Discurso no Senado Federal

PARABENIZANDO O PROCURADOR-GERAL DA REPUBLICA PELA INICIATIVA DE ABERTURA DE PROCESSOS CONTRA O GOVERNADOR DO ACRE, SR. ORLEIR CAMELI.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO ACRE (AC), GOVERNO ESTADUAL.:
  • PARABENIZANDO O PROCURADOR-GERAL DA REPUBLICA PELA INICIATIVA DE ABERTURA DE PROCESSOS CONTRA O GOVERNADOR DO ACRE, SR. ORLEIR CAMELI.
Publicação
Publicação no DSF de 05/12/1995 - Página 4701
Assunto
Outros > ESTADO DO ACRE (AC), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • ELOGIO, DECISÃO, GERALDO BRINDEIRO, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, REQUISIÇÃO, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), ABERTURA, INQUERITO JUDICIAL, ORLEIR CAMELI, GOVERNADOR, ESTADO DO ACRE (AC), MOTIVO, EXECUÇÃO, CRIME, PECULATO, FALSIDADE IDEOLOGICA, DISPENSA, LICITAÇÃO, SETOR PUBLICO.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, PAULO SOTERO, JORNALISTA, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, VIAGEM, ORLEIR CAMELI, GOVERNADOR, ESTADO DO ACRE (AC), EXTERIOR, SOLICITAÇÃO, VERBA, BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO (BID).

A SRª MARINA SILVA (PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, farei um breve relato dos encaminhamentos que vêm sendo tomados pela Bancada do Acre, no Senado, no que se refere às inúmeras denúncias de irregularidades, envolvendo o Governador do meu Estado, o Sr. Orleir Cameli. Tenho a obrigação de fazê-lo, porque, como Senadora da República, cabe a mim uma responsabilidade, talvez particular, com o meu Estado de origem. Se o meu Estado de origem está sendo, a toda hora, manchado por denúncias que, a cada momento, são acrescidas de outras, sinto-me na obrigação de fazer esse relato, dizendo quais são as providências que vêm sendo tomadas, do ponto de vista legal, para que aqueles Srs. Senadores que tenham uma relação de conjunto com os Estados da Federação possam também acompanhar a situação.

O Procurador-Geral da República, Geraldo Brindeiro, solicitou abertura, inicialmente, de três inquéritos contra o Governador Orleir Cameli. Determinou também que sejam feitas diversas diligências com vistas a colher provas para a abertura de novos inquéritos referentes ao restante das denúncias contidas na representação formulada pelos três Senadores do Acre, alguns Srs. Deputados Federais e várias entidades da sociedade civil.

Os três inquéritos iniciais são os seguintes: primeiro, para apurar desvio de recursos públicos em favor das empresas Cameli Comercial Distribuidora Ltda, de propriedade do Governador. Consta do relatório da Procuradoria-Geral da República que a análise dos documentos dos Convênios 01 e 02, assinados pelo Governo do Estado com a Prefeitura de Cruzeiro do Sul, trazem fortes indícios de peculato e crimes contra a Administração Pública do Estado, haja vista que os recursos, objetos dos convênios, foram parar na conta de uma das empresas do Sr. Orleir Cameli, Governador do Estado do Acre.

A segunda denúncia acatada pelo Procurador da República visa a apurar a real necessidade de dispensa de licitação para a realização da reforma do Pronto Socorro Joana Benício de Souza, utilizando-se do artifício de "situação de emergência". É bom salientar que o Governador, para fazer a dispensa da licitação, utilizou o argumento de que estava sob uma situação de emergência e, segundo algumas observações feitas na lei, quando se trata de estado de calamidade, estado de emergência, não seria necessária uma licitação, tendo em vista que esta demoraria muito e, claro, colocaria em risco a segurança ou determinadas condições de vida das pessoas.

O Pronto Socorro do Estado do Acre passa realmente por momentos difíceis - ratos estavam roendo os hansenianos -, mas se aproveitaram de uma situação de penúria do hospital para decretar situação de emergência e dispensar da licitação determinada empresa que gostariam de ver favorecida.

Segundo a Procuradoria-Geral da República, não existe nenhuma situação de emergência como consta no Decreto nº 494, de 02/06/95, e esse fato pode configurar crime contra a Administração Pública, além de delitos previstos na Lei nº 8.666/83 (Lei das Licitações Públicas).

A terceira denúncia acatada pela Procuradoria-Geral da República é para apurar os indícios relativos à utilização, pela mesma pessoa, de diversos números de Cadastro de Pessoa Física - CPF. Consta dos levantamentos feitos pela representante da Procuradoria-Geral da República no Acre que o Sr. Orleir Cameli possui cinco CPFs e há também uma informação, já confirmada, de que S. Exª realmente possui um sexto CPF. Este fato caracteriza crime de falsidade ideológica, descrito no art. 299 do Código Penal.

Com relação às demais denúncias, foram adotadas pela Procuradoria-Geral da República as seguintes medidas, para instruir abertura de novos inquéritos: sonegação fiscal - foi solicitado à Receita Federal que realize um levantamento minucioso sobre a situação fiscal das empresas do Sr. Orleir Cameli. E mais, foram solicitadas à Polícia Federal as informações sobre o Inquérito Policial nº 085/94, instaurado no âmbito da Superintendência da Polícia Federal do Acre, cujo objeto de apuração é a prática de sonegação fiscal envolvendo empresas do Grupo Cameli; apreensão do Boeing - foram requisitadas informações sobre o andamento do inquérito policial existente na Justiça Federal de São Paulo; retirada ilegal de madeira em terras indígenas -denúncia sobre a qual o Procurador está colhendo mais dados - foram solicitadas informações acerca da existência de procedimentos policiais instaurados ou processos criminais ajuizados relativos a esta questão.

