Discurso no Senado Federal

OBSERVAÇÕES A PROPOSITO DA ELABORAÇÃO E APRECIAÇÃO DA LEI ORÇAMENTARIA PARA O ANO 1996.

Autor
Josaphat Marinho (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Josaphat Ramos Marinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ORÇAMENTO.:
  • OBSERVAÇÕES A PROPOSITO DA ELABORAÇÃO E APRECIAÇÃO DA LEI ORÇAMENTARIA PARA O ANO 1996.
Aparteantes
Antonio Carlos Magalhães, Flaviano Melo, José Roberto Arruda, João Rocha.
Publicação
Publicação no DSF de 26/01/1996 - Página 975
Assunto
Outros > ORÇAMENTO.
Indexação
  • COMENTARIO, DEMORA, CONGRESSO NACIONAL, DELIBERAÇÃO, ORÇAMENTO, UNIÃO FEDERAL.
  • DEMORA, TRAMITAÇÃO, COMISSÃO MISTA, ORÇAMENTO, FALTA, TEMPO, DEBATE, DISCUSSÃO, PROJETO, PLENARIO, CONGRESSO NACIONAL.
  • NECESSIDADE, MESA DIRETORA, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS, APRESENTAÇÃO, SOLUÇÃO, NORMAS, PROCEDIMENTO, APROVAÇÃO, ORÇAMENTO.
  • DEFESA, EMENDA, AÇÃO INDIVIDUAL, ORÇAMENTO.
  • ELOGIO, PROJETO, REGULAMENTAÇÃO, NORMAS, ELABORAÇÃO, ORÇAMENTO.

O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, devo fazer algumas observações a propósito da elaboração do orçamento.

Encerramos a sessão legislativa de 1995 sem deliberar sobre a matéria. Retomamos os trabalhos legislativos neste exercício, sob convocação extraordinária, e, até o momento, não se tem certeza se o orçamento será votado.

Ora, Srs. Senadores, esse problema não é do interesse apenas do Senado, nem da Câmara dos Deputados, isoladamente. O orçamento é a principal lei da República e, por isso mesmo, a lei mais fundamental que elaboramos em cada sessão legislativa. Assim é no mundo de hoje, sobretudo, o orçamento não se resume a uma enumeração de receita e despesa; o orçamento deve resumir os programas do governo.

Embora a Constituição não esteja sendo cumprida quanto à elaboração de planos nacionais, regionais e locais, embora assim não ocorra, há sabidamente programas: uns de natureza geral e outros de natureza mais reduzida. De qualquer modo, há programas que se transportam para o orçamento com as verbas respectivas. Há, de outro lado, aquelas verbas que resultam da própria iniciativa dos Parlamentares. Apesar disso, o orçamento continua sem chegar ao plenário do Congresso para deliberação até hoje, quando já nos aproximamos do final do mês de janeiro.

Ainda hoje, aliás, a imprensa publica que os Relatores parciais teriam entregue seus trabalhos ao Relator Geral. E a imprensa, como a dar a entender que não há deliberações seguras sobre as diferentes partes do orçamento, diz que os Relatores parciais transferiram os "abacaxis" ao Relator-Geral - permitam-me a palavra, foi a que a imprensa usou.

Vale dizer que não se está decidindo a matéria com critérios de segurança e certeza, como era de esperar-se. Isso significa que, já quase dois meses decorridos do exercício, o Governo não tem segurança de que verbas pode dispor, e o Congresso Nacional não tem o instrumento orçamentário votado para que possa exercer, sobre a ação administrativa, o seu poder de fiscalização e controle.

O Sr. Flaviano Melo - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Com prazer, ouço V. Exª.

O Sr. Flaviano Melo - Concordo plenamente com todo o seu pronunciamento. Apenas a título de informação, eu gostaria de relatar o que sei sobre o orçamento, porque faço parte da Comissão em questão. Ontem, às 24h30min, a última subcomissão concluiu os seus trabalhos, e os 7 relatórios dessas subcomissões já estão com o Relator-Geral. Devem chegar às mãos de V. Exª assim que o Prodasen os conclua, ainda esta semana. A votação desse orçamento está prevista, na Comissão, para quinta ou sexta-feira. Em seguida, irá ao plenário do Congresso Nacional, o que se acredita deverá acontecer até o encerramento dessa convocação extraordinária. Era só isso que eu gostaria de informar a V. Exª.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Só tenho razões para agradecer a atenção de V. Exª, dando as informações que acaba de prestar por intermédio do modesto discurso que profiro ao Plenário do Senado. Mas note V. Exª que a expectativa é de, ao fim da próxima semana, o Orçamento ser votado na comissão respectiva, já, portanto, no decurso do mês de fevereiro. Isso significa que, se o Orçamento vier ao Plenário do Congresso Nacional, será dias depois de iniciado o mês de fevereiro, o que resume a certeza de que não nos vai ser dada a oportunidade de criteriosa discussão da matéria.

