Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A APROVAÇÃO DO SUBSTITUTIVO, DE AUTORIA DO SENADOR DARCY RIBEIRO, AO PROJETO DE LEI DA CAMARA 101, DE 1993, QUE FIXA DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL. CONGRATULANDO-SE COM AS CIDADES SATELITES DO PARANOA, SAMAMBAIA E CANDANGOLANDIA PELO TRANSCURSO DE SEUS ANIVERSARIOS.

Autor
José Roberto Arruda (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/DF)
Nome completo: José Roberto Arruda
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO. HOMENAGEM.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A APROVAÇÃO DO SUBSTITUTIVO, DE AUTORIA DO SENADOR DARCY RIBEIRO, AO PROJETO DE LEI DA CAMARA 101, DE 1993, QUE FIXA DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL. CONGRATULANDO-SE COM AS CIDADES SATELITES DO PARANOA, SAMAMBAIA E CANDANGOLANDIA PELO TRANSCURSO DE SEUS ANIVERSARIOS.
Aparteantes
Bernardo Cabral, Edison Lobão, Lúdio Coelho.
Publicação
Publicação no DSF de 28/10/1995 - Página 2020
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO. HOMENAGEM.
Indexação
  • ANALISE, CONTEUDO, PROJETO DE LEI, DIRETRIZES E BASES, EDUCAÇÃO, SUBSTITUTIVO, DARCY RIBEIRO, SENADOR, APROVAÇÃO, COMISSÃO DE EDUCAÇÃO.
  • COMENTARIO, EMENDA, APRESENTAÇÃO, ORADOR, PRIORIDADE, EDUCAÇÃO, DEFESA, COMPLEMENTAÇÃO, BAIXA RENDA, POPULAÇÃO CARENTE, VINCULAÇÃO, ENSINO.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, EDUCAÇÃO, DESENVOLVIMENTO, PAIS.
  • ANALISE, SITUAÇÃO SOCIAL, BAIXA RENDA, POPULAÇÃO CARENTE, POLITICA, MERENDA ESCOLAR, CONTROLE, MIGRAÇÃO, BRASIL.
  • ANALISE, PROGRAMA, EDUCAÇÃO, VINCULAÇÃO, POPULAÇÃO CARENTE, BAIXA RENDA, DISTRITO FEDERAL (DF).
  • DEFESA, REGIME, PARLAMENTARISMO, DESENVOLVIMENTO, SOCIEDADE.
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, CIDADE SATELITE, DISTRITO FEDERAL (DF).

            O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA (PSDB-DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu gostaria de, nesta manhã de sexta-feira, iniciar aqui uma discussão sobre o conteúdo - e não mais sobre a forma e a oportunidade da aprovação - da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira. O substitutivo, aprovado pela Comissão de Educação e aprovado, em primeira votação, no Senado Federal, do eminente Senador Darcy Ribeiro, não só simplifica e moderniza a relação do Estado com a sociedade no que diz respeito à educação básica e à educação universitária, como também sinaliza para um período em que a educação brasileira deverá ter, se aprovada a Lei de Diretrizes e Bases, absoluta prioridade nas políticas públicas, nos próximos dez anos.

            A aprovação da LDB pelo Senado Federal coincide com a remessa de alguns projetos do Governo Federal para o Congresso que também modificam - ao nível operacional - as relações do Estado com a sociedade na área de educação.

            Como iniciaremos, a partir da próxima semana, o debate de cada um dos artigos da Lei de Diretrizes e Bases, e será aberto regimentalmente o prazo para emendas à LDB, eu gostaria de registrar que, depois de estudar com técnicos conceituados na área de educação, em Brasília e fora de Brasília, estou ultimando os preparativos para apresentar uma emenda - apendas uma - à Lei de Diretrizes e Bases, exatamente ao seu art. 86, aquele que, pela redação dada pelo Senador Darcy Ribeiro, institui os próximos dez anos como o decênio da prioridade absoluta à educação no Brasil.

            Todos sabemos que países que saíram do pós-guerra com a sua economia destroçada, que saíram sem perspectivas de evolução econômica e social conseguiram reerguer as suas economias, conseguiram modelar o desenvolvimento e, principalmente, melhorar a qualidade de vida das pessoas, investindo fundamentalmente em educação e em ciência e tecnologia. O caso japonês é citado em todos os estudos, e os cientistas políticos de todo o mundo mostram que os povos asiáticos conseguiram colocar os seus países no mapa dos países economicamente desenvolvidos e socialmente justos, exatamente investindo em educação e em ciência e tecnologia.

