Discurso no Senado Federal

CRITICAS AO ANUNCIADO ACORDO ENTRE O GOVERNO E LIDERES PARTIDARIOS NO SENADO, NO SENTIDO DA APROVAÇÃO DA MEDIDA PROVISORIA 1.179/95, QUE PROPÕE A REESTRUTURAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • CRITICAS AO ANUNCIADO ACORDO ENTRE O GOVERNO E LIDERES PARTIDARIOS NO SENADO, NO SENTIDO DA APROVAÇÃO DA MEDIDA PROVISORIA 1.179/95, QUE PROPÕE A REESTRUTURAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
Aparteantes
José Eduardo Dutra, José Fogaça.
Publicação
Publicação no DSF de 17/11/1995 - Página 3219
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • CRITICA, ACORDO, GRUPO PARLAMENTAR, LIDERANÇA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), APROVAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), REESTRUTURAÇÃO, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, GAZETA MERCANTIL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DIVULGAÇÃO, DEFICIT, TESOURO NACIONAL.
  • ANALISE, CRITICA, PROPOSTA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), REFORÇO, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, ATUAÇÃO, BANCOS, DOAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, POLITICO, MEMBROS, COMISSÃO, ANALISE, MEDIDA PROVISORIA (MPV), SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.

O SR. EDUARDO SUPLICY (PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador José Sarney, Srªs e Srs. Senadores, na última terça-feira, o Ministro da Fazenda, Pedro Malan, chamou ao seu gabinete os Líderes dos diversos Partidos e de lá saíram esses Senadores, porta-vozes do Ministro da Fazenda, com a notícia, colocada nos jornais de quarta-feira, de que o Governo fez um acordo com o Senado para aprovar a medida provisória dos bancos.

Ora, Sr. Presidente, pergunto se o Senado compreende apenas os Senadores que apóiam o Governo ou se o Senado é composto também por Senadores que pertencem ao Partido dos Trabalhadores, ao Partido Socialista Brasileiro, ao PPS, ao PDT, porque, senão, ficam fáceis as coisas!

A Comissão de Assuntos Econômicos havia marcado para o próximo dia 21 a exposição do Ministro da Fazenda, Pedro Malan, e do Presidente do Banco Central, Gustavo Loyola, para virem discutir em sessão pública, aberta, a medida provisória que propõe a reestruturação do sistema financeiro nacional. Ora, Sr. Presidente, será que só o fato de os Senadores irem ao gabinete do Ministro da Fazenda e ali ouvirem as suas razões já é o bastante para eles se colocarem inteiramente de acordo com a proposta do Governo?

Segunda-feira, o Líder do Governo, Jader Barbalho, fez um pronunciamento de críticas severas ao Governo, por ter anunciado essa medida às 4h da manhã da madrugada de sábado. Os Senadores compreenderam as razões pelas quais a medida provisória foi publicada, diante das explicações do Ministro da Fazenda, Pedro Malan: ela ficou pronta às 21h de sexta-feira, foi encaminhada ao Palácio do Alvorada, e, como o Presidente estava jantando, só terminou de ler, avaliar e assinar o texto à meia-noite. Então, foi por essa razão que a medida provisória, segundo o próprio Ministro, demorou dias para ser estudada e elaborada e, só então, foi divulgada.

Em vista dessa explicação, o Senador Líder do PMDB, Jader Barbalho, designa para presidir a Comissão Mista que vai examinar o assunto o Senador Ney Suassuna. S. Exª veio à tribuna do Senado, terça-feira, para afirmar que, embora não esteja de acordo com o processo de socialização de prejuízos, se deu por satisfeito com as explicações do Ministro Pedro Malan.

Ora, Sr. Presidente, Srs. Senadores, preocupa-me sobremaneira o que está por acontecer. Espero que o Ministro da Fazenda, respeitando todos os Partidos, e não apenas aqueles que estão dispostos a simplesmente aceitar suas explicações a portas fechadas, venha a esta Casa na próxima terça-feria, conforme previsto, a fim de explicar por que razão o Governo se encontra em situação extremamente difícil. Ainda ontem, S. Exª anunciou que, ao contrário das expectativas governamentais, está ocorrendo déficit, pois os gastos estão superando as despesas neste ano; apesar de a receita governamental de 1995, até o presente momento, estar muito superior àquela que o próprio Governo estava prevendo há algum tempo; apesar de o Governo estar com uma arrecadação muito significativa, apesar de a receita governamental deste ano ser da ordem de 30% do Produto Interno Bruto; apesar de ter havido uma receita significativa por causa da ampliação da atividade econômica - ainda que tenha havido decréscimo da atividade nos dois últimos trimestres, por causa do esforço ainda não suficiente para se garantir maior receita e menor evasão fiscal -, o fato concreto é que o Governo está com um significativo déficit, que resulta, dentre outras razões, de algo que havíamos advertido no ano passado e em anos anteriores sobre os acordos da dívida externa.

