Discurso no Senado Federal

ANUNCIANDO A APRESENTAÇÃO DE REQUERIMENTO DE CONVOCAÇÃO DO SR. PEDRO MALAN PARA QUE PERANTE O SENADO PRESTE ESCLARECIMENTOS DE FATOS VEICULADOS NA IMPRENSA, CONCERNENTES A INJEÇÃO DE DINHEIRO PUBLICO NO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MINISTERIO DA FAZENDA (MF), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES. BANCOS. PRIVATIZAÇÃO.:
  • ANUNCIANDO A APRESENTAÇÃO DE REQUERIMENTO DE CONVOCAÇÃO DO SR. PEDRO MALAN PARA QUE PERANTE O SENADO PRESTE ESCLARECIMENTOS DE FATOS VEICULADOS NA IMPRENSA, CONCERNENTES A INJEÇÃO DE DINHEIRO PUBLICO NO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 23/01/1996 - Página 671
Assunto
Outros > MINISTERIO DA FAZENDA (MF), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES. BANCOS. PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, PEDRO MALAN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), SOLICITAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, PROVIDENCIA, GOVERNO, AUXILIO FINANCEIRO, BANCOS.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, DISPARIDADE, VALOR, INVESTIMENTO, AREA, EDUCAÇÃO, SAUDE, AUXILIO, FUSÃO, BANCOS, CONTRADIÇÃO, GASTOS PUBLICOS, AUSENCIA, REAJUSTE AUTOMATICO, SALARIO, FUNCIONARIO PUBLICO, OMISSÃO, POLITICA, DESENVOLVIMENTO SOCIAL.
  • CRITICA, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD).

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, venho, neste momento, à tribuna para anunciar ao Plenário desta Casa que estamos convocando o Ministro da Fazenda, Pedro Malan, para nos esclarecer sobre uma série de questões - que, permanentemente, estão sendo divulgadas pela imprensa nacional - que nos deixam extremamente estarrecidos, sem compreender o que está acontecendo. Creio que seja da necessidade dos Senadores desta Casa, de uma maneira geral, entenderem o porquê de certas medidas do Governo Federal.

Em primeiro lugar, todos os jornais mencionaram esse assunto, mas especialmente a reportagem da Folha de S.Paulo traz termos comparativos dos absurdos que estão ocorrendo neste País. No jornal de sábado, a Folha de S.Paulo traz uma matéria com o título "Fusão custa R$5,6 bilhões ao País. Incentivo à incorporação do Banco Nacional pressiona a expansão monetária e a inflação". E aqui há uma série de comparações extremamente interessantes que realmente precisam ser esclarecidas.

Diz a reportagem:

      "O dinheiro empregado no incentivo às fusões bancárias em novembro e dezembro supera toda a despesa de 95 com as universidades federais (R$5 bilhões); é 2,5 maior do que a liberação oficial em 95 para o plantio da safra agrícola brasileira", estimada em R$2,2 bilhões; "equivale a 92% do custo anual das internações hospitalares e do atendimento ambulatorial (R$6,045 bilhões)".

Ou seja, o Governo pagou, em 1995, R$6,045 bilhões com todas as internações ocorridas neste País pelo SUS. E só em novembro e dezembro, repito, ele gastou R$5,6 bilhões para incentivar a incorporação do Banco Nacional.

Mas há mais comparações, os recursos gastos com os bancos superam em 5,6 vezes a receita obtida em 95 com a venda de todas as estatais federais. Todas as estatais que o Governo brasileiro vendeu para a iniciativa privada somaram R$1 bilhão e este mesmo Governo, em dois meses, gastou R$5,6 bilhões para incentivar a fusão dos bancos. Seria suficiente para financiar quatro projetos do porte do Sivam, que tem o custo estimado em R$1,4 bilhão.

Aí, nobre Senador Eduardo Suplicy, uma questão como essa não dá novela como o Sivam. É isso que eu não consigo compreender. O assunto Sivam vem rolando nesta Casa há um ano. É manchete em todas as revistas, em todos os jornais. Entretanto, o Brasil gasta R$5,6 bilhões em dois meses para incentivar a fusão de bancos e isso não vira novela de jornal. Esse não é um assunto debatido todo dia e toda hora. Não é um assunto questionado e investigado. Será que isso não seria mais assunto para uma CPI do que o próprio Sivam?

Mas não é só isso, Sr. Presidente.