            O Sr. Lúdio Coelho - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Com o maior prazer.

            O Sr. Lúdio Coelho - Considero muito válida a preocupação de V. Exª com o aprimoramento educacional e com o desenvolvimento da ciência e da tecnologia. Tenho pensado muito no fato de que, com a internacionalização da economia mundial, os países que são mais atrasados e os países do Terceiro Mundo, como o nosso, se não tiverem um amplo desenvolvimento educacional, vão pagar um tributo muito alto. Acho que faz muito bem V. Exª em dar ênfase a essa área.

            O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Muito obrigado, Senador Lúdio Coelho. Recolho o aparte de V. Exª com muito prazer, até porque tenho um respeito muito grande pela história de vida de V. Exª e pela forma simples e ao mesmo tempo objetiva com que tem analisado os problemas importantes deste País.

            Eu queria, inclusive, aproveitar a presença, neste plenário, do Senador Roberto Requião, que preside a Comissão de Educação do Senado - aliás, já dirigida anteriormente pelo Senador Valmir Campelo, que preside esta sessão -, para levantar aqui uma tese que reconheço, de início, polêmica e que deve gerar, e é bom que gere, controvérsias. São teses que talvez tenham até mais importância pelo processo de discussão do que pela sua implantação propriamente dita.

            O Brasil, já há alguns anos, tem algumas lideranças políticas, entre elas o Senador Eduardo Suplicy e o ex-Senador - hoje, Presidente da República - Fernando Henrique Cardoso, que defendem a tese da renda mínima.

            Imaginam alguns sociólogos, alguns políticos, alguns cientistas políticos que, num país como o nosso, ainda que se viabilize um projeto de desenvolvimento que inclua as populações marginalizadas nesse período de transição, para, com o crescimento, eliminar a miséria, deve haver alguma política pública que injete recursos diretamente naquelas famílias que estão abaixo da linha de pobreza. Quais são essas políticas públicas? Tenta-se, por exemplo, o programa da fome, que é especificamente uma política social emergencial, para fazer com que brasileiros não passem pela vida num processo de absoluta miséria, enquanto o País resolve os seus problemas fundamentais e volte a crescer.

            Mas existe um projeto de renda mínima sendo debatido no Brasil, que faria com que os recursos públicos - portanto, os recursos colhidos da sociedade através dos impostos - fossem direcionados especificamente àquelas famílias mais carentes. Segundo pesquisas, há aproximadamente 16 milhões de brasileiros que hoje, pela manhã, não tomaram o café e que provavelmente não conseguirão almoçar. Ou seja, são 16 milhões de seres humanos vivendo abaixo da linha mínima de miséria e pobreza aceitas pelas organizações internacionais.

            Há uma outra tese, também sendo discutida na Comissão de Educação, de algumas experiências, notadamente a de Campinas e a de Brasília, de complementação de renda mínima através da bolsa escolar. O que significa isso? Que famílias com renda abaixo de um salário mínimo, que tenham filhos entre 7 e 14 anos - portanto, na idade escolar do Primeiro Grau - matriculados na rede pública e com rendimentos e assiduidade mínima, receberiam, através do Estado, uma complementação escolar, em dinheiro. De tal maneira que essas famílias pudessem consumir, pelo menos, o alimento básico necessário para que suas crianças obtenham os índices mínimos de aprendizagem, até porque as pesquisas revelam que o índice de repetência e de evasão escolar está diretamente ligado à falta de alimentos.

            Há um terceiro programa sendo discutido no Brasil, de incentivo à contenção das correntes migratórias. Todos sabemos que a cada seca do Nordeste, a cada problema grave na agricultura brasileira, no Centro-Oeste ou no Nordeste, grandes correntes migratórias fazem com que brasileiros, irmãos nossos, tenham que sair da suas regiões de origem para habitar as periferias das grandes cidades, continuando uma vida miserável, em busca de uma falsa esperança, diga-se de passagem, de uma vida melhor. Com isso, aumentam as desigualdades, aumenta a miséria.

            Unindo essas três questões, pretendo apresentar uma emenda à LDB que proveja recursos específicos do Estado brasileiro, num montante mais de dez vezes inferior ao necessário para o projeto de renda mínima, que, ainda que saudável para um País como o nosso, é inexeqüível em nível econômico.

