Discurso no Senado Federal

REPUDIO A DECISÃO DA JUSTIÇA EM MANTER PRESOS OS LIDERES DO MOVIMENTO DOS SEM-TERRA DO PONTAL DO PARANAPANEMA.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA. SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM). :
  • REPUDIO A DECISÃO DA JUSTIÇA EM MANTER PRESOS OS LIDERES DO MOVIMENTO DOS SEM-TERRA DO PONTAL DO PARANAPANEMA.
Aparteantes
Ademir Andrade, José Roberto Arruda, Marina Silva, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 02/02/1996 - Página 1223
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA. SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, JUSTIÇA, RELAÇÃO, POPULAÇÃO CARENTE.
  • CRITICA, MANUTENÇÃO, JUSTIÇA, PRISÃO PREVENTIVA, LIDER, SEM-TERRA.
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO SOCIAL, POPULAÇÃO CARENTE, BRASIL.
  • COMENTARIO, ATUAÇÃO, IGREJA, CONSCIENTIZAÇÃO, TRABALHADOR RURAL, SEM-TERRA.
  • NECESSIDADE, LICITAÇÃO, OBJETIVO, IMPLANTAÇÃO, PROJETO, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).

O SR. EDUARDO SUPLICY (PT-SP. Como Líder, pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, V. Exªs certamente já tiveram oportunidade de ouvir a máxima popular: "a Justiça é a sanção das injustiças."

Esse sentimento, tão comum entre os estamentos oprimidos das sociedades, resulta da verificação diuturna das decisões de parte da magistratura. Não obstante a própria norma legal disponha que "na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum", não raro vêem-se decisões judiciais em que a prestação da tutela jurisdicional nada mais é do que a ratificação da opressão e a satisfação dos interesse de elites egoístas e espoliadoras.

Entre a realização do justo e a conservação do status quo, a ideologia dominante, travestida de doutrina científica, induz o juízo, na condição de intérprete da lei, a optar pela última, como se fosse possível a uma sociedade traçar os seus planos de futuro apenas com base "na certeza do direito", na previsibilidade das decisões dos tribunais, no convencimento de que é melhor o direito certo do que o direito reto.

Exemplos dessa lamentável corrente do pensamento jurídico são encontrados às pencas: entre os italianos, há quem diga: "os leigos do direito não compreendem a necessidade de sacrificar, dentro de certos limites, a justiça à certeza"; entre os alemães já foi ensinado que "a existência duma ordem jurídica é mais importante do que a sua justiça; a justiça é a segunda grande missão do direito, sendo a primeira a segurança jurídica, a paz".

Faço hoje este pronunciamento como manifestação de meu inconformismo com a decisão do Poder Judiciário de Presidente Prudente, por sua Vara Distrital de Pirapozinho, de manter a prisão preventiva de líderes do Movimento dos Sem-Terra, no Pontal do Paranapanema.

Na esteira do pensamento jurídico conservador, o Exmº Sr. Juiz de Direito Fernando Florindo Marcondes considerou conveniente "para a garantia da ordem pública" manter presos cidadãos que, junto com seus pares, lutam por um pedaço de chão para plantar; que clamam pelo direito de trabalhar a terra para sobreviver, para educar os filhos. Lutam, enfim, por uma vida digna.

Mas, não! Na ótica dos poderosos, são "formadores de quadrilha", que afrontam a ordem pública e a paz social! Não enxergam esses vetustos senhores que a ordem pública e a paz social na verdade estão ameaçadas - como lembra Frei Beto, no artigo "Prenda-se Jesus por formação de quadrilha", publicado ontem (31.01.96) no O Estado de S. Paulo - com a "favelização nas cidades e o aumento do desemprego, do número de crianças de rua e da violência urbana".

Embora queiram convencer-nos do contrário, continuaremos a acreditar que a vida e o espírito postulam um direito reto, quer dizer, justo e oportuno. Enquanto esta meta não for alcançada, nós nos perfilaremos ao lado dos oprimidos e dos desvalidos; junto dos sem-terra, sem-teto, sem-emprego, sem-saúde, sem-educação, sem-dignidade, sem-cidadania!

Inolvidáveis, Srªs e Srs. Senadores, são as palavras de Brecht, tão oportunas para esta ocasião: "Do rio que em seu caudal tudo leva, diz-se violento, mas nada se diz da violência das margens que o oprimem".

