Pronunciamento de Júlio Campos em 18/01/1996
Discurso no Senado Federal
NECESSIDADE DE QUE SE RECOLOQUE EM DISCUSSÃO O USO DA ENERGIA NUCLEAR NO BRASIL.
- Autor
- Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
- Nome completo: Júlio José de Campos
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA ENERGETICA.:
- NECESSIDADE DE QUE SE RECOLOQUE EM DISCUSSÃO O USO DA ENERGIA NUCLEAR NO BRASIL.
- Publicação
- Publicação no DSF de 19/01/1996 - Página 559
- Assunto
- Outros > POLITICA ENERGETICA.
- Indexação
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- ANALISE, VANTAGENS, RISCOS, UTILIZAÇÃO, ENERGIA NUCLEAR, IMPACTO AMBIENTAL, PRIORIDADE, SEGURANÇA.
- ANALISE, SITUAÇÃO, BRASIL, DIFERENÇA, TRATAMENTO, PAIS, PRIMEIRO MUNDO, TERCEIRO MUNDO, ACORDO INTERNACIONAL, ENERGIA NUCLEAR.
- NECESSIDADE, DEBATE, CONTINUAÇÃO, PROGRAMA NUCLEAR BRASILEIRO, CONTROLE, TECNOLOGIA, PRESERVAÇÃO, SOBERANIA NACIONAL.
O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os desastres nucleares de Chernobyl, na ex-União Soviética, e de Three Miles Island, nos Estados Unidos, sem dúvida alguma vieram colocar um freio no andamento dos programas nucleares que se desenvolviam no mundo. Esses dois acontecimentos serviram para mostrar que a energia atômica, a despeito de suas inúmeras e incomensuráveis vantagens, no campo ecológico e no campo das ciências, requer uma atenção redobrada no que tange à segurança. De nada adianta ser menos poluente, se um acidente numa dessas usinas pode causar prejuízos inimagináveis e irreparáveis ao meio ambiente e à vida humana. De nada adianta salvar vidas às custas da utilização adequada e racional dos átomos, se um vazamento ocasional de combustível nuclear pode ceifar centenas de vidas ou prejudicar de forma irreparável milhares de outras.
O Brasil, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, muito já sofreu, em seu desenvolvimento, por não estar na vanguarda do conhecimento científico e tecnológico. Tudo aqui é conseguido a duras penas, pois muito daquilo que faz parte do dia-a-dia da ciência de países desenvolvidos e industrializados ainda precisa ser investigado por nossos cientistas como se ainda estivéssemos nos primórdios desses conhecimentos; muita descoberta da comunidade científica desses países é simplesmente sonegada aos nossos pesquisadores, com medo de que possamos, no futuro, utilizar esses conhecimentos contra esses mesmos países.
A esse propósito, é muito significativa a advertência contida em documento secreto da Embaixada Norte-Americana, a que a CPI encarregada de investigar as exportações de minerais radioativos, em 1956, teve acesso: "o estabelecimento no Brasil de um processo de extração de urânio fóssil pode ser considerado como uma ameaça à segurança dos Estados Unidos e do Hemisfério Ocidental"; ou a reação do Senador norte-americano John Genn à assinatura do acordo nuclear do Brasil com a Alemanha, em 1975: "Não temos mais o monopólio do conhecimento nuclear. Temos que encontrar novas formas de controle".
Como se vê, Srs. Senadores, O Saber é uma forma de dominação. Aquele que o detém, aquele que o transforma em novas tecnologias e em novos inventos tem o domínio, tem o controle, dita as normas. Aos outros cabe, tão somente, obedecer, fazer o que se manda.
A energia nuclear, apesar dos percalços mencionados no início, continua muito importante para a humanidade. Na França, por exemplo, setenta por cento da energia aí consumida são de origem nuclear. Nos países da Comunidade Européia a energia nuclear estará respondendo, no próximo ano, por quarenta por cento do consumo global de eletricidade. Em termos ecológicos, os benefícios dessa opção saltam à vista: no mundo industrializado, a França é um dos países em que os níveis de emissão do dióxido de carbono (CO2) é dos mais baixos. De acordo com Mauro Moura, assessor da INB - Indústrias Nucleares Brasileiras, estudos indicam que, "comparada a uma central a carvão da mesma potência, uma usina nuclear de mil megawats evitaria que nada menos de seis mil toneladas de poeira e oito milhões de toneladas de gás carbônico fossem lançadas na atmosfera no período de um ano. As centrais nucleares não produzem gás carbônico nem óxidos de enxofre e azoto, apontados como causas principais da degradação ambiental e responsáveis pela morte lenta das florestas em todo o mundo, principalmente na Europa".
Na medicina, o avanço proporcionado pelo uso adequado de energia nuclear foi simplesmente fantástico: a radioterapia, a cintilografia e a tomografia ajudam cada vez mais a diagnosticar doenças e salvar vidas. Mas, não é só isso: técnicas de irradiação criaram um campo novo na conservação de alimentos; o isótopo Carbono 14 revolucionou as técnicas de datação de obras de arte e de peças arqueológicas..
Infelizmente, o nosso acesso a essas novas tecnologias e a esses novos conhecimentos científicos só tem ocorrido a reboque dos países desenvolvidos.
Por pressões internacionais, principalmente dos Estados Unidos, os nossos conhecimentos nessa área estão no mínimo trinta anos atrasados. Documentos a que a CPI já mencionada teve acesso revelaram ainda a existência de um outro documento secreto, em que constava a exigência para a demissão do almirante Álvaro Alberto da presidência do CNPq pelo simples fato de ter adquirido à Alemanha três ultracentrifugadoras. Não só foi ele demitido como as ultracentrifugadoras foram arrestadas pelas tropas norte-americanas de ocupação, sediadas na Alemanha.
Paralelamente a essas pressões, existem outras igualmente duras. Carrion Júnior, Secretário de Planejamento do Rio Grande do Sul, em artigo publicado no Jornal de Brasília de 10/3/93, indaga, por exemplo: "Quem não sabe que o famoso Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares (TNP) é leonino, desigual e imoral, ao só estabelecer obrigações e restrições aos países que ainda não dominam a tecnologia nuclear, inclusive submetendo-os a inspeções humilhantes, a que o monopólio dos possuidores de bombas não se submetem?"
Por tudo isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não é só oportuno ou de bom alvitre, mas é urgente e obrigatório que recoloquemos em discussão a questão nuclear.
Precisamos escolher que caminho trilhar no futuro: se o caminho do desenvolvimento e da altivez como nação - o que implica grandes conhecimentos científicos e o domínio do átomo - ou o caminho da subserviência, que se contenta com aquilo que os outros quiserem nos repassar; se o caminho de quem é capaz de se impor por seus conhecimentos e suas idéias ou aquele de quem só faz o que outros querem que façam.
Caso optemos pela nossa afirmação como povo e como nação, o que nos parece óbvio, precisamos levar adiante o nosso programa nuclear tão penosamente iniciado e tão inexplicavelmente paralisado; precisamos dar condições aos nossos cientistas para que possam verdadeiramente perscrutar os intrincados caminhos da ciência e do saber; precisamos concluir a usina Angra II, para que não se percam os bilhões de dólares que ali já foram investidos e para que possamos desfrutar dos benefícios desse investimento. Com o Engenheiro Guilherme Camargo, concluo: "precisamos debater seriamente esta questão e não aceitar este apartheid nuclear que nos querem impor".
Muito obrigado!