            O que desejamos nós? Alcançar famílias carentes, com renda total inferior a um salário mínimo, que tenham filhos na idade escolar matriculados na rede pública, com assiduidade e rendimento escolar mínimo, e que vivam em cidades com população inferior a 50 mil habitantes. E por que apenas nas pequenas cidades? Porque as estatísticas mostram que exatamente nessas pequenas cidades e no campo há concentração de miséria. E dar bolsas escolares em cidades grandes, como Campinas e Brasília, ainda que socialmente justo, gera um problema adicional, que é o de motivar a corrente migratória: "vamos para Brasília, vamos para Campinas, porque lá, pelo menos, o Estado nós dá uma bolsa escolar para os nossos filhos estudarem".

            O que se deseja, então, com essa emenda? Que nesses dez anos em que o Brasil, cumprindo inclusive os compromissos da socialdemocracia, ao investir em educação, não o faça apenas de forma teórica - "nos próximos dez anos, daremos prioridade à Educação" - mas que essa tese seja defendida, na prática, como um movimento de levar à escola efetivamente todas as crianças em idade escolar, para que, num período de dez anos, tenhamos invertido essa quadro de miséria e de injustiça social.

            Com essa emenda, que desejamos discutir no plenário do Senado, exatamente na oportunidade em que se discute a LDB, o que mais desejamos é que essas famílias carentes, do campo ou das pequenas cidades brasileiras - porque mais de 80% das famílias miseráveis estão em municípios de população inferior a 50 mil habitantes, notadamente no Centro-Oeste, no Norte e no Nordeste brasileiro -, vivam com mais dignidade.

            Ora, se tivermos um programa de âmbito nacional, que faça com que cada uma dessas famílias carentes receba uma complementação de renda mínima, vinculada à educação de seus filhos e tendo como vetor adicional um incentivo à fixação do homem no seu local de origem, estaremos, provavelmente pela primeira vez na história das políticas públicas brasileiras, unindo três graves problemas sociais, que são, em primeiro lugar, a miséria e a fome; em segundo, a evasão e as repetências escolares; e, em terceiro, as políticas de fixação do homem no seu lugar de origem.

            Estaremos, dessa forma, unindo três gravíssimos problemas sociais numa só solução, que nada mais é do que um substitutivo para um programa de renda mínima, defendido neste plenário pelo então Senador Fernando Henrique Cardoso; defendido em todo o País pelos Senadores Eduardo Suplicy e Ney Suassuna; defendido por sociólogos, por cientistas políticos, por estudiosos; defendido, enfim, por importantes segmentos organizados da sociedade brasileira, mas que ainda não conseguiu unir o que teoricamente é aceitável em países pobres como o nosso com a viabilidade econômica de sua implementação.

            São necessários recursos para que haja essa complementação de renda mínima da forma como apresentamos, ou seja, não o fazendo nas grandes cidades, porque não desejamos inchá-las, mas apenas nos pequenos municípios para exatamente termos o vetor de fixação do homem no seu local de origem. A complementação da renda mínima, embora saudável - porque traz pelo menos o arroz e o feijão para a mesa do pobre -, deve estar vinculada ao fato de que os filhos dessas famílias, com idade entre 7 e 14 anos, tenham de estar matriculados em escolas da rede pública.

            O Sr. Edison Lobão - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Com o maior prazer, Senador Edison Lobão, até porque V. Exª conhece melhor do que nós, com a sua experiência como Governador do Maranhão, os problemas graves da injustiça social, principalmente nos pequenos municípios daquele Estado.

