Discurso no Senado Federal

AGRAVAMENTO DO DESEMPREGO NO PAIS.

Autor
Josaphat Marinho (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Josaphat Ramos Marinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESEMPREGO.:
  • AGRAVAMENTO DO DESEMPREGO NO PAIS.
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares, Bernardo Cabral, Eduardo Suplicy, Hugo Napoleão, Humberto Lucena, Jader Barbalho, Marina Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 07/02/1996 - Página 1379
Assunto
Outros > DESEMPREGO.
Indexação
  • COMENTARIO, FATO ANTERIOR, DISCURSO, HUGO NAPOLEÃO (PI), SENADOR, RELAÇÃO, DESEMPREGO, BRASIL.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), LANÇAMENTO, PROGRAMA, DEMISSÃO, VOLUNTARIO, BANCO PARTICULAR.
  • CRITICA, PROGRAMA, DEMISSÃO, VOLUNTARIO, LANÇAMENTO, EMPRESA, BANCOS, MOTIVO, AUMENTO, DESEMPREGO.

  SENADO FEDERAL - SECRETARIA LEGISLATIVA SF -

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 08/02/96


O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em dia recente, o nobre Senador Hugo Napoleão, com a serenidade do seu temperamento, tratou, neste plenário, do problema do desemprego. Expondo a seriedade do problema, fê-lo sem nenhum propósito crítico. Examinou fatos, fez ponderações. Deram-lhe apoio ilustres Líderes e outros Senadores. Foi voz comum a de que se impõem determinadas medidas capazes de impedir o aumento crescente do desemprego.

Tive oportunidade, logo em seguida, de comentar a discussão havida neste plenário, fazendo-o em artigo no qual fixei esta conclusão:

      "Parece que o recente debate no Senado, desdobrado sem emoção, teve exatamente a virtude de convocar ao exame sereno do problema. Não afrontou o Governo nem lhe estipulou prazo. Participando do debate Líderes que o apóiam, as considerações feitas valeram como convite à reflexão. Vendo o desemprego como um mal que se agrava, o Senado exerceu forma construtiva de colaborar, a ponderação. Em quadro de desemprego da extensão do atual, ponderar e sugerir é mais útil do que apenas apoiar ou simplesmente criticar."

Com esse mesmo espírito, ocupo hoje a tribuna.

Saliente-se que, logo após o discurso do eminente Senador, a imprensa timbrou em assinalar que se agrava o problema do desemprego. E o fez salientando que, diante do desdobramento do problema, o Governo cuida até de criar um fundo especial capaz de gerar condições impeditivas da ampliação do desemprego.

Ao mesmo tempo, cuidou-se e se vem cuidando de discutir a necessidade de modificar a legislação trabalhista e a legislação correlata, para que sejam eliminados certos gravames que, segundo se comenta, concorreriam ou concorrem, para gerar dificuldades ao mercado de trabalho e acarretar, conseqüentemente, o aumento do desemprego.

Não vou, neste momento, examinar se é próprio ou não cuidar da modificação da Constituição ou da legislação para verificar se devem ser eliminadas determinadas exigências legais, que estariam concorrendo para dificultar a relação de emprego e acarretar desemprego. Pretendo situar fatos recentes.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje, o jornal O Globo publica notícia, que me parece extremamente estranha. Anuncia que o Unibanco lança plano de "demissão voluntária."

A nota é esta:

      "O Unibanco lançou ontem um programa de incentivo a demissões voluntárias, prevendo o pagamento de gratificações escalonadas por tempo de serviço e a manutenção temporária de auxílio médico e alimentação. Segundo o vice-Presidente de Recursos Humanos do Banco, Paulo Bravo, ele começará a ser aplicado entre o fim desta semana e o início da próxima. Estimativas de consultores indicam que, para manter sua eficiência, o banco precisará enxugar seu quadro administrativo em pelo menos 10 mil funcionários. Com a incorporação do Nacional, o Unibanco ficou com 31 mil empregados."

Em seguida, a nota especifica as condições que o banco pretende adotar para a obtenção desses pedidos de demissão voluntária.

