Discurso no Senado Federal

RELAÇÃO ENTRE OS TEMAS DISCUTIDOS DURANTE A PRESENTE SESSÃO.

Autor
Geraldo Melo (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RN)
Nome completo: Geraldo José da Câmara Ferreira de Melo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • RELAÇÃO ENTRE OS TEMAS DISCUTIDOS DURANTE A PRESENTE SESSÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 07/10/1995 - Página 637
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, EXISTENCIA, LIGAÇÃO, CONTEUDO, PRONUNCIAMENTO, SENADOR, RELAÇÃO, ANALISE, PROBLEMAS BRASILEIROS, DEFESA, NECESSIDADE, GOVERNO, GARANTIA, EFICACIA, REFORMA TRIBUTARIA, OPORTUNIDADE, DEFINIÇÃO, FORMA, ESTADO, IDENTIFICAÇÃO, FATO GERADOR, TRIBUTOS.

O SR. GERALDO MELO (PSDB-RN. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, parece que a paz das manhãs de sexta-feira é um ambiente fecundo para podermos tratar de assuntos tão importantes quanto esses que foram levantados esta manhã, nesta sessão do Senado, da qual levarei a lembrança e o orgulho de ter podido participar.

Aparentemente houve discursos que cobriram temas distintos, mas a minha impressão é a de que esses discursos se relacionam entre si; desde a informação que nos prestou o Senador Josaphat Marinho, em torno da crise da universidade, até as discussões que chegaram a super-rodovia de informações, ao mundo novo que está surgindo, e a advertência sensata e oportuna que nos fez a Senadora Marina Silva, de que não podemos esquecer que estamos tocando a fímbria do futuro, mas num País que ainda tem multidões para quem é mais importante saber se vai chover amanhã para trazer umidade para o seu roçado do que saber qual foi a taxa de câmbio do dia.

Portanto, um País fascinante como este, um País desafiador como este, um País que vive agora uma oportunidade de ouro, que a História nos reservou, chegarmos ao final do século sob a liderança de um homem com a envergadura política, humana, pessoal e intelectual do Presidente do Brasil. Um homem que tem a sensibilidade, a experiência, o instrumental intelectual para perceber, compreender que sua simples presença na Presidência da República, dá a todos nós o direito de imaginar que os rumos deste País seguem diferente, e criar em cada brasileiro a expectativa de que as soluções tenham uma dimensão compatível com a responsabilidade de um homem público como Fernando Henrique Cardoso.

Nós que estamos, aqui, ajudando o País a se construir, inclusive, para esses brasileirinhos que acabam de completar a paisagem e o cenário desta manhã aqui no Senado, para que, olhando para suas faces, estejamos bem lembrados da responsabilidade que temos de preparar para eles, para o futuro, um Brasil que seja uma casa onde possam viver em paz, com alegria e confiança no dia de amanhã.

A oportunidade que a História nos reservou colocando-nos com um Presidente como Fernando Henrique Cardoso para chegarmos ao final do século é, como advertiu o Senador Levy Dias, uma oportunidade que não temos o direito de desperdiçar. Por isso eu participo das inquietações que todos revelaram aqui. Não adianta estarmos, por exemplo, dizendo que os Municípios ou os Estados são os vilões, como muito bem assinalava no começo da sessão o Senador Júlio Campos, contando o drama dos municípios de sua terra, que é o drama dos municípios da terra de todos nós. Não adianta estarmos dizendo que os governadores são uns irresponsáveis, que desfazem qualquer política de equilíbrio econômico-financeiro, qualquer política de estabilidade econômica no País.

Os governadores são herdeiros de uma estrutura administrativa cara que eles não construíram e que não foi concebida nos Estados. Foi concebida aqui em Brasília. Era daqui que saía, anos atrás. Se um governador queria fazer um programa de turismo, ele tinha que fazer sua "Embraturzinha" estadual. Se um governador queria fazer alguma coisa na área do crédito ao desenvolvimento, ele tinha que fazer o seu banco de fomento. Se um governador queria fazer alguma coisa na área de assistência técnica e extensão rural, ele tinha que fazer sua EMBRAPA, sua EMATER. E assim era em tudo o mais. Era preciso haver simetria entre a estrutura dos Estados e a estrutura do Governo Federal. E é daí que vem a grande estrutura a respeito da qual tanto se diz que é necessário enxugar os Estados. É necessário enxugar, mas é preciso saber que não foram os governos estaduais que "molharam" aquilo que se precisa enxugar agora. Na realidade, é infrutífero estarmos falando sobre essas coisas.