O Sr. Lauro Campos - Permite V. Exª um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE - Concedo o aparte ao nobre Senador Lauro Campos, com muito prazer.

O Sr. Lauro Campos - Essa matéria que V. Exª trata, eminente Senador, é, realmente, da máxima importância. É muito sintomático o silêncio, que V. Exª salienta, que conseguiram erguer em torno de um problema escandaloso como esse. Esse problema mostra, claramente, que o Banco Central brasileiro é sempre composto por ex-banqueiros, pré-banqueiros e por candidatos a banqueiros. A bancocracia brasileira, encastelada no Banco Central desde a sua fundação, só se preocupa com a saúde dos bancos; só se preocupa em ressuscitar bancos; só se preocupa em salvar a pele dos agiotas organizados deste País, usufruindo da mais elevada taxa de juros do planeta e, depois, entram em falência. E o Banco Central, que deveria prestar mais atenção na fiscalização que ele não faz nem em bancos, nem em consórcios, nem em coisa alguma, continua como detentor de um poder igual ou superior ao do próprio Estado brasileiro. E, impunemente, comete este descalabro, um economicídio neste País como esse que V. Exª acabou de salientar: emprega R$5,6 bilhões para salgar a parte podre de um banco e entrega a parte boa do Banco Nacional praticamente de graça para outras instituições, repetindo o que foi feito no Brasil no início dos anos 70, quando faliram as financeiras. Naquela ocasião, vimos o Ministro do Planejamento, o Ministro da Fazenda, Mário Henrique Simonsen, dizer que havia inventado uma fórmula que podia ser exportada. O Banco Central e o BNDES injetavam recursos novos, gratuitos, para que uma instituição ainda não falida, como acontece hoje com os bancos, comprasse a outra instituição já falida. A situação é a mesma, a situação que levou os bancos à falência continua, nada foi mudado. Então, é evidente que a onda de falências não vai parar por aí, porque nada foi mudado na estrutura bancária, nada foi mudado dentro da política monetária e financeira neste País e, portanto, as causas estão presentes e vão continuar a atuar, provocando um incremento no País dos incrementos, no País das vitórias. Um incremento também não apenas da taxa de desemprego e de outras taxas sociais perversas, mas também o da taxa de falência desses bancos que estão afogados em sua própria banha e que repassam para o exterior grande parte de seu patrimônio, sem que o Banco Central também tome providência a respeito disso. Meus parabéns, Senador, pela oportunidade e pela importância do assunto que V. Exª está abordando.

O SR. ADEMIR ANDRADE - Agradeço a V. Exª.

Queria ressaltar outros pontos. Li outra reportagem em que o Presidente Fernando Henrique Cardoso, quando esteve em Petrópolis, apelava aos banqueiros nacionais para que reduzissem os juros. Ora, eu também gostaria de ter um esclarecimento de um pedido como esse. Talvez o Ministro da Fazenda possa fazê-lo aqui, no plenário.

Sempre entendi que quem tem determinadas taxas de juros neste País tem sido o Banco Central. Tem sido o próprio Governo que tem usado, como um instrumento para conduzir o processo econômico, baixar ou reduzir os juros no Brasil. Ora, não compreendo como o Presidente faz um apelo deste, nesta reportagem: "Fernando Henrique Cardoso diz que juros dependem do Banco". Sua Excelência fez esse apelo quando, no dia anterior, o Banco Central vendeu títulos com resgate marcado para 31 de janeiro; portanto, títulos vendidos aos banqueiros com resgate com menos de 20 dias, aceitando taxas de juros de 3,58%. Se o cidadão comum vai ao banco aplicar em CDB, ou num fundo de investimento qualquer, ele não consegue mais do que 2%. O Governo vende seus títulos a banqueiros nacionais para receber com 21 dias de prazo - já que isso foi feito no dia 09. No dia 31, o Banco Central terá que honrar esse compromisso, com juros de 3,58%. Quer dizer que o Banco Central estimula a venda dos seus títulos aos banqueiros nacionais e o Presidente da República, publicamente, pede aos banqueiros a redução dos juros. Não é possível compreender uma situação como esta. Precisamos de mais explicações.

Sr. Presidente, fala-se muito na redução da dívida, que se está trabalhando para reduzi-la, que estão vendendo as empresas estatais, entregando-as ao setor privado, principalmente ao setor multinacional, para diminuir as dívidas, para que o Governo tenha mais condições de agüentar as dificuldades.