A Gazeta Mercantil de 14/15 de novembro informa:

      "O déficit de caixa do Tesouro Nacional (receitas menos despesas) superou R$1 bilhão em outubro. (...) As receitas do Tesouro atingiram R$6,8 bilhões e as despesas, que ainda estão sendo detalhadas, podem ter ultrapassado R$7,9 bilhões.

      O desembolso de US$2,2 bilhões com o pagamento de juros e do principal da dívida externa é apontado como o principal fator de desequilíbrio de caixa do Tesouro no último mês. (...) Só o Clube de Paris (que reúne os credores governamentais) recebeu U$410 milhões. Os demais compromissos com credores privados e o pagamento de garantias para a dívida renegociada ultrapassaram U$1,8 bilhão.

O déficit ocorreu apesar de a arrecadação de impostos e contribuições terem ficado dentro das expectativas oficiais, em torno de R$7 bilhões.

Pelo menos, Sr. Presidente, estamos agora constatando aquilo para que tínhamos chamado a atenção quando da apreciação dos acordos da dívida externa: que se estava aprovando um fluxo de compromissos acima da nossa capacidade de pagamento, que poderia resultar em dificuldades.

O Sr. José Fogaça - Senador Eduardo Suplicy, permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY - Com muita honra, Senador José Fogaça. Só pediria que aguardasse mais um instante para que possa completar um pensamento sobre o conteúdo explícito da medida provisória.

Esse programa de estímulo à reestruturação e ao fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional, em seu art. 1º, diz:

      "Art. 1º - O Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional, instituído pelo Conselho Monetário Nacional, com vistas a assegurar liquidez e solvência do referido Sistema e a resguardar os interesses de depositantes e investidores, será implementado por meio de reorganizações administrativas, operacionais e societárias, previamente autorizadas pelo Banco Central do Brasil.

      § 1º O Programa de que trata o caput aplica-se inclusive às instituições submetidas aos regimes especiais...

      § 2º O mecanismo de proteção a titulares de créditos contra instituições financeiras, instituído pelo Conselho Monetário Nacional, é parte integrante do Programa de que trata o caput.

      Art. 2º. Na hipótese de incorporação, aplica-se às instituições participantes do Programa a que se refere o artigo anterior, o seguinte tratamento tributário:

      I - A instituição a ser incorporada deverá contabilizar como perdas os valores dos créditos de difícil recuperação, observadas, para esse fim, normas baixadas pelo Conselho;

      II - As instituições incorporadoras poderão registrar com ágio, na aquisição do investimento, a diferença entre o valor de aquisição e o valor patrimonial na participação societária adquirida;

      III - As perdas de que trata o inciso I deverão ser adicionadas ao lucro líquido da instituição a ser incorporada, para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.

      IV - Após a incorporação, o ágio a que se refere o inciso II, registrado contabilmente, poderá ser amortizado, observado o disposto no inciso seguinte;

      V - Para efeito de determinação do lucro real, a soma do ágio amortizado com o valor compensado dos prejuízos fiscais e períodos-base anteriores não poderá exceder, em cada período-base, trinta por cento do lucro líquido, ajustado pelas adições e exclusões previstas na legislação aplicável;

      VI - O valor do ágio amortizado deverá ser adicionado ao lucro líquido, para efeito de determinar a base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.

Ora, Senador José Fogaça, preocupa-me que o Governo, diante de uma situação de déficit difícil como essa, venha a abrir mão de receitas que no ano que vem aconteceriam. O Governo, para as instituições financeiras, dispõe de uma renúncia fiscal ou coloca a possibilidade de uma renúncia fiscal significativa em instituições que tenham um comportamento mais saudável, que estejam economicamente registrando lucros e poderão absorver instituições. Apesar das altíssimas taxas de juros praticadas pelo Sistema Financeiro Nacional, decorrentes da política econômica monetária - taxas de juros recordes a nível mundial, em termos reais -, que visa, entre outros propósitos, de um lado, tentar estabilizar a moeda, e, de outro lado, inequivocamente, possibilitar às instituições financeiras que tenham um comportamento altamente lucrativo, ainda assim, as instituições financeiras tiveram prejuízo.

