Discurso no Senado Federal

ANALISE DAS AFIRMAÇÕES DO EXMO. SR. PRESIDENTE DA REPUBLICA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, SOBRE O SIVAM, PUBLICADAS NOS JORNAIS DE HOJE. JUSTIFICANDO REQUERIMENTO QUE IRA APRESENTAR, SOLICITANDO INFORMAÇÕES AO MINISTRO DA FAZENDA, SR. PEDRO MALAN.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REGIMENTO INTERNO. SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM). MINISTERIO DA FAZENDA (MF), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES.:
  • ANALISE DAS AFIRMAÇÕES DO EXMO. SR. PRESIDENTE DA REPUBLICA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, SOBRE O SIVAM, PUBLICADAS NOS JORNAIS DE HOJE. JUSTIFICANDO REQUERIMENTO QUE IRA APRESENTAR, SOLICITANDO INFORMAÇÕES AO MINISTRO DA FAZENDA, SR. PEDRO MALAN.
Publicação
Publicação no DSF de 24/11/1995 - Página 3692
Assunto
Outros > REGIMENTO INTERNO. SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM). MINISTERIO DA FAZENDA (MF), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES.
Indexação
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, CUMPRIMENTO, REGIMENTO INTERNO, MESA DIRETORA, CONGRESSO NACIONAL.
  • ANALISE, DECLARAÇÃO, AUTORIA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, RELAÇÃO, PROJETO, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).
  • ENCAMINHAMENTO, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, MESA DIRETORA, ENDEREÇAMENTO, PEDRO MALAN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), SOLICITAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, CREDITOS, EXTERIOR, PAGAMENTO, CONTRATO, PROGRAMA, VIGILANCIA, REGIÃO AMAZONICA, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).

O SR. EDUARDO SUPLICY (PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Agradeço a atenção de V. Exª, Sr. Presidente. É importante o cumprimento do Regimento Interno. O Art. 14, II, a, já foi objeto de uso do Presidente José Sarney, com rigor.

      "Art. 14. O Senador poderá fazer uso da palavra:

      II - se líder:

      a) por 5 minutos, em qualquer fase da sessão, excepcionalmente, para comunicação urgente, de interesse partidário".

Desse modo, em qualquer fase da sessão para o Líder é mais forte do que aquele outro item que V. Exª leu, e o Presidente José Sarney aqui já o usou. Outro dia ainda, o Senador Renan Calheiros usou excepcionalmente da palavra como Líder, invocando exatamente esse item. Apenas para reflexão da Mesa, Sr. Presidente, para que o Presidente cumpra o Regimento Interno com o rigor necessário.

Ainda ontem, Sr. Presidente, Senador José Eduardo Dutra, Srªs. e Srs Senadores, o Presidente Fernando Henrique Cardoso qualificou de "corvos", segundo a imprensa, os críticos do Sistema de Vigilância da Amazônia e garantiu que o projeto será retirado se apontarem nele "uma só irregularidade". Disse ainda: "Vamos evitar que esse espírito de corpo volte a pousar no País. De ver podridão em tudo. Há vontade de sentir cheiro de carniça. Essa carniça exala da própria consciência malsã dos que não percebem que há gente com espírito público".

Em primeiro lugar, quero ressaltar que reconheço no Presidente Fernando Henrique Cardoso pessoa que durante a sua vida mostrou ter espírito público. Gostaria, ainda, de dizer que fui o único, no Senado Federal, a votar contra o projeto de resolução que autoriza o financiamento para o projeto SIVAM. Obviamente, quero dizer ao Presidente que considero mais do que legítimo que um Senador da Oposição esteja aqui a apontar questões tais como as que apontei na noite do dia 21 de dezembro de 1991. Gostaria de relembrar alguns fatos importantes e concluir com algumas observações sobre a necessidade de termos informações precisas em alguns pontos.

Primeiro, o Senado Federal, com o parecer favorável do Senador Gilberto Miranda e com o meu voto contrário, aprovou, em 21 de dezembro de 1994, projetos de resolução nos quais o Governo solicitava autorização para contratação de operação de crédito externo para a implantação do Projeto SIVAM.

Durante aquela sessão questionei, primeiro, a necessidade urgente de aplicarmos US$1 bilhão e 700 milhões num sistema de radares e tudo que compunha o Projeto SIVAM. Na verdade, o Projeto SIVAM é apenas parte do Projeto SIPAM, que, este sim, visa a integrar a Amazônia como um todo.

Creio, como declarei à época, que o volume de recursos é demasiadamente elevado para um retorno que, talvez, não melhore a qualidade de vida daquela população. Quero dizer que não tenho a certeza de que esse dispendioso projeto, do modo que está concebido, seja o mais adequado para a proteção e o desenvolvimento da Amazônia.