Ora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é evidente que não podemos, de modo genérico, intervir na vida das empresas quanto à formação do seu quadro de pessoal. Podemos apenas exigir que as empresas privadas o façam, respeitadas as normas estabelecidas na Constituição e nas leis. Logo, a observação não se estende ao comum do funcionamento das empresas. No caso, porém, a situação é especial. Trata-se de um banco que se fundiu, ou se incorporou a outro banco, ou que trouxe à sua estrutura o Banco Nacional. Pouco importa a designação - se foi compra, se foi fusão, se foi entendimento - , certo é que as duas organizações se uniram formando uma empresa da maior extensão e do mais amplo poder econômico. Para que assim ocorresse, o Governo entrou com ajuda financeira, funcionou o Proer. Não é de se indagar aqui se a ajuda foi diretamente ao Unibanco ou se foi ao Unibanco por intermédio do Banco Nacional. Exato é que, para que as duas instituições se fundissem, o Governo deslocou dinheiro a fim de assegurar-lhes a nova formação e o desenvolvimento de suas atividades. Aí, então, entra o problema: é razoável que bancos recebam favor financeiro do Governo para que possam sobreviver ou para que possam unir-se e pouco após anunciem plano de demissão de pessoal? É lógico, é razoável que se canalize dinheiro do poder público para que sobrevivam instituições bancárias ou para que elas, juntando-se, se ampliem e possam em seguida, em nome da economia, em nome do refazimento de sua estrutura, promover a demissão de pessoal e em quantidade como a que se anuncia?

Isso é admissível num quadro de desemprego como o que já se verifica no Brasil, em que só em São Paulo, segundo se diz, já há um milhão de desempregados? É razoável que o banco, ontem beneficiário de vantagem financeira, possa logo após, como agora, anunciar um plano de demissão para reestruturar-se?

O Sr. Hugo Napoleão - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Pois não, nobre Senador Hugo Napoleão?

O Sr. Hugo Napoleão - Eminente Senador Josaphat Marinho, recolho sensibilizado as observações de V. Exª a respeito do meu pronunciamento feito na semana passada na tribuna do Senado Federal. V. Exª faz ao Plenário uma indagação que eu poderia começar por responder que não. Não é justo. Esse problema que a imprensa vem focalizando foi detectado por dois dos grandes institutos de pesquisa: o Instituto Vox Populi e o Instituto Gallup. As preocupações maiores da população brasileira, anteriormente fixadas na segurança, na saúde, na educação, hoje, transpuseram-se para o desemprego. E o desemprego aparece tanto num Instituto quanto no outro como o item um da preocupação da opinião pública do nosso País. Diante dessas assertivas, diante de um programa como o Proer, criado para dar sustentação às instituições financeiras, aos seus correntistas, àqueles que poupam, a resposta à sua pergunta deve ser efetivamente "não". Encerro este breve aparte com uma observação. Um de nossos Colegas, um Senador, disse que seu filho foi obrigado a fechar as portas de sua pequena empresa por não suportar os juros elevados e foi obrigado a demitir sete empregados. Avaliem o que acontece no resto do País. É oportuno, é tempestivo, é meritório o pronunciamento de V. Exª, ao qual, com muita honra, tomo a liberdade de associar-me em nome do Partido da Frente Liberal.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Nobre Líder, agradeço-lhe o aparte e o apoio, sobretudo porque, em verdade, estou apenas desdobrando o tema que foi por V. Exª suscitado, com muita proficiência.

O que se indaga não é da liberdade de iniciativa ou de ação econômica pelas empresas privadas. O de que se cuida é de perguntar se, num quadro de crise, como o que atravessamos, uma empresa bancária que foi financeiramente ajudada pelo Governo, para sobreviver ou para ampliar-se, pode usar a liberdade de administração para promover um plano de demissão voluntária, que equivale, em verdade, a uma demissão imposta. Quem conhece as relações entre o capital e o trabalho, quem já conviveu com a luta entre patrões e empregados sabe, com certeza, que nesses planos de demissão voluntária o que em verdade há é uma demissão coativa.

