Discurso no Senado Federal

ARTIGOS PUBLICADOS NOS JORNAIS O ESTADO DE S.PAULO E JORNAL DO BRASIL, SOBRE A INSATISFAÇÃO DE AUTORIDADES DO PARAGUAI COM RELAÇÃO AS MEDIDAS ADOTADAS PELO GOVERNO BRASILEIRO, DIMINUINDO AS COTAS DOS PRODUTOS QUE OS BRASILEIROS PODEM TRAZER DAQUELE PAIS BEM COMO A ENTREGA DA RELAÇÃO DOS MEMBROS A ALFANDEGA.

Autor
Jefferson Peres (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. SENADO.:
  • ARTIGOS PUBLICADOS NOS JORNAIS O ESTADO DE S.PAULO E JORNAL DO BRASIL, SOBRE A INSATISFAÇÃO DE AUTORIDADES DO PARAGUAI COM RELAÇÃO AS MEDIDAS ADOTADAS PELO GOVERNO BRASILEIRO, DIMINUINDO AS COTAS DOS PRODUTOS QUE OS BRASILEIROS PODEM TRAZER DAQUELE PAIS BEM COMO A ENTREGA DA RELAÇÃO DOS MEMBROS A ALFANDEGA.
Aparteantes
Lúcio Alcântara, Vilson Kleinübing.
Publicação
Publicação no DSF de 28/11/1995 - Página 3783
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. SENADO.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), JORNAL DO BRASIL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DESAPROVAÇÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, PARAGUAI, DECISÃO, GOVERNO BRASILEIRO, REDUÇÃO, VALOR, COTA, IMPORTAÇÃO, TURISMO, PAIS ESTRANGEIRO.
  • DEFESA, MANUTENÇÃO, DECISÃO, GOVERNO BRASILEIRO, REDUÇÃO, VALOR, COTA, IMPORTAÇÃO, TURISMO, PAIS ESTRANGEIRO, PARAGUAI, CRITICA, TENTATIVA, GOVERNO ESTRANGEIRO, IMPOSIÇÃO, AMEAÇA, EMBARGOS, RELAÇÕES DIPLOMATICAS.
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, REAJUSTAMENTO, SALARIO, TAQUIGRAFO, SENADO.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os jornais O Estado de S. Paulo e o Jornal do Brasil de ontem dedicam alguns de seus editoriais ao problema do contrabando em Ciudad del Este. Referem-se principalmente às violentas pressões que as autoridades paraguaias começam a exercer sobre o Governo brasileiro no sentido de serem revogadas as medidas de repressão ao comércio ilegal através daquela cidade do país vizinho. Medidas que as autoridades paraguaias não aceitam, demonstrando, assim, o que se diz e o que já se suspeitava há muito tempo: o envolvimento de boa parte do setor público do Paraguai com o contrabando.

O Governo brasileiro, no âmbito da sua competência, reduziu a quota de bagagens isenta de impostos, de US$ 250 para US$ 150, nivelando à quota dos demais países do Mercosul. Os paraguaios não se conformaram, querem ser exceção. Mas, como salienta o jornal O Estado de S. Paulo, o problema não é só esse. Além da redução do valor da quota, eles se mostram inconformados principalmente com a determinação da Receita Federal de exigir declaração de bagagem de todos que atravessam a Ponte da Amizade, gerando um valor total de mercadorias estimado em US$ 3 bilhões por ano. Calculando-se o número de ônibus e passageiros que circulam diariamente no local e estabelecendo-se o valor de US$ 250 por pessoa, chega-se ao montante de US$ 3 bilhões.

O que entra além da quota - porque nunca houve fiscalização efetiva -, chega, segundo cálculos do comércio de Manaus, a US$ 10 ou US$ 12 bilhões por ano ou US$ 1 bilhão por mês, com uma sonegação de impostos da ordem de US$ 1 bilhão por ano, pelo menos.