Ainda uma vez corremos o risco, ou de não votar o Orçamento nesta convocação extraordinária, ou de apreciá-lo aos trambolhões, como tem ocorrido nos anos anteriores.

V. Exª não tem nenhuma culpa dessa situação, mas essa é a verdade que se está reproduzindo de ano em ano, com grave repercussão sobre a imagem do Congresso. A lei fundamental que nos cabe elaborar vem, sempre, não à nossa apreciação, nem mesmo à nossa decisão, mas à nossa aceitação, nas últimas horas de um prazo que for possível.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - V. Exª me concede um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Pois não, Nobre Senador.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - V. Exª aborda, como sempre o faz, com muita propriedade e competência, tema da maior importância para esta Casa: o assunto principal da razão de ser do Legislativo, eu diria. Não há por que o Legislativo não votar no próprio ano o Orçamento. Os Parlamentares mais antigos - e infelizmente estamos entre eles - viram como funcionava a Comissão de Orçamento em tempos idos e vemos como funciona agora. Evidentemente nenhum Parlamentar tem culpa. É essa estrutura atual a responsável pelo mau funcionamento da elaboração do Orçamento e pela repetição dos erros todos os anos, como V. Exª salienta muita bem. Mas o fato de não votarmos anualmente o Orçamento, com um pouco de satisfação do Executivo de não ter o Orçamento e ficar a seu bel-prazer a utilização de verbas, poder negar ou dar verbas como bem quiser, usando MP e LDO ao seu bel-prazer, tudo isso cria um clima muito ruim na administração pública. Daí por que ainda hoje dizia a V. Exª que pretendo modificar a legislação e apresentar novos prazos para viger o Orçamento, no sentido de que chegue às duas Casas Legislativas no dia 1º de junho e que seja o Congresso Nacional obrigado a entregá-lo ao Executivo no dia 15 de dezembro. Nenhum país que se respeita pode começar o ano sem ter o seu Orçamento do próprio ano vigendo. V. Exª aborda, como sempre o faz, com propriedade, tema importante. Lamento que seja num fim de tarde. Este é um assunto importante para esta Casa e para a Câmara dos Deputados. Convido a Mesa do Senado a reunir-se com a Mesa da Câmara dos Deputados para tratar esse assunto com muita força, com a força que o Congresso tem junto mesmo ao Executivo, para que no ano de 1997 não venha ocorrer o mesmo problema.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Agradeço-lhe a colaboração com que fortalece as considerações que venho formulando, nobre Senador Antonio Carlos Magalhães. Permita dizer de logo que me agradou que antecipasse conclusão a que ia chegar: a de que a Mesa do Senado se reúna com a da Câmara para encontrar uma forma definitiva capaz de corrigir o equívoco em que estamos incidindo há anos seguidos. Não é possível deixar o Governo sem a lei regular para aplicação dos recursos, como subtrair ao Congresso o documento que lhe facilita o poder de apreciação crítica da ação administrativa.

Ainda ontem, numa das televisões - e lamento que não esteja presente nesta Casa -, o nobre Senador José Roberto Arruda comentava o assunto e dizia que não havia segurança de que se votasse o Orçamento até o fim da convocação extraordinária. Mas S. Exª avançou numa crítica que atinge a representação parlamentar de modo geral: a referente à apresentação de emendas individuais. Alegou que a representação do Distrito Federal delas abdicou para apresentar emendas apenas coletivas; acentuou a necessidade de acabar com as emendas individuais e, segundo dizia S. Exª, para que não se reproduzissem os equívocos já ocorridos em legislaturas anteriores.