O Sr. Pedro Simon - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY - Ouço V. Exª, com prazer.

O Sr. Pedro Simon - Nobre Senador Suplicy, solidarizo-me com V. Exª pelo pronunciamento que faz. É profundamente lamentável a decisão desse juiz. O problema dos sem-terra é sério e grave, e somos responsáveis por ele. Num País como o nosso, com oito milhões e quinhentos mil quilômetros quadrados, somos responsáveis por haver pessoas sem terra. Se a Justiça não faz, se ela não age, se ela não anda, pelo menos que não seja grotesca em determinar a manutenção da prisão, dizendo que manter na prisão é que vai resolver o problema da paz social. Perdoem-me a sinceridade, mas esse juiz está fazendo exatamente o contrário. Estão criando vítimas. Vão começar as passeatas em solidariedade. É uma decisão ridícula e irresponsável a desse juiz, que precisaria ter um pouco mais de discernimento. E nós, a sociedade brasileira, termos que pagar o preço por um juiz não ter o necessário equilíbrio para proferir uma decisão. A decisão que ele está tomando é absolutamente fora do normal.

O SR. EDUARDO SUPLICY - Agradeço a manifestação de solidariedade de V. Exª. Ontem à tarde, o Presidente do INCRA, Raul do Valle - após eu ter conversado com o Juiz Fernando Florindo Marcondes - transmitiu ao juiz, por telefone, ao meu lado, que avaliava, como muito importante, a revogação da prisão para que houvesse um clima de maior boa vontade no sentido de se solucionar o problema.

Hoje, o Secretário de Justiça, Belisário dos Santos Júnior, está visitando o local dos assentamentos. Amanhã, eu próprio e diversos Parlamentares estaremos também visitando o local para sabermos se houve cumprimento ou não da palavra do Secretário de Justiça.

O Governador Mário Covas tem uma interpretação do que seria o assentamento. Em verdade, 1.050 famílias deveriam estar assentadas naquela região até 31 de dezembro e mais 1.050 até o final deste semestre. E somente no dia 28 de dezembro - em função de uma decisão da Justiça - iniciou-se o assentamento.

Diz o Governador que não poderia ter sido feita a infra-estrutura antes do assentamento. Vamos, então, ali averiguar o que pode e o que não pode ser feito.

O Sr. Ademir Andrade - V. Exª me concede um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY -  Com muita honra.

O Sr. Ademir Andrade - Senador Eduardo Suplicy, eu gostaria de somar as minhas preocupações às de V. Exª e também lamentar as afirmações do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que, segundo a imprensa, radicalizaria contra o Movimento Sem-Terra, numa reunião realizada com a Bancada do Rio Grande do Sul. Acho que o Senador Pedro Simon até poderia confirmar, pois o Presidente disse que não negociaria mais, em hipótese alguma, se o Movimento Sem-Terra continuasse agindo como está agindo e continuasse provocando, segundo suas colocações. Por outro lado, percebemos que o Governo não tem uma forma de agir, não toma iniciativa. Ao longo de mais de 30 anos, o Governo jamais tomou qualquer iniciativa nesse sentido. Pensa numa área e começa a elaborar um projeto de reforma agrária, ou seja, um projeto de assentamento naquela área. No entanto, durante toda a minha luta política, não conheci um único projeto do Governo para assentar alguém antes que qualquer problema se estabelecesse. Todos os casos que conheci, na luta pela terra, foram provocados por trabalhadores rurais que batalharam para consegui-la. E o Governo, em toda a sua história, desde o regime militar, passando por todos os Presidentes que tivemos até agora, tem servido simplesmente para tentar pacificar, regularizar, resolver aquele problema que foi criado. É lamentável uma informação dessas por parte do Presidente da República. Sua Excelência tem que reconhecer as falhas e as dificuldades do seu Governo e colocar o Ministério da Agricultura e o Incra para trabalhar, oferecendo recursos para que esse trabalho possa ser realizado, ao invés de dizer que não vai negociar mais enquanto o MST não parar de se comportar como vem se comportando. Ele não conseguirá parar o MST porque essa é uma questão social que está à flor da pele, pois todos nós estamos sentindo o problema. Não vai ser a radicalização do Presidente que vai paralisar a busca pela terra e esse conflito que, infelizmente, se estabelece, gerando mortes, violências, prisões, por falta de ação do Governo Federal para resolver a questão. Era esse o registro que eu gostaria de fazer.

