Discurso no Senado Federal

CARTA ABERTA SUBSCRITA POR S.EXA., EM RESPOSTA AS DECLARAÇÕES DO EX-GOVERNADOR DO RIO DE JANEIRO, SR. LEONEL BRIZOLA, A PROPOSITO DOS INCIDENTES QUE ENVOLVERAM POLICIAIS E MEMBROS DOS SEM-TERRA, NA CIDADE DE SANTA ISABEL DO IVAI-PR.

Autor
Luís Alberto de Oliveira (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/PR)
Nome completo: Luís Alberto Martins de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • CARTA ABERTA SUBSCRITA POR S.EXA., EM RESPOSTA AS DECLARAÇÕES DO EX-GOVERNADOR DO RIO DE JANEIRO, SR. LEONEL BRIZOLA, A PROPOSITO DOS INCIDENTES QUE ENVOLVERAM POLICIAIS E MEMBROS DOS SEM-TERRA, NA CIDADE DE SANTA ISABEL DO IVAI-PR.
Aparteantes
Geraldo Melo, Marina Silva, Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 18/11/1995 - Página 3254
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • LEITURA, CARTA, CRITICA, ATUAÇÃO, LEONEL BRIZOLA, EX GOVERNADOR, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), MOTIVO, COMENTARIO, PARTICIPAÇÃO, POLICIA MILITAR, ESTADO DO PARANA (PR), DESPEJO, TRABALHADOR RURAL, SEM-TERRA.
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, VIOLENCIA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), EFEITO, ADMINISTRAÇÃO, LEONEL BRIZOLA, EX GOVERNADOR.

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA (PTB-PR. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, o Paraná não é terra de ninguém. Essa afirmação se impõe antes de iniciarmos uma análise das declarações do ex-Governador do Rio de Janeiro, Sr. Leonel Brizola, a propósito do incidente ocorrido semana passada em Santa Isabel do Ivaí, interior do Paraná.

Lá, houve um incidente entre trabalhadores sem-terra e pessoas que não eram trabalhadores sem-terra - havia até traficantes de drogas. A valorosa Polícia Militar do nosso Estado foi convocada para cumprir ordem judicial de despejo em área particular, invadida por cerca de 300 pessoas, o que resultou em ferimentos.

O Sr. Leonel Brizola, provavelmente no intervalo entre o pastoreio de suas ovelhas no latifúndio do Uruguai e o seu ócio remunerado num apartamento de frente para o mar, no Rio de Janeiro, resolveu dar um conselho ao Governador eleito por todos os paranaenses, Jaime Lerner.

Pois bem, já que S. Exª assim agiu, vou responder, como representante popular eleito sucessivamente pelo voto da generosa gente paranaense, com uma carta aberta a S. Exª, o ex-Governador do Rio de Janeiro, que está vazada, Sr. Presidente, nobres Srs. Senadores, nos seguinte termos:

      "No Paraná não, Governador Leonel Brizola!

      Os brasileiros do Paraná, entre perplexos e assustados, tomaram conhecimento, através da leitura dos jornais, dos conselhos na área de segurança que o Governador Brizola deu ao Governador do Estado do Paraná, Jaime Lerner.

      Falta-lhe, Governador Brizola, autoridade moral para dar palpites na área de segurança e sobram-lhe provas de incompetência para administrar esse setor vital da sociedade brasileira.

      No seu Governo, Governador Brizola, instalou-se o clima de conluio entre a polícia e o crime organizado e campeou, impunemente, a corrupção nas polícias civil e militar".

      Denunciou-se - pasmem, Srs. Parlamentares - que diletos amigos e companheiros do Governador Brizola recebiam propinas dos contraventores bicheiros. Foi preciso que um Procurador, nascido no Paraná, Dr. Antônio Carlos Biscaia os denunciasse para que a Juíza Denise Frossard os colocasse na cadeia. No Paraná, Governador Brizola, político e Vice-Governador não recebem propina do crime organizado.

      O retrato de sua incúria em manter a ordem pública transformou lamentavelmente as fotos da chacina da Candelária num cartão postal da violência do Rio de Janeiro, que se transmitiu ao mundo todo ao invés da beleza, das imagens da Cidade Maravilhosa, que, no passado, todos os brasileiros e o mundo aprenderam a admirar.

