Discurso no Senado Federal

ASSASSINATO DE DOIS JOVENS HOJE, EM RECIFE, LIGADOS AO MOVIMENTO NACIONAL DOS MENINOS E MENINAS DE RUA. DENUNCIA DE EXPLORAÇÃO DE MULHERES BRASILEIRAS NA ALEMANHA.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. POLITICA EXTERNA.:
  • ASSASSINATO DE DOIS JOVENS HOJE, EM RECIFE, LIGADOS AO MOVIMENTO NACIONAL DOS MENINOS E MENINAS DE RUA. DENUNCIA DE EXPLORAÇÃO DE MULHERES BRASILEIRAS NA ALEMANHA.
Publicação
Publicação no DSF de 08/12/1995 - Página 5199
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • COMENTARIO, HOMICIDIO, MENOR ABANDONADO, CRIANÇA CARENTE, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE).
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), CONTINUAÇÃO, APURAÇÃO, HOMICIDIO, MENOR, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), SOLUÇÃO, PROBLEMA, MENOR ABANDONADO.
  • DENUNCIA, OCORRENCIA, EXPLORAÇÃO, MULHER, PAIS ESTRANGEIRO, ALEMANHA, SOLICITAÇÃO, ITAMARATI (MRE), MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), GOVERNO FEDERAL, FISCALIZAÇÃO, SITUAÇÃO, GARANTIA, MELHORIA, TRATAMENTO, BRASILEIROS.

A SRª BENEDITA DA SILVA (PT-RJ. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, lamento profundamente não ter tido oportunidade de fazer esta comunicação quando um número maior de Senadores encontrava-se presente. Faço-a agora porque recebi, do Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua, um telegrama com o seguinte teor:

      Comunicamos o assassinato dos jovens José da Silva e Edson dos Santos, hoje em Recife. As informações que temos dizem que eles foram arrastados e amarrados por desconhecidos encapuzados no bairro Chão de Estrelas, quando assistiam a um programa de TV na casa de um companheiro.

Na CPI da Câmara dos Deputados que investigava o extermínio de crianças e adolescentes, José da Silva foi um dos depoentes. Lembro-me que ele, no seu depoimento, teve a coragem de citar nomes de pessoas, personalidades envolvidas com o extermínio de crianças e de adolescentes em Recife.

Foi através desse menino que conseguimos dar à Comissão Parlamentar de Inquérito que Investigava o Extermínio de Crianças e Adolescentes um conteúdo mais forte. Também tivemos a oportunidade, diante da denúncia feita por esse menino, de convocar, na ocasião, o responsável pela Polícia Federal, o hoje Senador Romeu Tuma, que ali nos informou que já era de conhecimento do Governo Federal a questão do extermínio de crianças e de adolescentes.

Naquela época, Sr. Presidente, Srs. Senadores, esse menino dizia que estava com sua vida ameaçada. Já era um menino fora da rua e estava contribuindo com o Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua, ajudando a recuperar seus companheiros e companheiras, a reintegrá-los, num excelente trabalho feito com outros movimentos, inclusive da Casa de Passagem de Recife.

Eu gostaria de apelar aos Srs. Senadores representantes do Estado de Pernambuco no sentido de que ajudem o Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua, na medida em que o Governo Federal se propôs, através de campanha, do Comunidade Solidária e tantas outras iniciativas, a resolver de uma vez por todas a situação de meninos e meninas de rua. Desejamos um esforço no acompanhamento da apuração desses fatos. Nesta hora é imprescindível o apoio, o companheirismo da Deputada Rita Camata, que presidiu aquela CPI, e da Deputada Fátima Pelaes, que foi a relatora. Tendo sido eu a requerente daquela CPI, fui impedida, por articulação política, naquela época, de presidi-la. Todavia, acompanhei, todos os dias, os seus trabalhos. Por isso sei perfeitamente que se não tivermos a coragem de tomar uma iniciativa - Ministério da Justiça, Comunidade Solidária, até mesmo a Comissão de Assuntos Sociais e a Comissão de Relações Exteriores, que tem um papel importante porque existe extermínio para retirar órgãos de crianças e enviar para o exterior - não se resolverá essa triste situação. Queremos envolver o Senado Federal e suas comissões, para que possamos dar um basta nisso.

O Sr. Bernardo Cabral - V. Exª me permite um aparte, nobre Senadora Benedita da Silva?

A SRª BENEDITA DA SILVA - Pois não, nobre Senador Bernardo Cabral.

O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares) - Senador Bernardo Cabral, infelizmente, o Regimento não permite aparte quando se trata de comunicação inadiável.