O anúncio do convite a que empregados se demitam é apenas a advertência feita para que, se não aceitarem a proposta, a empresa realize a demissão no momento que lhe convier.

O Sr. Bernardo Cabral - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - V. Exª tem o aparte, nobre Senador Bernardo Cabral.

O Sr. Bernardo Cabral - Eminente Senador Josaphat Marinho, V. Exª sabe que li o artigo de V. Exª, onde registra que é melhor ponderar e sugerir, algumas vezes; e diz mais: que é melhor até do que simplesmente criticar. V. Exª, no fio condutor filosófico do seu discurso, sem nenhuma dúvida, está a abordar o problema do ângulo social. E por que o faz? O eminente Senador Hugo Napoleão, ao responder a pergunta de V. Exª, diria que não é justo. Eu ouso complementar: não é justo, é criminoso. V. Exª mostrou o conluio entre uma identidade que se locupleta de um favor para gerar um problema social, como a demissão, esfrangalhando a relação capital e trabalho. E diz muito bem V. Exª, com a percuciência de sempre, que, como se anuncia, é um pedido de demissão voluntário, quando, por trás disso, o que há é uma coação; ou seja, uma fachada de catedral e os fundos de bordel. Nesse passo, Senador Josaphat Marinho, estamos caminhando para uma circunstância sui generis, que é a bancarrota, queiram ou não queiram, das médias e microempresas, que não podem suportar o índice altíssimo de juros e não têm como se beneficiar do auxílio que é dado a outras instituições. De modo que V. Exª não retoma o tema iniciado pelo eminente Senador Hugo Napoleão; V. Exª sempre enriquece qualquer tema que seja abordado, e é o que faz nesta hora, da tribuna do Senado.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Sou muito grato ao seu aparte, nobre Senador, mas, em verdade, a sua intervenção é que enriquece o meu modesto pronunciamento.

De qualquer modo, o que está em relevo é a indagação da propriedade do plano anunciado. Segundo ainda o noticiário de O Globo, o projeto é o seguinte: "O funcionário que aderir ao programa vai ter direito a gratificações de acordo com o tempo de trabalho. Quem trabalha há menos de um ano vai receber, além das garantias fixadas em lei, o equivalente à metade do salário pago na data de recisão - o valor inclui comissões e bônus anteriores. De um a três anos de casa, a gratificação sobe para um salário. De três a cinco, vai a dois salários. De cinco a oito, dois salários e meio. De oito a 15 anos, 2,75 salários. Acima de 15, três salários e mais um quarto de salário por ano trabalhado."

Parecerá, a uma rápida leitura, que é uma vantagem que a empresa está oferecendo. Quem vive de salário limitado, receberá de uma vez um volume de dinheiro com que não contava. Mas o problema é outro: é o problema social a que se refere o nobre Senador Bernardo Cabral. Recebido esse dinheiro, o trabalhador é um desempregado, e o mercado de trabalho como está não oferece condições para absorver sua mão-de-obra. Ficará, então, comendo e gastando o que recebeu a título de uma vantagem aparentemente útil à sua sobrevivência ou à manutenção e à melhoria da condição de vida da sua família. Em realidade, esse dinheiro se esgota em pouco tempo, até porque hoje, mesmo que possa ser recolhido a um banco, a renda é muito pequena. Servirá, portanto, apenas para a manutenção regular do trabalhador e de sua família. E enquanto o dinheiro se esgota, estará desempregado e sem perspectiva de ocupação próxima. Digo sem perspectiva de ocupação próxima porque estudo da Confederação Nacional da Indústria, traçando uma perspectiva da economia brasileira para 95/96, adverte que não há como prever-se facilidade de emprego no tempo próximo.

Analisando as dificuldades da economia, esse documento acentua: "Este é um dos motivos pelos quais pode-se antever um agravamento do problema do emprego nos próximos anos. De fato, as perspectivas quanto às taxas de crescimento econômico para os próximos anos, se não podem ser consideradas ruins, são bastante modestas."

