O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os Senadores da Amazônia pouco têm falado ultimamente sobre o SIVAM. Senadores e Deputados de todos os Estados, nos últimos dias, vêm abordando o assunto, e a voz da Amazônia pouco se tem feito ouvir.

Talvez esse silêncio se explique, Srªs e Srs. Senadores, porque estamos perplexos. Estamos torturados por uma dúvida enorme. Não me sinto impedido de perguntar, em voz alta, neste plenário, o que fazer?

A Amazônia precisa de um sistema de vigilância. Só quem, como nós, fez campanha na região, viajando em bimotores a hélice, em dias de tempestade, com visibilidade zero, com água e floresta embaixo, sabe o que é não ter um sistema de monitoramento para a segurança do vôo na região.

Mas não é só isso não. A Amazônia é rota de narcotráfico. As portas estão escancaradas. A Colômbia é logo ali, uma população miserabilizada, empobrecida. O esgotamento dos produtos tradicionais do extrativismo a deixam exposta a uma grande tentação, a de que se multipliquem as plantações de ipadu, numa área onde absolutamente não existe fiscalização. As queimadas, depois de um recesso de 2 anos, recrudescem, avolumam-se, e o IBAMA não tem como controlar.

E a garimpagem predatória? São problemas não da Amazônia, mas do Brasil. Há a necessidade imperiosa de que um sistema de monitoramento eletrônico dê ao Poder Público instrumentos para controlar a região. Para isso, foram criados o SIPAM e o SIVAM; para isso, foi aprovado o famoso - hoje tristemente famoso - contrato com a Raytheon, maculado desde o início por suspeitas de favorecimento e corrupção.

Às vésperas da aprovação do financiamento, estoura esse episódio nebuloso, nebulosíssimo, de escuta telefônica no Palácio do Planalto. A primeira pergunta que se faz é a seguinte: quem está por trás disso? As suspeitas são várias. A empresa derrotada na concorrência? Talvez. Outras empresas interessadas na abertura de nova concorrência? Quem sabe? Ou, como quer o Jornalista Márcio Moreira Alves, em sua coluna de hoje: o cartel do narcotráfico? Brigas palacianas, internas, apenas? Não creio. Deve haver algo mais do que isso.

O Senador Gilberto Miranda, Relator da matéria, diz, em seu parecer, depois de uma viagem ao exterior, que existiriam pelo menos dois outros sistemas mais baratos e mais avançados. Comprovadamente? Não sei. Essa é a informação que passaram ao Relator da matéria. A pergunta que nós, representantes da Amazônia nesta Casa, nos fazemos é esta: como proceder? Impedir, levar à revogação do contrato com a Raytheon? Partir para outras opções? Talvez. A esta altura, é temerário manter o contrato com a Raytheon tal como está mas, e se depois as opções realmente não existirem? Teremos perdido a oportunidade; teremos perdido um tempo enorme. E se o financiamento não sair - pergunta o Senador Antonio Carlos Valadares?

O Sr. Gilberto Miranda - Permite V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Ouço V. Exª, Senador Gilberto Miranda. Só lhe peço que não se estenda demasiadamente, porque meu tempo é curto.

O Sr. Gilberto Miranda - Serei breve, Senador Jefferson Péres. Creio que todos os Srs. Senadores - porque 2/3 da Casa praticamente mudaram - deveriam ler as notas taquigráficas da reunião do dia 21 de novembro, ocorrida neste plenário, às 22h. Se o fizerem, o assunto ficará muito claro, muito bem explícito aos Srs. Senadores que chegaram este ano a esta Casa. Através de um documento de 10 folhas a respeito, eu disse que, nos Estados Unidos, há um edital pronto para sair do WAAS - Wide Area Augmentation System -, que é o sistema por satélite que vai revolucionar o mercado e que é o futuro. Isso está escrito com todo o detalhamento. Disse-me o Ministério da Aeronáutica que esse sistema só funcionará em 2005. Mas o Governo americano argumenta que prontamente entrará em funcionamento. Todos esses dados e muitos outros os Srs. Senadores vão encontrar nas notas taquigráficas do dia 21. Já naquela época, eu alertava que existia um sistema que iria entrar em funcionamento. Agora, recebi o estudo do futuro da Aeronáutica, que diz que o estudo feito em 93 - que só chegou agora e não foi mencionado à época - deixa claro que o futuro é o WAAS - no Brasil, chamado de GNSS. Então, aconselho todos os Srs. Senadores a lerem as notas taquigráficas, porque nelas está bem clara a minha recomendação nesse sentido. Muito obrigado.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Agradeço os seus esclarecimentos, Senador. Cada um é senhor do seu juízo, mas lhe digo o seguinte: em seu lugar, àquela altura, nessas condições, não teria votado a favor.