Mas - vejam bem - falava-se muito que a dívida externa brasileira havia chegado a US$100 bilhões. Pois bem, está aqui a reportagem da Folha de S. Paulo, de agosto do ano passado:

      "A dívida externa do País já alcança US$151,7 bilhões. Conta de bancos e empresas cresceu 115,6%, de 89, por causa dos juros altos."

Então, não é possível ficarmos escutando essa lenga-lenga de que não se tem dinheiro para pagar o aumento do funcionário público, de que o Tesouro teve um déficit de US$4 bilhões, no ano de 1995, e, ao mesmo tempo, sabermos que o Governo emitiu moeda no valor de R$5,6 bilhões para incentivar a fusão de bancos, especialmente o Proer.

Dessa forma, Sr. Presidente, é preciso trazer esclarecimentos, porque acredito que o Governo esteja bem intencionado. Acredito que o Presidente Fernando Henrique Cardoso é um homem sério, honesto, um homem que tem uma história, uma vida de luta; um homem que veio da esquerda, um sociólogo. Acredito sinceramente em Sua Excelência o Senhor Presidente. Então, é preciso esclarecer o porquê dessas decisões. Será porque não tem força política? Será porque as elites nacionais, os banqueiros nacionais, têm aqui no Congresso Nacional a maioria de Parlamentares, Senadores e Deputados Federais, para defender seus interesses e, assim, o Presidente Fernando Henrique, mesmo podendo ter boa intenção, não consiga concretizá-la, porque não tem força política para isso? Será que essas coisas não precisam ser do conhecimento e do domínio público? Será que o Presidente da República, ao invés de ficar acuado por um Congresso Nacional, que defende os interesses das elites não podendo fazer as coisas para o povo, digamos assim, não poderia abrir-se direto com a população e colocar as coisas de maneira clara e franca? Será que Sua Excelência tem que viver todo o tempo preso, amarrado, com medo? Fora disso, não consigo compreender fatos como esses, que são noticiados.

Por isso tomamos a iniciativa de convocar, para prestar esclarecimentos neste Senado Federal, o Sr. Ministro da Fazenda, Pedro Malan, já que é muito difícil trazer o próprio Presidente da República. Queremos que ele nos explique, que nos convença do porquê de coisas que consideramos extremamente absurdas e inaceitáveis. Queremos que venha com boa-fé, com vontade de que sejamos convencidos de que tudo está sendo feito da maneira correta.

A princípio parece-nos um verdadeiro absurdo, porque alegam que não têm recursos para o funcionalismo público, o que chegaria - com esse aumento de 21,6%, que seria a correção da inflação de 1995 - a um aumento da folha de pagamento, segundo os dados do Tesouro, em R$10 bilhões. Ora, o Governo não tem esses R$10 bilhões para, ao longo de todo o ano, atender à necessidade de reajuste do funcionário público, mas, em dois meses, gastou R$5,6 bilhões incentivando a fusão de bancos. Quanto ele gastará de agora para frente? E a questão do Banespa, em que o Governo financiou R$7,5 bilhões ao Governo do Estado de São Paulo para que ele atenuasse sua dívida para com o Banco de São Paulo? E, além de tudo, comprou bens que, de certa forma, já eram da União, levando aí mais R$7,5 bilhões em troca de bens que nada trarão de novo ou de melhor para a sociedade brasileira.

O Governo Federal assume com o Governo de São Paulo uma dívida de U$15 bilhões para manter funcionando o Banespa. E os investimentos para a sociedade brasileira? E a reforma agrária? E a questão dos índios? E a questão da saúde? Está-se tentando criar um novo imposto para bancar a saúde, uma saúde que está muito mais caminhando para fortalecer o setor privado do que para fortalecer o setor público. Precisamos de respostas a essas questões. E a única maneira de as termos será aqui falando para nós, sendo questionado por nós, fazendo-nos compreender e quem sabe até nos convencendo, o Ministro da Fazenda, Pedro Malan. Por isso, deixo aqui este meu requerimento, esperando que ele tenha a aprovação dos demais Senadores desta Casa.