O SR. EDUARDO SUPLICY - Senador Ademir Andrade, de fato eu não estava presente - o Senador Pedro Simon estava e pode dar-nos o testemunho - mas, pelo que li no jornal, fiquei impressionado com a reação do Presidente Fernando Henrique Cardoso, inclusive com respeito ao nosso Colega do Partido dos Trabalhadores, Deputado Adão Pretto.

O que se deve fazer? Repito as palavras do Frei Betto: "Quando se aprenderá que justiça não se faz com polícia e, sim, com boa política? O que é melhor: um sem-terra com enxada na mão ocupar uma área ociosa para plantar alimentos ou virar um assaltante e, com uma arma na mão, ocupar residências e matar?"

A Srª Marina Silva - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY - Ouço V. Exª com prazer.

A Srª Marina Silva - Acho muito interessante o pronunciamento de V. Exª e fico triste com as palavras do Presidente ao dizer que vai radicalizar contra o Movimento dos Sem-Terra. Toca-nos muito as palavras do Frei Betto, quando ele diz que justiça não se faz com polícia e, sim, com boa política. Eu diria que justiça se faz com as duas coisas: com uma boa polícia e com uma boa política e uma boa justiça. O problema é que usam a polícia para coisas erradas, como prender trabalhadores que se organizam para conquistar um pedaço de terra. Mas não usam a polícia para fazer as coisas certas, como no caso dos assassinos do Chico Mendes, que estão fora da cadeia há 1.078 dias, e a polícia não é usada para fazer justiça. Vou repetir sempre a quantidade de dias que os assassinos estão soltos para que o Governo pense que está usando a polícia de forma errada. O Governo brasileiro não dá o mesmo tratamento. Recordo-me agora de uma bela entrevista que o Presidente concedeu aos Deputados Domingos Leonelli e José Genoíno e ao Senador Roberto Freire na revista Esquerda 21. O Presidente fala de vários temas e um deles é a reforma agrária. Sua Excelência diz que a reforma agrária não é nenhuma questão de produção, que hoje, com o avanço da tecnologia, com a agricultura mecanizada, estaria resolvida. A reforma agrária, segundo o Presidente, é fundamental por uma questão de justiça social. Diz que as pessoas, às vezes, não é que necessitem de um trabalho, precisam é de ocupação. Achei moderna e interessante a interpretação do Presidente em termos de pensamento, em termos de idéia. Agora, eu gostaria de ver essas idéias modernas e interessantes se concretizarem na prática, promovendo justiça social, por exemplo, oferecendo ocupação às pessoas; no caso do Movimento dos Sem-Terra, alimentação e dignidade para suas famílias. Penso que Frei Betto cala fundo em nosso coração, mas eu diria que podemos fazer a justiça com as duas coisas. O problema é usar adequadamente os instrumentos que temos para fazer a justiça.

O SR. EDUARDO SUPLICY - Agradeço o aparte de V. Exª.

O SR. PRESIDENTE (Lúcio Alcântara) - A Presidência pede a V. Exª que não deixe de observar o nosso Regimento no art. 21. Freqüentemente, V. Exª tem falado de costas para a Mesa, o que não é permitido. A Mesa pede a V. Exª que observe esse dispositivo regimental.

O SR. EDUARDO SUPLICY - Sr. Presidente, eu não estava falando de costas para a Mesa, apenas estava querendo ver quem havia pedido o aparte às minhas costas, porque não tenho olho atrás de mim.

O Sr. Pedro Simon - Sr. Presidente, é que S. Exª considera que anjo não tem costas.

O SR. PRESIDENTE (Lúcio Alcântara) - No particular, sim, mas o Regimento não distingue essa particularidade.

O SR. EDUARDO SUPLICY - Com muita honra, concedo o aparte ao nobre Senador José Roberto Arruda.

