Pronunciamento de Lúcio Alcântara em 19/10/1995
Discurso no Senado Federal
TRANSCURSO, NO PROXIMO DIA 21, DOS 86 ANOS DO DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRAS CONTRA A SECA-DNOCS.
- Autor
- Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
- Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
- TRANSCURSO, NO PROXIMO DIA 21, DOS 86 ANOS DO DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRAS CONTRA A SECA-DNOCS.
- Publicação
- Publicação no DSF de 20/10/1995 - Página 1292
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
- Indexação
-
- COMENTARIO, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRAS CONTRA AS SECAS (DNOCS), ORGÃO EXECUTIVO, RESPONSAVEL, OBRA CIVIL, INFRAESTRUTURA, PROGRAMA, ASSISTENCIA SOCIAL, REGIÃO NORDESTE.
- COMENTARIO, NECESSIDADE, TRANSFORMAÇÃO, MODELO, DESENVOLVIMENTO, EXPLORAÇÃO, RECURSOS HIDRICOS, REGIÃO NORDESTE, CONSCIENTIZAÇÃO, REFORÇO, ATUAÇÃO, DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRAS CONTRA AS SECAS (DNOCS).
- DEFESA, PARCERIA, DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRAS CONTRA AS SECAS (DNOCS), INICIATIVA PRIVADA, AUMENTO, EFICIENCIA, INVESTIMENTO, REGIÃO SEMI ARIDA, CRIAÇÃO, POLO AGROINDUSTRIAL, MOTIVO, REDUÇÃO, FLUXO, EXODO RURAL, DESENVOLVIMENTO, PAIS.
O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no dia 21 de outubro, o Departamento Nacional de Obras contra a Seca, DNOCS, completa 86 anos da sua criação. Durante sua longa história, o órgão teve diversas funções. No seu período inicial, de 1909 a 1919, estudou a região semi-árida do Nordeste através de especialistas internacionais. Sob a denominação de Inspetoria Federal de Obras contra a Seca (IFOCS), no período 1914 a 1945, supriu lacunas, construindo rodovias, ferrovias, portos e outras obras de infra-estrutura, e engajando-se em programas sociais e assistencialistas.
O DENOCS, a partir de 1945, dedicou-se principalmente à formação de recursos hídricos, tendo construído 295 grandes barragens, acumulando 15 bilhões e 800 milhões de metros cúbicos de água; perenizou 3 mil e 200 quilômetros de rios, antes intermitentes, construindo 25 mil poços na região; administra 396 açudes públicos e cerca de 700 açudes construídos sob a forma de cooperação. Embora esses dados impressionem e representem o trabalho de gerações, há muito o que fazer no campo da reservação. Os números mais conservadores indicam que apenas 50% do potencial hídrico do Nordeste semi-árido foi ativado e que muitas bacias e sub-bacias não estão controladas, com enorme desperdício de água, que passa diretamente para o mar.
Um grande feito do DNOCS foi no campo do desenvolvimento de tecnologias de reprodução de peixes e da introdução de espécies exóticas nas diversas bacias. Se a tecnologia foi dominada, os resultados práticos junto à população poderiam ter sido muito maiores, caso os seus resultados fossem massificados na região, através dos serviços de extensão. Mesmo assim, o órgão é responsável pela produção de 10% do pescado de água doce do País, o equivalente a 20 mil toneladas/ano de peixes.
A partir de 197l, com consultoria da França, Espanha e Israel, o órgão iniciou a estruturação de perímetros de irrigação. Hoje, o DNOCS opera 27 projetos, ocupando um pouco mais de 30 mil hectares, área inexpressiva em face do potencial de áreas irrigáveis do Nordeste, da ordem de 6 milhões de hectares. Desse total, juntando-se os projetos privados, estaduais e da CODEVASF, irriga-se, na região, pouco mais de 10%.
Nesses 80 anos de existência, o DNOCS investiu US$6.5 bilhões, quantia muito inferior à consumida em obras como as usinas nucleares, metrôs, Itaipu e outras situadas no Sul-Sudeste, tendo oferecido retornos muito significativos. Os melhores momentos vividos pelo DNOCS, em termos de dotações orçamentárias, foram as dos Governos Epitácio Pessoa (1921-1923), quando o órgão chegou a ter disponibilizados, por ano, US$483 milhões; e no de Juscelino Kubitschek (1957-1960), quando contou com US$378 milhões por ano. Em período mais recente, no Governo José Sarney (1986-1990), as dotações, então em baixa, se elevaram a US$262 milhões.