O Sr. Gilberto Miranda - Até então, como todos nós, acreditei absolutamente em todas as informações que me foram fornecidas àquela época pelos senhores membros responsáveis pelo projeto na Aeronáutica. Hoje, visitando os Estados Unidos no mês de outubro, conversando com o Presidente do FAA, com o Diretor-Geral e com o Subsecretário do Pentágono, tive a oportunidade de verificar - e a própria Raytheon o explica agora - que a empresa vitoriosa nos Estados Unidos ganhou com US$475 milhões e foi desclassificada para esse mesmo sistema; e o WAAS já foi contratado, licitado e entra em operação daqui a dois anos.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Nós, principalmente os Senadores da Amazônia, estamos numa situação difícil. Estamos perplexos e sem saber como agir. Se votarmos pela anulação do contrato com a Raytheon, poderemos, amanhã, ter problemas de consciência sobre se não teremos prejudicado, abortado a implementação de um programa realmente necessário para a região. Mas se, por outro lado, contribuirmos para a manutenção do programa e amanhã ficar demonstrado que havia alternativas melhores e mais baratas, também, igualmente, nos sentiremos culpados pelo prejuízo causado à Nação.

Não conhecemos as forças que estão por trás disso, mas suspeitamos quais sejam. Sinto-me como um marisco na briga do rochedo contra o mar e não sei a que interesses involuntariamente, inocentemente, poderei estar servindo tomando posição de um lado ou de outro. Realmente, estou perplexo!

O Sr. Elcio Alvares - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Jefferson Péres?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Ouço o nobre Senador.

O Sr. Elcio Alvares - Gostaria de fazer uma colocação que entendo muito oportuna no pronunciamento de V. Exª: discutir a importância do projeto SIVAM não só em relação à sua Amazônia, mas ao Brasil, seria despiciendo a essa altura. Porém, o Governo do Presidente Fernando Henrique, já tendo tomado conhecimento do parecer do Senador Gilberto Miranda, dentro do tempo razoável da vista, oferecerá por intermédio dos seus Líderes no Congresso Nacional, principalmente no Senado, as verdadeiras colocações que devem ser feitas em torno desse momentoso episódio.

Eu apenas gostaria de ponderar, Senador Jefferson Péres, no que tange à tecnologia, que na Aeronáutica, uma Força que tem merecido nosso respeito através tempo, seja pelo seu posicionamento histórico, seja pela inteireza dos homens que a compõem, o estudo em relação ao Projeto SIVAM foi feito dentro dos critérios mais rigorosos da coisa pública. Estabelecer termos de comparação sem conhecer a profundidade do Projeto parece-me medida açodada. O Governo ontem deu demonstração do diálogo que vem sendo cultivado com esta Casa. Todos os Líderes da base de sustentação partidária do Governo, juntamente com o Líder e com o Vice-Líder, compareceram para uma audiência com o Presidente às 17h30min no Palácio do Planalto. Na oportunidade, o Presidente foi muito claro - estava presente o Secretário de Assuntos Estratégicos - em relação ao fato de que pretende examinar em toda a extensão o Parecer do Senador Gilberto Miranda, que merece todo o respeito, e depois fará uma colocação que represente a realidade dos estudos da Aeronáutica e o verdadeiro posicionamento do Governo. Portanto, posso adiantar a V. Exª, um Senador a quem dedico profundo respeito e admiração, que em relação ao Projeto SIVAM a verdade é o grande objetivo do Governo. Há aspectos técnicos que, às vezes, refogem à nossa apreciação, porque o Senado, dentro do enfoque do Projeto SIVAM, teria que examinar, obviamente e exclusivamente, as razões do empréstimo. Porém, como o mérito foi atingido, ontem mesmo, interpretando o pensamento de todos os Líderes presentes, solicitamos ao Governo que nos fornecesse um estudo técnico detalhado. Comprometo-me com V. Exª neste momento a trazer, logo que tenha em mãos - tendo por base evidentemente o Parecer do Senador Gilberto Miranda -, o posicionamento do Governo. Farei a entrega a V. Exª , porque como representante do Amazonas, assim como o Sr. Senador Gilberto Miranda, tenho certeza de que tem interesse especial pelo Projeto SIVAM, embora este seja do mais alto alcance. Este compromisso assumo com V. Exª: tão logo tiver em mãos o estudo do Governo, eu o encaminharei a V. Exª.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Muito obrigado a V. Exª, nobre Senador Elcio Alvares. Aguardo o encaminhamento do documento.

