Discurso no Senado Federal

GUERRA MULTINACIONAL PELA PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE. COMUNICANDO TER ENCAMINHADO REQUERIMENTO AO MINISTRO DAS MINAS E ENERGIA, SOLICITANDO INFORMAÇÃO SOBRE A EXPLORAÇÃO DE JAZIDAS DE OURO PELA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • GUERRA MULTINACIONAL PELA PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE. COMUNICANDO TER ENCAMINHADO REQUERIMENTO AO MINISTRO DAS MINAS E ENERGIA, SOLICITANDO INFORMAÇÃO SOBRE A EXPLORAÇÃO DE JAZIDAS DE OURO PELA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE.
Aparteantes
Coutinho Jorge.
Publicação
Publicação no DSF de 24/01/1996 - Página 791
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, PROGRAMA NACIONAL DE DESESTATIZAÇÃO, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD).
  • COMENTARIO, APREENSÃO, SOCIEDADE CIVIL, CONGRESSO NACIONAL, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD).
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), ESTADO DO PARA (PA).
  • DEFESA, MANUTENÇÃO, CONTROLE, EMPRESA PUBLICA, GOVERNO BRASILEIRO, MOTIVO, PATRIMONIO, TERRAS, PROPRIEDADE, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), ESTADO DO PARA (PA).
  • CRITICA, OBJETIVO, PAIS ESTRANGEIRO, JAPÃO, CONTROLE, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), MOTIVO, SEGURANÇA NACIONAL, ACESSO, MATERIA-PRIMA.
  • ENCAMINHAMENTO, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), RESULTADO, LEVANTAMENTO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), OURO, ESTADO DO PARA (PA).

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, já existe, neste País, uma guerra multinacional pela privatização da Companhia Vale do Rio Doce.

O Programa Nacional de Desestatização (PND) que o atual Governo vem implementando sempre nos pareceu marcado por equívocos. E o maior deles é a tentativa de privatização da Companhia Vale do Rio Doce - CVRD -, uma das maiores empresas do mundo no setor de extração e produção de minérios, cujo alcance empresarial estende-se também sobre uma série de outras áreas industriais.

A sociedade brasileira tem-se manifestado, por diversas ocasiões, apreensiva quanto às investidas que vêm sendo feitas em favor da privatização dessa empresa. Este debate tem, inclusive, ocupado certo destaque aqui no Senado, demonstrando, pelo posicionamento de um significativo número de Senadores, uma quase unanimidade em preservar a CVRD sob o controle estatal, dada sua importância estratégica para o nosso País.

Tenho dito reiteradas vezes, Sr. Presidente, que, para o meu Estado do Pará, o interesse na manutenção do controle estatal sobre essa Companhia é de suma importância. Ainda ontem, desta mesma tribuna, tive oportunidade de mencionar alguns dados sobre a atuação da Vale do Rio Doce no Pará, seu patrimônio, e a influência que tem sobre a economia do País, sendo óbvio que um empreendimento do porte da CVRD, neste momento em que se fala tanto em sua privatização, atraia os mais diversos interesses, afinal, avaliações preliminares que estão sendo feitas indicam um patrimônio estimado em torno de U$12 bilhões, sem se levar em consideração as reservas minerais cujas concessões são propriedade da companhia.

Além disso, asseguro que para os paraenses esta questão traz um outro desdobramento preocupante. Tenho insistido em denunciar neste plenário que a área de 1 milhão 167 mil hectares de terras ocupadas pela Vale no Estado do Pará é um verdadeiro enclave. Como se fosse um território autônomo dentro de uma unidade federada; com acesso restrito e uma série de outras limitações... Fico imaginando o que pode acontecer caso prospere essa idéia de privatização...

Se já é incômodo ter uma empresa estatal assenhorando-se de boa parte do território do Estado do Pará, em função das peculiaridades de sua atividade industrial, o que não dizer de uma empresa privada, cujas perspectivas indicam a possibilidade de que seja de origem multinacional agindo da mesma forma?

Pois bem, Srs. Senadores, se o governo brasileiro não tem interesse ou sensibilidade em preservar essa Companhia, em face da sua importância para nossa auto-suficiência no setor mineral, que lhe confere um papel estratégico em nossa economia, deveria mirar-se no exemplo de outros países, para os quais a defesa de interesses econômicos confunde-se com a defesa de sua própria autonomia como nação.