Em 1995, os recursos em transferência pela União e convênios deverão somar US$297 milhões, subindo para US$367 milhões no Orçamento de 1996.
Como vimos, o DNOCS foi o pioneiro na promoção do desenvolvimento regional. Foi o primeiro instrumento do Estado na luta pela superação das restrições e na promoção das potencialidades do semi-árido. A partir dos anos 70, o fulcro das atividades do DNOCS passou da construção e operação de açudes para a implantação e administração de projetos de irrigação, uma tarefa para a qual o órgão, por falta de tradição de irrigação no semi-árido brasileiro, não se mostrou suficientemente habilitado.
Para implantação de perímetros irrigados, desapropriaram-se áreas produtivas sem imediato reaproveitamento, havendo má escolha de áreas, compostas de solos aluvionais ribeirinhos, que, nas áreas pioneiras, apresentaram problemas de drenagem e de salinização. Além disso, ao invés de selecionarem-se pessoas habilitadas a manusear com tecnologias modernas, houve o estabelecimento de critérios inadequados para a escolha dos agricultores, inclusive pelo tamanho das famílias, as quais, além disso, eram monitoradas de forma autoritária e paternalista.
Hoje, está consolidada no órgão a idéia de que os projetos de irrigação devem se situar preferencialmente nas chapadas e tabuleiros, que continuam a se constituir em vazios econômicos e demográficos, apesar do alto potencial para o desenvolvimento agrícola. Concluiu-se também que o modelo de irrigação pública está claramente superado, necessitando-se de uma recuperação dos perímetros e da emancipação dos mesmos.
A nosso ver, ao DNOCS caberia construir e operar as grandes obras, como a instalação de barragens de armazenagem e de derivação, estações de bombeamento e grandes canais, sendo responsável pelo despacho da água até o lote, cobrando preços reais pelos serviços, contado para isso com o envolvimento de órgãos estaduais e municipais no processo, tal como a experiência que ora se inicia no Ceará.
Outra conclusão óbvia é de que as atividades de irrigação devam ser entregues à iniciativa privada. Para tanto, serão organizadas associações autônomas de irrigantes ou distritos de irrigação, que serão responsáveis pela gerência e operação dos perímetros e pelas solicitações de financiamento. Assim, parece claro que o período de assistencialismo e paternalismo está superado, que os projetos de irrigação desenvolvidos através de modelos claramente equivocados terão de ser recuperados e que os novos projetos terão de ser auto-sustentados, situados sob a égide da privatização, com atração de empresas privadas com tradição em irrigação, beneficiamento e comercialização de produtos agrícolas. Entende-se que o setor produtivo privado deve ser parceiro do desafio da irrigação, assumindo riscos e realizando investimentos que complementem os recursos públicos aplicados no setor.
Há um avanço que considero fundamental para o melhor desenvolvimento do gerenciamento integrado dos recursos hídricos do Nordeste, que é a conscientização, por parte dos nordestinos e do próprio órgão, de que o modelo e a cultura de atuação do DNOCS devem ser repensados. Para isso, é necessário que o órgão seja fortalecido.
No plano conjuntural, há de se tomar decisões urgentes, como a liberação tempestiva dos recursos financeiros previstos, finalização dos projetos de irrigação e dos açudes em andamento, alguns dos quais paralisados e em processo de deterioração. Os atuais projetos públicos de irrigação devem ser imediatamente emancipados, embora em alguns casos deva-se proceder a sua recuperação.
Algumas dessas medidas já estão sendo implementadas, pois o DNOCS retoma, no momento, 22 obras prioritárias no Nordeste, todas elas paralisadas, algumas necessitando apenas de 5% do total de recursos para sua finalização.