Devemos ter em mente que o mais importante é elevar a qualidade de vida, aplicando da forma mais correta os poucos recursos disponíveis. Não conheço tão bem a Amazônia quanto a Senadora Marina Silva e os outros Senadores do Amazonas, mas posso dizer que é excessiva a aplicação de US$1 bilhão e 700 milhões, os quais, na verdade, ao longo de 15 ou 19 anos, serão US$2 bilhões e 800 milhões, conforme a demonstração de pagamentos de despesas.

Não seria melhor para a própria proteção e desenvolvimento da Amazônia se utilizássemos tais recursos nos projetos que visam à criação de empregos, à proteção do meio ambiente, à formação de cooperativas como aquelas que eu próprio visitei no Estado do Acre, onde se procura cultivar uma multiplicidade de plantações, num sistema que, efetivamente, cria riquezas, distribui renda e cria empregos?

Em terceiro lugar, o Governo, sob o argumento de que o Projeto SIVAM era matéria de segurança nacional, fez com que a sua tramitação e aprovação ocorresse com a maior urgência. Estranhamente, quando tentei garantir que o Poder Executivo, através de seus funcionários, tivesse o controle e a operação do sistema em suas mãos, o Relator rejeitou a minha proposição alegando ser ela corporativa.

Srªs. e Srs. Senadores, todos sabemos que as pessoas devem lealdade às instituições para as quais trabalham. Sendo assim, se empresas privadas ou estrangeiras, como consta do contrato assinado entre o Governo e a Raytheon, controlarem e operarem o sistema, serão elas que efetivamente comandarão o SIVAM. Logo, o Projeto SIVAM deixa de ser considerado de segurança nacional como foi sustentado pelo Governo.

Em quarto lugar, o Governo tem afirmado, insistentemente, que a Comissão de Coordenação de Implantação do SIVAM fará a integração do sistema. Ratificou tal afirmativa mediante a Mensagem nº 858/95, na origem, enviada ao Congresso em agosto último, através da qual solicitou a alteração das resoluções do SIVAM. Todavia, pelo contrato comercial firmado entre a Raytheon e o Poder Executivo, está claro que a empresa americana será a integradora, fornecendo softwares do sistema.

Este ponto vital do projeto não está colocado de forma clara e objetiva para a opinião pública.

Um ponto importante, Sr. Presidente: a mídia publica hoje que o Brasil deverá pagar U$3,5 milhões de multa contratual - se já não pagou - pois os recursos do financiamento externo já estão à disposição do Governo.

As resoluções aprovadas pelo Senado não autorizaram a contratação do empréstimo nas condições ora existentes, o que me faz concluir que a efetivação do pagamento da referida multa será - se já não o foi - realizada ao arrepio da lei.

Por causa dessa minha preocupação, Sr. Presidente, estou dando entrada a este requerimento de informações que passo a ler:

"Requeiro, nos termos regimentais, sejam prestadas pelo Ministro da Fazenda, Sr. Pedro Malan, as seguintes informações:

1. O Banco Central do Brasil tem registro de qualquer contrato financeiro firmado entre o Governo brasileiro e a filial do Banco do Brasil nas Ilhas Grand Cayman, com a empresa Raytheon Company ou com o EXIMBANK, para o fornecimento de crédito externo para pagamento dos contratos comerciais do Projeto SIVAM/SIPAM?

2. Em caso afirmativo, em que data foram assinados e registrados tais contratos? Qual o valor e quais as condições prescritas em cada um, principalmente no que se refere a pagamento de multas ou commitment fee?

3. O Governo brasileiro já desembolsou recurso para fazer frente a qualquer compromisso derivado destes contratos? Em caso afirmativo, sob que título foram pagos? Quais os valores e em que datas foram realizados esses desembolsos? Estão previstos outros pagamentos a serem realizados nos próximos 6 (seis) meses?

4. Que pareceres jurídicos embasam o registro dos contratos e os pagamentos de valores deles derivados? Houve manifestação da Procuradoria-Geral da Fazenda, da Secretaria do Tesouro Nacional ou de qualquer outro órgão do Governo?

Solicito, também, o encaminhamento dos contratos financeiros firmados, bem como dos pareceres que embasaram os contratos e eventuais pagamentos derivados dos mesmos."

E justifico:

"A imprensa tem informado a respeito de pagamentos de multas realizados pelo Governo brasileiro em função de contratos relativos aos projetos SIVAM/SIPAM. Os esclarecimentos solicitados são motivados pela estranheza causada por estas notícias, tendo em vista que a Resolução aprovada pelo Senado Federal não permite tais atos. A Resolução condiciona a assinatura dos contratos financeiros à assinatura dos contratos comerciais entre o Governo Brasileiro, a Raytheon e a empresa ESCA.