Neste sentido, as especulações em torno da privatização da Companhia Vale do Rio Doce nos permitem um exemplo indiscutível do que estamos afirmando.

A imprensa brasileira tem noticiado que o Japão, Sr. Presidente, está disposto a travar uma verdadeira guerra com a Austrália pela posse da Companhia Vale do Rio Doce, já que disso pode depender sua sobrevivência como país industrializado. As razões, Srs. Senadores, são de facílima compreensão: o Japão recebe da estatal brasileira cerca de 40% dos minérios que consome. Outros 40% são adquiridos junto aos australianos, significando que, se estes últimos vencerem a corrida pela compra da Companhia Vale do Rio Doce, nada menos do que 80% do suprimento das mais importantes matérias-primas na economia brasileira estarão sob controle australiano.

Para os japoneses, comprar a Vale do Rio Doce, caso esta venha a ser privatizada, tornou-se uma questão de interesse nacional, e como tal está sendo tratada naquele país. A mais importante empresa japonesa, a Nippon Steel, de uma influência no governo japonês inimaginável no Ocidente, sócia da Companhia Vale do Rio Doce em vários negócios, é quem deverá liderar os interesses japoneses, segundo informações de fontes ligadas àquela empresa.

Adquirir a Vale, para os japoneses, é hoje um caso de segurança nacional, visto que o Japão nunca superou o trauma do bloqueio de matérias-primas imposto pelos anglo-saxões na II Guerra. Portanto, deixar nas mãos da britânica Austrália a chave da sua capacidade de produção é tido pelos japoneses como inaceitável. Além disso, não se pode deixar de mencionar que muito do desenvolvimento industrial que o Japão alcançou até hoje se deve, em parte, às operações mantidas pelos japoneses com a própria Vale do Rio Doce, em face da associação mantida com a estatal brasileira na maior parte dos projetos desta companhia, situação esta que os japoneses têm interesse em preservar.

O Sr. Coutinho Jorge - V.Exª me permite um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE - Ouço V.Exª com alegria.

O Sr. Coutinho Jorge - Senador Ademir Andrade, V.Exª hoje analisa de forma clara e precisa a problemática relacionada à privatização da Vale do Rio Doce. E é uma ironia o que está acontecendo. Em primeiro lugar, nós, da Amazônia, nós, do Pará e de outros Estados brasileiros, somos contra a privatização da Vale do Rio Doce pelo seu papel estratégico e pela sua importância dentro do Brasil. E na Amazônia, V.Exª sabe, o papel da Vale é excepcionalmente estratégico. Ela detém o domínio, o comando dos maiores jazimentos minerais da região e comanda os projetos estratégicos mais importantes, como é o caso de Carajás, da Albrás, que é o maior complexo de alumínio e alumina da América Latina, e a implantação futura do Projeto Cobre-Salobo, para dar exemplo de três projetos fundamentais e estratégicos. A Vale do Rio Doce fornece uma grande quantidade de minerais, sobretudo para o Japão. O que se vê é o Governo entendendo que ela não é tão importante e tão estratégica para o Brasil. Em compensação, os concorrentes, como V.Exª coloca, australianos e japoneses, entendem que a Vale é fundamental para eles. Por um lado, os japoneses são dependentes de matéria-prima fornecida pela Vale. E V. Exª colocou que, durante a II Guerra Mundial, o Japão teve um problema gravíssimo em relação a esse bloqueio. Quem conhece sabe que é um país absolutamente pobre em recursos naturais, dependendo totalmente de sua importação. Por outro lado, os australianos são ofertantes de matéria-prima e produtos manufaturados derivados de minerais, dominam o mercado internacional. Com isso, o que vai acontecer? O Japão tem medo de que a Vale seja vendida aos australianos porque ele ficará altamente dependente de um mercado, de uma nação. Os australianos, por sua vez, se comprarem a Vale, serão monopolistas do mercado internacional. Portanto, um luta pela sobrevivência econômica; outro, pelo comando do monopólio desses produtos importantes. É uma guerra internacional importante, fundamental, a que V. Exª coloca. Isso é uma ironia. E o Brasil? O Brasil não defende a manutenção, o comando da Vale em nível estatal. Lamentavelmente é um equívoco do Governo tentar vender as ações da Vale. Deveríamos mantê-la no comando do Governo pelo papel estratégico e importante. E quem está dizendo isso não somos nós, não é o ilustre Senador Ademir Andrade, não é o governador do Pará, que é contra a privatização, que é do PSDB também, como eu. Quem está dizendo isso são países importantes como Japão e Austrália que lutam pela fatia que o Brasil quer vender, quer entregar a outros países. Acredito que a colocação de V. Exª é oportuna, correta, e nos dá mais força para que possamos lutar contra a privatização da Vale do Rio Doce. Ou seja, é o mundo, mercados importantes que mostram que a Vale é estratégica, é importante para o Brasil e para o mundo. Parabéns pelo seu pronunciamento oportuno e necessário.

