Discurso no Senado Federal

DISTORÇÕES NAS ANALISES SOBRE O PROJETO SIVAM. RECOMENDAÇÃO DE TRANSPARENCIA NA POSIÇÃO DO SENADO NO CASO SIVAM.

Autor
Levy Dias (PPB - Partido Progressista Brasileiro/MS)
Nome completo: Levy Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).:
  • DISTORÇÕES NAS ANALISES SOBRE O PROJETO SIVAM. RECOMENDAÇÃO DE TRANSPARENCIA NA POSIÇÃO DO SENADO NO CASO SIVAM.
Aparteantes
Osmar Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 06/12/1995 - Página 4828
Assunto
Outros > SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).
Indexação
  • DEFESA, POSIÇÃO, SENADO, QUESTIONAMENTO, PROCESSO, EXECUÇÃO, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM), MOTIVO, SUSPEIÇÃO, OCORRENCIA, IRREGULARIDADE, PROJETO, VIGILANCIA, REGIÃO AMAZONICA.
  • COMENTARIO, ANALISE, LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, PUBLICAÇÃO, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), RELAÇÃO, CARTA, AUTORIA, IVAN FROTA, BRIGADEIRO, REFERENCIA, POSSIBILIDADE, REALIZAÇÃO, FINANCIAMENTO, BRASIL, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM), MENOR PREÇO.

O SR. LEVY DIAS (PPB-MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, desejo fazer um pequeno registro que acredito de fundamental importância em relação ao Projeto SIVAM.

A nação brasileira tem hoje os olhos voltados para o Senado Federal. No momento em que foi colocada nas mãos desta Casa a decisão sobre o Projeto SIVAM, espera-se dos Senadores um posicionamento que seja a um tempo ponderado, transparente, firme e definitivo.

Na análise da questão vale considerar: primeiro, o complexo processo de definição das coordenadas técnicas do estratégico Projeto SIVAM contou com a presença e forte participação da empresa ESCA. Na medida em que, posteriormente, veio a público o fato de esta empresa haver usado documento falsificado para habilitar-se a papel fundamental no âmbito da escolha dos equipamentos e tecnologia e na própria execução do projeto, a meu ver, todo o processo foi contaminado.

A partir da situação criada com a saída da Esca, nas condições em que ocorreu, é natural questionar possíveis distorções havidas nas análises e conclusões do processo.

A questão acima levantada se realça com o pronunciamento do Senador Gilberto Miranda, Relator do Projeto SIVAM e Presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, no sentido de que existem alternativas de menor custo e idênticos resultados.

O Senado Federal detém competência privativa, consignada no art. 52 da Constituição de 1988, para conceder autorizações às operações de crédito externo contratados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios. No âmbito dos financiamentos pretendidos para execução do SIVAM, ressaltam dois aspectos que merecem exame em maior profundidade:

a) Há previsão de contrato entre a União e Banco do Brasil (Agência Gran Cayman) para repasse de recursos captados junto a agências de financiamento no exterior. Ocorre que a Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986, conhecida como a "lei do colarinho branco", em seu art. 17, veda a deferição de empréstimo pela instituição financeira pública ao seu controlador. Coloca-se, portanto, o impedimento legal ao contrato acima referido.

Pode-se alegar que essa norma não se aplica ao caso em tela, em virtude de o Decreto-Lei nº 1.312, de 15 de fevereiro de 1974, permitir, em caráter excepcional, e de acordo com certos limites, que o Poder Executivo conceda garantia a empréstimos negociados por agências oficiais no exterior (art. 3º).

Ambas as normas, uma de caráter geral e outra específica, são de idêntica hierarquia. A Lei de 1986 é, no entanto, mais recente, o que coloca a discussão de sua natural precedência sobre o decreto-lei.

b) Há, ademais, previsão de que, em alguns dos contratos previstos, a União emita notas promissórias aos credores externos. Esta prática colide com o art. 11 da Resolução nº 96/89, do Senado Federal, que regulamenta a competência constitucional já referida. Ressalte-se que as resoluções do Senado Federal têm força de lei.

Conforme estabelece a Resolução nº 96/89, deve ser remetido ao Senado um conjunto de informações para exame e fundamentação da autorização pretendida nas operações de crédito. Dentre tais informações, cumpre destacar a análise da relação custo/benefício do projeto, bem como a análise das fontes alternativas de financiamento.