O Sr. José Roberto Arruda - Eu gostaria apenas de fazer uma consideração a V. Exª. Tenho tido o privilégio de participar de alguns encontros, onde o Presidente Fernando Henrique Cardoso vem adotando uma posição que segue uma linha de coerência com a sua vida pública, que V. Exª conhece tão bem, e tem manifestado, como na entrevista que deu à revista Esquerda 21, a que se referiu a Senadora Marina, o seu desejo pessoal e o desejo do Governo de que a reforma agrária efetivamente seja feita no Brasil. Presenciei, inclusive, em uma reunião do Presidente com algumas Lideranças do Senado, a sua preocupação de chamar o Presidente em exercício do Incra ao seu gabinete, na nossa presença, para exigir que este lhe levasse o nome e o número da carteira de identidade dos quarenta mil pais de família que foram assentados, segundo dados do Incra, nos últimos doze meses. E queria o Presidente Fernando Henrique saber o nome e o número da identidade de cada um desses cidadãos brasileiros assentados no Programa de Reforma Agrária porque o Movimento dos Sem-Terra, segundo Sua Excelência, não estaria aceitando como assentados cidadãos brasileiros que não fossem inscritos e militantes do Movimento dos Sem-Terra. Tenho uma postura pessoal totalmente favorável à tese de que um País como o nosso, com as nossas circunstâncias históricas, não pode fugir do desafio da reforma agrária. Penso que essa é até uma visão consensual nesta Casa, percorrendo, inclusive, todos os aspectos ideológicos e partidários que estão aqui representados. O radicalismo que está presente nas duas partes - inclusive nos casos em que terras produtivas são invadidas, no caso em que a violência é usada por ambas as partes -, em minha opinião pessoal, deve merecer a discordância desta Casa. Qualquer movimento deve merecer o apoio político do Senado Federal desde que seja pacífico e que possa ser tratado em um modelo de país mais justo, menos desigual, mais harmônico. Considero fundamental registrar o desejo do Presidente da República de realmente levar a cabo o seu desafio da reforma agrária, mas, ao mesmo tempo, deixar claro que tal reforma agrária deverá atender a todos os cidadãos brasileiros e não apenas àqueles inscritos e militantes no Movimento dos Sem-Terra, principalmente quando esse Movimento, em alguma localidade específica, possa ser instrumento de alguma ação política não diretamente ligada ao objetivo maior de todos nós, que é o de promover uma justa reforma agrária no País. De qualquer maneira, como o pronunciamento de V. Exª basicamente repele o radicalismo,

solidarizo-me com o núcleo central dele.

O SR. EDUARDO SUPLICY - Agradeço o aparte de V. Exª, Senador José Roberto Arruda.

Eu gostaria de salientar que o questionamento do Movimento dos Sem-Terra sobre os números da reforma agrária é porque algumas das quarenta de duas mil famílias que constavam daquele levantamento, na verdade, estavam com seu assentamento parcialmente realizado, e aí surgiu a dúvida. Mas é importante que se realize a reforma agrária com maior velocidade, porque de outra forma continuaremos assistindo a incidentes, vendo prisões, ouvindo sugestões que Frei Betto faz ao Governo, para que a Justiça venha prender aquela que inspirou a criação do MST, Movimento dos Sem-Terra: a Igreja Católica.

Nos anos 70, sua Pastoral Social propiciou a organização das famílias despojadas de suas terras. Por isso, a maioria dos dirigentes do MST, como José Rainha, adquiriu consciência de seus direitos em reuniões da Igreja. Prenda-se, pois, o Papa, como supremo responsável, diante de Deus e dos homens, pela Igreja Católica. E apreendam-se as obras de Santo Ambrósio, Bispo de Milão, que no século IV ensinou que "a terra foi dada a todos e não apenas aos ricos; foi a avareza que repartiu os pretensos direitos de posse".

Ou quem sabe o melhor seja seguir o exemplo de Caifás e ir direto à fonte: decretar a prisão preventiva da Jesus Cristo, que formou essa quadrilha que insiste em apregoar que todos os seres humanos são iguais em direitos e dignidade e, um dia, para salvar um homem, fez precipitar num abismo uma vara de porcos. Acham que o dono dos porcos gostou? Onde já se viu não respeitar a propriedade alheia?

O Sr. Pedro Simon - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY - Com muita honra, Senador Pedro Simon.