O SR. ADEMIR ANDRADE - Agradeço a V. Exª, Senador Coutinho Jorge. Esperamos poder fazer o Governo voltar na sua decisão.

A luta dos japoneses deverá ocorrer principalmente com dois grandes grupos do setor de minérios: a RTZ - Rio Tinto Zinc, um grupo australiano controlado por ingleses, e o BHP, de capital exclusivamente australiano. Informações divulgadas pela imprensa brasileira dão conta de que altos executivos do RTZ andaram pelo Brasil ultimamente, iniciando contatos com vistas à formação de consórcios para atuar na privatização da Vale do Rio Doce.

Chega a ser vergonhoso, Sr. Presidente, observar dois países com um elevadíssimo nível de desenvolvimento econômico-social, como é o caso do Japão e da Austrália, em vias de travarem um duro enfrentamento na defesa de seus interesses industriais e econômicos, enquanto nós, no Brasil, abrimos mão exatamente do objetivo perseguido por esses dois países, qual seja, a auto-suficiência no setor de extração e produção mineral e a consolidação do nosso desenvolvimento industrial.

Considero, Sr. Presidente, que este Programa Nacional de Desestatização carece de uma discussão mais aprofundada nesta Casa. Afinal são os interesses e o patrimônio brasileiro que estão em jogo, e nós não podemos, de modo algum, deixar que esse processo de privatizações venha a fragilizar nosso País, tanto em nível interno quanto nas relações internacionais.

É importante ressaltar que a Companhia Vale do Rio Doce está se tornando a maior produtora de ouro do Brasil, cujas reservas nas áreas em que detém as concessões são ainda desconhecidas ou guardadas a sete chaves.

Em vista disso, encaminho à Mesa um pedido de informações dirigidas ao Ministro das Minas e Energia no sentido de que seja dado conhecimento a este Senado Federal dos estudos feitos pela Vale na área do garimpo de Serra Pelada, dando-nos conta do que existe de ouro naquela área, bem como a sua produção mensal atual, suas perspectivas até o anos 2000 e o potencial das reservas desse metal no Estado do Pará.

Gostaria de deixar devidamente registrados os termos desse pedido de informação, cuja resposta, espero, o Ministério encaminhe ao Senado Federal, porque interessa inclusive aos garimpeiros de Serra Pelada, já que existe uma disputa entre a Vale e os garimpeiros, os quais têm esse direito legítimo garantido pela Constituição.

As perguntas que faço ao Ministro das Minas e Energia, de maneira bem clara, são as seguintes: qual o potencial estimado de ouro existente em Serra Pelada, baseado nos estudos atuais feitos pela Companhia Vale do Rio Doce? Até hoje, ninguém consegue ter acesso a essas informações.

Qual a produção mensal de ouro da Companhia Vale do Rio Doce no Estado do Pará, nos anos de 92 a 95?;

Quais as perspectivas da Companhia Vale do Rio Doce em termos de exploração de ouro até o ano 2000, ano a ano?

Qual o potencial de todas as reservas de ouro da Companhia Vale do Rio Doce no Estado do Pará, que estejam sob concessão e as já em exploração?

São essas as perguntas que dirijo ao Ministro das Minas e Energia. Espero que S. Exª as responda devidamente.

Reitero que nós, Senadores desta Casa, aguardamos que o Sr. Líder do Governo, Senador Elcio Alvares, cumpra com o compromisso assumido no dia 15 de dezembro, por ocasião do encerramento da sessão legislativa do ano passado, de trazer ao plenário do Senado Federal o Sr. Ministro José Serra para que S. Exª nos esclareça o porquê de sua determinação em privatizar a Companhia Vale do Rio Doce.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/01/1996 - Página 791