O Sr. Gilberto Miranda - Permite V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Nobre Senador Gilberto Miranda, o nobre Senador José Eduardo Dutra havia solicitado o aparte anteriormente.

O Sr. Gilberto Miranda - É apenas para dizer a V. Exª que aceito o debate técnico, em plenário, com o Sr. Senador Elcio Alvares, a respeito da parte técnica do Projeto.

O Sr. Elcio Alvares - Nobre Senador Jefferson Péres, citado que fui, faço apenas uma colocação: deixo muito claro que não sou técnico no Projeto SIVAM; atenho-me apenas à responsabilidade do Senado. Parece-me que a responsabilidade do Senado, na apreciação da matéria na Comissão de Assuntos Econômicos, teria que ficar adstrita a um painel de apreciação e julgamento. Evidentemente o nobre Senador Gilberto Miranda - acredito - mais do que qualquer um de nós tem conhecimento a respeito desse Projeto. Mas eu não gostaria de levar o debate para esse campo, tanto que tive a humildade de falar neste plenário que solicitei aos órgãos técnicos do Governo a apreciação sobre o Projeto. No entanto, o Governo tem o direito de fazer essa apreciação. Acima de tudo, tenho obrigação com os meus companheiros de Senado de encaminhar a cada um a explicação técnica dos setores que estão envolvidos, principalmente da Aeronáutica, que - repito - é constituída de homens que conhecem não somente o avanço tecnológico, mas que têm, acima de tudo, a tarefa patriótica de dar ao nosso País o que há de melhor no que se refere a uma matéria dessa importância, como é o Projeto SIVAM.

O Sr. José Eduardo Dutra - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Concedo o aparte ao nobre Senador José Eduardo Dutra.

O Sr. José Eduardo Dutra - Nobre Senador Jefferson Péres, serei bastante breve, pois não pretendo tomar o tempo de V. Exª, que faz um pronunciamento bastante sereno - aliás, é característica de V. Exª. Espero que o episódio do SIVAM, independentemente dos desdobramentos que dele poderão advir, sirva como lição para esta Casa. Na medida em que nenhum de nós Senadores tem obrigação de ter conhecimentos técnicos sobre WAAS, sobre OTH, o ensinamento que nos fica é de que esta Casa não poderá mais, em se tratando de matérias de tal relevância e de tal importância, aceitar pedidos de urgência por parte do Executivo e aceitar como verdade absoluta as exposições de motivos que acompanham esses pedidos de urgência. Acredito que, se esta Casa incorporar apenas esse ensinamento, já dará grande contribuição para o fortalecimento da democracia e do Congresso brasileiro. Muito obrigado.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Na verdade, Senador José Eduardo Dutra, é realmente estarrecedor que um projeto dessa importância e magnitude tenha sido aprovado em uma antevéspera de Natal, às 23h, com o plenário vazio. Que isso nunca mais se repita. Realmente essa é a minha esperança.

