Discurso no Senado Federal

AUMENTO DO DESEMPREGO, SITUAÇÃO CAOTICA DOS SISTEMAS DE SAUDE, EDUCAÇÃO E SEGURANÇA PUBLICA NO PAIS.

Autor
Ramez Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Ramez Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • AUMENTO DO DESEMPREGO, SITUAÇÃO CAOTICA DOS SISTEMAS DE SAUDE, EDUCAÇÃO E SEGURANÇA PUBLICA NO PAIS.
Aparteantes
Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 31/10/1995 - Página 2166
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • ANALISE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, DESEMPREGO, SAUDE, EDUCAÇÃO, VIOLENCIA, FALTA, SEGURANÇA PUBLICA, PAIS.
  • ANALISE, CRITICA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, NECESSIDADE, REFORMA AGRARIA, JUSTIÇA SOCIAL, COMBATE, VIOLENCIA.
  • NECESSIDADE, ENTENDIMENTO, EXECUTIVO, LEGISLATIVO, OBJETIVO, APLICAÇÃO, POLITICA, BENEFICIO, CIDADÃO.
  • COMENTARIO, CRIME, VIOLENCIA, SEQUESTRO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), PARTICIPAÇÃO, POLICIA, CORRUPÇÃO.

            O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, temos que fazer uma confissão, ou melhor, um desabafo daquilo que temos sentido em nosso íntimo, diante dos últimos acontecimentos verificados no País.

            Acredito que qualquer homem público, qualquer pessoa que detenha hoje uma parcela de responsabilidade, principalmente aqueles que representam a sociedade, representam o povo brasileiro, devem estar, sem dúvida alguma, cada vez mais perplexos e inconformados nos últimos dias. É o meu estado de espírito, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, diante do que tenho lido, diante do que tenho presenciado na televisão, em suma, diante dos últimos acontecimentos que assolam a pátria brasileira.

            Em verdade, o que vemos? Qual é o quadro a que se assiste no País? O quadro de desemprego? Sim, devido ao processo de automação, ao processo tecnológico e científico da sociedade, segundo uns; segundo outros, em decorrência da política do País, da política econômico-financeira, temos um desemprego como o que existe no mundo inteiro.

            Os índices de desemprego dos Estados Unidos da América do Norte são até maiores dos que existem em nosso País. Ainda outro dia li um comentário sobre isso, segundo o qual a taxa de desemprego depende da estratégia para se apurar esse índice para se saber o nível que ele está atingindo.

            De outro lado, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ainda ontem, em um programa de televisão, ouvi uma reportagem sobre os problemas na área da saúde. Num hospital do Espírito Santo, um médico declarava que "alguns terão mesmo que morrer. No atendimento vou dar preferência aos mais moços." Esse é o quadro da saúde no País, para não falar muito e ficar só nos exemplos.

            Quanto à educação, segundo a opinião dos técnicos e segundo o que sentimos - não é necessário ser nenhum emérito professor para fazer essa avaliação -, ela está indo também de mal a pior.

            Sr. Presidente, Sªs e Srs. Senadores, e a violência urbana? E o quadro de violência a que o País está assistindo estarrecido? E os acontecimentos que ocorrem na antiga capital da República? Na cidade maravilhosa do Rio de Janeiro, houve três seqüestros quase que ao mesmo tempo, na mesma semana, num verdadeiro desafio. Esse desafio mexe com as instituições, pois bandidos tomam de assalto estudantes e colocam em pânico as famílias. As instituições de crimes organizados proclamam ter melhor armamento, dizem que estão mais armadas, mais guarnecidas do que a própria autoridade policial ou do que o próprio Governo, a quem incumbe, em última análise, zelar pela paz e pela tranqüilidade das famílias e da sociedade. Grassa a violência urbana, trazendo pânico, trazendo intranqüilidade.

            Ao lado disso, vê-se também a violência no campo, com invasões de propriedades. Tudo está sem solução e não se vê nenhum ato operacional para coibir esses verdadeiros abusos, eu diria, esses crimes.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todos nós que temos espírito cristão e de solidariedade sabemos que se faz necessária a justa distribuição de riqueza no País. As desigualdades sociais só serão amenizadas no instante em que, verdadeiramente, tivermos condições de promover a reforma agrária, uma reforma agrária que seja justa, uma reforma agrária que possa ser realizada, uma reforma agrária que não abale o processo produtivo do País, uma reforma agrária que venha, realmente, a contemplar aqueles que não têm terra, aqueles que precisam trabalhar na terra.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, isso exige, ao lado de uma política agrícola bem definida - e este País não a possui - uma política agrária também bem definida, também bem-estruturada, que possa atingir seus verdadeiros objetivos.