A SRª BENEDITA DA SILVA - Agradeço, Senador Bernardo Cabral, a intenção e reconheço em V. Exª um parceiro nesta luta. V. Exª acompanhou o nosso trabalho na Câmara dos Deputados e depois teve a oportunidade de estar ao nosso lado na Assembléia Nacional Constituinte, quando discutíamos a necessidade de se criar um estatuto da criança e do adolescente.

A criação desse Estatuto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, garantiu a adoção de algumas políticas.

Ocupo a tribuna hoje para solicitar ao Governo Federal e ao Ministro da Justiça a continuidade do projeto, junto com a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, para que possamos descobrir os responsáveis pela morte de José da Silva e de Edson dos Santos, e de tantas crianças e adolescentes vítimas de extermínio.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria também de registrar que participei, a convite da Instituição Evangélica das Igrejas Luteranas, "Pão para o Mundo", do lançamento da campanha de arrecadação de fundos para 1996 para projetos no Brasil, na Ásia, na África e na América Latina. Oportunamente, apresentarei à Casa um relatório dessa visita que fiz à instituição "Pão para o Mundo".

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tenho uma outra denúncia a fazer. Embora a Alemanha seja a maior potência econômica da Europa, tenha a maior renda per capita européia, devido o processo da reunificação, enfrenta a recessão econômica - porque lá também o Banco Central fixou altas taxas de juros para impedir a inflação - e outros problemas, como o movimento neonazista.

Vivem na Alemanha, aproximadamente, duas mil mulheres brasileiras cuja situação quero aqui denunciar e, ao mesmo tempo, tomar iniciativas junto ao Itamarati, ao Governo Federal e ao Ministro da Justiça, porque não se pode abandonar um pedaço do Brasil fora deste chão.

Essas mulheres estão sendo exploradas. Algumas foram enganadas com promessas de emprego, de estudo e até de casamento. Vivem trancadas em suas casas, impedidas de entrar em contato com outras pessoas para que não possam aprender a língua alemã e tomar a iniciativa de retornarem. Estão sendo escravizadas pelos seus maridos, que fazem com que assinem acordos, segundo os quais não poderão se comunicar com ninguém além deles. Não podem sair de casa e devem abrir mão do direito à herança. Ficam casadas porque, segundo a lei alemã, devem ter no mínimo quatro anos de casamento para permanecerem na Alemanha. Muitas delas, evidentemente, envergonhadas de voltar de mãos vazias e em situação difícil, como tivemos oportunidade de ver no encontro com as brasileiras, não voltam e se submetem a tal situação.

É importante, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que possamos acompanhar com um olhar fiscalizador os brasileiros que estão fora deste País. As universidades na Alemanha, por exemplo - e esta é uma questão que temos que levantar -, não reconhecem o nosso ensino de 1º e 2º graus para o ingresso de brasileiros. É preciso fazer tudo de novo.

Precisamos conhecer melhor os acordos que o nosso País está fazendo, para dar essa garantia mínima no que diz respeito à questão de adquirir conhecimentos. É uma experiência que não podemos jogar fora. Temos que garantir aos brasileiros que se encontram fora do País o mesmo tratamento que nós estamos dando aos estrangeiros, por meio da nossa Constituição, das nossas leis, das nossas relações humanas. Este País é maravilhoso no tratamento com os estrangeiros.

Vou revelar uma cena que parece folclore. Estou em tratamento e precisei tomar uma injeção na Alemanha. Foram quase duas horas de argumentações. Tive que pagar - e bem! - para que aplicassem uma injeção que sequer foi aplicada da forma como manda o figurino. Sei porque sou enfermeira. Inclusive houve um certo desrespeito por parte do médico. Num determinado momento em que eu devia ter sido tratada como uma paciente com certa reserva, dado o local em que eu tomaria a injeção, para espanto da pessoa que me acompanhava - como intérprete, é claro, porque eu não falo alemão; na Alemanha, só médicos aplicam injeção, enfermeira não sei o que faz - fui pelo médico abordada, que me aplicou a injeção na presença daquele meu companheiro, sem sequer me pedir licença. Eu não estou acostumada a me despir diante de qualquer outra pessoa, a não ser do meu respectivo esposo. Então, foi com espanto até que recebi aquele tratamento. Considerei um choque de cultura, na minha imaginação, por mais liberada que a mulher brasileira seja.

Conto este detalhe, que parece até folclore e até achamos graça, mas é simplesmente absurdo, porque foi uma invasão de privacidade, um desrespeito para com o ser humano e com a sua cultura.

Sr. Presidente, vou apresentar um relatório de situações também positivas sobre a Alemanha. Tive oportunidade de visitar empresas de trabalho profissionalizante, mas também vi esse lado negativo, que compreendemos necessário ser fiscalizado por nós brasileiros.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/12/1995 - Página 5199