Pronunciamento de Osmar Dias em 23/10/1995
Discurso no Senado Federal
REUNIÃO ENTRE AUTORIDADES GOVERNAMENTAIS E REPRESENTANTES DAS COOPERATIVAS AGRICOLAS, COM O FIM DE VIABILIZAR SOLUÇÕES PARA AS DIVIDAS DOS AGRICULTORES. NECESSIDADE DE GESTÕES NO SENTIDO DE SE ELEVAR A PRODUTIVIDADE E A COMPETIÇÃO DO SETOR AGRICOLA, FRENTE A CONCORRENCIA INTERNACIONAL.
- Autor
- Osmar Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
- Nome completo: Osmar Fernandes Dias
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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AGRICULTURA.:
- REUNIÃO ENTRE AUTORIDADES GOVERNAMENTAIS E REPRESENTANTES DAS COOPERATIVAS AGRICOLAS, COM O FIM DE VIABILIZAR SOLUÇÕES PARA AS DIVIDAS DOS AGRICULTORES. NECESSIDADE DE GESTÕES NO SENTIDO DE SE ELEVAR A PRODUTIVIDADE E A COMPETIÇÃO DO SETOR AGRICOLA, FRENTE A CONCORRENCIA INTERNACIONAL.
- Aparteantes
- Waldeck Ornelas.
- Publicação
- Publicação no DSF de 24/10/1995 - Página 1497
- Assunto
- Outros > AGRICULTURA.
- Indexação
-
- COMENTARIO, REUNIÃO, GOVERNO FEDERAL, REPRESENTANTE, COOPERATIVA AGRICOLA, PAIS, OBJETIVO, SOLUÇÃO, DIVIDA, AGRICULTOR.
- NECESSIDADE, MODERNIZAÇÃO, PROPRIEDADE AGRICOLA, APLICAÇÃO, TECNOLOGIA, MELHORAMENTO, PRODUÇÃO AGRICOLA, AUMENTO, PRODUTIVIDADE, CONCORRENCIA, MERCADO INTERNACIONAL.
O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, volto a esta tribuna, nesta segunda-feira, primeiramente para comunicar a realização de uma importante reunião que ocorrerá ainda hoje, às 16h30min, na sala do Conselho Monetário Nacional, em que se contará com a presença do Sr. Ministro da Fazenda, do Sr. Ministro da Agricultura, do Sr. Secretário Executivo do Ministério da Fazenda, Pedro Parente e dos Presidentes do Banco do Brasil e do Banco Central. Juntamente com todas as cooperativas agrícolas do País, trataremos de um assunto da maior relevância para os Estados e, em conseqüência, para o País.
Estamos exatamente no período em que se semeia a safra de verão, e as cooperativas se encontram em situação precária de endividamento, em situação financeira difícil. E até agora, não foram tomadas medidas que possam alcançar essas organizações que são fundamentais para o desenvolvimento da agricultura.
É certo que o Governo, na semana passada, tomou uma medida de extrema importância, quando securitizou as dívidas dos agricultores, limitando os empréstimos em R$200 mil. No entanto, essa medida adotada pelo Governo não alcança, de forma absoluta, as cooperativas, que têm dívidas muito maiores e que são contratadas para financiar milhares de produtores rurais. Não podemos, portanto, tratar as cooperativas como se fossem produtores individuais. Esse é o primeiro ponto.
O segundo ponto que quero analisar é que, mesmo que tenha sido justo com aqueles que devem e que não pagaram porque não puderam, é preciso que se analise a situação também daqueles que pagaram as suas dívidas. Eles podem sentir-se agora estimulados, Sr. Presidente, num futuro próximo, no vencimento dos seus créditos para a próxima safra, a não pagar, esperando que o Governo possa estender medida equivalente àquela que adotou agora.
A meu ver, o Governo demorou demais, porque, no semestre passado, realizamos diversas reuniões das quais participaram alguns Senadores, inclusive o Líder do Governo. Apontávamos, naquela oportunidade, as soluções ou propostas que o Governo poderia adotar para resolver o problema do campo. Penso que teria saído mais barato, Sr. Presidente, porque agora a securitização vai atingir um valor de R$7,5 bilhões de dívidas, que vão ser roladas por sete anos, com juros de 3% ao ano e mais a equivalência produto. Isso significa que o Tesouro vai ter que colocar dinheiro para equalizar a diferença da dívida, corrigida normalmente nos bancos, através da securitização.