            Ora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, se esse País não tem sequer o cadastro efetivo daqueles que sabem trabalhar na terra ou daqueles que querem, efetivamente, trabalhar na terra, como podemos vender ilusão? Como podemos falar de reforma agrária sem estarmos preparados para realizá-la?

            Há muitos e muito anos, desde os meus tempos de bancos acadêmicos, ouço falar em reforma agrária sem jamais vê-la concretizada, sem jamais vê-la sequer iniciada, porque não podemos considerar como início de reforma agrária a distribuição simples de terra que, vez por outra, alguns governos têm realizado. Isso não é reforma agrária, pois não temos sequer um cadastramento.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, governei meu Estado por 10 meses. Naquela época, houve invasão de terra, e eu não deixei que houvesse violência alguma contra os trabalhadores sem-terra, mas pude constatar que no meio deles havia os profissionais da invasão. Havia aqueles que queriam aproveitar-se, aqueles que se intitulavam homens do trabalho no amanho da terra, mas na verdade eram - quantos encontramos assim - comerciantes ou proprietários urbanos e estavam na fila, ao lado dos sem-terra, na esperança de obterem um lote. Enquanto isso, recebiam benefícios do Estado, que, por meio de convênios lhes proporcionava tratamento de saúde e até mesmo a cesta básica, que, graças a convênio com o Ministério da Agricultura, por intermédio do INCRA, o Governo concedia para alimentar aqueles que esperavam a tão sonhada e propalada reforma agrária.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, assistimos, nos centros urbanos, ao crescimento da violência que nos ameaça, que ameaça nossos filhos, que ameaça toda a sociedade. Os estudantes saem às ruas, em passeatas, exigindo mais segurança, mais justiça. Moços universitários pedem paz, tranqüilidade. Enquanto isso, no campo, há invasão de terra, sem que qualquer providência seja tomada para conter a violência tanto rural quanto urbana.

            Sr. Presidente, é preciso operacionalizar alguma coisa. Queremos um Brasil mais moderno, um Estado mais ágil. Essas reformas que o Congresso Nacional está fazendo junto com o Poder Executivo visam a melhorar a vida dos cidadãos e a eliminar as injustiças sociais que grassam em nosso País. É preciso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, operacionalizar algo de imediato, porque a situação está se tornando grave demais para ficarmos apenas esperando o processo das reformas. É preciso que o Governo, unido à sociedade, tome providências imediatas para restabelecer o clima de tranqüilidade no País. É possível essa parceria, sim, porque a sociedade, quando foi chamada a participar nunca negou o seu apoio, a sua dedicação. Digo isso porque meus olhos de cidadão antevêem um quadro triste para o Brasil, caso permaneça o caos que hoje vigora com a violência urbana e rural.

            Quantas vezes ouvimos apelos patéticos de mães, como a do jovem que ainda se encontra seqüestrado no Rio de Janeiro, pedindo que a polícia se afaste. A descrença chegou ao ponto em que se pede à polícia que guarde distância, que abandone o caso, para ver se há possibilidade de encontrar uma solução. Esse é um quadro desesperador. Isso mostra um retrato muito maior da fisionomia assustada, da fisionomia perplexa, da fisionomia atordoada da sociedade brasileira, que, sem dúvida nenhuma, exige maiores providências no sentido de solucionar os problemas desta fase difícil que está atravessando.

            O Sr. Lauro Campos - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. RAMEZ TEBET - Concedo o aparte ao Senador Lauro Campos.

