confederação Nacional da Agricultura, que propõe que os grandes empresários do setor agroindustrial se armem para defender suas terras." Como se isto fosse um problema do PT. Não tenho nenhuma mandato para defendê-lo porque possui grandes representantes nesta Casa, mas é muito simplista, Sr. Presidente, dizer que o movimento foge ao controle do PT. Outra matéria se refere ao movimento mais violento do PC do B, como se isso fosse um problema partidário.

Acredito eu que os partidos podem apoiar qualquer movimento de massa que reivindique uma situação melhor para seus participantes. Outras notícias nos davam conta da presença do Sendero Luminoso entre aqueles que tiveram sérios problemas na Cidade de Corumbiara.

A imprensa me procurou para discutir esse assunto. Reservo-me a não entrar no mérito porque o Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional já está preocupado com o assunto e deverá, nas próximas discussões, trazer alguma idéia de como nos situarmos sobre esse problema, através do que a imprensa informa de relatórios que estão na mão do Governo.

Acredito que é inviável a presença de representantes do Sendero Luminoso no Movimento dos Sem-terra. Pode haver uma infiltração forte, tendo em vista que os casos na região Norte têm a possibilidade da presença do Sendero Luminoso ou de membros de movimentos radicais que querem conquistar o Governo pela força nessa região. Em operações para a erradicação do epadu ou da coca brasileira na região Norte, detectava-se a possibilidade da presença de membros do Sendero Luminoso, que vinham ao território brasileiro comprar víveres para sua sobrevivência nas selvas. Então, aguardo que essa questão seja esclarecida.

Vimos o Senador Ernandes Amorim, na última reunião da Comissão de Infra-Estrutura, alertar que há cerca de 600 mil garimpeiros - se eu errar, corrijam-me, Senadores Ernandes Amorim e Romero Jucá, que também discutiu isso -, nestas regiões, sem oportunidade de trabalho, que se poderão incorporar a esses movimentos dos sem-terra, porque o objetivo é o mesmo: tentar buscar uma estabilidade social e econômica para poderem sobreviver.

O Sr. Romero Jucá - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ROMEU TUMA - Concedo a palavra a V. Exª, Senador Romero Jucá.

O Sr. Romero Jucá - Senador Romeu Tuma, V. Exª trata de uma questão gravíssima da realidade do País hoje, preocupação que também quero externar, até porque comungo da leitura dos jornais de fim de semana, como V. Exª fez, o que demonstra a gravidade que essa questão está tomando. Trouxe também, como V. Exª, alguns recortes de jornais de todo o País, e há manchetes que preocupam. Do Jornal do Brasil: "Sem-terra vai garantir invasão à bala"; "Proprietários já contratam segurança", de a Folha de S. Paulo; "Entidades reagem à avalanche dos sem-terra; "Movimento é criminoso, diz pecuarista"; "Reforma Agrária de Fernando Henrique Cardoso pode demorar 250 anos"; "Sem-terra fogem a controle de entidade ligada ao PT e radicalizam as invasões". Isso demonstra, Senador Romeu Tuma, que a preocupação de V. Exª e de todos os membros deste Senado tem que se voltar para uma ação efetiva do Governo Federal, que precisa agilizar a proposta de reforma agrária. Temos que procurar mecanismos que tragam a paz ao campo, quer no tocante a 600 mil garimpeiros que estão vagando hoje, principalmente pela Amazônia Legal, quer no que se refere à situação dos sem-terra ou ao envolvimento ou não do Sendero Luminoso. Isso, na verdade, é um detalhe operacional. Se o campo não estivesse fértil para a questão da gravidade social, qualquer tipo de pregação mais radicalizada não teria ressonância. Portanto, junto-me às palavras de V. Exª no sentido de dizer ao Governo Federal, de dizer ao Ministério da Justiça, Ministério da Agricultura, ao INCRA, enfim, a todos os mecanismos responsáveis pelo trato dessa questão da agricultura e da reforma agrária no Brasil, que é fundamental que o Governo saia do discurso e entre numa prática urgente. Estamos caminhando para um conflito de altas proporções no campo. Estão aí os jornais, os meios de comunicação, a Rede Globo e as televisões mostrando invasões do Pontal do Paranapanema. Está aí a questão de Corumbiara, onde já morreram mais de seis pessoas, estão aí vários conflitos no Pará, sobre o que o Senador Ademir Andrade teve condições de falar na sexta-feira passada. Enfim, temos um quadro que está se agravando dia a dia e não estamos vendo uma resposta rápida e emergente no mesmo nível da demanda social que está se tratando. Parabenizo-o pelas suas considerações e digo que comungo dessas preocupações. Espero que todos nós, do Congresso Nacional e, em especial, do Senado, tomemos providências para que o Governo e a sociedade possam dar uma resposta rápida a essa crise no campo.

