Discurso no Senado Federal

A INTEGRAÇÃO DOS ESTADOS DO NORDESTE NO FORTALECIMENTO DA UNIÃO. TRANSCRIÇÃO NOS ANAIS DO SENADO FEDERAL DO ARTIGO DO SENADOR BENI VERAS, INTITULADO 'BRASIL UM PAIS FRATURADO', PUBLICADO EM O ESTADO DE S.PAULO DE HOJE.

Autor
Josaphat Marinho (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Josaphat Ramos Marinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • A INTEGRAÇÃO DOS ESTADOS DO NORDESTE NO FORTALECIMENTO DA UNIÃO. TRANSCRIÇÃO NOS ANAIS DO SENADO FEDERAL DO ARTIGO DO SENADOR BENI VERAS, INTITULADO 'BRASIL UM PAIS FRATURADO', PUBLICADO EM O ESTADO DE S.PAULO DE HOJE.
Aparteantes
Beni Veras, José Roberto Arruda.
Publicação
Publicação no DSF de 14/11/1995 - Página 2941
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • NECESSIDADE, ENQUADRAMENTO, PROBLEMA, OBJETIVO, INTEGRAÇÃO, REGIÃO NORDESTE, BRASIL.
  • INSERÇÃO, ANAIS DO SENADO, ANALISE, CONTEUDO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, SENADOR, AVALIAÇÃO, SITUAÇÃO, REGIÃO NORDESTE.
  • NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, IMPLANTAÇÃO, POLITICA, PLANEJAMENTO, SOLUÇÃO, PROBLEMA, REGIÃO NORDESTE.
  • DEFESA, CRIAÇÃO, MINISTERIO, REGIÃO NORDESTE.
  • ANALISE, HISTORIA, FINANÇAS, MODELO ECONOMICO, DESENVOLVIMENTO, REGIÃO NORDESTE, RELAÇÃO, BRASIL.

            O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, muito se tem falado a respeito dos problemas do Nordeste; ora palavras recheadas e sem substância, ora documentos dignos de consideração.

            Neste plenário, em diferentes momentos, modestamente tenho assinalado a necessidade de planejamento sobre os problemas do Nordeste. Não basta que reclamemos que o Nordeste não recebe o tratamento devido dos governos; não basta que se apontem as falhas; é impróprio que se invoquem apenas as deficiências da sua estrutura econômica e social.

            Essencial é que os problemas sejam postos com objetividade e dentro de critérios capazes de conduzir a solução razoável.

            Hoje, expondo assim os problemas, quero prestar uma homenagem ao nosso Colega, Senador Beni Veras, pelo artigo publicado neste dia, intitulado "Brasil, um País fraturado". É primorosamente objetivo o trabalho que acaba de vir ao nosso conhecimento.

            Sem paixão e sem excesso de adjetivação, o nobre Senador, conhecedor que é dos problemas da nossa Região, situa-os apontando como resolvê-los adequadamente. Irei pedir a transcrição deste artigo nos Anais do Senado Federal, como um subsídio ao exame geral dos problemas da Região. Fazendo-o, quero, entretanto, assinalar alguns dos seus pontos fundamentais.

            Começa o eminente Senador pelo Estado do Ceará a dizer:

            O nosso maior desafio, neste final de século, é integrar o Brasil. Não podemos ingressar no século XXI sem enfrentar, de forma definitiva, as imensas desigualdades regionais que dividem este País em dois: um desenvolvido e outro subdesenvolvido.

            No momento em que o ilustre Senador fala em integração, cuida exatamente da questão fundamental, não apenas da região, mas do País. O País precisa integrar-se, inclusive, através das regiões Norte e Nordeste, para que as soluções se dêem, fortalecendo a União. Não se trata de pleitear soluções apenas para fortalecer o Estado, a sociedade, a economia das regiões Norte e Nordeste, mas de soluções que façam com que o Nordeste integrado possa colaborar no desenvolvimento do País, acima das desigualdades, não apenas regionais, mas também sociais, que atormentam toda a Nação neste momento.

            Adiante, o nobre Senador observa, depois de acentuar a existência dos dois brasis, a que ele denomina Brasil-1 e Brasil-2:

            "Uso a expressão Brasil-1 para identificar as regiões Sul, Sudeste e parte do Centro-Oeste, que abrangem 18% do território nacional e concentram 62% da população. Os seus quase 100 milhões de habitantes geram um PIB estimado em R$330 bilhões, o que corresponde a uma renda per capita de R$3,3 mil. Essa região é responsável por mais de 80% das exportações brasileiras."

            Criteriosamente, então, mostra o contraste:

            "Chamo de Brasil-2 a região compreendida pelo Norte, Nordeste e Mato Grosso. É uma área que concentra 38% da população do País e representa 82% do território nacional. Essa região é responsável por um PIB de R$65 bilhões e possui renda per capita não superior a R$1,1 mil. Ou seja, a renda por habitante é um terço da renda do Brasil-1. A esperança de vida ao nascer é de 58 anos no Nordeste e 70 no Sul. No Nordeste, 51,2% da população se situa abaixo da linha de pobreza."