Durante muito tempo se especulou o motivo pelo qual as autoridades brasileiras não tomavam providências. Extra-oficialmente se sabe que a resistência do governo paraguaio era muito grande, com ameaças veladas de retaliações. De que forma? Provavelmente, endurecimento no que tange às tarifas de Itaipu e represálias contra os 300 mil brasileiros que vivem e trabalham no Paraguai.

Parece que as autoridades brasileiras se intimidaram durante muito tempo com essas ameaças. Reagiram agora, mas receio que cedam às pressões. Já duas delegações paraguaias estiveram no Brasil. Algumas tiveram diálogo áspero com as autoridades brasileiras, e foram, até diria, arrogantes e desaforadas. O próprio Presidente Juan Carlos Wasmosy disse que vai buscar o entendimento com o Presidente Fernando Henrique Cardoso. O Governador do Paraná, o Sr. Jaime Lerner, entra no coro e pede providências ao Governo Federal. Que providências seriam essas? Afrouxar as rédeas outra vez? Escancarar as portas novamente para essa sangria de divisas e de receita fiscal que é Ciudad del Este?

Se realmente as relações se deteriorarem, se as autoridades paraguaias quiserem sair para retaliações, de quem é o maior poder de barganha, o deles ou o nosso? Se nós, na legítima defesa de nossos interesses, fechássemos o Porto de Paranaguá? Se deixássemos, mesmo sofrendo o racionamento de energia, de comprar energia de Itaipu, quem sofreria mais, o Paraguai ou o Brasil? Creio que o Paraguai não tem poder de barganha nenhum.

Dizem - prefiro não acreditar nisso - que é tamanho o envolvimento de setores militares do Paraguai com o contrabando que há quem tema, no Governo brasileiro, até mesmo um golpe de estado naquele País. Mas então seríamos reféns dos militares paraguaios, o que seria um absurdo. Deixaríamos de tomar medidas em cumprimento das nossas leis, em defesa dos nossos interesses, para nos rendermos a ameaças abertas ou veladas, ou de represália do Governo paraguaio ou de uma desestabilização do governo paraguaio? Não creio.

O Sr. Vilson Kleinübing - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Ouço o aparte do nobre Senador Vilson Kleinübing.

O Sr. Vilson Kleinübing - Senador Jefferson Péres, o pronunciamento de V. Exª me permite acrescentar algumas informações e preocupações a respeito do assunto. Em primeiro lugar, essa questão da Ciudad del Este é realmente vergonhosa, pois meia dúzia de paraguaios e coreanos lá estão, num sistema organizado de contrabando, a manterem todo um comércio à parte.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Máfia asiática.

O Sr. Vilson Kleinübing - O pior é que gerou-se uma atividade econômica em nosso País em função disso, a exemplo dos sacoleiros da praça do Paraguai. Em Blumenau, cidade que tem uma indústria e um comércio poderosos, já existe a feira do Paraguai. O Governo Federal começou a formar Zonas de Processamento de Exportação; criaram-se umas 15 ZPEs, que é - mais uma vez - uma vergonha, porque não vão funcionar. Agora estão criando Zonas de Livre Comércio. Todo dia há uma para ser aprovada aqui no Senado. Como ocorre com os municípios, ao criar-se um pequeno, mesmo que não se justifique a sua existência, formam-se outros e assim por diante. Santa Catarina, que é um Estado industrial, já conta com mais de 60 municípios, que não têm guia de recolhimento de imposto, para se ter uma idéia do tamanho dos municípios desmembrados. A Zona Franca de Manaus tem seus limites, mas também lá há liberdade de importação. O problema é essa diferença entre o rico e o pobre; o rico faz compras de até US$ 500, no free shopping, sem pagar impostos, aqui ou quando volta do exterior. Estava comentando com o meu colega que infelizmente o Governo é assim: se tiver que introduzir uma medida para ajudar os pobres e uma outra para ajudar os ricos, a medida que estará em vigor em 30 dias, sem dúvida, será a dos ricos. Faço esta colocação porque as sacoleiras, com direito a despender até US$ 150 em compras, estão proibidas de fazê-lo, enquanto estamos criando zonas de livre comércio; mais de 30 municípios já as estão criando. Vai ser a indústria do contrabando. Estamos criando zonas de processamento de exportação, essas coisas viraram moda. Quer dizer, se o Governo Brasileiro ceder às pressões dessa pequena máfia do Paraguai, o comércio exterior brasileiro terá dificuldades daqui para o futuro, porque o País perderá receita de impostos, como é o caso de perdas fabulosas ocorridas no comércio com a Ciudad del Este. Meu objetivo era o de acrescentar esses dados ao pronunciamento de V. Exª. O grande desafio do Governo Brasileiro não é governar o Brasil, é cortar as exceções, colocar ordem no País e fazer com que haja regras claras, definidas, internas e externas, para que o Brasil tenha credibilidade junto aos parceiros do Mercosul e junto a outros países com que mantém relações comerciais.