O Sr. Ney Suassuna - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Ney Suassuna - Senador Jefferson Péres, o Líder do Governo comprometeu-se a trazer informações e dados técnicos a esta Casa. Isso é muito bom. Sou um dos que se sentem exatamente como V. Exª está-se sentindo. Creio que em momento como esse não podemos desprezar a possibilidade de uma tecnologia melhor a um preço menor. Não podemos, de maneira alguma, ter a pirraça de dizer: "mas a posição estava tomada"! A meu ver, se se tratar de economia para o povo brasileiro e, mais ainda, se for comprovado que o preço é menor, devemos optar pela melhor solução para o nosso País. O Relatório do Senador Gilberto Miranda trouxe-me dúvidas. Para que possamos decidir, precisamos exatamente de melhores informações, mais claras, mais técnicas. Acredito que é da competência do Senado Federal apenas a discussão do empréstimo. Mas neste momento é obrigação do Senado Federal clarificar todo esse caso.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Com certeza, Senador Ney Suassuna, é o que o Senado precisa fazer.

O Sr. Lúdio Coelho - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Senador Lúdio Coelho, concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Lúdio Coelho - Senador Jefferson Péres, as preocupações de V. Exª são as preocupações da Nação brasileira; pessoalmente participo delas. O Projeto SIVAM está causando uma dúvida muito grande ao País. Não sabemos o que fazer. O alerta de V. Exª é muito importante para que o Senado examine cuidadosamente o caminho a tomar. Vamos examinar e fazer o que for mais conveniente à Nação, sem nenhuma dose de precipitação. Recomendo um estudo muito cuidadoso. Felicito V. Exª por esse posicionamento.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Muito obrigado Senador Lúdio Coelho. É o mínimo que poderemos fazer.

O Sr. Eduardo Suplicy - Permite V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Concedo o aparte ao nobre Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy - Senador Jefferson Péres, cumprimento-o pelas observações que faz, sobretudo por ser V. Exª Senador pelo Estado do Amazonas. V. Exª demonstra cuidado ao tratar da coisa pública, razão pela qual o felicito. Acredito que precisamos ver qual a melhor forma de desenvolver, de proteger toda a Amazônia. Quando o Governo solicitou que o Senado Federal aprovasse o levantamento de empréstimos da ordem de US$1,4 milhão, avaliei que se tratava de decisão que mereceria extraordinário cuidado. O Governo havia optado, por questões de segurança nacional - foi ouvido o Conselho de Segurança Nacional -, por um procedimento de seleção especial e não de licitação pública para a escolha do Projeto SIVAM. Seria o caso de, diante de tudo aquilo que está sendo revelado, revermos com profundidade e possivelmente recomendarmos ao Governo - acredito que esse será o caminho - seja efetuada uma licitação. Há um ponto importante a ser esclarecido, na medida em que o Presidente da República, ontem, revelou que há cerca de duas semanas havia recebido o Senador Gilberto Miranda, Relator da matéria, e que S. Exª havia dado a informação - segundo o Presidente - de que, caso todo o projeto pudesse ser efetuado pela Raytheon, Sua Excelência daria parecer favorável. E, diante da postura do Senador Gilberto Miranda de propor, a partir das averiguações que fez e do que S. Exª viu na Ucrânia e na Rússia, que pode haver outros sistemas tecnologicamente mais avançados e mais baratos e que não se deveria seguir aquele caminho, avalio que seria importante o esclarecimento em profundidade também dessa questão. Porque, afinal de contas, pelo que li na imprensa, o Senador Gilberto Miranda deu uma outra versão sobre seu diálogo com o Presidente. Há, portanto, duas versões: a palavra do Presidente e a do Senador Gilberto Miranda. Espero que tenhamos a possibilidade, num breve espaço de tempo, ainda mais porque foi decidido que as três Comissões, a de Assuntos Econômicos, a de Relações Exteriores e Defesa Nacional e a de Fiscalização e Controle irão averiguar tudo o que está se passando, acredito que teremos, num breve espaço de tempo -repito-, a possibilidade de concluirmos o que realmente se passou. Se porventura essas três Comissões, num período de duas semanas, não chegarem a desvendar os fatos satisfatoriamente, então, será inevitável a formação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Senador Eduardo Suplicy, sem dúvida o Senado deve reexaminar o Projeto SIVAM em profundidade, mas deve andar nesse terreno movediço com muita cautela, com redobrada cautela, para que não sejamos usados como instrumento nessa novela de capítulos cada vez mais mal-explicados e malcheirosos, na qual me sinto profundamente desconfortável.