O SR. ROMEU TUMA - Agradeço ao Senador Romero Jucá. Quero trazer para o meu discurso o pronunciamento de V. Exª, que esclarece um pouco mais a situação.

O Sr. Ademir Andrade - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. ROMEU TUMA - Ouço V. Exª, Senador Ademir Andrade.

O Sr. Ademir Andrade - Vou ser bem breve, Senador. Recebi, há poucos dias, um relatório do Banco Mundial, que me foi enviado por algumas entidades sindicais e entidades de consultoria aqui de Brasília. É inacreditável, inclusive estou preparando um pronunciamento especificamente sobre isso. Saiba V. Exª que, pelo relatório do Banco Mundial, o Brasil é o primeiro país do mundo, deste planeta Terra, em nível de desigualdade social. É o único país do mundo que atinge esse índice - isso fiz questão de gravar, mas vou detalhar isso aqui - em que 10% da população, privilegiada, evidentemente, detém 50,47% da renda bruta nacional. Veja bem onde chegamos: um país tão rico, tão poderoso, tão farto, tão privilegiado, ser o primeiro país do mundo em nível de desigualdade social. E é evidente que a questão dos sem-terra é conseqüência dessa diferença de vida entre as pessoas. Então, o Governo não tem que ficar conversando, tem que agir, porque essa estatística é extremamente danosa a nossa Nação.

O SR. ROMEU TUMA - Acolho o discurso de V. Exª. Acredito que realmente o Governo tem que mapear as desigualdades sociais no nosso País. E aguardaremos com ansiedade o discurso que V. Exª fará nos próximos dias.

O Sr. Ernandes Amorim - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ROMEU TUMA -  Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Ernandes Amorim - Senador Romeu Tuma, fico satisfeito quando vejo que, de São Paulo a Roraima ou Rondônia, há um Brasil que já se preocupa com essa questão da terra, o problema dos sem-terra, enfim, os problemas sociais do nosso País. Aconteceu aquele conflito em Corumbiara, no meu Estado, em que houve mortes e tantas coisas e, até agora, ninguém tomou providências, nem o Governo Federal nem o Governo Estadual ou mesmo o próprio INCRA. Tudo continua como se nada tivesse acontecido. E, ainda hoje, li em um jornal declaração do Ministro da Agricultura dizendo da sua incapacidade em administrar essa questão da reforma agrária, das desapropriações e da ineficiência do INCRA. Até parece que o Ministro realmente não está mandando no INCRA ou praticamente não entende nada do assunto. Talvez entenda mais de banco. Nas palavras de S. Exª, houve um momento em que citou países que tanto reclamam e tanto exigem do Brasil - essas tais ONGS que estão ao lado do INCRA para atender interesses internacionais - que, ao invés de ajudar até a abrir mercado para compra da safra, para ajudar o povo e a agricultura, estão fomentando uma política internacional que não tem nada a ver com os brasileiros. Este momento é muito difícil. V. Exª falou nos 600 mil garimpeiros. Na verdade, são de 400 a 600 mil garimpeiros parados no Brasil, irregularmente. Amanhã, estaremos no primeiro horário fazendo um pronunciamento a respeito do problema mineral do País. Estamos retornando de uma CPI em Minas Gerais, onde detectamos várias irregularidades e vários problemas. O Brasil, portanto, precisa ser revisto; as leis melhoradas e alterados muitos artigos da Constituição atual. Espero poder contar com o apoio e a presença de V. Exª para ajudar a esclarecer este assunto. Muito obrigado.

O SR. ROMEU TUMA - Obrigado, Senador Ernandes Amorim.

Acredito que este é o papel do Senado: buscar, através do Poder Legislativo, a solução que às vezes o Executivo, por uma série de razões que não compete agora analisar, evita. E muitas vezes evita a própria discussão.

O Senador Ademir Andrade conhece, e conhece bem, as angústias por que passou, que a sociedade brasileira tomou conhecimento, os grandes problemas de terra no sul do Pará, onde assassinatos por encomenda e choques violentos se desenvolvem há mais de uma década. Pergunto a V. Exª: qual a solução apresentada em matéria legislativa e em matéria de vontade política dos governos que por aí passaram durante todo esse período? São coisas em que temos que avançar.

Entretanto, não foi só esse problema que me trouxe à tribuna.