            O Sr. Lauro Campos - Gostaria não só de parabenizar o ilustre Senador Ramez Tebet pelo brilhantismo com que aborda as importantes questões que constituem o âmago de sua exposição, mas também de dizer que, na primeira parte do seu discurso, foi tão grande nossa sintonia que pensei estar ouvindo um Senador da oposição. V. Exª, brilhantemente, pôs o dedo nas chagas da nossa sociedade, enfatizando, inicialmente, a questão do desemprego, mostrando o conteúdo tecnológico de parte de nosso desemprego, nós que temos um modesto percentual dos 820 milhões de desempregados que a economia moderna conseguiu produzir. Em seguida, V. Exª trata dos temas da violência e quase tangencia aquilo que foi, anteriormente, objeto da exposição e da crítica do nosso ilustre correligionário Senador José Eduardo Dutra, representante de Sergipe. Parece-me, Senador Ramez Tebet, que tanto a violência urbana quanto a violência rural constituem parte desse quadro de violência que se agudiza, quando se trata da violência policial a que se referiu o Senador que o precedeu. São formas de manifestação de uma sociedade violenta, de uma sociedade que reage diante de uma injustiça que é uma herança histórica, cultural, econômica e social de nosso tempo. Assim me parece que cada dia se torna mais óbvio o quadro de violência que mostra cabalmente não termos encontrado ainda uma organização que satisfaça a sociedade. A insatisfação que estava escondida nas bases da sociedade, que agora se enterra no submundo das drogas, do crime, de uma parte da sociedade que se auto-organiza na violência, no banditismo, repetindo, no quadro urbano, aquilo que há algumas décadas acontecia no quadro rural. Parece-me que a agressividade de que é vítima grande parte da população urbana recai sobre uma população que foi expulsa do campo por falta de reforma agrária, por falta de condições de vida, por uma distribuição desumana dos recursos que privilegiam a modernidade, os proprietários, os detentores dos novos e eficientes meios de produção, em detrimento do trabalhador, que é expulso das terras, vira bóia-fria e, depois, vai engrossar a população de nossas favelas. Parece-me que também a polícia, que devia ser apenas a mão coercitiva e, em parte, armada da Justiça, transforma-se também em um agente perigoso dessa violência. O sistema penitenciário brasileiro é realmente algo semelhante aos campos de concentração, ao invés de ser um campo de reabilitação dos delinqüentes e daqueles que têm uma conduta social desviada. Só os cegos não enxergam que não é possível continuarmos trilhando esses rumos que a nossa prática, a nossa história já demonstrou que levam a esse quadro dantesco, desumano, em que a insatisfação permeia não apenas os pobres, os expulsos, os marginalizados. Ele também incomoda, desassossega e cria problemas de consciência para aqueles que desfrutam o fruto amargo desse processo egoísta em que as benesses, também, vão adquirindo um preço insuportável por parte daqueles 10% de privilegiados que existem ainda neste País e que são os principais responsáveis por essa situação em que nos encontramos. Muito agradecido, Sr. Senador Ramez Tebet.

            O SR. RAMEZ TEBET -  Senador Lauro Campos, recebo como um enriquecimento, um estímulo ao meu despretensioso pronunciamento as suas sábias palavras, que dão um brilho à minha modesta manifestação. Mas discordo de V. Exª num ponto: credito a violência existente no nosso País, sem dúvida nenhuma, a múltiplos fatores sociais.

            Sei também - e todos nós sabemos - que há muito o que se fazer no nosso aparelho policial. E quantos policiais, lamentavelmente, não se encontram hoje envolvidos no emaranhado de teias que envolve a violência no nosso País! A fome, por exemplo. Tudo isso envolve a violência, mas, positivamente, isso não é produto exclusivo daqueles que foram retirados do campo. Porque aqueles que são recolhidos aos cárceres por praticarem crimes hediondos - que, como bem disse o Senador Bernardo Cabral, estão catalogados pelo brilhantismo dos constituintes de 1988, como é o caso da tortura - muitos deles nunca sentiram sequer o cheiro do mato, são produtos do asfalto. E eu diria, concordando com V. Exª: produtos do asfalto selvagem dos grandes centros urbanos deste País, talvez, mas não são oriundos do campo.

            É preciso fortalecer o campo - e eu sustento - é preciso fortalecer o processo produtivo no País, cuidar para que não se invadam as casas nos centros das cidades, as propriedades produtivas deste País, sob pena de comprometermos o processo produtivo neste País, desestimularmos os agricultores, os verdadeiros trabalhadores rurais, pequenos, médios e grandes, aqueles que, de uma forma ou de outra, estão produzindo no campo, sujeitos às intempéries da natureza.

            O SR. PRESIDENTE (Jefferson Péres) - Senador Ramez Tebet, o tempo de V. Exª está esgotado.

            O SR. RAMEZ TEBET - Recebo, Sr. Presidente, a vossa advertência e me preparo para encerrar. Tenho certeza de que não me omiti. Não trago soluções, pois elas são difíceis, tendo em vista a gravidade dos problemas. Mas eu disse, no início de meu pronunciamento, que era um desabafo que, oxalá, possa servir para algo. Espero que sim, pelo menos para dizer àqueles que hoje estão indefesos, àqueles que estão com suas propriedades ameaçadas, que há muitas vozes no Congresso Nacional a abominar a violência sob todas as suas formas. A fome, talvez, seja a mais terrível de todas as violências.

            Sr. Presidente Srªs e Srs. Senadores, ainda vamos voltar ao tema e discuti-lo em maior profundidade, pois é preciso tentar sair do estado em que nos encontramos. Precisamos operacionalizar, tomar medidas que tirem o pânico e a intranqüilidade do seio da sociedade brasileira, que está indignada, posso afirmar.

            Tenho conversado com amigos e com populares, sentido a voz e o clamor do povo, que não concorda com nada disso que está ocorrendo. Estão todos inquietos, intranqüilos por estarem vivendo neste clima de violência como este que está acontecendo no território brasileiro.

            Vamos todos torcer para que saiamos desta tempestade em que a sociedade está mergulhada e que, um dia, possamos respirar um clima, um ar, um oxigênio mais saudável socialmente neste País que muito espera de todos nós.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/10/1995 - Página 2166