Há poucos dias, na Comissão de Assuntos Econômicos, o Ministro Pedro Malan - que teve, aliás, um desempenho brilhante, competente na reunião conosco - dizia que há Estados em que a folha de pagamento ultrapassa 100% da receita. Portanto, se o Governo Federal assumisse toda a dívida desses Estados, no final do mês eles estariam endividados de novo. O que é verdade.

O que S. Exª estava querendo dizer é que era necessário que os Governadores cortassem na carne. Eu, numa intervenção que fiz, disse-lhe que no Estado de São Paulo, por exemplo, que é o Estado mais importante econômica e politicamente do País, o custo do dinheiro, o custo da dívida, o serviço da dívida, os juros que paga absorvem R$ 200 milhões a mais do que a receita do Estado.

A receita do Estado de São Paulo, segundo informou à mesma Comissão do Senado o Secretário da Fazenda de São Paulo, é da ordem de R$1,6 bilhão por mês e os juros da sua dívida são da ordem de R$ 1,8 bilhão por mês.

Então, eu queria dizer ao Ministro que também existem Estados em que, se fosse demitido todo o pessoal e se se reduzisse a zero a despesa do Estado, ainda assim, não havia solução para ele, não dependia só de que o governador cortasse na carne.

E não é só nos Estados que se deve cortar. O depoimento do Senador Josaphat Marinho mostra a falência, o desastre, a vergonha que é a universidade brasileira - e a Universidade da Bahia é uma universidade federal.

E eu até que louvo e aplaudo a prudência do Governo. Em nome da necessidade de cortar na carne, não podemos destruir o futuro e acabar de matar a universidade. É preciso ser prudente com a universidade, como é preciso ser prudente nos Estados com muitas estruturas lá existentes, porque é preciso não esquecermos que governar não é sinônimo de administrar. Se a função de governo se confundisse com a função de administrar, poderíamos contratar um bom técnico, quem sabe uma boa empresa e se ela fosse muito eficiente poderia governar 12, 13 ou 15 Estados. A função política envolve outros componentes.

Há poucos dias eu dizia ao Governador do Rio Grande do Norte: "Demitir de verdade, demite-se o fraco, o pequenininho, demite-se o servidor de salário mínimo". Para poupar R$100 mil, precisa demitir mil funcionários de salário mínimo; para poupar R$1 milhão por mês, demita 10 mil funcionários de salário mínimo. Esse R$1 milhão é uma poupança, não há dúvida, mas é uma poupança muito cara, vista não na conta de custo/benefício, mas na conta da responsabilidade que tem o Governo como entidade, não apenas como entidade administrativa mas também como entidade que tem a responsabilidade de participar da condução da sociedade em relação ao seu futuro.

Diante de tudo isso, com a discussão desta manhã, penso que realmente todos se referiram mais ou menos explicitamente a um conjunto de preocupações que temos. As reformas estão vindo. E o nosso Presidente, com a envergadura que tem, precisa garantir que as reformas estejam à altura de um governo presidido por ele. É preciso que essas reformas estejam à altura dele. E aí é que começam as dúvidas: a reforma tributaria inovou em quê? A reforma tributária vai ter o meu apoio. Eu vou ajudar, humildemente, naquilo que for preciso, no que for necessário fazer para que ela seja aprovada. Mas eu tenho que reconhecer que ela precisaria ter levado em consideração propostas, por exemplo, como a do Deputado Luís Roberto Ponte.