Os cálculos de alguns técnicos chegam à conclusão de que o Governo terá que desembolsar cerca de R$2,5 bilhões para cobrir essa diferença. Não fiz os cálculos; estou confiando nos cálculos dos técnicos, mas, de qualquer forma, aquela solução imediata que apontávamos na oportunidade, ou seja, no primeiro semestre, alcançaria uma cifra em torno de R$1 bilhão e 600 milhões, portanto teria resolvido o problema de forma antecipada, fazendo com que aqueles produtores se preparassem para a atual safra, não retardando a retomada de crédito por esses produtores e, além disso, teria um custo menor.
Se a decisão tomada pelo Governo é essa, nós a respeitamos, mas não podemos respeitar a proposta que está sendo feita para o Governo. Eu, como Senador integrante da Bancada do Governo, do PSDB, quero estar sempre ao lado dos produtores, mas estarei também ao lado do Governo quando perceber que a proposta que lhe for apresentada não for benéfica ao País mas apenas um privilégio a meia dúzia de pessoas.
A proposta ora apresentada, Sr. Presidente, pretende transformar dívidas ou pagar dívidas com TDAs. Fiz um levantamento no INCRA e cheguei à conclusão que as TDAs vencidas têm hoje um valor no resgate de 58% apenas em relação ao seu valor de face, e as TDAs a vencer têm um valor ainda menor, não chegam a 30% do seu valor de face. Imaginem um devedor do Banco do Brasil ou de tributos que queira pagar o Governo, e este aceita o pagamento dessas dívidas com títulos podres, como se constituem as TDAs, significando um deságio que pode chegar até a 70% quando os títulos estão a vencer.
Não posso, portanto, concordar com essa proposta que vem sendo discutida por alguns integrantes da Bancada Ruralista e que o Governo está se predispondo a anunciar, que alcançaria todos os produtores e tiraria, inclusive, o limite de R$200 mil estabelecido para a securitização. Será, sem dúvida nenhuma, no meu entendimento, um negócio até imoral com o Governo e a sociedade.
Primeiro, vou repetir o que tenho dito desde o início, quando analiso a questão das dívidas: não é justo que alguns produtores sejam obrigados a pagar as suas dívidas e para isso tenham de vender tratores, equipamentos, colheitadeiras e até parte da sua propriedade, enquanto outros esperam que tudo estoure, para que o Governo, pressionado pela reforma a ser votada pelo Cogresso, ceda em favor de poucos que continuam devendo, apesar das condições ofertadas para a negociação das dívidas.
Dizem que esta medida adotada vai atingir os pequenos produtores, o que é verdade: serão 250 mil atingidos. Agora, colocando-se 250 mil em um universo de sete milhões de produtores e tirando-se o percentual, verifica-se que a minoria está sendo alcançada pela securitização das dívidas.
Se o Governo estender essas medidas e transformar dívidas em TDAs, será um escândalo, porque atingirá pouco mais de 15 mil produtores em um universo de sete milhões.
Particularmente, não concordo com isso e vou criticar o Governo - que defendo aqui e a favor do qual voto praticamente em todas as matérias -, se aceitar essa proposta que, no meu entendimento, é imoral.
Estamos vivendo um período de dificuldades para a União, os Estados e os Municípios e enormes obstáculos para os pequenos e médios empresários do campo, da cidade e, consequentemente, para os trabalhadores. A quota de sacrifícios tem que ser de todos. Agora, simplesmente, considerar a TDA válida para pagamento de dívidas será, sem dúvida nenhuma, algo de imoral e, evidentemente, não posso apenas concordar, mas irei criticar, de forma severa, se isso acontecer, denunciarei este acordo que está sendo feito.