      No seu Governo, Governador Brizola, a marca da violência, do seqüestro diário, do assalto aos brasileiros do Rio, do despreparo policial, da permissividade e da cumplicidade das autoridades e criminosos do tráfico de drogas e de justiceiros e de ladrões de toda a espécie.

      No Paraná, não aceitamos esse clima de terror e intranqüilidade Governador Brizola. Nossa gente, ordeira e pacífica, quer viver sob a égide da lei e da justiça, num clima de fraternidade social, único caminho para se realizar um País justo e democrático.

      No Paraná, Governador Brizola, se respeitam ordens judiciais e se admira, sim, uma polícia ágil e competente, capaz de dar lições de competência ao Brasil como no caso dos crimes de seqüestro na cidade interiorana da Marechal Cândido Rondon que as televisões e os jornais mostraram ao Brasil inteiro. E no Rio de Janeiro, Governador Brizola, como eram no seu Governo tratadas as questões relativas a seqüestro?

      Por isso, com a autoridade de representante popular, eleito em sucessivas eleições pela generosa vontade da gente paranaense, dou-lhe também de graça, Governador Leonel Brizola, um conselho: vá dar suas idéias e conselhos à polícia do seu Estado, o Rio, que, como o Paraná, lhe derrotou nas últimas eleições; ou ainda pastorear suas ovelhas no seu latifúndio do Uruguai.

O Sr. Romero Jucá - Senador Luiz Alberto, permita-me V. Exª um aparte?

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - Com muito prazer.

O Sr. Romero Jucá - Senador Luiz Alberto, não sou político do Paraná e nem tenho mandato pelo Estado do Paraná. Ao contrário, tenho um mandato pelo Estado de Roraima, um Estado distante que também foi colonizado por paranaenses, que, ordeiramente, trabalham e contribuem com o meu Estado. Por conta disso, tenho uma grande afinidade com o povo do Paraná. Ousei pedir este aparte para fazer um breve comentário sobre duas questões. A primeira delas é sobre um fato específico: o conflito, fato que gerou esse aconselhamento pelo ex-Governador Leonel Brizola. Estranhamente, temos visto crescer no País a invasão de terras. Todos somos favoráveis à reforma agrária, a que o homem do campo tenha onde plantar, a que haja recursos para se ampliar a produção agrícola do País. Entretanto, ninguém pode ser favorável à invasão de propriedades, à violência e ao tipo de ação que está descambando para o desrespeito às leis. E foi exatamente no respeito às leis que se pautou a ação do governo e da polícia do Estado do Paraná. Foi exatamente cumprindo uma determinação judicial que a polícia do Estado do Paraná agiu para liberar a área determinada pela Justiça. Estranhamente, àqueles que, cumprindo a lei, executaram a ação, estão-lhe sendo colocados a pecha, estão-lhe sendo feitas acusações infundadas. Pergunto: em que país estamos? Quem cumpre a lei é acusado e é pedida sua cabeça; quem não a cumpre é exaltado e vira ídolo. Não podemos continuar assim. Entendo que a Justiça e a polícia paranaense agiram em conformidade com a determinação judicial. Não questiono o mérito da decisão judicial, como também não cabia à polícia do Paraná questionar o mérito da decisão judicial. Esta a primeira ponderação que gostaria de fazer. A segunda é lamentar que, infelizmente, em cima desse fato, tenha surgido um aconselhamento, sobre essa questão, de uma das figuras que jamais poderia tratar de questões de polícia em nosso País: o ex-Governador Leonel Brizola. S. Exª pode falar sobre tudo, como, por exemplo, agricultura, viagens internacionais, socialismo, enfim, sobre qualquer coisa, mas não tem, infelizmente, autoridade moral, no Brasil de hoje, para falar sobre segurança pública, porque os seus dois governos deixaram no Rio de Janeiro seqüelas que não se sabe como serão resolvidas. A criminalidade, o seqüestro, o tráfico de drogas, tudo isso é fruto do desserviço, da falta de atuação da polícia do Rio de Janeiro na gestão Leonel Brizola, do pacto político que se fez com o morro, com os traficantes, com os bandidos, com os bicheiros, enfim, com quem mandava no crime organizado no Rio de Janeiro para eleger políticos.