O Sr. Eduardo Suplicy - Senador Ademir Andrade, V. Exª me permite um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE - Com muita satisfação, Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy - Apoiando a iniciativa de V. Exª, creio que cabe de fato ao Ministro da Fazenda trazer os esclarecimentos, pois, quando da sua vinda para a medida provisória sobre o Proer, não tinha os elementos ainda suficientes; disse na ocasião que, logo que os tivesse, poderia aqui trazê-los, para que pudéssemos ter uma noção mais clara de quanto corresponderiam, em termos de custos, diferenciando a liberação de recursos em forma de caixa para as instituições financeiras, tais como o Banco Econômico, o Banco Nacional, o Banorte da liberação para as instituições estatais como o Banespa, o Banerj e assim por diante. É fato que os boletins do Banco Central, de novembro e dezembro, salientam que os recursos destinados pelo Banco Central para as instituições dentro do Proer corresponderam a R$4,2 bilhões e R$2,2 bilhões respectivamente, somando, portanto, R$6,4 bilhões na forma de caixa.

Seria importante que o Ministro da Fazenda pudesse nos dar uma estimativa do impacto desses valores sobre o Tesouro. Na semana passada, o Presidente Fernando Henrique Cardoso salientava que, depois de pagos os salários, as aposentadorias, as obrigações normais do Governo, que arrecada R$7 bilhões por mês, R$800 milhões vão para a saúde e sobram R$400 milhões para o Governo realizar um tipo de política com alguma alternativa. Ora, para um Governo que tem R$400 milhões mensalmente e disposição para fazer política escolhendo prioridades, de repente, gastar R$4,2 bilhões num mês e R$2,2 bilhões no outro representa uma quantia extraordinária e merece, de fato, o esclarecimento em profundidade, sobretudo se compararmos o Proer com os programas na áreas que o próprio Governo denomina "sob a coordenação da Comunidade Solidária".

O SR. ADEMIR ANDRADE - Agradeço a V. Exª, Senador Eduardo Suplicy. A divergência de dados leva-nos à necessidade dessas informações, porque o que a Folha publica é que o Banco Central emprestou aos bancos R$5,6 bilhões nos dois meses.

O Líder do Governo nesta Casa assumiu um compromisso conosco de trazer aqui também o Ministro José Serra para discutir, ainda durante o período da convocação extraordinária, a questão da privatização da empresa Vale do Rio Doce. Vejam bem V. Exªs, há duas empresas contratadas para avaliar a Vale do Rio Doce, mas se faz uma avaliação antecipada em torno de U$12 bilhões.

Quando se vê o Governo gastar a cada dois meses praticamente metade desse dinheiro para incentivar a fusão de bancos, aumentar a dívida interna pública em mais de U$2 bilhões; quando se vê o Governo incentivar o aumento de juros e vender títulos do Banco Central com prazo de vinte e um dias a juros de 3,58%, há que se perguntar: por que, então, vamos vender a Companhia Vale do Rio Doce?

O que faremos com o dinheiro da venda da Companhia Vale do Rio Doce, uma empresa lucrativa, que, sendo do Estado, encontra-se mais ligada aos interesses do desenvolvimento da comunidade?

Como já disse aqui, ela atua no Pará como se fosse um estado independente dentro daquele Estado, pois tem um território intocável, no qual ninguém entra sem autorização, ninguém entra sem ser revistado.

Este Senado Federal deu à Companhia Vale do Rio Doce 400 mil hectares de terra há cerca de 12 anos. Hoje, a Vale do Rio Doce detém 1 milhão 167 mil hectares de terra no Estado do Pará. Ela administra três reservas florestais em convênio com o Ibama e grilou as outras áreas, unindo todo esse arco numa área imensa de 1 milhão e 167 mil hectares de terra; território intocável, território no qual ninguém entra, território que ninguém vê, território no qual ninguém manda, isso porque é do Estado.

Temos conseguido algum benefício em termos de desenvolvimento regional, ou seja, alguns investimentos para ajudar prefeituras, o governo do Estado, e investimentos para programas de incentivo à cultura. No entanto, temos conseguido quase que à força alguns recursos da Vale do Rio Doce para o desenvolvimento da nossa região. Imaginem no caso de ser ela privatizada. E privatizada para quê? Para se jogar o dinheiro na mão de multinacionais, na mão de banqueiros?

Essas questões precisam ser devidamente colocadas aqui no Senado Federal. Espero que os Srs. Senadores possam me ajudar na aprovação deste requerimento. Espero também que o Líder do Governo traga o Ministro José Serra para uma conversa conosco, a fim de que S. Exª fale, ainda no período da convocação extraordinária, sobre a privatização da Companhia Vale do Rio Doce.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/01/1996 - Página 671