Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DA PRORROGAÇÃO DO FUNDO SOCIAL DE EMERGENCIA-FSE, COMO INSTRUMENTO POLITICO CIRCUNSTANCIAL PARA A ESTABILIZAÇÃO DA ECONOMIA.

Autor
José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • NECESSIDADE DA PRORROGAÇÃO DO FUNDO SOCIAL DE EMERGENCIA-FSE, COMO INSTRUMENTO POLITICO CIRCUNSTANCIAL PARA A ESTABILIZAÇÃO DA ECONOMIA.
Aparteantes
Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 04/11/1995 - Página 2368
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • COMENTARIO, POSIÇÃO, ORADOR, DEFESA, NECESSIDADE, PRORROGAÇÃO, FUNDO SOCIAL DE EMERGENCIA, EFICACIA, INSTRUMENTO, POLITICA ORÇAMENTARIA, ESTABILIZAÇÃO, ECONOMIA.

            O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, modestamente, não pretendo fazer um pronunciamento de grande extensão e, dada as minhas limitações, nem mesmo de grande profundidade. Mas, quero fazer um registro.

            Não sou um defensor do Fundo Social de Emergência, hoje chamado Fundo de Estabilização Fiscal. Não sou um defensor. Creio que normalmente um país não deve ter um fundo dessa natureza. É uma gestão orçamentária um tanto quanto oblíqua, eu diria inovadora, sim, mas não permanentemente recomendável. O que um país normalmente deve ter é um equilíbrio das suas contas, um equilíbrio de despesa e receita, uma estrutura orçamentária organicamente correta.

            No entanto, Sr. Presidente, está muito claro que as decisões políticas que antecedem a esse equilíbrio não foram tomadas pelo Congresso Nacional. Ou seja, a postura de darmos ao orçamento e às contas públicas uma estrutura não deficitária não vem sendo seguida, não vem sendo adotada criteriosamente no Brasil. Ao contrário, estamos em pleno andamento de um plano bem sucedido de estabilização, todos os instrumentos políticos alternativos estão sendo adotados, o Governo se vale de uma política monetária extremamente rígida, extremamente dura. No entanto, aquilo que seria - digamos assim - a base, o pilar de sustentação do programa de estabilização, que é o equilíbrio fiscal, até hoje é um desiderato não alcançado. Percebe-se isso pelas contas públicas da União e principalmente pelas contas dos Estados e dos Municípios.

            O déficit público previsto para 1996 pode chegar a US$3 bilhões, por exemplo, e boa parte desse valor, cerca de 70%, é de responsabilidade dos Estados e dos Municípios. Conseqüentemente, isso exigiria, por parte de um governo que tivesse um orçamento inteiramente engessado dentro de uma rigidez estrutural absoluta, algo destrutivo no que tange a um programa de estabilização: emissão de moeda.

            De modo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que, mesmo não entendendo que um fundo social de emergência ou um fundo de estabilização fiscal ou um fundo de emergência como esse seja o mais desejável, não posso deixar de entender que o Fundo tem razão de ser neste momento. É o instrumento político viável, é o instrumento político adequado ao momento do País para evitar-se aquilo que, como eu disse, é devastador a qualquer programa de estabilização, que é a necessidade de emitir moeda para cobrir o rombo dos gastos públicos.

            Portanto, Sr. Presidente, o que quero registrar com toda ênfase possível é que, pessoalmente - não falo evidentemente em nome do meu Partido, não tenho nenhuma representação para isso - entendo como necessário o Fundo de Estabilização Fiscal. Se o meu Partido vier a adotar uma outra orientação, e essa orientação for fechada, oficialmente adotada mediante o processo estatutário, terei que me render a essa decisão. Mas quero fazer o registro de que, do ponto de vista pessoal, do ponto de vista do meu posicionamento, não creio que haja, a essa altura, outra alternativa, outro instrumento de política orçamentária do qual o Governo possa lançar mão.

            Apenas faço o registro porque tenho lido nos jornais que o PMDB votará contra o Fundo Social de Emergência, o Fundo de Estabilização Fiscal. Creio que isso é um tema de debate interno, tem que ser analisado, tem que ser discutido internamente. Eu, do meu ponto de vista pessoal, já estou tentando dar esta contribuição, a contribuição no sentido de que não aprovar o Fundo de Estabilização Fiscal significa dizer que o Governo tem que emitir no ano que vem, tem que romper com a sustentação do programa de estabilização, significa tirar instrumentos, tirar meios de ação, quando lhe negam todas as demais que seriam aquelas que constituem os fatores determinantes de um equilíbrio fiscal.

