Discurso no Senado Federal

ABORDAGEM SOBRE O DEFICIT HABITACIONAL BRASILEIRO.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA HABITACIONAL.:
  • ABORDAGEM SOBRE O DEFICIT HABITACIONAL BRASILEIRO.
Publicação
Publicação no DSF de 12/12/1995 - Página 5438
Assunto
Outros > POLITICA HABITACIONAL.
Indexação
  • DENUNCIA, GRAVIDADE, PROBLEMA, HABITAÇÃO POPULAR, EFEITO, AUSENCIA, ESTABILIDADE, ECONOMIA, INEFICACIA, BANCO NACIONAL DE HABITAÇÃO (BNH), NECESSIDADE, DIRETRIZ, UNIÃO FEDERAL, DESENVOLVIMENTO URBANO, SANEAMENTO BASICO, TRANSPORTE URBANO, CUMPRIMENTO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
  • CRITICA, DESTINAÇÃO, INVESTIMENTO PUBLICO, HABITAÇÃO, CLASSE SOCIAL, RIQUEZAS, NECESSIDADE, OPÇÃO, CONSTRUÇÃO, IMOVEL, DESTINO, LOCAÇÃO, TRABALHADOR.
  • INFORMAÇÃO, GESTÃO, ORADOR, EX GOVERNADOR, ESTADO DO MARANHÃO (MA), IMPOSSIBILIDADE, SOLUÇÃO, PROBLEMA, HABITAÇÃO POPULAR, TRANSCRIÇÃO, PROGRAMA DE GOVERNO, RELAÇÃO, POLITICA HABITACIONAL.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL-MA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o nosso País ainda não enfrentou com seriedade um dos seus mais graves problemas, que é o da habitação popular.

Nos dias que correm, calcula-se que é de 10 a 12 milhões o nosso déficit habitacional, engrossado a cada ano por novos 500 mil brasileiros que procuram uma casa para residir com sua família.

Em tempos passados, houve tentativas que, se levadas à frente com persistência e criatividade, talvez tivessem encontrado as soluções ainda não encontradas. Refiro-me à Fundação da Casa Popular e, também há mais de cinqüenta anos, à autorização dada aos então Institutos de Previdência, a começar pelo antigo IAPI, para a construção e o financiamento de imóveis.

Todas essas tentativas, porém, foram eliminadas, concentrando-se os esforços governamentais, nesse setor, no Banco Nacional de Habitação, a partir de 1966.

Dali para cá, ampliaram-se as correntes migratórias para os grandes centros, esvaziando-se os campos com o inchaço das cidades. Multiplicou-se geometricamente o número dos 'sem-tetos', e com eles vieram as invasões de terrenos públicos e particulares, as concentrações faveladas. Muitas dessas comunidades conseguiram disciplinar suas ocupações e, mesmo sem a ajuda do poder público, tornaram-se até um modelo de organização social. Muitas outras, porém, especialmente no Rio de Janeiro e em São Paulo, continuaram vivendo em moradias indignas do ser humano, fugindo das suas lideranças o controle da violência, do adequado saneamento básico e da propagação de doenças.

A instabilidade econômico-financeira vivida pelo Brasil, nessas últimas décadas, seguramente foi um dos principais motivos do fracasso dos organismos que deviam solucionar o problema habitacional. A inflação galopante erodiu todos os planos que visaram soluções a médio e a longo prazo. Muitos outros motivos, de igual modo, conjugaram-se para impedir o nosso avanço em tão importante setor.

Sr. Presidente, compete à União instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos (art. 21, inciso XX, da Constituição Federal), o que até agora não se fez, como centenas de outras promessas constitucionais não cumpridas.

Parece-me claro, entretanto, que residem nos artigos 23, inciso IX; 30, inciso VIII, e 182 e seus parágrafos, o caminho normativo que estimularia a implementação, em nosso País, de uma política habitacional.