            Ora, Sr. Presidente e Srs. Senadores, quando esses dados são postos em relevo, é preciso que o Governo desperte, não para soluções isoladas, não para decisões circunstanciais, mas para formular um conjunto de soluções ordenadas que tenham continuidade no tempo, acima das decisões pessoais de governantes, sejam Presidentes das República, sejam Ministros de Estado ou Governadores.

            As medidas se impõem em conjunto. É por isso que o nobre Senador, a cujo artigo me refiro, salienta, com a visão do nosso tempo, e não com a visão do passado, de um liberalismo vencido, que é preciso modificar a atuação das organizações de planejamento no País. Vale dizer: não se quer que sejam adotadas medidas isoladas, destinadas a um ou outro estado, nem que se circunscrevam a providências circunstanciais. O que se impõe é uma solução coordenada, que se desdobre em múltiplas providências, de maneira que os problemas da região sejam cogitados com espírito de continuidade e permanência. É o que nos tem faltado. Mas é isso que, neste momento, se precisa pôr em relevo, e é o que faço, valendo-me da oportunidade do substancioso artigo, a que me venho referindo.

            Por isso, o nobre Senador acrescenta:

            "Mas o Brasil-2 é diferente. A capacidade das regiões pobres de atraírem iniciativa do setor privado é muito pequena. Essas regiões são reféns de investimentos estruturadores, de responsabilidade do setor público. O Norte, o Nordeste e o Centro-Oeste ainda precisam de um Estado promotor do seu desenvolvimento."

            Quero parabenizá-lo, de modo particular, nessa passagem do seu artigo, em que investe contra o falso liberalismo dominante, que pretende reduzir a capacidade do Estado, quando todos sentimos que sem um Estado presente e juridicamente forte não há soluções adequadas para as desigualdades vigentes no País, no campo das regiões e no campo social.

            Mas faz uma outra observação o nobre Senador:

            "A segunda percepção importante é que o combate às desigualdades regionais não poderá mais ser realizado de maneira fragmentada. Não podemos continuar olhando o Brasil de uma forma desagregada. Não se trata mais de promover o desenvolvimento da Região Norte ou Nordeste de forma isolada."

            Assim, acrescenta, com a visão de quem descortina os problemas sociais e econômicos:

            "Mais uma vez o papel relevante será reservado ao Estado. No entanto, é preciso redesenhar o aparato institucional responsável por esse problema. Em primeiro lugar, creio que se torna necessária uma reforma nas instituições de planejamento. Em vez de uma superintendência para cada região, poderia haver uma grande instituição para o desenvolvimento do Brasil-2, capaz de ver, de forma integrada, as necessidades de infra-estrutura e as potencialidades de desenvolvimento."

            Essa, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, parece-me a forma de ver os problemas da nossa região, integrada ela no conjunto do País. Será por um sistema de planejamento, vale dizer, de fixação de prioridades para a solução continuada no tempo, que encontraremos o caminho para reduzir a miséria e as desigualdades que estão atormentando a população brasileira.

            O Sr. Beni Veras - Concede-me V. Exª um aparte?

            O SR. JOSAPHAT MARINHO - Ouço V. Exª com prazer.

            O Sr. Beni Veras - Senador, quero agradecer a generosidade das palavras de V. Exª, neste momento em que o País passa por uma etapa fundamental no seu desenvolvimento, ocasião em que o Centro-Sul, por exemplo, tem agora o MERCOSUL como uma grande oportunidade para o seu desenvolvimento, a internacionalização da nossa economia também derivará, sem dúvida, para o crescimento da Região Centro-Sul. Temo que a distância entre o Nordeste, o Norte, o Centro-Oeste, o Sul e o Sudeste seja aumentada, de tal forma que o nosso Governo não tenha condições de funcionar como "dois governos", como seria o caso, porque tamanhas são as diferenças entre as duas regiões. Muito agradecido pelas palavras generosas de V. Exª.

            O SR. JOSAPHAT MARINHO - V. Exª ainda agora tem razão. Podemos acrescentar - como alguns já observaram - que o importante para a solução dos nossos problemas regionais não está na criação de um ministério específico. Não se trata de criar cargos. O importante é que se fixem soluções ordenadas, planificadas, que tenham desdobramento no tempo, acima do poder voluntarioso de governantes. O que o País está precisando exatamente - e não apenas, aliás, o Nordeste - é de que as soluções obedeçam a planejamento, e não à vontade circunstancial dos dirigentes. Na medida em que operarmos essa transformação, teremos condições de promover um clima de igualdade no País e de menos perturbação da ordem social.

            O que está ocorrendo, por exemplo, no campo da reforma agrária não é outra coisa senão a falta da planificação. Não se sabe quais os pontos em que o Governo pretendeu fixar as prioridades para a desapropriação e realização da reforma agrária. As decisões se dão conforme a energia ou a violência do Movimento dos Sem-Terra.