Portanto, a posição do Senado Federal no sentido de questionar aspectos do SIVAM procede e é importante, ainda que o projeto tenha sido contemplado com recursos no Orçamento da União, aprovado pelo Congresso Nacional.

Diante de tais considerações, impõe-se, como exigência oriunda da consciência pública, entender prejudicado o processo em curso para a execução do SIVAM, ainda que não se conteste o seu mérito.

Recomenda-se, então, instalar um novo processo transparente, com a audiência clara de todos os setores envolvidos. Essa parece ser a posição mais adequada a ser assumida pelo Senado Federal, face aos problemas que se colocam atualmente aos financiamentos no âmbito do Projeto SIVAM. Com isso, esta Casa preservará a sua prerrogativa de guardiã da legalidade e do respeito aos interesses da Nação.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, terminava esta nota hoje quando vi pela Imprensa e li no jornal Folha de S. Paulo uma matéria intitulada:

"O preço da vigilância." Custo original do SIVAM era 57,1% menor.

Brigadeiro responsável pelos primeiros estudos do sistema de radares afirma que pressão de empresas alterou o projeto."

Julgo, Sr. Presidente - naturalmente tenho a certeza que toda a Casa também assim considera- , essa matéria publicada hoje na Folha de S. Paulo extremamente séria:. "Pressão de empresas podem ter alterado o custo do Projeto SIVAM." E o brigadeiro fez uma carta ao Senhor Presidente da República. O jornal transcreve parte dessa carta:

"O SIVAM (Sistema de Vigilância da Amazônia) deveria custar 57,1% do preço atual (US$1,4 bilhão) e ser desenvolvido pelo Brasil, de acordo com o projeto original do Ministério da Aeronáutica.

      O coordenador dos primeiros estudos, brigadeiro Ivan Frota, disse à Folha que a proposta original sofreu alterações no preço e nos objetivos por influência de empresas privadas. Frota, na reserva, enviou carta ao Presidente Fernando Henrique Cardoso há sete meses aconselhando que não contratasse a empresa Raytheon.

"Se esse contrato for assinado, estaremos oferecendo a um determinado país não só gratuitamente, mas, o que pior e profundamente irônico, pagando uma astronômica quantia, um instrumento de valor estratégico incomensurável", escreveu Frota a FHC. Mesmo com a carta encaminhada em abril deste ano, o Palácio do Planalto deu prosseguimento ao projeto.

Aí, Sr. Presidente, vêm trechos da carta enviada ao Presidente da República pelo Brigadeiro Ivan Frota, em 14 de abril. Considero isso extremamente sério para o País, sem, em nenhum momento, contestar o mérito do Projeto Sivam. Há necessidade de o Senado tomar todas as suas decisões, para que o Projeto Sivam seja levado avante com absoluta transparência e com a participação da concorrência totalmente aberta, o que poderá, sem sombra de dúvida, baratear seu custo para o contribuinte brasileiro.

O Sr. Osmar Dias - Nobre Senador, V. Exª permite-me um aparte?

O SR. LEVY DIAS - Ouço V. Exª, Senador Osmar Dias.