O primeiro estabelece a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico. O art. 30 e seu inciso VIII dão competência aos Municípios para promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano. E o art. 182 e seus parágrafos delegaram ao poder público municipal a responsabilidade de traçar a política de desenvolvimento urbano, buscando ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. A Constituição, nesses dispositivos, ofereceu aos Municípios os instrumentos coercitivos para cumprirem a sua missão.

As normas constitucionais, na verdade, ajudam como orientação ou como um instrumento para conscientizar o cidadão dos seus direitos e dos seus deveres, mas nada podem fazer sozinhas.

Aos juros atuais - referindo-me somente às instituições oficiais de crédito e abstraindo-me do sistema bancário privado - a aquisição da casa própria é difícil até mesmo para a classe média alta e absolutamente impossível para os assalariados de baixa renda.

A nossa prática habitacional continua voltada, pois, para os grandes investimentos, inalcançáveis pelos que mais precisam de um teto sob o qual manterem suas famílias, que são os milhões de trabalhadores de menor ou nenhum poder aquisitivo.

Diariamente estampam os jornais custosos anúncios de novos edifícios do mais alto luxo, com acabamentos suntuários que só fazem encarecer sobremodo as construções. São construções financiadas com o dinheiro de instituições arrecadadoras dos depósitos e tributos pagos pelo povo. Em outras palavras, os edifícios luxuosos são na verdade financiados pelos que não podem adquiri-los.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, note-se que quando se fala em habitação, no Brasil, o raciocínio cinge-se à casa própria, construída por uma determinada organização, sempre com objetivo de lucro, a ser vendida para alguém em condições de comprá-la.

Já nos esquecemos do instituto da locação, do aluguel, há muitos anos abandonado pelas firmas construtoras.

E não é sem razão o desinteresse das empresas privadas pela locação de casas populares, tais os entraves da burocracia legal e judiciária que encontrariam pela frente.

No Brasil, precisamos voltar a pensar seriamente em imóveis populares para locação, destinados aos trabalhadores que não têm condições para adquiri-los.

Ao assumir o Governo do Maranhão, em 1991, levei para o Palácio dos Leões essa preocupação sobre política habitacional, e três anos depois, ao deixar a administração para me candidatar ao Senado, trouxe comigo a frustração de não ter resolvido adequadamente o problema que também angustia meus conterrâneos maranhenses.

Defrontei-me com compromissos inadiáveis. Um Estado, que já fora exportador de gêneros alimentícios, agora os importava do Sul e de vizinhos. Nossos produtores rurais, desestimulados, cruzavam os braços. A falta de estradas impedia a livre circulação entre os Municípios e os pontos de comércio. A juventude reclamando escolas e empregos. A mortalidade infantil superando os índices da tolerância internacional. Os setores culturais reclamando a salvação do velho teatro, uma das construções mais bonitas do Brasil, na iminência de ser demolido por segurança pública. O meio ambiente degradado, inclusive nossas belas praias de São Luís. Credores nacionais e internacionais batendo às nossas portas.

Não me foi dado o direito de muitas escolhas. Minha administração construiu ou reparou mais de quatrocentas escolas. Doamos a cada aluno o seu material escolar. Oferecemos cursos de aperfeiçoamento para professores. Triplicamos o número de matrículas no primeiro e no segundo graus. Investimos na saúde, na agricultura, na informatização para o aumento da arrecadação. Distribuímos mais de 25.000 títulos de terra, um marco histórico, junto com um milhão de toneladas de sementes selecionadas e centenas de milhares de ferramentas de trabalho agrícola. Construímos e asfaltamos 750 quilômetros de rodovias do total de 1.200 construídos em 400 anos de Maranhão. Ampliamos a distribuição de energia para as frentes agrícolas que se implantaram no sul do Estado. Da colossal dívida superior a 1bilhão e 600 milhões de dólares - assumidos por governos que me antecederam -, honrei o pagamento de 250 milhões de dólares e não contraí um centavo de novas.

Quanto às habitações populares, tão carentes em meu Estado, pudemos construir algumas centenas, mas em número muito inferior ao que planejávamos construir, tolhidos que estivemos pela premência de solução para problemas emergenciais.