            O Sr. Lauro Campos - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. JOSÉ FOGAÇA - Concedo o aparte ao nobre Senador Lauro Campos, com muita honra.

            O Sr. Lauro Campos - Eminente Senador José Fogaça, admiro a conduta de V. Exª no Senado e quero usar deste aparte - que considero um privilégio, quando dirigido a V. Exª - para salientar algo que deveria ser muito claro para nós. Não apenas o governo do Brasil, mas também o da Argentina, através do Plano Cavallo, o do México e outros colocaram como objetivo, como desiderato quase que exclusivo, como pressuposto indispensável, o combate à inflação. No final do processo, quando a inflação vai caindo e se transforma em negativa, o próprio Ministro Malan pede desculpas e diz que o sacrifício chegou ao fim. O Governo muda o nome de dois impostos - do IPMF e agora do Fundo Social de Emergência - para alcançar aquilo que considera indispensável para combater a inflação: o equilíbrio orçamentário. Mas, enquanto os preços estão caindo e a inflação está acima de zero, os trabalhadores, os funcionários e a sociedade têm um prejuízo menor. Se a inflação era de 10% e passa a ser de 5% ou 2% ao mês, os trabalhadores, em vez de perderem 10%, passam finalmente a perder apenas 2%. Mas, quando a queda de preço se transforma em negativa, como aconteceu no mês passado no Brasil, a situação se inverte. Pela primeira vez, na conjuntura, os salários e os vencimentos se elevam. Antes, com a inflação positiva, caíam menos, os trabalhadores, os funcionários, os que recebiam renda fixa perdiam menos na medida em que os preços estavam descendo lentamente. Mas, agora, quando a inflação se torna negativa, os salários se elevam em termos reais, os vencimentos também se elevam em termos reais. Portanto, os lucros caem e, a partir desse momento, se verifica que a inflação ajudava a acumulação de capital, a manutenção do lucro e que a deflação significa prejuízo: vendas a preços cadentes; receitas para os comerciantes e para os industriais com o poder de compra cada vez menores; dificuldades na reposição dos estoques. De modo que, então, o Governo percebeu - parece-me - que havia abusado do remédio e o combate à inflação se transformou em deflação, em perigo para aprofundar a crise. Foi por isso que o Governo elevou os preços, puxou para cima de novo os preços de seus serviços, do petróleo e derivados, da eletricidade, etc. O Governo passou a inflacionar a economia, diante da deflação; viu que a dose do remédio utilizado, da farmacopéia utilizada no combate à inflação era excessivamente elevada. Era isso que gostaria de acrescentar ao discurso de V. Exª. Agradeço a oportunidade do aparte.

            O SR. JOSÉ FOGAÇA - Muito obrigado Senador Lauro Campos. Como sempre, a intervenção de V. Exª é dotada de muita substância, muito conteúdo e, portanto, acrescenta e aprimora o processo de debate que estou tentando trazer à Casa neste momento.

            A crítica de V. Exª - embora concorde com ela em boa parte -, na verdade, traduz também os altos e baixos de um programa, de um plano de estabilização que lida com dados imponderáveis ou desconhecidos, como, por exemplo: qual é a dose, a taxa de juros ideal para um país como o Brasil? Qual é o limite para o processo de contenção do consumo? Qual é o prazo pelo qual um governo pode manter estáveis ou imutáveis os chamados preços públicos ou as tarifas dos serviços públicos? Tudo isso contém um processo de aprendizado, um processo de adaptação contínua, constante, momentosa a cada crise e a cada dificuldade. A dose da taxa de juros aplicada em abril foi cavalar, realmente, foi duríssima, mas, talvez, justamente por causa dessa elevação dos juros é que se conteve o consumo e se chegou à deflação que V. Exª caracteriza bem ter ocorrido no mês anterior.

            Por outro lado, não poderia continuar esse nível de contenção de consumo, porque, evidentemente, isso iria arruinar os negócios, inibir os investimentos, impedir o crescimento econômico, desarrumar as empresas e criar uma situação segundo a qual "o rabo é que iria abanar o cachorro", e não o contrário. Ou seja, uma política de juros, que é apenas um instrumento de política monetária, iria acabar determinando toda a tendência do conjunto do programa de estabilização.