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - E é esse clima que não queremos no Estado do Paraná, eminente Senador.

O Sr. Romero Jucá - Por isso, entendo que o ex-Governador Leonel Brizola jamais poderia se arvorar de autoridade na área de segurança para dar conselhos ao povo ordeiro do Paraná. Gostaria de expor esse meu repúdio, apoiando as palavras de V. Exª. Espero que o Governador Jaime Lerner demonstre que tem posições próprias. Comenta-se muito, no PDT, que o ex-Governador Leonel Brizola manda e os outros obedecem. Acredito que essa seja uma grande oportunidade para o Governador Jaime Lerner demonstrar que tem autonomia e posições próprias, e que S. Exª é quem governa o Estado do Paraná e não, felizmente, o ex-Governador Leonel Brizola. Meus parabéns.

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - Não há dúvida. O Governador do Estado do Paraná é um governador eleito pelos paranaenses e, seguramente, não será um "pau mandado" do caudilho Leonel Brizola.

Mas gostaria até de, agradecendo o aparte enriquecedor de V. Exª, nobre Senador Romero Jucá, que honra o meu modesto pronunciamento, dizer que, no Paraná, no passado, também tivemos outros incidentes.

Lamentavelmente, em 1991/1992, houve um conflito na região oeste do Estado, perto da cidade de Cascavel, onde a polícia teve um entrevero com os sem-terra. E, naquela ocasião, dois policiais foram assassinados pelos líderes dos sem-terra. Em reprimenda a esse fato, a polícia militar foi atrás do líder dos sem-terra, um senhor chamado de Teixeirinha e o metralhou, em uma choupana, com mais de 35 tiros de fuzil, arma exclusiva das Forças Armadas. Isso ocorreu no Governo do nosso colega Senador Roberto Requião, por sua ordem.

Por que, naquela ocasião, o Governador Leonel Brizola não solicitou ao Governador Roberto Requião que exonerasse o seu secretário de segurança? Por que S. Exª, o ex-Governador do Rio de Janeiro, Leonel Brizola, não exonerou o seu próprio secretário de segurança na chacina da Candelária, que envergonhou a Nação brasileira? Por que só agora, depois de derrotado pelas urnas, caminhando para o ostracismo político definitivo, é que o ex-Governador Brizola pretende, dessa forma, incendiar o campo e trazer a intranqüilidade à Nação brasileira, num momento em que todos nós - disse-o bem o Senador Romero Jucá - queremos resolver o angustiante problema dos homens sem-terra neste País? Nós também queremos fazer com que a agricultura tenha um novo zoneamento, tenha um novo planejamento, tenha melhores condições de fazer com que o setor primário da economia do País, tão importante para esta Nação de dimensão continental, seja bem atendido.

Sr. Presidente, Srs. Parlamentares, será que é com esse tipo de conselho: "desrespeitem a lei, não cumpram ordem judicial", que se resolverão os conflitos agrários neste País?

O Sr. Geraldo Melo - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - Pois não, nobre Senador.

O Sr. Geraldo Melo - Em primeiro lugar, desejo cumprimentar V. Exª pela marcante intervenção que faz nesta manhã, a qual muito alegra a todos aqueles que, como eu, tem com V. Exª uma relação antiga de amizade e de respeito e compreendem o quanto V. Exª pode contribuir para a grande obra de construção da nova sociedade brasileira.

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - O respeito é mútuo, eminente Senador.