A esse respeito, peço licença aos meus generosos Pares para transcrever o programa de governo, relativo à política habitacional, com que me apresentei ao povo do Maranhão. Nele há conceitos que se aplicam não somente ao meu Estado, mas a todo o País, e apresentam-se com toda a atualidade.

Dizia em 1991:

"O agravamento do déficit habitacional, nos últimos 30 anos, ocorreu justamente após a criação do Banco Nacional de Habitação - BNH -, que marginalizou o segmento da baixa renda (1 a 5 SM), que, embora representando 80% da população brasileira, recebeu apenas 8% dos recursos do Sistema Financeiro da Habitação - SFH -, tornando explosiva a crise social em todo o País, que teve como resultado a onda de invasões de terrenos urbanos ocorrida na última metade dos anos 80.

No Maranhão, nesses 30 anos, foram construídas 37.809 habitações, sendo 25.809 pela COHAB e 12.000 pelo Instituto de Previdência do Maranhão - IPEM. A demanda não atendida transformou São Luís em uma ilha cercada de palafitas por todos os lados e fez surgir a indústria das invasões.

O déficit habitacional brasileiro situa-se na faixa de 10 a 12 milhões de habitações, sendo que no Maranhão este número é de 170 mil habitações e tem as mesmas causas, que resultam basicamente de: falta de renda compatível com o valor dos imóveis colocados à venda pelo mercado imobiliário, uma vez que 80% da população economicamente ativa ganha até 2 SM; a especulação imobiliária e a rápida expansão urbana fazem com que o custo da terra se torne inacessível à população de baixa renda; os mecanismos de financiamento do SFH, criados para atender a população de baixa renda, se tornaram ineficientes diante da instabilidade econômica vivida pelo País há anos, e pela falta crônica de recursos financeiros, pela CEF; a elevação do custo dos materiais de construção, pela cartelização desse setor, e o lucro excessivo do setor imobiliário privado; e finalmente a falta de uma política pública para a habitação a nível nacional.

Neste contexto, a questão habitacional exige ação imediata dos poderes públicos nos três níveis de governo, encarando-a como um problema social grave, e não meramente como um negócio bancário. A baixa renda precisa ser fortemente subsidiada para ter acesso a uma moradia condigna."

Nesse mesmo programa de governo, propus as seguintes ações:

"1 - Implantação de um Programa Municipal de Habitação Popular, mediante convênio com o Governo do Estado, visando à regionalização dos investimentos, à utilização das potencialidades regionais e ao fortalecimento da economia local.

2 - Promover a regularização das áreas urbanas e rurais ocupadas por invasões consolidadas.

3 - Criar o Programa Estadual de Geração de Tecnologia Habitacional e de Saneamento que visa ao barateamento dos materiais de construção a partir da realidade local, usando a mão-de-obra, instalações e equipamentos da Universidade Estadual do Maranhão.

4 - Criar o Programa de Geração de Emprego e Renda que permita à população atendida pelo programa arcar com as prestações da casa própria.

5 - Criar o Programa do Banco de Ferramenta e do Material da Construção, para atender aos pequenos produtores rurais, microempresários e às famílias de baixa renda.

6 - Recuperar a administração, sanear as finanças e fortalecer a COHAB-MA.

7 - Atender à demanda por habitação, das várias faixas de renda com os seguintes Programas:

. Lotes Urbanizados;

. Lotes Urbanizados + Cesta Básica de Materiais;

. Lotes Urbanizados + Casa iniciada;

. Reurbanização de Favelas e Melhoria de subabitações;

. Lotes produtivos e Casa Rural;

.Conjunto Habitacional.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, estou certo de que essa preocupação com o problema habitacional envolve todos os meus Pares nesta Casa, cada qual procurando o melhor caminho para as soluções definitivas.

Devemos, portanto, estar atentos às proposições em tramitação, nesta Casa ou na Câmara, que versam sobre essa matéria, e a elas oferecermos a nossa experiência, a fim de que, dentro da realidade brasileira, possamos ao menos amenizar o angustiante problema da habitação popular em nosso País.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/12/1995 - Página 5438