Pois bem, aquelas que tiveram lucro vão poder amortecer, vão poder colocar como prejuízo o resultado negativo daquelas instituições financeiras que vierem a absorver.

Isso me preocupa. Esse é o caminho de salvação das instituições para proteger os correntistas e investidores - isso é importante - como também para proteger a estabilidade da moeda. Mas a que custo? Quem vai ser beneficiado com tal procedimento?

Preocupa-me também, Senador José Fogaça, aquilo que agora talvez tenhamos melhor possibilidade de compreender: as autoridades monetárias pressionaram o BANESPA para que publicasse um balanço que iria registrar um patrimônio líquido negativo da ordem de R$6 bilhões. O Governador Mário Covas tem procurado demonstrar que o Governo de São Paulo, reconhecendo sua dívida para com o BANESPA, está tentando conseguir liquidez para o patrimônio do Estado de São Paulo, e, com isso, pagar ao BANESPA, para que não seja preciso o registro desse patrimônio líquido negativo.

Mas qual seria a conseqüência do registro de um patrimônio líquido negativo da ordem de R$6 bilhões pelo BANESPA?

Diante dessa nova medida provisória, se publicado aquele resultado negativo, abrir-se-ia a possibilidade de uma instituição financeira privada com resultado positivo abater esse montante daquilo que teria de pagar de Imposto de Renda até o limite de 30%, mas também ficando para os anos posteriores ainda a possibilidade pendente, e com isso diminuir significativamente o Imposto de Renda a pagar.

Fico até me perguntando se não está, agora, mais explícita e clara a razão pela qual as autoridades monetárias estavam insistindo tanto para se publicar o resultado financeiro do BANESPA com o patrimônio líquido negativo, o que, potencialmente, no caso de sua privatização, implicaria em grande possibilidade de não pagar tanto Imposto de Renda por parte da instituição que iria absorvê-lo, na hipótese de ocorrer a sua privatização.

São questões, nobre Senador José Fogaça, que quero ver respondidas, tanto pelo Presidente do Banco Central quanto pelo Ministro Pedro Malan. Espero que ambos venham, terça-feira próxima, perante a Comissão de Assuntos Econômicos e perante a Comissão Mista, porque a previsão é que ambas as Comissões possam ouvi-los simultaneamente.

O Sr. José Fogaça - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY - Com muita honra, Senador José Fogaça.