Releve-me o eminente Senador dele discordar no tratamento radical que deu à matéria. O problema não está em que haja emendas individuais, mas em que haja critérios para adotá-las. Devemos - e respeito a opinião contrária dele e de outros - devemos ter o poder de apresentar emendas individuais, para atender a determinados serviços, sobretudo de natureza social e cultural, para os quais os Estados e os Municípios não têm condições regulares de oferecer recursos.

O problema, repito, não está nas emendas individuais, mas no critério com que forem apresentadas e, sobretudo, na forma regular com que o Congresso as examinar, para aceitá-las ou repeli-las.

Adito a esta observação, Sr. Presidente, dois ou três exemplos, a respeito dos quais é aqui testemunha o Senador Antonio Carlos Magalhães. Por que não podermos apresentar emendas individuais para determinadas instituições idôneas e que não se manterão regularmente sem esse auxílio que provém da representação popular? Na Bahia, por exemplo, as Obras Sociais de Irmã Dulce, o Hospital do Câncer e algumas instituições de caráter cultural desempenham um papel relevante no desenvolvimento da sociedade baiana, na preservação das necessidades coletivas ou no amparo ao desenvolvimento da educação e da cultura. Por que não podermos nós ampará-las?

O problema, repito, não está nas emendas individuais, mas no selecioná-las. Não será razoável, por exemplo, que a título de beneficiar um Município se apresente emenda de valor diminuto para construção de obras de alto valor. Não se constrói a obra nem se aproveita o recurso. Mas, para aqueles serviços, aquelas instituições de natureza social ou cultural, não há por que não o fazermos. Devemos ter o poder de ajudá-las, é função nossa. É para isso que somos representantes dos Estados.

O que cabe, sim, é fazer a discriminação devida, para que não haja destinação de recursos a instituições fantasmas, nem a dotação de valores incompatíveis com a feitura de determinadas obras ou a realização de certos serviços.

O Sr. João Rocha - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. João Rocha - Muito obrigado, Senador Josaphat Marinho. V. Exª está tratando de tema que considero dos mais importantes do Congresso Nacional. Coincidentemente, coube a mim relatar um projeto de iniciativa do Senador Lúcio Alcântara, que pretende mudar todo o conceito de Orçamento em nosso País. Tanto a emenda coletiva quanto a individual são importantes. O fundamental é analisar o seu conteúdo, a sua dimensão. Senador Josaphat Marinho, tive a felicidade de conviver com V. Exª desde 1991 e comungo também com V. Exª do mesmo conceito sobre o Orçamento: o Brasil precisa de prioridades. Discutir os recursos que serão alocados e aplicados em cada comunidade, em cada unidade federada, requer muita responsabilidade. Há poucos dias, tomamos conhecimento do relatório de obras inacabadas. Trata-se de uma agressão ao Congresso e à sociedade brasileira, porque muitas obras não foram concluídas. Até nos interrogamos se compensa terminar algumas delas. É uma realidade muito drástica. No caso dos Estados Unidos, por exemplo, a discussão do orçamento inicia-se dois anos antes da sua execução, para dar oportunidade a todos os parlamentares e unidades federadas de recolher as informações necessárias para elegerem suas prioridades. Concordo com V. Exª que se deva dar prioridade a uma emenda coletiva em detrimento de uma individual. E se essas emendas coletivas não expressarem a verdade, a realidade daquilo que a comunidade precisa? Estamos também nos acomodando no conceito, buscando a simplicidade, a simplificação. Não cito o exemplo de Brasília - referido por V. Exª -, em que todos os Deputados e Senadores se concentraram em emendas coletivas. Estou analisando sob um aspecto mais genérico, mais amplo, mais macro. Aproveito a oportunidade para pedir a colaboração de todos os Srs. Senadores. Foi-me dada a incumbência de relatar uma lei complementar do Senador Lúcio Alcântara, que busca condensar todos os projetos em andamento nesta e na outra Casa em um que atenda melhor aos anseios da sociedade. Pretendo ouvir a opinião dos Secretários de Planejamento dos Estados e dos Municípios, para que esta Casa exercite seu poder - o mais importante - de elaborar uma peça orçamentária não fantasiosa, séria. Hoje vemos o Orçamento de 1995 ser cortado em 50% pelo Ministro do Planejamento, sob a alegação de que a receita era incompatível com o que havíamos alocado como despesa. Tínhamos uma projeção de receita de US$82 bilhões, e essa receita chegou a quase US$85 bilhões. Portanto, ela cresceu US$3 bilhões em termos reais. Por conseguinte, no mês de setembro, outubro, o Governo praticamente enviou um novo Orçamento para o Congresso e nós o aceitamos, por falta de base, de conhecimento. Isso ocorreu também em anos anteriores, porque o Governo sabia que o Congresso não tinha informação completa, não tinha uma preocupação mais profunda com o Orçamento. Então, aquilo que ia ser realizado em termos de receita era encaminhado como 40%; de outro lado, aquilo que ia ser realizado em termos de despesa, como 120%. E nós aceitávamos isso com a maior tranqüilidade, como aconteceu há um mês, porque esta Casa não se preparou, não se orientou e relegou o Orçamento a um plano secundário. Peço, portanto, como Relator do Projeto do Senador Lúcio Alcântara, o parecer de V. Exª, para que possamos gerar uma Lei de Diretrizes e Bases Orçamentárias, um PPA realista e possamos fazer com que o Congresso Nacional exercite, em toda a sua dimensão, em toda a sua plenitude, aquilo que a ele cabe e aquilo que lhe é devido: projetar o Orçamento e acompanhar a sua realização. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - V. Exª interfere no debate, nobre Senador João Rocha, não apenas com conhecimento de causa, mas com experiência sobre a realidade. Acaba de assinalar que é o Relator de um Projeto de Lei Complementar que visa a regular a matéria. Só tenho porque louvar a iniciativa do nobre Senador Lúcio Alcântara em apresentar proposição dessa natureza. Essa proposição, sim, pode disciplinar a matéria, estabelecer os critérios gerais de trabalho da Comissão, fixar os critérios de apresentação e apreciação das emendas, de maneira que se verifique, entre o Poder Legislativo e o Executivo, um trabalho de coordenação e não de contraste.