Também não posso concordar com o fato de que dívidas que estão sendo pagas com o Banco do Brasil possam ser feitas com a sobrevalorização dos bens que estão em garantia. Na semana passada, vi na imprensa um negócio feito com uma fazenda de propriedade da família dos Matsubara, do Paraná, que inclusive, são meus amigos. Não posso concordar com o valor dado àquelas terras, recebendo-as em garantia para o pagamento da dívida. Um cálculo grosseiro do Banco do Brasil chegou à conclusão de que cada hectare irá ficar para aquele banco num valor R$6.800, o que significa uma sobrevalorização de pelo menos três vezes em relação ao valor real daquelas terras.
Se o Banco do Brasil quer receber as suas dívidas, comece, por exemplo, recebendo as dívidas do Tesouro que alcançam a R$4,8 bilhões. Mas ninguém, nenhum diretor do Banco está autorizado a simplesmente receber dívidas supervalorizando, porque, do contrário, daqui para frente, será conveniente ser devedor e não bom pagador. Se é bom devedor, tem securitização, há a possibilidade de pagar com Títulos da Dívida Agrária, os chamados títulos podres, de negociar a sua hipoteca, a sua terra por um preço supervalorizado. Então, por que pagar a conta?
O Governo tem de tomar cuidado para não desestimular os honestos, os decentes e transformá-los, também, em inadimplentes do Banco do Brasil, o que vai agravar, de forma muito mais severa, a situação do Banco, que existe para financiar o pequeno e médio produtores de forma prioritária.
Na semana passada, apresentei propostas a este Plenário e ao Presidente da República, as quais podem dar solução definitiva ao crédito rural.
A primeira delas aumenta o volume de crédito rural disponível de R$3 bilhões para R$10 bilhões, sem mexer em um centavo do Tesouro, usando 10% dos fundos que estão aí, o chamado FIF, que poderiam ser transformados em Letra Agrícola ou CDB Verde - como estou chamando.
A Letra Agrícola poderia ser operada por intermédio das cooperativas que, juntamente com as Bolsas de Mercadorias, passariam a financiar não apenas o custeio das safras, mas também o investimento. Essas Letras Agrícolas seriam títulos com credibilidade e poderiam, inclusive, lastrear as TDAs, oferecer também mais credibilidade às TDAs e teríamos uma Reforma Agrária mais célere. Como assim?
Hoje o grande entrave da Reforma Agrária está exatamente no seguinte: o proprietário da terra resiste à idéia, em primeiro lugar, de ceder a sua terra por um valor que não seja justo; em segundo lugar, o proprietário não deseja receber em títulos com prazo de 20 anos e que não têm valor algum no mercado ou, se têm valor, têm 30% ou 58%, no caso de títulos vencidos.
Estou propondo que essas Letras Agrícolas possam lastrear as TDAs e oferecer credibilidade. E, ao se avaliar a propriedade, se ela é produtiva ou não, deve-se determinar o valor, cujo preço seria pago da seguinte forma: 50% com as Letras Agrícolas, e os outros 50% poderiam ser pagos em TDAs, não em 20 anos, mas em 10 anos como se faz com os lotes urbanos
Aqui estão vários ex-Governadores, ex-Prefeitos que sabem que quando se desapropria lotes urbanos o prazo de pagamento é de 10 anos, diferentemente do que ocorre no campo, quando o prazo é de 20 anos e o seu preço é pago com títulos podres.
Minha proposta visa diminuir a resistência dos proprietários que, mesmo com terras improdutivas, muitas vezes, vão à Justiça, como ocorreu na Fazenda dos Atalas, no Paraná. Somente agora a Justiça conseguiu determinar que essa propriedade fosse destinada aos assentados que lá estão desde 1986, apesar de ter sido demonstrado várias vezes que aquela terra era improdutiva.
Essa é uma proposta de viabilização de crédito para a Reforma Agrária.
A outra proposta visa a dar sustentação ao crédito rural e aos investimentos. Hoje não estamos carentes apenas do crédito de custeio para plantar as safras, precisamos modernizar nossas propriedades para torná-las competitivas e inserirmos a agricultura de forma competitiva no mercado internacional. E para fazermos isso precisamos investir em modernização e, sobretudo, na aplicação de novas tecnologias.