            O Sr. Edison Lobão - V. Exª se refere a uma experiência que está dando certo em Brasília, com o Governador Cristovam Buarque. Mas no Nordeste - imagino - o problema é mais grave. Quando assumi o Governo, possuíamos cerca de 285 mil matrículas escolares. Ao longo de 400 anos, todos os Governos, somados, foram capazes de criar 285 mil matrículas no Estado. Nos três anos do meu Governo, criei mais 315 mil e dobrei o número de salas de aulas. Temos ainda um sem-número de crianças fora das salas de aula. No Nordeste o que há basicamente é carência de escolas e professores. Estes, por sua vez, em grande parte, recebiam - envergonho-me de dizer - seus salários com a impressão digital, porque não sabiam assinar o nome. Tivemos que substituí-los - foi um processo doloroso, traumático até - por outros concursados, todos. Não nomeamos nenhum professor que não fosse rigorosamente concursado. O concurso foi realizado pela Fundação Carlos Chagas, de São Paulo, sem qualquer participação das autoridades do Estado do Maranhão. Nomeamos milhares e milhares de professores de excelente qualificação. Situação pior ainda: 70% das escolas do Estado não eram nem sequer reconhecidas pelo Conselho Estadual de Educação, ou seja, os diplomas que emitiam não passavam de meros papéis pintados, não tinham qualquer valor. Até as escolas do Estado não eram reconhecidas pelo Conselho de Educação. Tudo isso foi modificado. Todos os professores passaram por um regime de reciclagem, e hoje o ensino do Maranhão, que era de péssima qualidade, passou a ser de boa qualidade. No entanto, apesar de termos dobrado o número de salas de aula - mais do que dobrado - ainda há carência de sala e de professores no Estado do Maranhão. E é assim em todos os Estados do Nordeste. A meu ver, a situação daquela Região, e do Norte também, é bastante diferente da de Brasília. Acredito que a experiência é interessante, pode ser realmente exportada para outros Estados na medida em que, de fato, passem esses Estados a ter um número suficiente de salas de aula e de professores. Cumprimento V. Exª por abordar tema tão importante nesta manhã.

            O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Faço apenas dois registros sobre o aparte oportuno de V. Exª.

            O primeiro deles é sobre a experiência de Brasília. O atual Governador quis conhecer minha opinião sobre esse programa. Disse-lhe que, sobre o assunto, tenho uma notícia boa e outra ruim. Não obstante o fato de sermos de coligações diferentes, considero o programa bom, socialmente justo, embasado em ótima tese, razão pela qual tem o meu apoio. No entanto, em segundo lugar, nunca poderia, a meu ver, ser aplicado em Brasília, nem em nenhum outro grande centro.

            O que ocorre infelizmente - falávamos sobre isso no discurso anterior, do Senador Bernardo Cabral - é que as políticas públicas de assistência social no Brasil são implementadas exatamente onde não devem. Essa é a história da favelização do Rio de Janeiro e de São Paulo; essa é a história do incentivo à falsa melhoria da qualidade de vida nas grandes cidades brasileiras.

            Ora, nobre Senador Edison Lobão, qual é a repercussão, sobre uma família humilde do Maranhão, ao se escutar, de manhã, na Rádio Nacional, que em Brasília a família carente recebe um salário mínimo para os seus filhos estarem na escola? Sabe V. Exª que provavelmente, poucos dias depois, essa família vai bater à porta do gabinete de V.Exª, pedir dinheiro para comida ou passagem para voltar. Será que podemos gerar essa falsa esperança no seio das famílias pobres brasileiras?

            Muito bem. Mediante a apresentação dessa emenda, pretendo conciliar o que considero oportuno e teoricamente elogiável com o que me parece adequado, ou seja, a idéia da complementação de renda mínima ligada ao ensino, ligada à obrigatoriedade da presença dos filhos entre 7 e 14 anos nas escolas com o fato de isso estar restrito às cidades pequenas e ao campo, ao interior do País.

            Não excluo a idéia de que um prefeito de Capital ou governador de Estado, tendo recursos próprios, possa estender esse programa a favelas, a cortiços das grandes cidades. No entanto, a União, o Governo Federal não pode implementar um programa de renda mínima ligada à educação que não contenha a preocupação com a contenção das correntes migratórias. Caso contrário, vai permanecer a tendência dos últimos 30, 40 anos, de levar os grandes benefícios às regiões e às cidades mais ricas. Essa é a primeira consideração.

            A segunda refere-se ao que foi abordado por V. Exª em relação à rede pública e aos salários dos professores. V. Exª tem razão: essa deve ser a prioridade da emenda que apresento. Apenas considero que o projeto que o Ministro da Educação e o Presidente da República encaminharam ao Congresso Nacional procura uma forma que me pareceu extremamente eficaz. Trata-se da busca de uma unidade aluno/ano, no caso de R$300, que valeria para todo o território nacional, e um fundo de eqüidade da educação brasileira. Ou seja, a disparidade que existe entre um professor primário no interior do Maranhão e um professor primário no interior de São Paulo é abissal; a disparidade que existe entre a formação desses dois professores é profunda.