            Esse Movimento não se há de dizer que não tenha razão. Erra aqui e ali nos atos de violência. As origens de seu procedimento, entretanto, residem na falta de justiça social. Num País com a dimensão do Brasil há uma minoria que possui todas as terras e uma grande maioria que não tem terras para trabalhar e plantar. Mas se isso está se dando, continua a ocorrer, apesar das leis que regulam a reforma agrária, apesar do que a Constituição estabeleceu, porque até hoje não há um plano adequado, objetivo, abrangente a nível de País, de maneira que as prioridades se estabelecessem, e a tranqüilidade pudesse chegar aos que terra não têm para plantar, obtendo assim as condições para sua sobrevivência.

            O Sr. José Roberto Arruda - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Josaphat Marinho?

            O SR. JOSAPHAT MARINHO - Pois não, nobre Senador José Roberto Arruda.

            O Sr. José Roberto Arruda - Senador Josaphat Marinho, gostaria de cumprimentar V. Exª pelo gesto importante de sublinhar o artigo assinado hoje pelo Senador Beni Veras, que já foi Ministro do Planejamento do Brasil, e tem, portanto, uma idéia do desenvolvimento regional, portanto, uma idéia nacional, abrangente. O problema do Nordeste brasileiro não é apenas dessa região, é, sobretudo, um problema de todo o País, que tem suas bases, suas raízes, nas nossas desigualdades. Os cientistas políticos e os estudiosos têm defendido teses e exposto trabalhos mostrando que as desigualdades brasileiras são gritantes. Eles nos colocam mesmo numa situação muito desagradável, se comparado ao desenvolvimento social de todas as nações do mundo. Ocorre que temos uma outra desigualdade, igualmente perversa, só que menos analisada, que são exatamente as desigualdades regionais. Tenho absoluta convicção de que estamos caminhando para um novo período de desenvolvimento, para um novo período de crescimento econômico. Essa convicção não se funda apenas num plano de estabilização econômica e com efeitos a curto prazo. Funda-se numa crença maior: na revisão constitucional e na vinda do capital privado para setores produtivos da economia, mas, sobretudo, no movimento da economia internacional, que nos coloca, a nós, brasileiros, numa posição favorável, se soubermos manter nossa soberania, se soubermos manter as variáveis da nossa economia, que são altamente favoráveis ao País, e se soubermos efetivamente flexibilizar aquilo que é possível ser flexibilizado, sem prejuízo dos interesses nacionais. Ora, partindo dessa convicção, não podemos cometer o mesmo erro de modelos de desenvolvimento anteriores, que privilegiaram as regiões mais desenvolvidas em detrimento das regiões mais pobres. O modelo de desenvolvimento que se deseja é exatamente aquele que possa diminuir as desigualdades, concentrar menos renda no Sul e Sudeste e fazer as distribuições de recursos não em função do poder ou da economia que se tem hoje, mas do poder e da economia que se quer no futuro, que é menos desigual. Estou absolutamente de acordo com V. Exª e com o Senador Beni Veras, de que tudo isso parte de um pressuposto, que é o planejamento do desenvolvimento nacional. Ou teremos metas a serem alcançadas na Região Norte, na Região Nordeste e na Região Centro-Oeste, de tal sorte que num período de cinco a dez anos tenhamos um outro mapa do modelo de desenvolvimento nacional, ou outra vez teremos por gravidade um modelo de desenvolvimento que até produz riquezas, que até produz empregos, que, claro, produzem resultados positivos em termos macroeconômicos, mas que agravam normalmente as desigualdades regionais, já gritantes. Por isso, eu gostaria de parabenizar V. Exª por trazer tema tão importante a debate e principalmente por colocar a responsabilidade das soluções inicialmente no planejamento das ações públicas.

            O SR. JOSAPHAT MARINHO - Agradeço-lhe o apoio, nobre Senador, para salientar que o Governo não deve ter medo do planejamento. O fato de o regime de plano ter nascido na União Soviética, no chamado regime do socialismo real, não deve criar pânico, porque o regime de planejamento dali partiu para o mundo, e regimes capitalistas o adotam. Não há por que pensar no planejamento dentro do espírito do regime comunista, mas não há por que recusar o planejamento como forma de organizar a administração para a atividade permanente a serviço da população e da correção das desigualdades que dividem as populações, a exemplo do Brasil, em dois países.

            O Governo, por outro lado, não deve ir ao encontro da opinião de velhos liberais que consideram o planejamento uma idéia caduca e superada. O planejamento entendido como forma de definição de prioridades para soluções fundamentais de um país, esse planejamento é próprio e adequado em qualquer momento e em qualquer regime. Os homens é que lhe darão o espírito capaz de servir ao conjunto da população.

            Não se arreceie, portanto, o Governo dessas circunstâncias. Louve-se no pensamento tão lúcido de um dos seus mais eminentes correligionários, que é o Senador Beni Veras, e abandone as soluções de circunstância para adotar as soluções planejadas e de coordenação.

            É assim, Sr. Presidente, que peço a V. Exª que, com o meu discurso, faça transcrever nos Anais do Senado o brilhante artigo do Senador Beni Veras, "Brasil, um País fraturado!".

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/11/1995 - Página 2941