O Sr. José Fogaça - Nobre Senador Eduardo Suplicy, quero me reportar àquela parte do seu pronunciamento em que pedi a intervenção que agora estou fazendo. V. Exª fazia referência à dívida externa como uma das causas fundamentais desse déficit operacional do Governo. Sabemos perfeitamente que esse trimestre teve uma caracterização absolutamente peculiar. Nós mesmos, aqui, no plenário do Senado, num debate do qual V. Exª e eu participamos, autorizamos o Governo a fazer um adiantamento nas garantias. De modo que há uma concentração desses pagamentos no período ao qual se refere V. Exª. Não poderíamos, por aí, julgar o acordo da dívida externa, mas, sim, pela enorme diferença que hoje há entre a taxa de juros que é paga externamente e a taxa de juros que é paga internamente. Sabemos que o grave, o terrível crescimento que se deu no processo de comprometimento das finanças públicas foi ao nível interno. É esse o efeito mais bombástico, mais nocivo que vem ocorrendo nas finanças do País. Sabemos perfeitamente que os juros que são pagos na dívida externa são da ordem de 4% ou até 6%, juros que até em nível de sistema financeiro internacional são, historicamente, muito baixos. Por outro lado, nós que chegamos a ter, em períodos anteriores, uma dívida externa quase que correspondente a 50% do PIB, poderemos chegar ao ano que vem, graças ao modelo de acordo que foi feito, a um patamar de 31%, o que significa que a dívida externa brasileira vem caindo consistentemente e que o acordo, portanto, foi bom para o País. Por outro lado, é importante lembrar que nós, aqui, autorizamos essas garantias e por isso esse adiantamento foi feito, concentrando uma evasão de recurso maior nesse período. Estávamos interessados em que, subseqüentemente, o Governo apresentaria, também, um pedido de autorização para emitir US$5 bilhões em títulos do Tesouro Nacional, a serem colocados no mercado externo. Ou seja, o adiantamento de garantias só foi feito porque abriria as portas para o Brasil desse mercado de títulos, em nível internacional, do qual ficamos fora por cerca de 15 anos. Então, acredito que V. Exª não está dizendo uma inverdade, V. Exª está fazendo um registro dos fatos. Realmente, houve um crescimento do comprometimento das finanças públicas nesse período, em função da dívida externa, mas trata-se de um fator peculiar, não permanente, passageiro e muito próprio dessa decisão que foi soberanamente tomada pelo Brasil, com a aprovação, inclusive, do Senado. Faço apenas esse registro, sem desautorizar V. Exª a ter a interpretação que, evidentemente, V. Exª sempre teve, desde o início, a respeito dessa matéria. Mas, como Relator que fui do acordo da dívida externa, como acompanho pari passu o assunto, me preocupo sempre em verificar o quanto isso, realmente, pesa e o quanto tem custado para o Brasil. De lá para cá, só tenho visto e constatado que, ao contrário do que se anunciava ou do que muita gente previa, o Brasil só ganhou com o acordo que fez no âmbito das suas dívidas com os bancos internacionais. Se puder, de alguma forma, dar a minha solidariedade a V. Exª quanto à questão referida no Ministério da Fazenda, eu a dou inteiramente. V. Exª tem toda a razão, e não é possível que o Ministro da Fazenda dê explicações para representantes do Governo, ou representantes de setores que apóiam o Governo, entre os quais eu me incluo, e não dê explicações, satisfações amplas e convincentes, também, aos representantes da oposição, que merecem toda a dignidade de tratamento que qualquer membro desta Casa merece. Obrigado a V. Exª.

O SR. EDUARDO SUPLICY - Agradeço a solidariedade do Senador José Fogaça, até porque eu compareci ao Banco Central, onde o Presidente Gustavo Loyola e o Diretor de Política Monetária, Alkimar Moura, deram explicações, algumas das quais ainda incompletas. Eu, por exemplo, solicitei a ambos e aos técnicos que me receberam que me fornecessem - pedindo que isso me fosse chegado às mãos até terça-feira de tarde, e ainda não chegou - um exemplo concreto de qual seria, hipoteticamente, a situação de um banco A absorvendo um banco B, o primeiro com resultado positivo e o segundo com resultado negativo, diante das modificações decorrentes da medida provisória, porque desejo fazer uma análise e uma crítica, aqui, bem informado. Inclusive transmiti a ambos que não é meu propósito estar aqui fazendo qualquer afirmação que possa estar resultando em instabilidade do sistema financeiro.

Também compreendo a responsabilidade das autoridades financeiras. Penso que há prós e contras na questão dos acordos com os credores internacionais. Sei que o Ministro provavelmente irá dizer que, se não fizéssemos o acordo, teríamos outros motivos de instabilidade, do ponto de vista da credibilidade junto aos investidores internacionais, às instituições internacionais. Por outro lado, o que eu quis apontar, e penso que poderemos até ter um cuidado grande ao examinar em que medida estamos ou não satisfazendo a capacidade doméstica...

O SR. José Eduardo Dutra - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY - Pois não, nobre Senador.