O Sr. Osmar Dias - Senador Levy Dias, tenho em mãos a Revista Veja desta semana, que praticamente acrescenta ao pronunciamento de V. Exª informações que realmente transformam o Projeto Sivam num projeto condenado, no meu entendimento, da forma como se apresenta. Aqui, o Relator do projeto, Senador Gilberto Miranda, lembrou que no dia 8 de novembro reuniu-se no Palácio do Planalto com o Presidente e um grupo de militares. Ali disse que o Projeto Sivam fora aprovado no Senado prevendo radares da empresa Westinghouse e que o pessoal da Aeronáutica os trocou pelos da Martin-Marietta, fazendo assim uma economia de R$40 milhões. Mas a diferença não foi reduzida do valor total do projeto, que permaneceu firme em astronômicos US$1.4 bilhão. "Cobrei na frente do Presidente o destino da diferença, disse Miranda." Quem estava no gabinete do Presidente, para explicar, era o Brigadeiro Marco Oliveira, Chefe do Comitê do SIVAM. "O Brigadeiro disse que tinha economizado entre US$40 e US$60 milhões, mas falou que não tinha de prestar conta ao Senado", relembra Miranda. O Ministro Gandra, que também estava presente, não disse nada, e o Presidente também não. No dia seguinte, o porta-voz Sérgio Amaral confirmou que os radares foram de fato trocados. Aí, o que considero mais grave é a explicação que foi dada pelo porta-voz Sérgio Amaral. O Governo vai utilizar esse dinheiro, ou seja, a diferença, em outras atividades do mesmo contrato. A modificação foi feita, pois era possível ter a mesma qualidade por um preço muito menor. Essa é uma justificativa que eu, pessoalmente, não engulo. Se é um projeto de US$1,4 milhões e se era um projeto perfeito nos seus aspectos técnicos, como defendem a Aeronáutica e o Governo, como é possível, economizando-se US$40 ou US$60 milhões em alguns equipamentos, usar esse dinheiro no mesmo projeto? Esse projeto não é completo? Se não é completo, não é perfeito. Se não é perfeito, não é defensável. A posição que adotarei no dia da votação desse projeto é quase certa. Não é possível aprovarmos no Senado um empréstimo dessa ordem, com tantas notícias que nos trazem tantas dúvidas e que, com certeza, a sociedade brasileira não aprovaria. Estamos aqui representando a sociedade brasileira.

O SR. LEVY DIAS - Senador Osmar Dias, Sr. Presidente, Srs. Senadores, não estou me reportando ao Projeto SIVAM hoje. Quando fizemos a primeira votação de autorização de crédito e todos tomamos conhecimento das matérias jornalísticas sobre a situação da ESCA, naquele exato momento, na minha avaliação, o projeto estava contaminado e deveria ser cancelado, e aberta nova concorrência transparente. Tanto é que me dirigi à assessoria do Ministério da Aeronáutica no Senado e pedi esclarecimentos. Recebi, então, uma carta do Tenente-Brigadeiro-do-Ar, Mauro José Miranda Gandra, Ministro de Estado da Aeronáutica, assinada também pelo Embaixador Ronaldo Mota Sardenberg, Secretário de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Essa carta, Sr. Presidente, é de 24 de agosto de 1995.

No momento que foi levantado o valor do projeto, lógico que o valor, de mais de US$1 bilhão, chamou a atenção.

Sempre questionei no Senado - há vários pronunciamentos meus registrados em que falo sobre isso - que o problema do nosso País não é de dinheiro, mas de gerência. Assim falei no dia que votei contra a contribuição sobre movimentação financeira tão pedida pelo Ministro Adib Jatene.

Em 24 de agosto de 1995, o Ministro da Aeronáutica e o Secretário de Assuntos Estratégicos da Presidência da República dirigiram-me um ofício e junto com ele uma nota longa sobre o SIVAM. Falo isso porque venho me preocupando com esse problema desde essa data. Se o ofício é de 24 de agosto, minha solicitação é anterior, porque eu queria esclarecimentos para votar com tranqüilidade e consciência.

Digo mais uma vez: não me refiro ao mérito do projeto; refiro-me à situação em que ele se encontra hoje. Falo como brasileiro. Na minha avaliação, o Projeto SIVAM está totalmente condenado e o Presidente da República deveria, de pronto, cancelar tudo e fazer uma licitação completamente transparente.

As informações que todos temos são extremamente sérias. A carta publicada hoje no jornal Folha de S. Paulo, do Brigadeiro Ivan Frota, traz dados que fazem com que a situação fique muito mais séria e complicada.

Seria muito melhor para o Senado, para o Governo, para o País e para o contribuinte que o assunto fosse reavaliado, não deixando, porém, de prosseguir os estudos e se executar o projeto, se possível nos preços mencionados pelo Brigadeiro Ivan Frota, publicados na imprensa, qual seja, US$500 milhões ou US$600 milhões. Porque realmente o dinheiro é atrativo, é a longo prazo, com juros baixos, com carência longa, mas o País vai ter que pagá-lo um dia, com os juros estabelecidos em contrato.

Como o Governo vai tomar uma decisão sobre o assunto, eu queria deixar registrado hoje, no Senado, a minha posição e a minha opinião a respeito desse projeto, que venho acompanhando desde antes do mês de agosto deste ano.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/12/1995 - Página 4828