O Sr. Geraldo Melo - Obrigado, Senador. Apenas queria assinalar a importância das observações que V. Exª está trazendo e a oportunidade de produzir uma reflexão a respeito de questões tão importantes como aquelas que estão por trás de todo esse pequeno momento do ex-Governador Leonel Brizola. S. Exª, realmente, assume uma dimensão que não está à altura da sua biografia, da sua história, do passado político de homem público que viveu momentos tão importantes da vida política do País. É pena que, em um episódio como esse, S. Exª perca a dimensão que deveria ter como estadista para assumir a simples dimensão do demagogo vulgar. Porque uma coisa é defender a reforma agrária. A defesa da reforma agrária se baseia na necessidade econômica da modernização do nosso País, que se faz na indústria, nos serviços, no comércio exterior, no Governo, e que tem que se fazer também na agricultura. A mudança na estrutura fundiária deste País faz parte; é um instrumento, uma alavanca nesse processo de modernização. Somente as vozes mais antigas, mais cobertas de poeira, de teia de aranha é que poderiam estar contra um programa de modernização da nossa agricultura, que inclui a reforma agrária. Esse programa de modernização do Brasil deve se apoiar em algo muito sólido, muito robusto, que pode alicerçar o grande salto que este País vai dar, que é a lei. E nem se trata de dizermos aqui qual lei é boa ou ruim. Não pode haver uma autoridade que, para não ferir ou por ser obrigada a ferir algo que protegemos, possa ter a prerrogativa de não cumprir a lei. Essa prerrogativa não pode existir. Daí por que eu mesmo já fiz um pronunciamento em torno da questão dos sem-terra, em que, embora defensor da reforma agrária, não posso ser defensor das invasões de propriedade; isso fere a lei. E se esta Casa, como uma das Casas do Congresso Nacional, só se ocupar em elaborar a lei e aceitar que ela seja jogada na lata do lixo, nós, Senadores, seremos os primeiros a insultar a nossa missão dentro da sociedade brasileira. Se a nossa missão é produzir a lei, temos de ser os primeiros e os mais indignados diante de qualquer tentativa do seu não cumprimento. Portanto, se a lei não serve à modernização da agricultura, se, como está, prejudica a reforma agrária e opõe-se aos propósitos dos que lutam a favor dela, então, que mudemos a lei. Quando houver uma lei nova, que se exija então o seu cumprimento. Mas, até que ela exista, nós desta Casa e todos os democratas deste País temos de nos erguer contra os arreganhos daqueles que procuram dizer que existe legitimidade no não cumprimento da lei. O que faz a diferença entre o estado de arbítrio e o Estado de Direito é exatamente o império da lei contra o império da vontade arbitrária do poderoso. Congratulo-me com V. Exª e com a sua indignação, que está a altura do momento que o Brasil está vivendo, e também com a sua reação, que vem numa oportunidade em que é preciso que as pessoas de responsabilidade reflitam. Tudo isso honra o papel que V. Exª desempenha nesta Casa. Quis participar modestamente do seu discurso, para me congratular com a contribuição que V. Exª nos traz.

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - Agradeço o aparte de V. Exª. Evidentemente, não foi modesta a sua contribuição; modesto foi o meu pronunciamento.

A colocação de V. Exª - um político que o Brasil inteiro aprendeu a admirar, não só pela sua vivência no Parlamento, mas por sua excelente obra administrativa frente ao Governo do Rio Grande do Norte - honra este humilde Parlamentar do Paraná, assim como as suas palavras e a sua ponderação, que são de um homem experiente, vivido e que, como nós, deseja que o País se desenvolva com justiça social, num clima de democracia e de respeito à lei e à ordem.

A Srª Marina Silva - V. Exª me concede um aparte?

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - Com muito prazer, Senadora Marina Silva.

A Srª Marina Silva - Senador Luiz Alberto, em primeiro lugar, quero cumprimentar-lhe por trazer nesta sexta-feira - pouco concorrida mas não menos importante, dada a nossa presença aqui - um debate dessa magnitude. Embora eu seja uma voz discordante das posições aqui defendidas por V. Exª - pelo menos de boa parte delas -, gostaria de tentar contribuir com esta discussão, até porque fica mais interessante se vierem à Mesa os posicionamentos divergentes. Quero também me congratular com o aparte do ilustre Senador Geraldo Melo - por quem tenho o maior respeito -, que agora levantou posições das quais defendo o contrário. Mas é bom que coloquemos a lei em primeiro lugar, senão vira terra de ninguém. Eu mesma, no meu Estado, estou tentando fazer com que a lei se manifeste para punir um Governador. Está difícil! Estou tentando fazer com que a lei também seja válida para os poderosos, como é o caso do nosso Governador que tira madeira ilegalmente de terras indígenas, que comete uma série de irregularidades.

