Discurso no Senado Federal

RAZÕES PARA A PRESENTAÇÃO DO PROJETO DE LEI DO SENADO 270, DE 1995, DE SUA AUTORIA JUNTAMENTE COM O SENADOR PEDRO SIMON, QUE DISPÕE SOBRE A DESTINAÇÃO DE RECURSOS ORÇAMENTARIOS PARA O CUSTEIO DAS CAMPANHAS ELEITORAIS.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES.:
  • RAZÕES PARA A PRESENTAÇÃO DO PROJETO DE LEI DO SENADO 270, DE 1995, DE SUA AUTORIA JUNTAMENTE COM O SENADOR PEDRO SIMON, QUE DISPÕE SOBRE A DESTINAÇÃO DE RECURSOS ORÇAMENTARIOS PARA O CUSTEIO DAS CAMPANHAS ELEITORAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 14/10/1995 - Página 937
Assunto
Outros > ELEIÇÕES.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DIVULGAÇÃO, PROCESSO, DOAÇÃO, FINANCIAMENTO, POLITICO, CAMPANHA ELEITORAL.
  • JUSTIFICAÇÃO, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, PEDRO SIMON, SENADOR, DISPOSIÇÃO, DESTINAÇÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, CUSTEIO, CAMPANHA ELEITORAL, AMPLIAÇÃO, ALCANCE, APERFEIÇOAMENTO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a imprensa tem publicado e comentado o episódio das doações recebidas pelos políticos na última campanha eleitoral. O tema, pelo destaque dado, parece revelar um acontecimento novo, descoberto pela Folha de S. Paulo, merecedor de manchetes e de editoriais.

O fato, no entanto, só pôde ser "revelado", em termos jornalísticos, pela transparência com que se processou. Graças à legislação vigente, cada candidato presta contas à Justiça Eleitoral, nomeando nome por nome, quantia por quantia, quantos tiveram a generosidade de ajudar as campanhas dos candidatos que mereciam a sua confiança.

Qualquer pessoa do povo, e particularmente os jornalistas, têm condições de bater às portas da Justiça Eleitoral e indagar, e anotar, os bônus eleitorais vendidos pelos candidatos. Coube à Folha de S. Paulo o mérito de ser o primeiro jornal a fazê-lo, dando ampla publicidade a detalhes que estavam abertos à curiosidade da opinião pública.

Ora, seria ingenuidade dizer-se que se pode enfrentar uma corrida eleitoral sem amplos recursos, geralmente superiores à capacidade financeira dos candidatos. Todos conhecemos, por exemplo, os altos custos exigidos para se montar um programa nos horários ditos "gratuitos". Na verdade, nada se paga às emissoras, que, por lei, são obrigadas a ceder seus estúdios e maquinário. Contudo, a produção de um único programa muitas vezes esgotaria as disponibilidades de um candidato da classe média.

Ainda agora, na listagem publicada pelo jornal paulista, constata-se que inclusive candidatos comunistas bateram às portas de empreiteiras e dirigentes de Bancos para buscar a ajuda de que necessitaram para suas campanhas eleitorais. Tudo muito natural, a meu ver, pois não há candidato capaz de suportar sozinho, sem a colaboração financeira dos que podem oferecê-la, uma campanha mesmo nitidamente popular. A "revelação" jornalística não é novidade para nenhum de nós políticos...

Ressalte-se logo de início, portanto, que nenhuma restrição temos a fazer à aludida reportagem. Ao contrário, só merece cumprimentos pelo seu esforço de compilação e comparação.

Pessoalmente, localizei equívocos nos dados apresentados pelo jornal, já que me atribuiu ter recebido o dobro - e oxalá o tivesse recebido - do montante que realmente coletei junto aos que acreditaram na minha vocação de homem público, profunda e integralmente interessado em melhores dias para o nosso País e o povo brasileiro.

O objetivo deste meu pronunciamento, porém, não é criar polêmica sobre dados corretos ou incorretos oferecidos pelo jornal paulistano, o que é de somenos importância.

Creio que se torna oportuna, sim, a discussão em torno do financiamento de eleições, um problema praticamente já solucionado em todos os países do Primeiro Mundo.

Esta tem sido a preocupação de vários dos Srs. Senadores, através de muitas proposições já formalizadas nesta Casa.

A 26 do mês passado, juntamente com o Senador Pedro Simon, apresentei o Projeto de Lei do Senado nº 270/95, que dispõe sobre a destinação de recursos orçamentários para o custeio das campanhas eleitorais.