Essa lei complementar poderá conduzir-nos até ao bom cumprimento da Constituição e obrigar o Poder Executivo à elaboração dos planos nela previstos. Não se governa no mundo de hoje por decisões circunstanciais e ocasionais. A Administração precisa ser disciplinada por um instrumento normativo que estabeleça as prioridades devidas. No dia em que assim procedermos, limitar-se-ão bastante, nobre Senador José Roberto Arruda, as emendas individuais. Se houver orçamento de caráter nacional, de caráter regional e local, haverá sempre, num dos títulos do Orçamento, verbas específicas que poderão atender àquelas instituições regionais e locais, de natureza de assistência social ou de natureza cultural, e assim serão elas amparadas sem que se pulverizem as verbas orçamentárias. Mas enquanto tal não se der - era o que queria dizer e agora digo com muito prazer na sua presença, nobre Senador Arruda -não podemos abdicar das emendas individuais, que são úteis.

Vou dar um exemplo muito concreto. Hoje, na Bahia, o centro de desenvolvimento cultural e de quase todas as realizações de caráter educativo, num sentido geral, mas sobretudo as de natureza cultural, é a Academia de Letras da Bahia. A muitos, poderá parecer, fora daqui que seria uma instituição a não merecer o amparo do Congresso, mas as academias de letras não têm recursos próprios para a sua manutenção.

Na Academia de Letras da Bahia, realizam-se hoje quase todos os atos culturais; todas as iniciativas desembocam para desdobrar-se nela em conferências, em inquéritos, em pesquisas, em congressos. De tudo isso, resulta um efeito educativo e cultural da maior relevância para a Capital da Bahia e para todo o Estado. Por que não podermos nós ampará-la?

Dou o exemplo de uma instituição de alcance limitado, mas, há pouco, na sua ausência, citava ainda as Obras Sociais de Irmã Dulce, o Hospital do Câncer, como também poderia ter invocado o Instituto do Cego e outras instituições de igual relevo, que prestam, na Bahia, valiosos serviços à coletividade.

Se o Orçamento for elaborado à base de um planejamento adequado, muitas dessas instituições poderão ser amparadas através de destinações específicas, ou de caráter geral. Como tal não se verifica, somos nós que devemos ampará-las para não as deixar fenecer ou de prestar à coletividade os serviços a que estão destinadas.

O Sr. José Roberto Arruda - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Ouço V. Exª com muito prazer, nobre Senador José Roberto Arruda.