O SR. José Eduardo Dutra - Senador Eduardo Suplicy, como V. Exª já registrou, foi aprovado, na semana passada, um requerimento na Comissão de Assuntos Econômicos, convocando o Ministro Pedro Malan e o Presidente do Banco Central para comparecerem àquela Comissão, no sentido de darem explicações sobre a medida provisória da fusão dos bancos. Espero que essas negociações que vêm sendo entabuladas por algumas Lideranças do Senado não sejam usadas como justificativa para que S. Exªs não compareçam, até porque não é apenas a imprensa que tem divulgado que o Governo fez um acordo com o Senado. O próprio jornal do Senado diz: "Os Senadores negociam e a MP dos bancos muda". Esperamos que isso não seja usado para justificar a ausência dos Ministros. Agora, o que me surpreende é a presteza com que o Governo toma uma medida no sentido de, segundo ele, resolver um problema que pode se tornar sério, do sistema financeiro brasileiro. Quando sabemos que, tanto no primeiro semestre como agora, surgiram reclamações de diversos setores da economia brasileira com relação a problemas que eles vêm encontrando, decorrentes seja da estabilização da moeda, seja, por exemplo, das alíquotas de importação. É o caso da indústria têxtil brasileira, que vem tendo problemas sérios em função de importações, particularmente da China; é o caso da indústria de calçados; da indústria de coco no Nordeste, que, com a importação de coco da Malásia, está sofrendo as conseqüências; algumas indústrias desse setor estão quebrando. No entanto, o Governo não tomou nenhuma posição em relação a esses setores. Bastou que alguns bancos - justamente o setor mais privilegiado ao longo dos anos, que mais ganhou dinheiro em decorrência da inflação alta no Brasil, que foi o sistema financeiro - bastou que alguns bancos começassem a dar sinal amarelo, rapidamente o Governo lança uma medida provisória, que tem alguns aspectos altamente questionáveis. Argumentam que a fusão é uma tendência mundial. Isso é lógico, é da própria essência do capitalismo a concentração cada vez maior, seja no sistema financeiro, seja na parte industrial, comercial etc. A grande discussão é saber se o Tesouro dos outros países libera recursos para viabilizar essa fusão. Recentemente aprovamos aqui no Senado um imposto para a saúde, que deve arrecadar entre 5 e 6 bilhões de dólares num ano. Estimativas feitas dão conta de que serão necessários de 12 a 13 bilhões de reais para sanear o sistema financeiro. Um dos critérios para se estudar a admissibilidade de uma medida provisória está exatamente na questão da sua urgência. Ora, existem alguns aspectos de extrema urgência no Brasil, como, por exemplo, a reforma agrária. Existe uma série de iniciativas tramitando no Congresso Nacional, que se relaciona com o rito sumário da desapropriação, com relação a liminares de reintegração de posse. Eu mesmo tenho um projeto relativo à expropriação de áreas onde seja detectado trabalho escravo. Tivemos uma audiência com o Dr. Francisco Grazziano e ouvimos dele que o Governo está procedendo a um estudo para agilizar e sistematizar os diversos projetos em tramitação no Congresso. Tenho certeza de que se o Governo editasse uma medida provisória para resolver essas questões relativas aos projetos em tramitação e que agilizariam a reforma agrária, não haveria nenhuma repulsa por parte do Congresso Nacional no sentido de se estar utilizando uma medida provisória, até porque não existem emendas no Congresso Nacional extinguindo-as; existem regulamentando, limitando o uso dessas medidas. Portanto, gostaríamos de estranhar a presteza com que o Governo agiu em relação ao sistema financeiro, coisa que não acontece em relação a outros setores da economia nacional. Muito obrigado.

O SR. EDUARDO SUPLICY - Agradeço o aparte, Senador José Eduardo Dutra. As questões que V. Exª levanta são extraordinariamente pertinentes.

Finalmente, Sr. Presidente, gostaria de registrar minha preocupação - e acredito que esta deva ser matéria de grande relevância e preocupação para o Presidente do Congresso Nacional, Senador José Sarney - com o que a imprensa tem publicado, como, na última semana, Elio Gaspari relatou em sua coluna: "Pró-garfo ganhou o relator do programa". E hoje a Folha de S. Paulo registra que "os bancos doaram a políticos que analisam a medida provisória", registrando que o sistema financeiro investiu R$988 mil na campanha eleitoral, e que oito membros da Comissão Mista confirmam que receberam dinheiro em 1994, nas eleições.

A indagação que deixo aqui, Sr. Presidente, é se esses parlamentares sentem-se eticamente em posição confortável para relatar, votar essa medida provisória que diretamente coloca os acionistas do sistema financeiro brasileiro, sobretudo os controladores, num grau de cidadania superior ao dos acionistas de outras empresas dos demais setores produtivos. Para o setor financeiro, estão-se definindo situações pelas quais eles passam a ser cidadãos incomparavelmente superiores, em termos de direito, a outros cidadãos brasileiros. Essa é uma preocupação que precisa ser objeto da reflexão do Congresso Nacional.

Sr. Presidente, peço que seja transcrita nos Anais do Senado esta matéria da Folha de S. Paulo, caderno 2-3: "Bancos doaram a políticos que analisam Medida Provisória.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/11/1995 - Página 3219