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - Nobre Senadora Marina Silva, concordo integralmente com V. Exª. Se permitir que possamos dialogar, gostaria de dizer que V. Exª, sendo representante do PT, honra o meu pronunciamento com o seu aparte. Ainda há pouco, o Senador Eduardo Suplicy - que estava aqui, mas teve que sair para viajar a São Paulo - dizia-me que estava muito feliz com a Justiça, pois haviam sido liberados dois líderes dos sem-terra que estavam presos. S. Exª fez elogios à Justiça, à lei e à ordem. Também fiquei feliz com isso. E tenho certeza de que V. Exª também respeita as decisões judiciais e deseja o cumprimento da ordem jurídica neste País.

A Srª Marina Silva - No que se refere à questão do Movimento dos Sem-terra, creio que devemos ponderar que a reforma agrária, no Brasil, é algo que precisa acontecer e que já deveria ter sido feita, inclusive no período adequado, ou seja, quando se iniciou o processo de industrialização do País. Esse processo já deveria ter sido acompanhado também pelo de democratização da terra, até como uma forma de alavancar a questão industrial brasileira. Todos os países que se modernizaram e se industrializaram tiveram também uma reforma agrária e promoveram a democratização da terra. No Brasil, infelizmente, isso não aconteceu.

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - V. Exª há de me permitir concordar também com suas colocações e dizer que no Paraná, durante o atual Governo Jaime Lerner, de forma ordeira e pacífica, foram solucionados 51 conflitos de terras. Mais ainda, no meu Estado, eminente Senadora, há uma experiência singular, moderna para resolver o problema dos bóias-frias que, lá, são da ordem de 400 mil; brasileiros que só podem ter emprego de acordo com a sazonalidade da nossa produção agrícola.

Pois bem, o Governador Jaime Lerner, em um ano, implantou mais de 50 vilas rurourbanas, oferecendo casa e terra para os nossos bóias-frias, para os nossos sem-terra. E, ao longo do seu período governamental, S. Exª - que é tido como um administrador modelar e reconhecido até internacionalmente -, irá implantar 700 vilas rurourbanas que irão atender, seguramente, a 400 mil pessoas que hoje não têm casa e não têm um pedaço de terra para trabalhar.

A Srª Marina Silva - Então, concluindo o meu aparte neste diálogo que acabamos entabulando aqui, gostaria de dizer que acredito que, hoje, a pressão que o Movimento dos Sem-Terra faz é legítima. Porque a lei, em muitos momentos, não é cumprida; as promessas de campanha não são cumpridas e as pessoas ficam na expectativa de que seja feita a reforma agrária. Daí, se não é feita da forma institucional, correta, programada, então, os excluídos , até em legítima defesa, para tentar fazer com que valha - digamos - a lei da sobrevivência, promovem ocupações que merecem ser tratadas de acordo com a dimensão social do problema.

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - Concordo, mais uma vez, com V. Exª.

A Srª Marina Silva - Se V. Exª me permitir, eu gostaria de concluir o meu raciocínio. V. Exª é o dono do pronunciamento, tem todo o direito de usar da palavra. Essas pessoas pressionam - é pressão mesmo - no sentido de que as autoridades façam o que já deveria ter sido feito, isto é, façam essas ocupações. Infelizmente, mesmo quando há boa vontade do Governo Jaime Lerner - como V. Exª acabou de dizer - também acontecem episódios desagradáveis. Mas isso, com certeza, não é por culpa do movimento. Fico triste quando vejo um juiz de uma cidadezinha do interior, de Corumbiara, por exemplo, dar uma ordem de despejo, e acontecerem episódios como esse em que 16 pessoas ficaram feridas. Mesmo agora na prisão da esposa do líder do Movimento dos Sem-Terra, Diolinda Alves de Souza, que, graças a Deus, dada a luta, a batalha jurídica travada, se encontra hoje em liberdade. A reforma agrária não pode ser vista apenas como afronta às leis, à propriedade, e sim como direito desses milhares de excluídos de ter um pedaço de terra para morar. Se o processo é demorado e encaminhado não como legítima defesa, aí então promovem-se as ocupações. Mas tal ato é em legítima defesa, é questão de sobrevivência.