O Sr. José Roberto Arruda - Senador Josaphat Marinho, estava em meu gabinete quando V. Exª iniciou o seu discurso. O meu gabinete dista deste Plenário aproximadamente 1,5Km à pé e, por isso, durante o trajeto, tive a infelicidade de perder um trecho do pronunciamento de V. Exª. Mas recolho, como sempre faço, com muita humildade, todas as ponderações que partem da experiência de vida pública de V. Exª, a qual já tive oportunidade de reconhecer publicamente como das mais importantes do Congresso Nacional. Permito-me, todavia, até por amor ao debate, dizer a V. Exª que, quando saía do meu gabinete, registrava uma discordância, mas, ao chegar a este Plenário, ouvi a conclusão do seu raciocínio e ouso dizer que temos mais concordâncias do que eventuais discordâncias. Há um ponto fundamental e, antes de tocar no substantivo, desejaria falar sobre o adjetivo. Se fui radical, é porque não tenho ainda a experiência parlamentar de V. Exª. Mas posso garantir que, no mínimo, sou bom aluno e, se Deus quiser, dentro de algum tempo terei a sua experiência e a sua habilidade, para expor temas tão delicados como este. Quanto ao substantivo que levantei desta tribuna - e agradeço a oportunidade que V. Exª me dá de fazer este registro -, em primeiro lugar, declarei que a atual Comissão Mista de Orçamento, presidida pelo Senador Renan Calheiros e que tem como Relator o Deputado Iberê Ferreira, tem pelo menos um mérito, o de tentar fazer a análise do Orçamento com mais clareza e transparência do que era feito anteriormente. Por outro lado, há uma questão fundamental na minha opinião: a existência do instituto da emenda individual e o da emenda coletiva. E o que é emenda coletiva? É aquela que pode ser de uma bancada ou de uma comissão temática, e pressupõe a base elementar do Parlamento: a discussão em grupo. Nós da bancada de Brasília - oito Deputados Federais e três Senadores, de partidos, ideologias, histórias de vida e perspectivas de futuro diferentes, nos reunimos para abrir mão as 220 emendas individuais a que tínhamos direito para nos concentrarmos em dez emendas coletivas. Após passarem pelo crivo de opiniões tão heterogêneas, acredito que elas representem as principais prioridades do Distrito Federal. Cada Parlamentar tem direito a vinte emendas individuais. Há, no Congresso Nacional, 513 Deputados e 81 Senadores. Então, chegamos ao número de mais de doze mil emendas individuais. A inteligência de V. Exª poderá reproduzir aqui centenas, milhares de exemplos, como a instituição da Irmã Dulce. Diria que temos milhares de bons exemplos de instituições que efetivamente merecem a alocação de recursos. Poderíamos, de outro lado, registrar exemplos sobre os quais pairam dúvidas quanto ao mesmo merecimento. Então, o fundamental - concordando com o Senador João Rocha - é que a forma de discussão e votação do Orçamento está errada. Em primeiro lugar, porque o Executivo manda o Orçamento para o Congresso Nacional a três meses do final do ano. Em segundo lugar, manda 140 créditos suplementares para serem discutidos pela mesma Comissão de Orçamento, criando, é claro, acúmulo de trabalho. Está errado! Como podemos discutir essas doze mil emendas individuais - para ser exato a Comissão Mista de Orçamento neste ano está analisando 10800 emendas individuais - se não temos tempo de discutir o que é essencial: o núcleo do Orçamento, que deve definir as prioridades nacionais? Portanto, não discutimos, como seria do nosso dever, o modelo de desenvolvimento que desejamos para este País. Ficamos discutindo o acessório em detrimento de discutir o principal. Mais do que isso, Senador Josaphat Marinho, nós já avançamos - e é forçoso reconhecer isso -, limitando o número de emendas individuais. Mas também é forçoso reconhecer que, justamente ao lado de uma emenda individual que se poderia consagrar como exemplo de uma emenda benemérita - como a da Irmã Dulce - temos outras tantas que produziram quatro mil obras inacabadas no Brasil. Encomendei esse levantamento ao Prodasen. Trata-se de emendas que, como V. Exª mesmo registrou no seu pronunciamento, dão um valor ínfimo para a realização de um hospital. Mas, por razões políticas, começa-se a obra desse hospital. Temos hoje, no Brasil, 1550 hospitais iniciados e inconclusos. O que digo é que, num ano de aperto fiscal como este, em que o Orçamento está comprimido por déficits públicos de um lado, e por redução de receitas de outro, não é racional - no caso, falo mais como engenheiro, do que como Senador - pulverizar recursos em 10.800 emendas, que terão valores ínfimos perto da necessidade de cada uma, em detrimento de prioridades que, se escolhidas nas comissões temáticas e regionais, seriam mais efetivas. Quanto ao exemplo que V. Exª citou, qual seja, o da Academia de Letras da Bahia, diria que, só por nela constar o concurso de V. Exª, a sua inteligência e o seu passado literário, já mereceria estar permanentemente com o auxílio de todos os Orçamentos.