Pois bem, o que estou propondo é que 10% do FIF seja colocado no Banco do Brasil como crédito para financiar a produção agrícola no seu custeio, como crédito para financiar investimentos na produção agrícola e investimentos na agroindústria.
O dinheiro que hoje está sendo usado para a especulação, e que portanto não resulta em nenhum emprego e não resulta em fomento à produção, seria ele dirigido ao fomento da produção e da geração de empregos. Não sairia um centavo do Tesouro e o Governo teria, assim, o dinheiro que os bancos utilizam na especulação para a produção e geração de empregos.
Com 12% de juros ao ano, esse dinheiro poderia ser captado pelo Banco do Brasil, ou seja, pagos esses títulos pelo Banco na ordem de 9% ao ano, sobrando 3% para capitalização daquela instituição financeira. Pelo meus cálculos, seriam R$10 bilhões que estariam disponíveis para o Banco do Brasil operar tanto no custeio da produção quanto no investimento para modernização da propriedade.
Se 3% ficassem com o Banco, teríamos R$300 milhões ao ano no Banco do Brasil, capitalizando-o, viabilizando-o para que voltasse a praticar uma atividade que ele deixou de fazer, e que está gerando muitas irregularidades no campo. Uma delas é que há muitas pessoas, Sr. Presidente, que estão tomando dinheiro no Banco do Brasil para financiar a produção e estão praticando agiotagem com esse dinheiro. É preciso denunciar: tomam dinheiro a 16% ao ano e, em vez de plantar, emprestam a 10% ao mês; portanto, uma prática de agiota e que está sendo feita nas barbas do Governo, sem que se tome uma providência.
Pois bem, com esses R$300 milhões que o Banco do Brasil receberia na diferença da operação desse crédito, ele colocaria em prática novamente uma estrutura de fiscalização, para exigir duas coisas: primeiro, que o dinheiro do Banco do Brasil seja aplicado efetivamente para a produção, para a geração de empregos; segundo, que esse dinheiro seja aplicado na produção e também em tecnologias modernas indispensáveis para o aumento da produtividade. Não dá para brincar com a Argentina. Não dá para brincar com o Uruguai. A Argentina, porque tem um solo muito mais fértil do que o nosso, pode produzir sem fertilizantes.
Para que os Srs. Senadores tenham idéia, fiz um levantamento do custo de produção de qualquer cultura na Argentina. Por exemplo, o custo total para a produção de uma tonelada de trigo é igual ao que gastamos na soma de adubos e defensivos ou agrotóxicos para produzir a mesma tonelada de trigo. Como vamos competir, se não aumentarmos a eficiência produtiva, que tem que passar exatamente pela aplicação de tecnologias que estão disponíveis, mas que não são aplicadas, pois faltam recursos e oportunidade ao produtor?
Entregamos também ao Presidente da República um projeto, um grande programa nacional de calcário. Lembro-me de quando era Secretário de Agricultura do Paraná dos Governos Álvaro Dias e Roberto Requião. Na época, fizemos um mutirão de calcário, corrigindo praticamente todo o solo do Estado do Paraná, com subsídio, porque sabíamos que o aumento da produtividade aumentaria a arrecadação de impostos e que aquilo que o Governo estava colocando para aumentar a produtividade retornaria na forma de impostos. Isso aconteceu.
Estou propondo, não que se subsidie o calcário, mas que se coloque o calcário em crédito de investimento porque ele vai ter o seu efeito no solo por dois ou três anos. Não é justo que o produtor pague o seu financiamento no custeio da safra, que é um financiamento pago em seis meses, às vezes, em oito meses ou um ano. É preciso colocar-se o calcário na linha de investimento. Com isso, tenho certeza de que vamos aumentar a utilização de calcário.
O levantamento que fiz demonstra que 14% das necessidades desse insumo estão sendo atendidas. Por que apenas 14%? Porque todas as vezes que o produtor vai plantar, ele faz uma conta: tenho R$500 por alqueire ou por hectare, preciso comprar adubo, semente e óleo diesel; preciso preparar o solo; preciso pagar a mão-de-obra, etc. Faz o cálculo e chega à conclusão de que o dinheiro não dá. Então, ele corta alguma coisa e quase sempre é o calcário, que é exatamente o insumo que vai possibilitar a absorção do adubo. Além de estarmos evitando o aumento da produtividade, estamos induzindo o produtor a jogar dinheiro fora quando coloca o adubo na terra sem o calcário.