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - Agradeço, mais uma vez, o aparte de V. Exª e concordo com 90% do que disse. Só não posso concordar quando diz que a Justiça e a lei devem existir quando beneficia o seu ponto de vista. Quando beneficia ponto de vista contrário, não devemos respeitar a lei e a Justiça? Evidentemente que não deve ser assim. Só é possível vivermos em um Estado Democrático de Direito se houver respeito permanente à lei. Pressionar, sim, mas respeitar as decisões judiciais sempre.

Pessoalmente, sou um defensor da reforma agrária. Compreendo a função social que a terra tem neste País. Sou a favor de que se promovam reformas agrárias, não sou contrário ao movimento de pressão popular legítima em qualquer Governo, em qualquer Estado ou até no País, mas não posso aceitar, eminente Senadora, que esse tipo de raciocínio que V. Exª faz seja o correto.

O Senador Eduardo Suplicy fez a mesma coisa. Libertaram os líderes dos Sem-Terra, então, a Justiça merece parabéns. A Justiça estabeleceu que houve agressão, inclusive coquetel molotov foi jogado contra a Polícia em local onde a terra era produtiva e não deveria sofrer invasão. Então, não devemos respeitar a lei? Para V. Exª a lei só tem uma face?

A Srª Marina Silva - Permita-me, por favor, fazer justiça a mim mesma?

O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - A Mesa lembra ao nobre Orador que seu tempo está esgotado e pede que conclua o seu pronunciamento.

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - Concluirei, Sr. Presidente, mas vou permitir, com muito prazer, que a eminente Senadora Marina Silva se manifeste.

A Srª Marina Silva - Permita-me discordar de V. Exª, quando diz que eu só defendo a lei quando ela favorece o meu ponto de vista. Não a defendo apenas nisso; muito pelo contrário, acabamos de advogar que, quando a lei não está favorecendo os processos de mudança que devem acontecer, ela deve ser mudada. Infelizmente, em muitos momentos, a lei não muda de per si; muitas vezes, muda a partir das pressões feitas pela sociedade. É nesse sentido que o Movimento dos Sem-Terra se coloca como um instrumento de pressão para mudar a lei. V. Exª sabe muito bem que algumas leis não corretas precisam ser mudadas; portanto, muitas delas mudam, mesmo que não haja pressão da sociedade; outras, a partir de pressões legítimas da sociedade. Daí por que, quando a lei não está correta e os que deveriam mudá-la não o fazem, a sociedade, até pela Constituição brasileira, tem o legítimo direito de fazer as pressões para que essas mudanças ocorram. Muitas vezes, temos que admitir que a sociedade anda bem à frente da nossa capacidade de articular as leis.

O SR. LUIZ ALBERTO DE OLIVEIRA - A nobre Senadora não precisa se preocupar com discordâncias eventuais de posicionamentos entre mim e V. Exª. Essa é uma das virtudes da democracia. Esta Casa é para o convívio dos contrários, e cada um tem o direito e o dever de trazer o seu ponto de vista. Muitas vezes, eles são evidentemente confrontantes. Entendo que as pressões populares são legítimas, e este é o fórum adequado para que trabalhemos no aperfeiçoamento do sistema legal brasileiro. Sejam homens ou mulheres, parlamentares ou populares, temos a obrigação de respeitar a lei e de contribuir para um clima de congraçamento, de fraternidade social no nosso País, e não estabelecer clima de terror, de pânico, de crime, de assalto, de seqüestro e de morte como o do Rio de Janeiro. Parece que o Governador Leonel Brizola quer importar esse ambiente para o nosso Estado. O Paraná, aquela terra, tem dono e o seu dono é o homem - são 8 milhões de paranaenses construindo, muitas vezes, em um trabalho solidário, um Estado que responde pela exportação de 20% da produção agrícola nacional. No Paraná, os nossos pequenos proprietários rurais, os paranaenses, oriundos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, construímos uma das mais belas civilizações deste País. Estamos convencidos de que, com o respeito, com a ordem, com o trabalho, com a seriedade e com a dignidade e não assassinatos, iremos construir uma sociedade mais justa e mais fraterna.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/11/1995 - Página 3254