O eminente Senador Pedro Simon e este orador que lhes fala debruçaram-se sobre o assunto e chegaram a conclusões que provavelmente serão igualmente as de V. Exªs:

1ª - o problema dos financiamentos eleitorais não pode continuar como está, mesmo após ter sido amenizado com a legislação que tentou disciplinar o assunto;

2ª - algo há de ser feito para impedir o abuso do poder econômico nas eleições;

3ª - a atual Lei Orgânica dos Partidos Políticos, na qual se abriga a instituição do Fundo Partidário, já oferece o caminho claro, aberto, para o encontro das melhores soluções através de simples projeto de lei, sem necessidade de novas reformas constitucionais.

O nosso projeto, ora em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça, buscou inspiração na legislação alemã, naturalmente adaptado à realidade brasileira.

Aceita o fato de que o Poder Público de nosso País, sozinho, não tem condições de financiar as campanhas eleitorais, e por isso o projeto admite a participação dos recursos privados até determinados limites. Dotações orçamentárias seriam reservadas para o custeio das campanhas à razão de cinco reais por eleitor alistado pela Justiça Eleitoral em 31 de dezembro do ano anterior ao da realização das eleições, cuja receita será rateada pelos partidos políticos proporcionalmente ao tamanho da bancada de cada um deles na Câmara dos Deputados.

São vários os outros detalhes que disciplinam o assunto no nosso projeto de lei, que deixo de ler e explicar para poupar os meus nobres Colegas.

Srªs e Srs. Senadores, na justificação da nossa proposição, para a qual peço a especial atenção da Comissão de Constituição e Justiça e de Vossas Excelências, dissemos que o aprimoramento da legislação eleitoral e partidária é uma exigência permanente de qualquer sociedade que procura tornar mais efetiva e representativa a participação política de seus cidadãos.

A influência do poder econômico sempre esteve presente nas discussões a respeito da real representatividade democrática dos pleitos eleitorais de qualquer país. Quanto ao Brasil, sua legislação eleitoral vem sendo modificada constantemente para incluir restrições ao uso abusivo do dinheiro nas campanhas eleitorais. No entanto, constatam-se, com freqüência, acusações contra determinados candidatos, eleitos em razão de despenderem elevadas somas de recursos financeiros em suas campanhas, infringindo, assim, a lei.

As principais democracias representativas do mundo estão procurando remover tal problema instituindo o financiamento público direto aos partidos políticos. Essa prática vem ganhando força entre os países europeus desenvolvidos, sendo que nos países nórdicos, Suécia, desde 1966, e posteriormente Finlândia, Noruega e Dinamarca, há uma certa similitude de legislação a respeito, o que permite falar em "modelo escandinavo" de subvenção estatal dos partidos, que está baseado em três pilares, a saber: a) a ajuda econômica oficial é destinada aos partidos de acordo com sua força eleitoral e sua força parlamentar; b) financiamento das atividades ordinárias, em bases anuais, sem que a ocorrência de eleições resulte na alocação de recursos públicos adicionais; c) não se exige, com exceção do caso finlandês, controle sobre o uso dessas subvenções públicas nem sobre a origem de quaisquer outras fontes de financiamento de que podem dispor os partidos. É importante ressaltar que a ausência do controle mencionado na letra "c" é uma característica desses países escandinavos, não ocorrendo nos demais países europeus que adotam o financiamento público dos partidos. 

O sistema de financiamento público dos partidos e da campanha eleitoral na Alemanha para o Bundestag compreende um sistema de restituição parcial das despesas efetuadas e de adiantamento de futuras restituições de despesas de campanha eleitoral, financiado com verbas orçamentárias. Isso significa, na prática, subsidiar regularmente os partidos políticos, prevendo, ainda, o controle e publicidade da contabilidade das campanhas dos partidos. Nesse sistema, o montante global de despesas restituíveis de campanha é calculado na base fixa de 5 marcos alemães por eleitor alistado, a ser rateado entre os partidos de acordo com seu desempenho eleitoral demonstrado pela apuração final do resultado das eleições. As doações de recursos financeiros são permitidas desde que não provenham de fundações públicas ou associações de interesse público; proíbem-se, também, as efetuadas por associações profissionais e as anônimas de valores superiores a 1.000 marcos alemães e as que forem oferecidas com evidente expectativa de vantagem econômica ou política. Toda doação superior a 20.000 marcos alemães deve ter seu valor declarado com a identificação do doador.