É do conhecimento público que a última das partes citada é inidônea e foi afastada das negociações. Tendo em vista estes acontecimentos, o Executivo encaminhou Mensagem Presidencial solicitando alterações na Resolução já aprovada, adequando-a à nova situação. No entanto, tal Mensagem encontra-se ainda em tramitação nesta Casa, tornando qualquer contrato que porventura tenha sido assinado desprovido da competente autorização legislativa.

Por essas razões, esta Comissão tem que ter conhecimento completo dos atos que possam ter sido efetivados à revelia dos preceitos legais."

Este requerimento, o entrego à Mesa, mas informo que também o entregarei à Comissão formada pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, Comissão de Assuntos Econômicos e Comissão de Fiscalização e Controle, na medida em que terá maior agilidade para obter tais informações importantes para o esclarecimento de todo o problema relativo ao SIVAM.

Quero dizer que será muito importante que essa grande Comissão que juntará três Comissões, realmente, mostre toda a vontade e eficiência em apurar o caso SIVAM. Já transmiti ao Presidente José Sarney, ao Líder do Governo, Elcio Alvares, e ao Senador que irá presidir essa Comissão, Senador Antonio Carlos Magalhães e aos demais Líderes que nós estamos colhendo assinaturas para a instalação da comissão parlamentar de inquérito. Neste instante, temos nove assinaturas de Senadores. Estamos conversando com os demais Senadores, mas o que temos ouvido é que os Senadores vão considerar importante o trabalho dessa comissão.

Então, será necessário que a comissão venha, efetivamente, a realizar o trabalho que a opinião pública brasileira dela espera.

Gostaria, ainda, de comentar sobre o que conversamos com o Presidente Fernando Henrique Cardoso, no dia em que Sua Excelência recebeu a visita do Presidente José Dirceu e do Líder do PT na Câmara. Eu próprio estava presente, juntamente com o Sr. Francisco Graziano; o coordenador do Movimento dos Sem-Terra, José Carlos Stedeli, e outras poucas pessoas.

Naquela ocasião, conversamos, sobretudo, sobre a questão da reforma agrária. O Presidente José Dirceu falou que o episódio de Corumbiara deveria ser o último caso de violência, ocorrido neste País, contra trabalhadores sem terra.

Essa audiência durou por volta de uma hora e meia. Ao final, o Presidente Fernando Henrique Cardoso expôs a sua preocupação com relação à tramitação do Projeto SIVAM. V. Exª, Sr. Presidente, sabe que somos contrários ao Projeto SIVAM; votei contra esse projeto. Eu disse ao Presidente que, agora, quem estava realizando um trabalho de investigação e de apuração, de grande profundidade, era o Senador Gilberto Miranda, que, naquela semana, tinha argüido longamente o Ministro Nelson Jobim por mais de uma hora e meia; só S. Exª fez mais de vinte perguntas ao Ministro. O Presidente demonstrou a sua estranheza. Eu lhe disse que se trata de um procedimento adotado por S. Exª, que irá levar muitas semanas, na medida em que há tantos ministros, autoridades e cientistas para serem ouvidos.

O Presidente fez um comentário no sentido de que haveria algum motivo especial da parte do Senador Gilberto Miranda relativamente a isso.

Mas eu gostaria de aqui registrar aquilo que o próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso transmitiu aos líderes da base governista e o Senador Elcio Alvares transmitiu a mim.

Ontem, na Embaixada da Alemanha, comentei com o Presidente Fernando Henrique Cardoso a conversa que Sua Excelência teve com o Senador Gilberto Miranda. Na ocasião, S. Exª transmitiu ao Presidente que, se fosse para o Projeto SIVAM ser inteiramente realizado pela RAYTHEON, usando a expressão turned key, isto é, porteira fechada, incluindo aquilo que era da ESCA - todas as obras civis -, ele estaria disposto a dar um parecer favorável.

O Presidente ressaltou que isso precisaria ser estudado atentamente pelo Ministro da Aeronáutica, Mauro Gandra; pelo Brigadeiro Oliveira, membro da Comissão que coordena o Projeto SIVAM; e pelo Embaixador Ronaldo Sardenberg, da SAE.

Houve, então, um novo diálogo com essas três pessoas, ocasião em que o Senador Gilberto Miranda transmitiu novamente aquela mesma postura e proposição.

Comuniquei ao Presidente que, ontem ainda, o Senador Gilberto Miranda afirmou ter entregue uma carta antes disso, dizendo das suas críticas ao Projeto SIVAM. Contudo, o Presidente reiterou que isso ocorreu há quinze dias, e não foi apenas Sua Excelência, é a palavra do Presidente e o testemunho das outras três autoridades citadas que se contradizem com a do Senador Gilberto Miranda.

Essa questão, obviamente, deverá ser objeto da atenção e do esclarecimento da Comissão, que se reunirá na próxima terça-feira, às 17h, para analisar o conteúdo do relatório sobre a motivação das degravações, que deve ter sido entregue hoje pelo Ministro da Justiça Nelson Jobim.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/11/1995 - Página 3692