Em todo caso, remetemo-nos para outra discussão sobre qual é o modelo de Estado que desejamos. Proporia, então, que tivéssemos um modelo de Estado em que o Governo Federal cumprisse menos missões, mas o fizesse de forma mais racional e que, para outras atividades de Estados e municípios, fossem descentralizadas responsabilidades e recursos, de tal maneira que o Congresso Nacional não tivesse a responsabilidade, muitas vezes difícil, de decidir se esta ou aquela emenda atende de fato, ou não, ao interesse público. Enquanto o modelo de Estado não é modificado, preferiria que, na discussão do Orçamento da União, ativéssemo-nos ou, pelo menos, Senador João Rocha, déssemos prioridade às emendas coletivas. Por quê? Porque elas passaram pelo crivo democrático da discussão de bancadas, quer no nível regional, quer no das comissões temáticas. Aproveito sobretudo este aparte para sublinhar que tenho o maior respeito por aqueles que têm dedicado 12 ou 14 horas do seu dia de trabalho para elaborar o Orçamento. Mas há que registrar que, em função de todas as dificuldades - o Congresso Nacional e todos os parlamentos de países democráticos do mundo nasceram da idéia de elaboração do Orçamento - o Congresso Nacional não conseguiu aprovar o Orçamento até 31 de dezembro do ano passado e, se não tiver ajuda das principais Lideranças deste Congresso Nacional, venceremos o período de convocação extraordinária ainda sem aprovar o Orçamento de um ano que, independentemente de nossa vontade, já começou. Muito obrigado.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Nobre Senador, o debate democrático tem esta grande virtude: esclarece as situações. Intervindo no debate, V. Exª, contrariamente ao que deu a transparecer ontem na televisão, deixa claro que não é radical na condenação às emendas individuais. Esse é o ponto fundamental a ficar esclarecido.

Note V. Exª: o mal não está na apresentação das emendas, mas na forma de considerá-las. O que nos tem faltado é critério exato. Digo critério no bom sentido; critério para fazer a justa seleção das emendas. Se tivermos critérios que poderão resultar da lei complementar, a que há pouco se referiu o nobre Senador João Rocha, se tivermos esta forma criteriosa de discriminação, as emendas serão aprovadas por seleção.

Haverá um aproveitamento, um exame seletivo e, por assim dizer, uma exclusão em conjunto, do que foi inadmissível. Tudo o que não se adequar aos critérios estabelecidos será facilmente eliminado. Mas isso é o que nos tem faltado. É a boa orientação traduzida em normas, e não em critérios circunstanciais ou individuais de sub-relatores e de relatores, para a consideração das matérias. Este que é o problema.

Estamos precisando de adotar critérios normativos para a elaboração do Orçamento, a fim de que não ocorra o que se está verificando, a ponto de V. Exª dizer com muita clareza que não sabe se o Orçamento será aprovado até o fim desta convocação extraordinária.

É lamentável para o Congresso brasileiro que tenhamos essa dúvida. O interesse público nos reclama a elaboração desta lei, que já devia estar pronta, para execução, desde o fim do ano passado.

Não é possível que não tenhamos esses critérios. Nenhuma comissão isoladamente é responsável. A responsabilidade é do Congresso. O Congresso é que ainda não adotou as medidas cabíveis para sistematizar a elaboração do Orçamento. É isto que se reclama. É isto que o Congresso pede. É o que decorre de todas as manifestações nesta tarde. É isto que venho manifestar ao Senado, para as providências do Congresso Nacional.

Se não fizermos isto, como Poder Legislativo, não temos as condições normais de fiscalizar a ação administrativa do Poder Executivo. Vale dizer, não teremos condições, como não temos no momento, de bem zelar pelo interesse coletivo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/01/1996 - Página 975