Como se vê, nobres Senadores, o problema localizado no caso do Unibanco tem projeção de importância social relevante. Disse-se, aqui, no debate provocado pelo discurso do nobre Senador Hugo Napoleão, que a solução do problema do desemprego não estava apenas na ação do governo, mas no procedimento conjunto dele e da sociedade. Enfim, disse-se que era necessário um pacto social, mediante o qual a ação conjugada do Poder Público e das empresas privadas pudesse assegurar condições normais de vida aos que vivem da aplicação da sua mão- de-obra.

Estimarei, imensamente, que os dirigentes do Unibanco possam desmentir a nota de O Globo, ou pelo menos, corrigi-la. Assim espero em nome dessa expectativa de pacto social de que se falou há poucos dias aqui. O que se anunciou hoje, entretanto, não é indicativo de pacto; é, antes, expressivo de atuação separada, isolada, divergente. Como, com a conjunção das duas organizações, a nova estrutura restou com 31 mil empregados, a solução não está em ampliar as atividades do banco, mas em reduzir o número de seus empregados.

Ora, não é possível que o capital tenha todas as vantagens para sobreviver e o empregado não tenha nenhuma para resguardar o seu trabalho e, em conseqüência, a manutenção da sua condição de vida.

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Concede-me V. Exª um aparte, nobre Senador Josaphat Marinho?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Pois não, nobre Senador Antonio Carlos Valadares.

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Senador, como sempre, V. Exª consegue despertar a atenção do Plenário desta Casa pela discussão séria e atualizada dos problemas nacionais. Hoje, este assunto tormentoso do desemprego volta à tona depois de discussões acaloradas ocorridas na semana passada, iniciadas pelo Líder do PFL, justamente o Partido que apóia, de forma leal e coerente, o Governo Federal, numa prova evidente de que o Presidente da República está se preocupando com as reflexões que aqui são feitas. As demissões no setor bancário começaram no Banco do Brasil. Recordo-me de que, no mês de julho do ano passado, durante o recesso, quando esta Casa tem sempre funcionando uma comissão, apresentamos um requerimento convocando o Ministro da Fazenda, Dr. Pedro Malan, para que S. Exª explicasse, de forma explícita, os motivos reais que levaram o Banco do Brasil a demitir 15 mil servidores, sob a capa de "demissão voluntária". E S. Exª, numa desatenção que considero descabida e despropositada contra o Senado Federal, afrontando o Regimento Interno desta Casa e ferindo frontalmente a Constituição Federal, a Carta Magna que ele é obrigado a aceitar, até o presente momento não se dispôs, agindo de forma imperativa, a vir a esta Casa e utilizar-se dessa prerrogativa que nós Senadores temos, para que nos explicar as reais demissões feitas no Banco do Brasil. Agora, os Estados são como que colocados na parede, num verdadeiro ato de invasão da autonomia das Unidades Federadas. São obrigados a impor ajustes fiscais, dentro dos quais a demissão está na primeira linha da vontade do Governo Federal. Trata-se de uma verdadeira intervenção branca nos Estados para tomar R$120 milhões, R$80 milhões, R$200 milhões. Se fizermos as contas, só o Fundo Social de Emergência e o Fundo de Estabilização Fiscal tiraram dos Estados e Municípios R$3 bilhões. E o Governo Federal, para emprestar R$450 milhões aos Estados, humilha-os, quase que ali intervém e incentiva também demissões. É o próprio PFL que vem a público condenar essas atitudes do Governo. As demissões acontecem no setor privado em decorrência dessa política de juros altíssimos, desumana e cruel que penaliza os empresários e, conseqüentemente, os trabalhadores. Devemos ver nos Estados e Municípios a pobreza e a humilhação por que os Governadores, principalmente do Nordeste, estão passando. V. Exª tem razão. É preciso que algo seja feito de forma urgente, para que se consiga um paradeiro, a fim de que se retome o desenvolvimento econômico, e a empresa privada seja valorizada, prestigiada, e não as empresas estrangeiras. Agora, encontrou-se ouro no sul do Pará. Espero que, agora, não tenhamos a desdita de vender a Companhia Vale do Rio Doce. De sorte que parabenizo V. Exª, que traz à reflexão da Casa esses acontecimentos nacionais. Espero que o Presidente da República, um homem preparado para governar o Brasil, atenda aos apelos dos seus correligionários, de um correligionário tão fiel e dedicado quanto Hugo Napoleão e tão fiel, dedicado e inteligente quanto V. Exª. Muito obrigado.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - O aparte de V. Exª, nobre Senador Antonio Carlos Valadares, fortalece as alegações que aqui estão sendo desenvolvidas, não apenas por mim, mas por outros Senadores. O relevante a assinalar-se é que, em procedimento como o de que se trata, há, em verdade, desrespeito à Constituição. A Constituição brasileira, entre seus princípios fundamentais, garante a dignidade da pessoa humana e os valores do trabalho. Não são respeitados esses princípios quando um grande estabelecimento bancário, depois de receber o benefício do Poder Público, logo estabelece como projeto, para seu regular crescimento, a redução de servidores numa fase de irrecusáveis dificuldades para a mão-de-obra.