O Sr. Bernardo Cabral - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ROMEU TUMA - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Bernardo Cabral - Senador Romeu Tuma, talvez neste País V. Exª seja o homem que mais conhece da matéria que está abordando e o faz com a densidade e a seriedade de sempre. Quando proclama que não há nenhuma matéria legislativa a tratar do assunto, V. Exª reconhece que este é um problema nitidamente social. As pessoas se esquecem de que nem sempre é a falta de escola, a falta de emprego, a falta de moradia que geram esse quadro social terrível. Quando muito, são componentes da violência. Mas suas raízes estão profundamente fincadas numa injustiça social. Posso afirmar que esta Nação lhe deve muito. Pena que alguns atos que foram tratados confidencialmente não possam vir a público. Da minha parte, posso afirmar que V. Exª foi um defensor como poucos, e sem estar no palco iluminado, mas na platéia escura a defender os garimpeiros, a defender uma situação que para muitos era fácil. V. Exª via, na dificuldade, qual o caminho a chegar. Em outra reunião de que participei, V. Exª apontava caminhos, indicava soluções. É que nem sempre aqui fora se sabe que uma pessoa do seu porte contribuiu como poucos porque não pode vir para a imprensa. De modo que quando vejo a imprensa registrar o que está a fazer agora - o problema de Sendero Luminoso, o problema de invasões das nossas fronteiras -, eu, que conheço muito bem o problema por dentro para me influenciar com ele por fora, posso dizer que V. Exª, no momento exato, vai ser convocado - apesar de não estar sendo agora por quem deveria ser e que, inclusive, sabota a atuação de V. Exª - para, mais uma vez, dar sua contribuição sempre brilhante, pela qual eu lhe parabenizo, Senador Romeu Tuma.

O SR. ROMEU TUMA - Agradeço a V. Exª o aparte, sempre carinhoso comigo, como chefe que ilustra a atividade do subordinado para, humildemente, esquecer que a orientação sempre foi dada por ele.

V. Exª sabe o carinho e o estímulo que sempre me deu quando, no Ministério da Justiça, tive a felicidade que Deus me colocasse como seu subordinado, aprendendo e aplicando os seus ensinamentos de grande jurista. Por isso aprendi que o melhor caminho para uma autoridade é o cumprimento da lei, e sei que esse sempre foi o pensamento de V. Exª.

Quero correr porque o Senador Ademir Andrade tem assunto importante para comunicar à Casa. Temos tido algumas dificuldades, inscrevi-me durante a semana passada toda para falar e não consegui. Então, gostaria de correr para dar esta chance a S. Exª também.

Entre outras coisas que me preocuparam está um programa apresentado ontem na TV Manchete e que não posso deixar de comentar nesta oportunidade. Foi uma entrevista com o único sobrevivente da chacina da Candelária. O rapaz, amedrontado, apavorado, informava, por carta posterior a uma entrevista, que deixava o País porque não tinha mais condições de sobreviver ao medo e à pressão que recebia daqueles que estão sendo acusados como autores do crime. Até o suicídio, segundo o relato da televisão, ele tentou.

Onde está o programa de proteção às testemunhas, que o Governo deve trazer à sociedade? Deixando um jovem à mercê de pressões desse tipo, como o Brasil poderá responder amanhã à sociedade internacional que, realmente, está trabalhando no sentido de punir os que praticam delitos dessa envergadura?

Ainda, ontem, o Estado de S. Paulo publicava que houve uma chacina, em que cinco rapazes foram fuzilados no ABC de São Paulo. Todos os noticiários mostraram que, na Linha Vermelha, houve um tiroteio entre os criminosos do Comando Vermelho e outros tantos comandos que se registram como crime organizado, mas que são bandos de criminosos. Houve um forte tiroteio que colocou em risco cidadãos de bem, que por lá transitavam, tendo que fugir desesperados, sem saberem que caminho tomar.

Falamos sobre o controle do Judiciário. O próprio Presidente do Supremo Tribunal Federal critica a atividade de alguns juízes. Onde o Estado está procurando encontrar meios para que os juízes possam trabalhar com afinco e com rapidez? Onde está a Justiça de pequenas causas para desafogar as pautas dos Tribunais de Justiça?

Remédios falsificados, que colocam em risco a vida de usuários, são um crime contra a saúde pública. Há uma crítica nos jornais, e eu defendo o Professor Kaline, que é um homem de bem e sempre buscou denunciar a atividade ilegal de determinados laboratórios na falsificação de medicamentos, inclusive de antibióticos. É um crime grave contra a Saúde Pública previsto no Código Penal. Não vejo providências a respeito disso, a não ser a intervenção no laboratório.

Também não vejo ações que visem a repressão de seqüestros e desaparecimentos de pessoas.

Para terminar, Senador Ademir Andrade, digo que o Ministério da Justiça realmente tem que prevenir a ocorrência desses crimes; estamos vivendo há muitos anos a reboque. Houve promessas, houve intenções, mas absolutamente nada que pudéssemos discutir aqui como matéria do Governo. Sei que o Ministro da Justiça, o grande negociador do Presidente da República na elaboração dos projetos de reforma econômica - e hoje está conversando com os Governadores para estabelecer a reforma tributária - não tem tempo, provavelmente, para inteirar-se desses assuntos que transformam a população brasileira em prisioneiros do medo. O cidadão de bem não tem coragem de circular; às vezes vai à Igreja, amedrontado, para pedir a Deus proteção.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 26/09/1995 - Página 16693