            O programa que o Governo Federal encaminhou ao Congresso Nacional pretende a criação de um fundo de redistribuição de recursos marginais, de tal maneira que em todos os municípios brasileiros, sem exceção, haja um piso mínimo para o salário do professor e para o custo do aluno/ano matriculado na rede pública. Penso que isso fatalmente vai carrear para as regiões mais pobres os recursos concentrados hoje nas regiões mais ricas.

            A título de exemplo, a Revista Veja da última semana mostrou que um prefeito de cidade rica, na obrigatoriedade de investir 25% do orçamento em educação, construiu um belo estádio de futebol, alegando que era para educação física, Enquanto isso, em muitos municípios brasileiros, os alunos têm aulas embaixo de folhas de árvores, porque não se consegue construir uma sala de aula.

            O projeto do Governo Federal, se aprovado pelo Congresso Nacional, com as eventuais modificações que venha a merecer, corrigirá essa distorção.

            A vinculação de valor mínimo orçamentário a ser gasto em educação não basta, porque distorce exatamente em favor dos municípios mais ricos. Mas o estabelecimento dessa bolsa de compensação e desses pisos mínimos, a meu ver, corrige essa distorção.

            O segundo passo, aí sim, seria a complementação de renda mínima vinculada à bolsa escolar e - repito - restrita aos municípios do interior do Brasil, onde ocorre a grande concentração de miséria.

            O Sr. Bernardo Cabral - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Ouço V. Exª com prazer.

            O Sr. Bernardo Cabral - Senador José Roberto Arruda, o mal de tudo isso chama-se sistema presidencialista de governo. Se tivéssemos um sistema parlamentarista, o Chefe do Governo teria que vir ao Congresso apresentar previamente o seu programa. Desse modo, tomaríamos conhecimento de onde e de que forma seriam executadas as políticas sobre a fonte de custeio; não cairíamos nisso que V. Exª, com muita propriedade, analisa, critica e sugere. Há pouco o Senador Jefferson Péres mostrava a brutal forma, a violenta maneira mediante a qual se deu o corte de recursos para as escolas técnicas federais, já ao apagar das luzes de um final de ano. Se o programa de governo fosse submetido ao Congresso previamente para que ou fosse aprovado ou rejeitado, teríamos idéia de como aconteceria. E sei que V. Exª concorda comigo, porque é um parlamentarista convicto. Mais uma vez quero ressaltar, V. Exª citava, no início do seu discurso, todas as grandes potências, inclusive aquelas que emergiram da II Guerra Mundial, como o Japão, a Alemanha e a Itália têm um sistema parlamentarista monárquico. Fala-se que o presidencialismo nos Estados Unidos é tido como uma grande forma de governo e se esquecem simplesmente que o presidencialismo, lá, leva um Presidente da República a ser eleito indiretamente. Essa é a grande realidade. Mais: o Presidente do Federal Reserve Bank é eleito antes de o Presidente da República tomar posse, e o seu mandato vai além do mandato do Presidente da República, que é quem comanda a política econômico-financeira do seu país, coisa completamente diversa do sistema presidencialista brasileiro. De modo que quero me associar a V. Exª, aplaudi-lo pela análise que, evidentemente, é irretocável e concluir que tudo isso tem como mal maior o sistema presidencialista de governo.

            O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Muito obrigado, Senador Bernardo Cabral.

            Acredito que hoje seja um dia de grandes coincidências. Nós, parlamentaristas, não perdemos a guerra. Quando não conseguimos ganhá-la, talvez até por falha nossa ao explicarmos à sociedade brasileira as vantagens do parlamentarismo, partimos para uma outra guerra: eleger um parlamentarista Presidente da República. Hoje o Brasil tem um regime parlamentarista; embora presidencialista de direito, ele é parlamentarista de fato.

            Claro que não tenho a experiência política de V. Exª, Senador Bernardo Cabral, nem a do Senador Elcio Alvares e de tantos outros Senadores aqui presentes, mas desconheço, na história política brasileira, um Presidente da República que tenha mais do que vontade política, que tenha prazer no convívio com o Parlamento, no debate democrático acerca de cada uma das idéias que pautam seu governo. Nós, parlamentaristas, depois de derrotados no plebiscito...

            O Sr. Bernardo Cabral - Afastados da vitória, Senador.