O Governo não pode prescindir, de forma alguma, de um programa nacional de calcário, pois esse é o insumo mais barato que temos à nossa disposição e que pode, através desse programa, ter a sua aplicação multiplicada duas ou três vezes. O que aconteceu no Paraná, em dois Governos, é que triplicamos a aplicação do calcário tanto no Governo Álvaro Dias como no Governo Roberto Requião.
Ofereci essas propostas de crédito, ofereci as propostas de aumento da produtividade, e ofereço outra proposta que vai muito além da discussão interna de nossas políticas. Pesquisei junto à FAO e ao Banco Mundial e obtive os preços das commodities agrícolas de 1965 para cá. Há trinta anos a União Européia, os Estados Unidos e o Japão aumentaram de forma significativa os subsídios da agricultura, chegando hoje a 350 bilhões de dólares.
Pois bem, desejava saber qual o impacto desses subsídios no aumento da produtividade, e o estudo me levou à seguinte conclusão: ao ano, a produtividade agrícola nesses países cresceu 1,8%. É evidente que no caso de produtividade alta, como ocorre nesses países, 1,8% ao ano é muito significativo, principalmente tendo em vista o acúmulo dessa taxa durante 30 anos. A produção agrícola cresceu 2,4% ao ano, sendo que 0,6% foi em função do aumento da área e 1,8% em função da produtividade.
A conclusão a que se chega é que os subsídios agrícolas deram oportunidade aos produtores dessas regiões de incorporarem tecnologias modernas, a ponto de sua produtividade ter crescido nos últimos 30 anos quase 50%. Nosso País, que exporta imposto e importa subsídio, não tem condições de competir. É preciso mudar a regra. Parece-me que a reforma tributária proposta pelo Governo toca no ponto da redução dos impostos nas exportações.
É necessário também que o Governo brasileiro negocie de forma mais agressiva a redução gradativa do protecionismo e dos subsídios das outras regiões do mundo, porque eles são responsáveis pela diminuição do preço das commodities agrícolas - e esse é um dado oficial do Banco Mundial - de 0,5% ao ano. E se acumularmos a redução dos preços dos produtos agrícolas, chegaremos à conclusão de que o preço das commodities agrícolas caíram 20% nos últimos trinta anos. E qual o impacto que isso traz para um país em desenvolvimento, como o Brasil, que tem sua base econômica na agricultura? O impacto é assombroso.
O outro estudo mostra que se, de repente, acabassem os subsídios os preços dos grãos, para o produtor, subiriam 20% e o preço do leite subiria 50%, o que sem dúvida viabilizaria nossa agricultura. Mas, se de repente acabassem os subsídios os países em desenvolvimento passariam a ter um mercado maior de compra, ou seja, de importação, de cerca de R$40 bilhões. O Brasil teria uma fatia muito importante de R$15 bilhões nesse mercado de commodities, principalmente. Somente no mercado de açúcar o Brasil teria uma ampliação nas exportações de R$7 bilhões.
Portanto, quando vejo aqui Senadores da Bahia brigando pelo cacau, Senadores do sul do País brigando pelo café, chego à conclusão de que não há como fazermos uma política de viabilização para a cacauicultura, para a cafeicultura, para os grãos, para a pecuária e para o leite, se o Governo brasileiro não interferir nas rodadas de negociação, principalmente do GATT, mostrando de forma agressiva que é incompreensível, realmente inaceitável a continuação dessa política protecionista que coloca produtos em nosso país no valor de 80%, ou até menos que isso, do custo de produção sem o subsídio. Isso é incompreensível!