            De modo que, diante do quadro que V. Exª analisa, parece-me claro que os sintomas de dificuldades que surgem com aumentos setoriais de preços, com o aumento da taxa de juros, com a contenção do consumo, com a retomada desse mesmo consumo e do crescimento econômico são sintomas de um programa de estabilização que procura os seus elementos, que procura suas bases, suas definições, à cata delas, no andar da própria carruagem, no andar do próprio processo. Porque esses dados não são definidos, não são previamente conhecidos; são construídos, a cada dia, cotidianamente, através da ação política, da ação econômica do Governo.

            Apenas faço esse registro para responder a V. Exª, no sentido de que considero previsto que isso está incluído, digamos assim, entre os altos e baixos de um programa de estabilização.

            Mas, Sr. Presidente, para concluir a minha intervenção, que não pretende ser longa, como disse, aqui reitero este posicionamento quanto à aprovação do Fundo de Estabilização Fiscal. Creio que, ao se dar o nome de Fundo de Estabilização Fiscal, se deu um tapa na hipocrisia, porque Fundo Social de Emergência era uma denominação vistosa, ou que tentava ser simpática, para objetivos outros que não exatamente os de conteúdo social. Na verdade, o conteúdo, o objetivo desse Fundo é a estabilização da moeda; o Fundo é para impedir ou evitar a sua emissão, apenas para isso. Para que o Governo não tenha que emitir. Portanto, se nós, do PMDB, estamos acompanhando o Governo, estamos com o Governo, temos o dever de reconhecer que esse instrumento é imprescindível e indispensável ao programa de estabilização.

            Não creio que os partidos de Oposição devam concordar com isso. Precisamos até de alertas, críticas e análises, como feitas hoje neste plenário pelo Senador Lauro Campos, por quem está ocupando um papel político de oposição, porque esse tipo de pronunciamento é legítimo, honesto, aberto e transparente e visa cumprir a parte da democracia sem a qual ela não existe, que é a Oposição. Democracia totalitária é um absurdo, uma incoerência. A democracia é governo, situação e oposição; a Oposição permanentemente alertando para os erros, apontando problemas e criticando decisões.

            Mas, quando dentro do próprio Governo surgem atitudes que ora são de Oposição ora de Governo, isso leva os jornais, a imprensa e boa parte da opinião pública a suspeitar de que se trata de um outro tipo de cobrança não tão transparente e não tão recomendável, no que, sinceramente, não acredito. Não creio que possíveis reações se devam a qualquer tipo de reivindicação ou a qualquer tipo de cobrança ou a qualquer tipo de jogo ou tráfico de interesses.

            Registro, também, que não aceito, não acredito e até repudio qualquer suspeita de que esses integrantes do meu Partido estejam querendo fazer qualquer tipo de barganha. Mas também creio que a melhor forma de desanuviar esse horizonte, de eliminar essas suspeitas, de "desinstrumentalizar" esse tipo de análise - como é feita, por exemplo, hoje, no jornal O Estado de S. Paulo, que levanta essa argüição, que propõe essa suspeita de que se trate de um jogo de interesses, que a Bancada do PMDB, no Senado, está trazendo ao processo político -, é termos uma postura correta, uma postura simples de um Partido de Governo. Analisar, debater, mas não ter previamente, a priori, uma posição contrária, que depois poderá acabar transformando-se numa posição favorável. Isso, sim, é suscitador de suspeitas por parte da imprensa. Absolutamente convicto de que não existe esse tipo de barganha, absolutamente convencido de que esse tipo de suspeita é incabível, quero também dizer que, para que se possa de todas as maneiras afastar definitivamente esse tipo de aleivosias, não há outro meio senão o de procurar, em primeiro lugar, adotar uma postura que nada mais é senão a de repetir aquilo que já fizemos em 1993, ou seja, conceder ao Governo o Fundo de Estabilização. Caso haja, no intrincado processo de decisões, algum ponto que, por exemplo, dessirva aos governadores de Estado, que dessirva aos interesses regionais, que isso seja negociado correta e transparentemente para evitar prejuízos aos governos bem como aos Municípios. Mas se somos favoráveis ao programa de estabilização, no modelo adotado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso, não podemos recusar-lhe o Fundo de Estabilização Financeira.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/11/1995 - Página 2368