Discurso no Senado Federal

CRITICAS A ADMINISTRAÇÃO DO SR. ORLEIR CAMELI, GOVERNADOR DO ESTADO DO ACRE.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO ACRE (AC), GOVERNO ESTADUAL.:
  • CRITICAS A ADMINISTRAÇÃO DO SR. ORLEIR CAMELI, GOVERNADOR DO ESTADO DO ACRE.
Publicação
Publicação no DCN2 de 06/09/1995 - Página 15463
Assunto
Outros > ESTADO DO ACRE (AC), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • CRITICA, ADMINISTRAÇÃO ESTADUAL, ORLEIR CAMELI, GOVERNADOR, ESTADO DO ACRE (AC), IRREGULARIDADE, GESTÃO, RECURSOS, GOVERNO ESTADUAL.

A SRA. MARINA SILVA (PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, o que me traz à tribuna desta Casa são os tristes episódios que vêm acontecendo no meu Estado, em função da administração desastrosa do Sr. Orleir Camelí. Esses acontecimentos têm contribuído para que os problemas na área de saúde e educação sejam cada vez mais agravados.

O Estado do Acre apresenta um triste quadro: 15.434 casos de malária em 1993; 20.800 pessoas são portadoras crônicas do vírus da hepatite B; mais de 20 mil famílias de seringueiros estão abandonadas à própria sorte; os funcionários públicos do Estado não receberam os salários de novembro, dezembro e 13º - o que gerou uma situação de quase calamidade, porque a única forma de circular dinheiro é através dos parcos recursos oriundos do funcionalismo público -; o governo não tem recolhido os 13% destinados ao Fundo Previdenciário do Estado. Enfim, são inúmeros os problemas que estamos enfrentando.

Pasmem os Srs. Senadores. Numa situação como esta, temos inúmeros casos de irregularidades envolvendo a autoridade maior do nosso Estado. Em 15 de fevereiro de 1995, o Governador do Estado do Acre, Sr. Orleir Camelí, assinou um convênio com a Prefeitura do Município de Cruzeiro do Sul, onde era prefeito. Após ser eleito governador, o Sr. João Barbosa de Souza assumiu aquela prefeitura. Daí por diante, o Secretário da Fazenda, Raimundo Nonato de Queiróz, passou a fazer o pagamento do convênio por meio de ofício, determinando ao Banco do Estado que fosse transferida da Secretaria de Planejamento para a Prefeitura Municipal de Cruzeiro do Sul a quantia de R$80 mil - isso foi da conta do Tesouro estadual. Esse recurso - pasmem os senhores -, que saiu com a argumentação de que iria para a recuperação de ramais, foi exatamente para pagar dívidas da própria empresa, do posto de gasolina do Governador Orleir Camelí, da sua época de campanha.

Temos ainda outros episódios. De acordo com a auditagem realizada pelo Tribunal de Contas, foi constatado o seguinte: os valores monetários dos convênios destinados à recuperação de escolas e estradas vicinais no Município de Cruzeiro do Sul foram parar na conta bancária de uma das empresas do Governador do Estado do Acre, Orleir Camelí, a distribuidora Cameli Comercial Ltda, sediada em Cruzeiro do Sul.

Temos ainda o episódio da BR-364, trecho que liga Feijó a Taraoacá: o Governo do Estado jogou irresponsavelmente mais de US$1milhão - na época era Governador o Sr. Romildo Magalhães -, figurando ali outra empresa do Sr. Governador Orleir Camelí, tudo comprovado conforme documentação da inspeção realizada pelo Tribunal de Contas do Estado do Acre.

O Secretário da Fazenda do Estado do Acre sacou, mediante ofício, R$9 mil e enviou para Fortaleza para ser creditado na conta corrente da empresa POB Transporte Ltda, sem justificativa.

Em face da fiscalização do Tribunal de Contas do Estado do Acre, o Governador do Estado passou a fazer retaliações ao Tribunal de Contas, o que obrigou o Tribunal, através do seu representante, a pedir socorro ao Ministério Público Federal para abertura de inquéritos.