O SR. JEFFERSON PÉRES - É verdade, Senador Vilson Kleinübing, essa proliferação de zonas especiais, isentas de impostos de importação, e a falta de repressão ao contrabando estão ameaçando transformar o Brasil numa grande "zorra". Esta é a verdade. Não sabemos onde isso vai parar, principalmente no que tange à sonegação fiscal, o que preocupa muito, num País que já apresenta este ano um déficit fiscal muito grande.

O Sr. Lúcio Alcântara - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Com muito prazer, Senador Lúcio Alcântara.

O Sr. Lúcio Alcântara - Senador Jefferson Péres, não é a primeira vez que V. Exª vem à tribuna abordar este assunto, mostrando o quanto o Brasil perde em empregos, arrecadação de tributos, movimentação da sua economia, com esse contrabando, essa entrada ilegal de mercadorias adquiridas em Ciudad del Este. As relações do Brasil com o Paraguai sempre foram muito sensíveis. Ouvi dizer que, apesar do tamanho do País, era uma das embaixadas que requeria titulares mais preparados, aos quais o Brasil dispensava grande atenção, porque o Paraguai se beneficiou durante muito tempo, inclusive, de uma chamada "política pendular", em que ora se voltava para a Argentina, no sentido de extrair vantagens, ora para o Brasil. E continua praticando essa política com muita competência. Havia, da mesma forma, um grande receio de que o processo de normalização democrática no Paraguai se desse com alguma fratura das nossas relações, que se tinham desenvolvido até então com governos autoritários, com ditaduras. Todavia, essa transição ocorreu pacificamente. O Brasil mantém relações estreitas, cordiais, próximas com o Paraguai, que integra, como a Argentina e o Uruguai, juntamente com o Brasil, o Mercosul. Os investimentos em Ciudad del Este - a que o Senador Vilson Kleinübing referiu-se como uma pequena máfia - são, pelo que li nos jornais, gigantescos, investimentos orientais de grande porte; isto é, os interesses que gravitam em torno de Ciudad del Este são muito grandes.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Dizem que só perde para Hong-Kong e Miami.