O Sr. Pedro Simon - Ouço emocionado o pronunciamento de V. Exª. Não há dúvida nenhuma de que V. Exª encontrará nos Evangelhos um número infinito de posições ali apresentadas, que defendem os mais fracos e os mais humildes. Quero dizer a V. Exª que eu estava presente na Bancada do Rio Grande do Sul e ouvi o pronunciamento do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Não se pode dizer, em nenhum momento, que o Presidente tenha feito algum pronunciamento contrário à reforma agrária ou de agressão á reforma agrária. Durante as negociações que estavam sendo conduzidas, os agricultores do Rio Grande do Sul reconheceram que erraram ao invadir a sede da Delegacia do Ministério da Fazenda; não eram nem pleiteantes da reforma agrária, eram pequenos proprietários que acabaram causando essa confusão que, inclusive, já foi resolvida. O Governador Britto falou que hoje se reunirão no gabinete do Vice-Presidente Marco Maciel, às 18h30min, os agricultores com a comissão designada pelo Presidente. Esse assunto está equacionado. Em nenhum momento, repito, o Presidente da República disse que tinha posições extremadas com relação à reforma agrária. Absolutamente não. Agora, quero dizer que o melhor momento que me lembro da reforma agrária foi vivido sob a Presidência de Fernando Henrique Cardoso, com o Francisco Grazziano como Presidente do Incra, inclusive fui para aquela tribuna fazer um apelo para que ele ficasse no cargo. Disse que ele não tinha nada a ver com a gravação. Ele, em questão de 2 meses, tomou, talvez, duas das decisões mais importantes, que eu me lembre, sobre reforma agrária. Primeiro, projeto de lei dele, que temos que votar com urgência, não pode ficar nas gavetas da Câmara e nem nas do Senado, pois determina que no momento em que o Incra desapropria, não pode o proprietário protelar. Essa é a principal fonte da rebelião. O Incra desapropriou, as pessoas estão se preparando para receber a terra, e o proprietário entra na Justiça e demora 3 anos discutindo. Então, o projeto que o Sr. Francisco Grazziano elaborou - e está para ser votado - diz exatamente isso: desapropriou, o proprietário vai discutir, vai debater, pode exigir indenização em dobro, em triplo, mas a terra é entregue. O segundo entendimento que ele fez, e foi excepcional, que ele teria conseguido 3 milhões e 500 mil hectares da área do Exército que, pela primeira vez na história, concordou em entregar algumas de suas áreas para a reforma agrária. Foram duas grandes medidas. Por isso que eu, da tribuna, fiz um a pelo ao Presidente Fernando Henrique que deixasse o Sr. Grazziano no cargo, porque ele estava fazendo um excepcional trabalho. O que não pode é terminar esse trabalho. O Presidente Fernando Henrique é bem intencionado em termos de reforma agrária, conhece o assunto, vive o assunto e quer fazer algo. Agora, com toda sinceridade, se há um poder que não tem autoridade para falar é o Congresso Nacional. Um dos motivos que derrubaram o Sr. João Goulart, foi quando ele fez um decreto querendo desapropriar as terras em volta das estradas federais na Amazônia, no Pará, etc. Foi um dos projetos que determinou a sua queda. Nesse Congresso não tivemos coragem de fazer nada até agora. Inclusive, na Constituinte, o tema reforma agrária regrediu e a Constituinte foi inferior ao Estatuto da Terra, de Castello Branco, e mesmo assim não tiveram coragem. Colocaram na Constituição "de acordo com regulamentação", a qual até hoje não aconteceu.

O SR. PRESIDENTE (Lúcio Alcântara) - Senador Eduardo Suplicy, lamento informar que o tempo de V. Exª já está encerrado. Peço que conclua o seu pronunciamento, porque ainda há oradores inscritos.

O SR. EDUARDO SUPLICY - Diante da observação do Senador Pedro Simon, finalizo com uma sugestão ao Presidente Fernando Henrique Cardoso e ao Senado: concluamos, antes do término dessa Sessão Legislativa, a questão do Sivam, reiterando a necessidade - já abraçada, como percebo, pelo Relator Ramez Tebet - de se fazer licitação pública. Assim, superado o Projeto Sivam, poderemos ter a volta do Presidente Francisco Grazziano, que, segundo o Senador Pedro Simon, estava caminhando bem.

Se decidirmos pela necessidade da licitação pública, concluiremos o episódio Sivam; Francisco Grazziano poderá voltar à Presidência do Incra e acelerar o projeto de reforma agrária, até porque, pelo que se sabe, ele saiu para evitar que houvesse qualquer problema de corrupção no Brasil.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/02/1996 - Página 1223