Neste ano, foram gastos aproximadamente R$150 milhões, através de ofício, sem nota de empenho, sem orçamentos, sem contabilidade pública; 90% do orçamento foi pago sem nota de empenho. Isso foi confirmado pelo Secretário da Fazenda, acrescentando que não fazia nada mais do que dar continuidade ao que vinha sendo praticado pelo Governador anterior, Sr. Romildo Magalhães, também do PPR.

Recentemente, houve uma dispensa de licitação para reforma no Hospital de Base e Pronto de Socorro do Estado do Acre, no valor de R$3 milhões, com o pretexto de que o hospital estaria em situação de calamidade. Mas, juridicamente, a dispensa de licitação foi totalmente errônea. Não há calamidade no estabelecimento. Estudos realizados pelo Tribunal de Contas do Estado do Acre mostram indícios de superfaturamento.

No mês de julho, foram abertas licitações para duas rodovias federais. Mas os recursos não constam do Orçamento Geral da União, nem do Orçamento do Estado do Acre e nem das perspectivas legais de diretrizes orçamentárias. O total para essas duas estradas chega a R$200 milhões.

Eu poderia ficar citando inúmeras irregularidades. Poderia, inclusive, mencionar novamente o caso do contrabando do avião. Poderia, ainda, relembrar a carta de intenções assinada com a empresa Mobil Ami, que mais parece uma carta de más intenções para com o Estado do Acre, uma vez que a empresa é de procedimentos duvidosos. E ainda usa-se o artifício de querer hipotecar terras no Estado do Acre no valor equivalente a duas vezes o empréstimo, que era da ordem de US$160 milhões.

Estou fazendo esse pronunciamento como uma obrigação, um dever para com o meu Estado. Neste momento, a população se levanta fazendo abaixo-assinado para que a Assembléia Legislativa faça o impeachment do Governador. Não é possível que o Estado do Acre continue a ser prejudicado em função das irregularidades cometidas. Não é possível, também, que populações sejam prejudicadas pela malversação do dinheiro público. Um Estado que depende de mais de 80% de repasses da União não se pode dar ao luxo, em absoluto, de fazer o que está fazendo com o dinheiro público.

É meu dever, como Senadora, defender os interesses do Estado do Acre enquanto Unidade da Federação. É mais dever ainda defender aquela população sofrida que conheço como a palma da minha mão. Recentemente, estive no Município de Sena Madureira, onde tive a oportunidade de ver pessoas descendo dos altos rios para aquela cidade, por não terem nenhuma perspectiva de sobrevivência nos seringais. Os projetos de colonização estão abandonados, as pessoas estão morrendo de malária e de hepatite, os hospitais não têm as mínimas condições de funcionamento, as escolas não podem oferecer o ano letivo. Realmente, é uma situação de calamidade.

Se porventura a Assembléia Legislativa do Estado do Acre não conseguir a maioria para afastar o Governador, com certeza algo tem que ser feito no âmbito federal, porque não se pode entregar uma população à sua própria sorte. Não é a primeira vez que o Estado do Acre se depara com tal situação. É meu dever fazer aqui esta denúncia, sob pena de estar conivente com todas essas irregularidades a que me referi anteriormente, que a imprensa nacional e local vem noticiando.

Nesse sentido, quero concluir, Sr. Presidente, Srs. Senadores, dizendo que, hoje, a sociedade civil faz uma movimentação pedindo o impeachment do Governador do Estado do Acre. Não se trata de um pronunciamento raivoso, de alguém que quer fazer oposição por oposição, de alguém que quer o quanto pior melhor para o meu Estado. Em absoluto. Desde que assumi nesta Casa, tenho tentado ajudar, de todas as formas o meu Estado. Agora, é impossível continuar lutando por recursos para um local cujos mandatários maiores não têm a mínima preocupação com os recursos públicos.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 06/09/1995 - Página 15463