Agora temos uma nova denúncia: consta que encontraram um sexto CPF em nome do Sr. Orleir Cameli.

Há mais um pequeno problema: o jornal O Estado de S. Paulo, do dia 30 de novembro, mostra a seguinte manchete: "Diretor de empreiteira ajuda Cameli a pedir verba ao BID". E o jornal faz uma longa matéria sobre a ida do Governador do Estado do Acre, juntamente com os Governadores do Amazonas e de Rondônia, e diz que essas autoridades levaram o representante de uma empreiteira para participar de uma reunião junto a uma instituição de apoio multilateral, que no caso seria o BID.

O jornal O Estado de S. Paulo, da semana passada, noticiou que diversos Governadores da Região Norte, inclusive o Governador do Acre, apresentaram como assessor de seus Governos o representante da empresa Emsa - Empresa Sul-Americana de Montagens -, Sr. Marcelo Vieira Pinto, que teria acompanhado também, como assessor, os Governadores de Rondônia e Amazonas, em visitas ao Banco Mundial.

Diz o jornal:

      "O Diretor Internacional da EMSA é próximo de Cameli e gosta de exibir, em rodas de amigos, um relógio Rolex de ouro que garante ter ganho de presente do Governador do Acre".

Em outro trecho, lê-se:

      "Cameli foi o primeiro Governador a levar para uma reunião no BID o representante de uma empreiteira. Isso constitui uma violação potencial das regras do BID e do BIRD. A participação de empreiteiros em projetos que deveriam ser decididos por licitação. A presença do representante da EMSA nas discussões preliminares com o Banco sobre o empréstimo para os três Estados amazônicos daria uma óbvia vantagem a essa empresa, numa eventual concorrência, em qualquer dos três projetos e seria causa suficiente para a impugnação dos resultados por outras firmas, caso a EMSA ganhasse".

Continua o jornal:

      "A revelação das irregularidades envolvendo o Governador Orleir Cameli despertou dúvidas sobre a ligação do Governador com a EMSA e liquidou qualquer chance de um aval federal ao projeto, que visa a melhorar o abastecimento de água em Rio Branco".

Faço questão de colocar essas informações do jornal O Estado de S. Paulo, do correspondente Paulo Sotero, que fez uma matéria extensa sobre esse episódio. Como o Senado da República, em última instância, é quem aprova esse tipo de empréstimo quando envolve agentes financeiros internacionais, há que se tomar mais cuidado com as visitas dos Governadores. Não que eu esteja aqui lançando suspeitas sobre todos os Governadores. Sei que muitos deles são bem assessorados, são pessoas de bem e não caberia qualquer preocupação. Todavia, o fato de três governadores terem ido a essas agências financiadoras, acompanhados de um representante de empreiteiras, faz com que esta Casa possa exigir - quando se tratar da busca de recursos internacionais -, que na agenda desses governantes conste os nomes das pessoas que compõem suas comitivas. O nosso objetivo é que qualquer agente de empreiteira ou seja lá de onde for, que não seja de interesse do Estado, não tenha suas propostas aprovadas pelo Senado Federal.

E, para concluir, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria de colocar aqui, infelizmente, mais uma denúncia que recebi hoje. Existe uma fita com a acusação de que a empreiteira CONSBRÁS, de São Paulo, tem um contrato de R$625 mil com o Estado do Acre para construir o trecho da estrada BR-364, que liga Rio Branco ao município de Sena Madureira. O seu representante, Carlos Mendes da Silva, revelou nesta fita que estaria sendo forçado a pagar uma caixinha de R$200 mil de propina a pessoas dentro do Governo de Orleir Cameli.

E o Sr. Carlos Mendes da Silva, representante da CONSBRÁS, subempreitou o trecho com pequenas empreiteiras e não estava efetivando o pagamento pelos trabalhados realizados, alegando que não poderia fazê-lo porque, do dinheiro que recebeu, teria sido obrigado a dar R$200 mil para uma caixinha existente no Governo do Sr. Orleir Cameli. Há denúncias de que este rapaz sofreu algum tipo de pressão e que fugiu do Estado do Acre, deixando essa fita.

Essa denúncia é muito grave e envolve mais uma vez dinheiro público no Estado do Acre. A construção dessa estrada é importante para o Estado, mas infelizmente está eivada desse tipo de irregularidades. Entendo que providências devem ser tomadas pela Polícia Federal, porque, com certeza, a Polícia Civil pode sofrer pressões para mudar o rumo das investigações que deveriam ser feitas.

O rapaz deve aparecer porque não se trata de um funcionário qualquer: é o principal representante dessa empresa no Estado do Acre e tinha poderes para assinar contratos e cheques; enfim, não era uma pessoa qualquer e, de repente, sumiu, evaporou. O Governo do Estado o acusa de ter sumido com o dinheiro, e ele acusa o Governo, pois estaria sendo forçado por pressões desse Governo a pagar R$200 mil.

Espera-se que a Justiça brasileira, que a Procuradoria da República faça as investigações devidas para que o Acre deixe de ser palco de inúmeras irregularidades, que vão desde assassinato, peculato, suspeita de relações com tráfico de drogas e assim por diante.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/12/1995 - Página 4701