O processo eleitoral norte-americano, na sua parte referente ao financiamento das campanhas, é disciplinado em legislação que compreende duas vertentes: as eleições federais em geral (presidenciais e para o Congresso) e uma específica para as eleições presidenciais. São estabelecidos, tanto para as pessoas físicas como para as pessoas jurídicas, limites para doações aos candidatos, os quais deverão constituir comitês habilitados para recebê-las, e obrigatoriedade de publicidade daquelas de valores superiores a US$ 100. Existem comissões estaduais, de composição bipartidária, que controlam os balancetes entregues pelos comitês eleitorais dos candidatos. Periodicamente são remetidos à Comissão de Eleições Federais (FEC) relatórios pormenorizados sobre as contribuições recebidas. Não há limites para as despesas de campanha para o Congresso; no entanto, tratando-se de eleições presidenciais, o candidato pode optar pelo financiamento público desde que obtenha 5% dos votos válidos e renuncie a qualquer financiamento privado de sua campanha.

Na França, a Lei Orgânica nº 88-226 e a Lei Ordinária nº 88-227, ambas de 11 de março de 1988, instituíram o financiamento público das campanhas para a Presidência da República e a Assembléia Nacional, bem como das atividades partidárias de rotina, sendo bastante expressivo tal financiamento de modo a evitar que as verbas de origem privada sejam determinantes para a eleição de qualquer candidato. No caso da eleição para a Presidência da República, o candidato que obtiver pelo menos 5% (cinco por cento) dos votos válidos no primeiro turno será ressarcido em 25% (vinte e cinco por cento) do limite máximo legal de despesa, que é de 24 milhões de dólares para o primeiro turno, valor este reajustável anualmente através de decreto, de acordo com a previsão de evolução da média anual dos preços de bens e serviços de consumo familiar.

Poderíamos citar outros países que financiam seus partidos políticos e suas campanhas eleitorais, porém, julgamos suficientes os exemplos acima para demonstrar uma tendência mundial de as democracias procurarem alijar da disputa eleitoral a malsã influência do poder econômico.

A Carta de 1988 determina, ainda, em seu art. 17, §3º, que: "Os partidos políticos têm direito a recursos do fundo partidário (...)". Esse fundo está previsto na Lei nº 9.096, de 19 de setembro de 1995 (Lei Orgânica dos Partidos Políticos), com a denominação de Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (art. 38), constituído de recursos provenientes de diversas fontes, inclusive de dotação orçamentária da União (art. 38, IV), a qual deverá ser consignada ao Tribunal Superior Eleitoral (art. 40). Tais recursos devem ser aplicados em conformidade com o disposto no art. 44 da referida lei, que menciona entre outros itens, o alistamento e eleição (44, III).

Todavia, a prática das campanhas eleitorais, inobstante a preocupação da legislação recente em coibir o abuso do poder econômico, tem demonstrado que o financiamento público dessas campanhas, através do fundo partidário, não tem cumprido a finalidade de reduzir a influência do poder econômico no resultado das eleições.

Os países que têm a legislação orientada nessa direção são países economicamente prósperos e na maioria dos casos politicamente amadurecidos, tendo uma população de elevado nível educacional e cultural que, por isso mesmo, cobra dos governantes um processo eleitoral em que não possa haver dúvidas quanto a seus resultados.

O Brasil ainda não se enquadra exatamente neste perfil. Mas as freqüentes denúncias de que candidatos são eleitos infringindo as normas eleitorais, abusando de poder econômico para conseguir êxito eleitoral, torna necessária a atuação do Poder Público, financiando as campanhas eleitorais, para coibir e erradicar tais práticas eleitorais incompatíveis com uma verdadeira democracia.

As objeções mais comuns à destinação de recursos orçamentários, em montantes significativos, para que os partidos possam disputar as eleições sem se submeterem aos interesses de grandes grupos econômicos, relacionam-se com as prioridades dos gastos governamentais e com a própria natureza de tais despesas, que poderiam ser inconvenientes frente aos graves problemas sociais do País, onde substancial parcela da população é mal assistida pelo Poder Público.

Tais argumentos podem ser retorquidos tanto por seu aspecto financeiro, considerando-se que o volume de recursos orçamentários é perfeitamente suportável pela sociedade sem que haja necessidade de sacrificar qualquer programa social, quanto pelo fortalecimento da cidadania, que é condição indispensável para que os frutos do progresso econômico cheguem a todos os brasileiros.

Srªs e Srs. Senadores, procuramos nesse projeto aproveitar a legislação partidária e eleitoral existente, apenas ampliando seu alcance. Por conseguinte, o que estamos propondo, em síntese, é a ampliação e reforço do Fundo Partidário, previsto na Lei nº 9.096, de 19 de setembro de 1995 (Lei Orgânica dos Partidos Políticos), para que o Estado possa participar, de modo decisivo, no financiamento das campanhas eleitorais, inspirando-se nos modelos adotados pelas principais democracias do mundo.

Creio estar em nossas mãos, com os aprimoramentos sugeridos pela experiência dos que compõem esta Casa, a solução para o problema do custeio das campanhas eleitorais.

Esperamos que isso aconteça.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/10/1995 - Página 937