Dentre as obras reativadas no Ceará, está a Estação de Piscicultura Osmar Fontenele, localizada em Sobral, que deverá dobrar a capacidade de produção de alevinos no Estado, passando a cerca de 12 milhões de alevinos/ano, proporcionando o incremento de 6.260 toneladas de peixe/ano no Estado. Outra obra importante, o açude Serafim Dias, em Mombaça, que deverá ser inaugurado pelo Ministro Gustavo Krause durante esta semana.
Está sendo retomada ainda a construção dos açudes Fogareiro, em Quixeramobim; São Miguel, em Assaré; Olho D´Água, em Várzea Alegre, e o açude Castanhão, cujos recursos estão sendo liberados para o início da obra no final deste mês. Outros projetos prioritários, reiniciados no Estado, são os de irrigação Araras Norte, em Varjota; Jaguaribe-Apodi, em Limoeiro do Norte. Foi dada ordem de serviço também para o início do projeto de irrigação Tabuleiro de Russas, beneficiando os municípios de Russas e Limoeiro do Norte - isso apenas no Ceará.
Além dessas demandas conjunturais, no âmbito estrutural, entende-se ser primordial ampliar o horizonte de planejamento do DNOCS para 10 anos, com etapas qüinqüenais e planos operativos anuais, evitando-se a improvisação e a descontinuidade das obras. Com relação aos recursos humanos, há uma deficiente distribuição por categorias profissionais, excesso de pessoal de nível administrativo e de apoio, envelhecimento do quadro funcional e perda acentuada dos profissionais mais qualificados. Ênfase especial deve ser prestada à área de formação e treinamento de recursos humanos, não só do DNOCS como também dos técnicos com atuação na região, aos irrigantes, aos empresários e outras categorias. Uma das decisões mais importantes refere-se aos ajustes da missão institucional do DNOCS, concentrando suas ações na gestão dos sistemas estratégicos de acumulação e manejo da água no semi-árido e criando parcerias mais fortes com os governos estaduais e municipais, em apoio a agricultura irrigada.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de ressaltar que o DNOCS está consciente de que é necessário mudar para vencer os novos desafios.
Com uma estrutura administrativa pesada e arcaica, o DNOCS deverá ser alvo de um reestruturação que prevê sua modernização. Proposta nesse sentido está em exame no âmbito do Ministério do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, devendo passar em seguida ao Ministério da Administração para, finalmente, ser apresentada à Presidência da República. Isso será um grande avanço para o DNOCS, principalmente o fato de ter sido embutida a mudança de suas atribuições no projeto de reestruturação. Com isso, ele passaria a ter as suas ações voltadas especificamente para o desenvolvimento e aproveitamento dos recursos hídricos, não mais tendo um caráter abrangente de desenvolvimento regional.
É prevista ainda a abertura de concurso público para o órgão que perdeu muito dos seus servidores com aposentadorias. Nesses 86 anos de atividade, apesar de erros cometidos em seu processo de aprendizagem, o DNOCS deixou na região inúmeras obras que mantiveram as populações em seus lugares de origem e evitaram tragédias quando da ocorrência das secas.
Ainda hoje, o papel estratégico da água no semi-árido reflete-se na necessidade indiscutível de haver uma agência federal para cuidar da captação, preservação e gestão da água dos reservatórios de caráter estratégico. O DNOCS, portanto, teria as seguintes responsabilidades: sua missão constitucional passaria a ser a gestão integral das principais bacias do semi-árido e a implantação e operação dos reservatórios estratégicos, a distribuição de maneira equilibrada dos encargos entre a União e os governos estaduais e municipais, quanto às questões de água e clima no semi-árido; a construção e operação da infra-estrutura básica de apoio à agricultura irrigada, que seria implantada e administrada pelo setor privado, com o respaldo dos governos estaduais e municipais e ainda a responsabilidade de avançar nas atividades de desenvolvimento da piscicultura de águas interiores, em articulação com os governos estaduais, principalmente quanto às tarefas de extensão e assistência técnica aos produtores.
Hoje o DNOCS deverá liderar essa nova etapa, porém com a clara diretriz de que os investimentos realizados, reconhecidamente elevados, terão otimizados seus retornos econômicos e sociais, não se constituindo em agravo aos contribuintes do resto do País. Há plena possibilidade do semi-árido sedear pólos agroindustriais prósperos, reter a população e contribuir efetivamente para o desenvolvimento nacional.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.