            O SR. JOSÉ ROBERTO ARRUDA - Nós, parlamentaristas, depois de afastados da vitória, como diz V. Exª, buscamos um outro caminho: elegemos um dos maiores líderes parlamentaristas da história política para a Presidência da República no sistema presidencialista.

            Mas as coincidências não terminam aí, Senador. Temos hoje aqui, nas galerias do Senado, a visita de um ilustre brasileiro, um dos grandes pensadores políticos, que é o Dr. Gustavo Ribeiro, que, inclusive, tem investido parte do seu tempo na tradução de trabalhos, principalmente os de Alain Touraine, que mostram exatamente que o desenvolvimento da América Latina está muito ligado à sua evolução política. No seu mais recente trabalho Palavras e Sangue, ele demonstra que, tanto através dos movimentos políticos como através das revoluções, todos os países da América Latina - que ele considera a classe média do mundo -, vêm truncado as suas perspectivas de desenvolvimento exatamente pelos desencontros políticos, ou dos sistemas totalitários, ou dos regimes individualistas, base do sistema presidencialista.

            Confesso a V. Exª que fiquei parlamentarista, ainda muito menino, quando li um livro fantástico, embora de ficção, intitulado O Primeiro Ministro, de Arthur Haley, que conta a história do parlamentarismo canadense.

            Particularmente, tenho o convencimento de que a base do regime parlamentarista, que é a divisão da responsabilidade das decisões por muitas Lideranças, escolhidas pela sociedade, é, em tese, melhor do que o poder concentrado, base do regime presidencialista.

            Mas essa discussão, vencida obviamente pelo calendário político brasileiro, é bom que seja sublinhada aqui. Primeiro, pela postura democrática e parlamentarista do nosso Presidente, que todos temos que aproveitar. Num segundo momento, Senador Bernardo Cabral, penso que o Senado Federal tem uma missão importante. Qual a diferença entre o Senado e a Câmara? É que aqui, o Estado de São Paulo, apenas para citar como exemplo, tem três brilhantes Senadores, como também o tem o Estado do Acre, com seus problemas e suas dificuldades. Aqui, todas as Unidades da Federação têm igualdade de representação. É, portanto, o Senado o princípio do federalismo - e acredito que a sociedade brasileira está enxergando isso com muita rapidez, neste momento da vida política brasileira. O próprio Governo Federal - sou testemunha disso - também tem enxergado esse fato. Vejam V. Exªs que o trabalho do Senador Elcio Alvares, Líder do Governo, está muito concentrado na importância do Senado como Casa Revisora e como última instância do Poder Legislativo. Penso que temos uma missão histórica de não apenas contemplar as políticas públicas nascidas do Governo Federal, mas de fazer com que nasçam aqui políticas públicas que invertam o mapa desigual da realidade brasileira. Uma delas é a área educacional. A análise feita a respeito da Lei de Diretrizes e Bases, iniciada esta semana, ainda que a discussão tenha se concentrado mais na forma do que no conteúdo, nessa fase de apresentação de emendas, deve ter sua discussão aprofundada, e cada um de nós deve dar a sua contribuição nessa discussão. Estou convencido de que o substitutivo do Senador Darcy Ribeiro eliminou as faces corporativistas do projeto, que antes apreciávamos, e contribuiu enormemente para que a educação brasileira possa ter um rumo mais coerente com as necessidades da sociedade.

            Gostaria, Sr. Presidente, Senador Valmir Capelo, se V. Exª me permitir, até porque somos representantes do Distrito Federal nesta Casa, de registrar o aniversário do Paranoá, de Samambaia e da Candangolândia, três cidades satélites que compõem o Distrito Federal, inclusive onde o Senador Valmir Campelo e eu trabalhamos. Desejamos que, num futuro próximo, sejam mais cidades e menos satélites, que tenham vida econômica própria, que contribuam mais para o desenvolvimento econômico do Centro-Oeste e que sejam menos cidades-dormitórios, com essa vocação econômica terciária de Brasília apenas como Capital, onde só há emprego no serviço público e no comércio. Acredito que atitudes podem ser tomadas para que essas três cidades, que comemoram o aniversário de sua fundação neste final de semana, possam ter, daqui para frente, geração de emprego e vida econômica própria, cumprindo, inclusive, a missão principal de Brasília, que foi de interiorização do desenvolvimento do Centro-Oeste brasileiro.

            Eram essas as minhas considerações, Sr. Presidente, na manhã de hoje.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/10/1995 - Página 2020