O Sr. Lúcio Alcântara - Exatamente; foi o que li na imprensa. Por outro lado, o Secretário Everardo Maciel afirmou que essa não era uma mera decisão alfandegária, não era uma mera decisão da Receita Federal do Brasil, mas, sim, uma decisão de Governo, de política governamental. É evidente que queremos manter com o Paraguai o melhor relacionamento possível. São muito íntimas as relações brasileiras com aquele País. E V. Exª falou de alguns aspectos de nossas relações, por exemplo, o de brasileiros que hoje vivem, trabalham e têm propriedades no Paraguai; da mesma maneira, a questão de Itaipu, de produção e aquisição de excesso de energia, a integração do Mercosul, que V. Exª lembrou muito bem. Já os outros países, o Uruguai e a Argentina, adotaram esse valor de US$ 150 como passível de compra em Ciudad del Este, sem que incidisse sobre isso qualquer imposto. Preocupo-me - o Senador Vilson Kleinübing também referiu-se à essa questão em seu aparte - com a criação dessas áreas de livre comércio. Li em um jornal, no fim de semana, que empresas de turismo já estão organizando caravanas para Macapá, onde haverá uma feira em uma determinada data. Já está havendo divulgação desse evento, para que pessoas, principalmente do Norte e do Nordeste, se dirijam para lá. Nessa feira, que vai durar dois ou três dias, é esperada grande movimentação de turistas, e os sacoleiros iriam se deslocar de Ciudad del Este para Macapá. De qualquer maneira, a cidade encontra-se dentro do País. Mas, sem dúvida, isso significa uma sangria na parte de tributos. A indústria de brinquedos, por exemplo, tem denunciado essa questão com muita veemência. Se não bastasse a redução de alíquotas, que permitiu a importação de produtos que vêm competir em condições muito favoráveis com o produto nacional, há agora essas ilhas de felicidade fiscal para quem importa ou vende esse tipo de mercadoria. É preciso que o Governo reavalie tudo isso para realmente adotar uma política que seja mais compatível com os interesses do País e dos Estados, que necessitam dos tributos para cumprirem os seus deveres com relação às políticas públicas que lhes cabem implementar. V. Exª traz, mais uma vez, um tema que repetidamente tem sido abordado aqui não só por V. Exª, mas também pelo Senador Bernardo Cabral. No momento em que se colheu algum resultado, em função dessa decisão do Governo Federal, não podemos sucumbir a uma pressão que, no nosso entender, não tem razão alguma de ser.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Muito obrigado, Senador Lúcio Alcântara. Não sei se pesa no subconsciente das nossas autoridades uma espécie de remorso histórico decorrente do holocausto que foi a Guerra do Paraguai; mas, razões de ordem sentimental, não podem evidentemente influir em decisões de governo. E se foi pelo fato de o Paraguai ser um país mediterrâneo, um país interior, sem saída para o mar, pobre, que merecia um tratamento especial do Brasil, isso mudou. Desde a integração desse país ao Mercosul, ele tem que merecer o tratamento que damos aos demais parceiros.

Espero sinceramente que o Governo Brasileiro não ceda a essas pressões, que resista, que as repila, mantendo boas relações com o Paraguai, mas sem recuar porque, além do aspecto econômico e fiscal de recursos que a Receita está perdendo, há o aspecto ético, representado pelo escancaramento ao contrabando que implica a institucionalização de uma atividade ilegal e, portanto, numa verdadeira falência do princípio da autoridade.

Antes de concluir, Sr. Presidente, gostaria de abordar um assunto de economia interna do Senado Federal e fazer um apelo à Mesa.

Recebi em meu gabinete uma exposição de motivos de funcionários do Setor de Taquigrafia desta Casa, os quais fazem um pleito que considero dos mais justos. Os Taquígrafos sofreram distorções ao longo desses anos e estão com suas remunerações defasadas. São poucas funcionárias, não estou cedendo a pressões corporativistas, não estou procurando ser bonzinho.

Há um mês, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, acompanhei os demais Senadores que vetaram o aumento indiscriminado de remunerações, ao mesmo tempo em que exigimos a correção de uma série de distorções no que se refere a salários.

No entanto, no caso dos Taquígrafos, funcionários concursados e que oferecem um trabalho de boa qualidade, como posso atestar porque raramente corrijo as notas taquigráficas dos meus pronunciamentos, penso que a Mesa deve examinar com a maior atenção essa reivindicação desses nossos bons auxiliares.

Era o que tinha a dizer. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/11/1995 - Página 3783