Com o cacau não foi diferente. O problema do cacau ao longo dos anos decorreu exatamente das políticas protecionistas. Inclusive, fizeram trocas com países concorrentes, trocas comerciais que possibilitaram o aumento da produção daqueles concorrentes. O Brasil ficou de fora. Está na hora de o nosso País começar a negociar o seu espaço. Essa negociação de espaço começa com o Presidente da República, passa pelos Senadores da República e vai até os Governadores, sem a mediocridade de ficarmos discutindo eternamente a falta de uma política agrícola. Até se tornará irrelevante o fato de o governo ter um ministro banqueiro, ou que não seja banqueiro, de chapéu, sem chapéu, ministro que entenda ou que não entenda dos problemas relativos à Pasta que dirige. Penso que devemos desprezar esse fato e simplesmente partir para o seguinte: nas negociações com o MERCOSUL ou com outros blocos econômicos, o Brasil tem de dizer o que quer em relação à política de subsídios, ao protecionismo, que hoje é o grande entrave para o desenvolvimento da nossa agricultura.
Não pensem que vamos resolver o problema da agricultura brasileira com a securitização feita ou simplesmente com a oferta de crédito. Ele não será resolvido enquanto não vencermos essa barreira de preços imposta pelo protecionismo mundial.
O Sr. Waldeck Ornelas - V. Exª concede-me um aparte?
O SR. OSMAR DIAS - Com todo o prazer, nobre Senador Waldeck Ornelas.
O SR. PRESIDENTE (Valmir Campelo) - Há cinco minutos o tempo do Senador Osmar Dias se esgotou. Por isso, peço a V. Exª, nobre Senador Waldeck Ornelas, que, por favor, seja breve no seu aparte.
O Sr. Waldeck Ornelas - Senador Osmar Dias, V. Exª tem sempre tratado das questões agrícolas com profundo conhecimento de causa e com muita responsabilidade, como agora o faz. São importantes as ponderações que apresenta a respeito de discussões que estão sendo mantidas neste momento, como também o são as propostas que apresenta. Tenho sempre buscado chamar a atenção para a grande heterogeneidade e desequilíbrio que marcam o nosso País e para a necessidade de levarmos isso em consideração. O País não comporta políticas homogêneas, uniformes. Quero chamar a atenção, em particular, para a região oeste da Bahia, que, hoje, participa com 2% da produção nacional de grãos, um número que pode parecer irrelevante, considerada a forte produção do Rio Grande do Sul e do Paraná, mas que é extremamente significativo quando se considera que se trata de uma região nordestina. Essas novas fronteiras precisam de atenção especial por parte do Governo, quando da execução das suas políticas de expansão da produção agrícola. O Brasil é um país muito feliz, que pode crescer não apenas com os ganhos de produtividade, a que se referiu V. Exª, mas também ainda mediante a incorporação de alguns fatores. A região oeste da Bahia, uma fronteira implantada sem os subsídios do crédito rural e sem o crédito subsidiado do PROTERRA, requer atenção especial. Deve haver uma orientação específica aos agentes financeiros na renegociação dessa dívida, no acordo que foi feito, até porque se trata de uma fronteira ainda não inteiramente ocupada, mas apenas embrionariamente, incipientemente, ocupada, situando-se mais amplamente no contexto do que nós chamamos de cerrado setentrional, ou seja, aquela área que abrange o oeste da Bahia, o sul do Maranhão, o sudoeste do Piauí e praticamente todo o Estado do Tocantins, que constitui uma válvula de escape muito grande, muito significativa para a grave crise social que nós enfrentamos no nordeste. Quero, ao aduzir esses comentários, cumprimentar V. Exª pelo pronunciamento que acaba de fazer.
O SR. OSMAR DIAS - Já vou concluir, Sr. Presidente.
Aceito o aparte do Senador Waldeck Ornelas como parte do meu pronunciamento, ao mesmo tempo em que afirmo que o trabalho de S. Exª na comissão que foi implantada para o desenvolvimento do Vale do São Francisco com certeza irá colaborar muito para o desenvolvimento daquela região, inclusive como exemplo para outras regiões do País.
Nós precisamos integrar-nos competitivamente. Não é aceitando títulos podres em troca de dívidas ou tributos que o Governo brasileiro irá ajudar a agricultura. Essa ajuda só será possível se tivermos uma política mais agressiva e competente.