Não consigo entender o porquê de se considerar o ICMS - aquele tributo que exige a mocinha com um lápis na mão, para preencher uma nota fiscal em carbono de dupla face - tão bom, um imposto de sonegação conhecida, e não se considerar bom um imposto como o Imposto sobre Transações Financeiras, que é um Imposto insonegável, como dissemos há pouco quando falava o Senado Levy Dias. E é um imposto que, por ser insonegável, vai alcançar todas as atividades econômicas, inclusive aquelas que não estão nas contas de ninguém, porque a economia informal pagará o seu tributo à sociedade.

Eu, na realidade, imaginava que essa seria a oportunidade de se fazer a grande reforma que este País espera. Não é nem a questão de ser tímida ou corajosa. É a questão de não ser inovadora.

Quando falamos em Internet, o que é que se estava querendo dizer? O que se estava querendo dizer não era que o Senado deveria propor que se distribuíssem brinquedos eletrônicos na sociedade. Não era que se deveria organizar o mundo, sentarem-se as pessoas e elas se esquecerem de falar umas com as outras para que sintam o cheiro de gente viva por perto e passem a sentir o cheiro de uma placa de vídeo. Não é isso que se quer. O que se quer, entretanto, é reconhecer que essas inovações existem e que essas inovações estão transformando a realidade e estão transformando de uma maneira que o Estado clássico, o Estado mobilizando apenas os velhos e antigos dedos com os quais construiu a sua trajetória até agora, o Estado corre o risco de não saber como segurar na asa dessa nova organização. O Estado talvez sobre dentro da construção nova que está sendo feita, porque, como dissemos antes, o que adianta proibirmos aqui o que possa ser feito pela Internet, por qualquer estrutura daquele tipo? Quem que vai tornar eficaz a nossa proibição?

Então, imagino que esta é a oportunidade de se redefinir a maneira como o Estado identifica o fato gerador do tributo. O tributo, historicamente, foi um instrumento para cumprir duas finalidades: pagar a conta, financiar o Estado, e para o Estado realizar determinadas políticas econômicas ou sociais, estimular a importação, desestimular a importação, estimular a exportação, desestimular a exportação, redistribuir renda através do Imposto de Renda - que é teoricamente uma concepção belíssima, mas, na prática, um instrumento sobre o salário e nada mais.

O SR. PRESIDENTE (Valmir Campelo. Fazendo soar a campainha.) - Quero lembrar a V. Exª que, como Líder, V. Exª tem a palavra por cinco minutos, e já ultrapassamos os seis minutos.

O SR. GERALDO MELO - Sr. Presidente, vou concluir. Gostaria apenas de registrar, já que a sua advertência oportuna e justa me obriga a mudar o curso do que iria dizer...

O SR. BERNARDO CABRAL - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Valmir Campelo) - Concedo a palavra ao nobre Senador Bernardo Cabral, pela ordem.

O SR. BERNARDO CABRAL (PP-AM. Pela ordem. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, gostaria de me inscrever como Líder e ceder o meu tempo ao Senador Geraldo Melo.

O SR. PRESIDENTE (Valmir Campelo) - Infelizmente, nobre Senador, o Regimento não permite.

O SR. GERALDO MELO - Agradeço ao nobre Senador Bernardo Cabral, cujo gesto, por si, vale por um discurso. Creio que o Senado já sabe as conclusões a que eu pretendia chegar. Não creio que o cumprimento do Regimento vá mutilar tão gravemente a oportunidade que eu quis aproveitar.

O SR. PRESIDENTE (Valmir Campelo) - Sem dúvida nenhuma as palavras de V. Exª serão bem-vindas.

O SR. GERALDO MELO - Para encerrar, desejo saudar a sessão que estamos terminando, a sessão desta manhã, saudar a oportunidade que se abriu. De certa forma, espero que o eco das nossas palavras todas misturadas continue pairando sobre o teto desta Casa, e que as diversas bancadas, com o conjunto da Casa, com a Casa reunida, no decorrer da próxima semana e das semanas que virão, possam fazer a grande reunião das nossas vontades, para com ela oferecer ao Brasil a verdadeira reforma que este País espera.

Espero sinceramente que a manhã de hoje tenha sido o início, o alvorecer de um novo momento no Senado Federal, na presente legislatura. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/10/1995 - Página 637