O Sr. Jader Barbalho - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Tem V. Exª o aparte, nobre Líder.

O Sr. Jader Barbalho - Senador Josaphat Marinho, desejo cumprimentá-lo pela análise que faz desse grave problema que preocupa toda a sociedade brasileira, que é a questão do desemprego. Confesso que estou plenamente solidário com V. Exª quando faz uma análise sobre a questão relativa à incorporação de bancos, com o apoio financeiro de uma linha de crédito. Se o Governo, por um lado, entende que o Sistema Financeiro não pode ter riscos e constrói uma linha de crédito, como é o caso do Proer, creio que, em contrapartida, haveria necessidade, no caso específico desse setor, que houvesse proteção ao emprego. É profundamente injusto e doloroso que se possa constatar a preocupação com o sistema bancário, com o sistema financeiro e não haja uma preocupação, por outro lado, em proteger os trabalhadores desse setor. Mas a análise de V. Exª é muito mais ampla no que diz respeito ao setor bancário. V. Exª, seguramente, apanha esse setor para demonstrar a gravidade do problema. Quero repetir aquilo que disse na semana passada ao Senador Hugo Napoleão: o Congresso Nacional, a classe política, enfim, é inevitavelmente responsabilizada pelos desacertos, nunca pelos acertos, da questão econômica. A nossa situação é profundamente desconfortável. Desconfortável porque são os economistas, e alguns deles com larga tradição, que emitem juízos e conceitos sobre os planos econômicos: este que aí está e outros que já foram aplicados e com insucesso. E eu fico a pensar - e pensar com extravagância, Senador Josaphat Marinho - o que será do conceito das escolas de Economia no Brasil se os nossos economistas, considerados brilhantes, não conseguem formular planos econômicos capazes de efetivamente dar um caminho seguro ao nosso País. Mais uma vez a classe política demonstra: não há uma emenda constitucional enviada pelo Presidente da República que não tenha merecido a solidariedade do Congresso. Presidentes anteriores também a mereceram. Houve um que até conseguiu bloquear dinheiro de caderneta de poupança com o apoio do Congresso Nacional. E isso foi montado pelos economistas. Às vezes, fico pensando se não deveríamos fechar as escolas de economia e mandar os estudantes que quisessem estudar para o estrangeiro. Mas toda essa gente tem mestrado em grandes universidades no exterior também; são PHDs de universidades renomadas nos Estados Unidos e na Europa. Então, fica tudo muito difícil. Mas quero registrar que mais uma vez um político com a tradição, a competência e o espírito público de V. Exª, vem e cumpre o seu dever de, na tribuna de uma das Casas do Congresso, analisar e tentar contribuir para o encaminhamento dessa questão. Este País não pode se tornar um escritório de contabilidade. Os responsáveis pela área econômica não podem imaginar que é possível controlar a situação que aí está apenas com o combate à inflação, deixando de lado num País de 160 milhões de habitantes, que tem uma distribuição de renda, talvez a mais perversa do mundo. Jogar este País na recessão é jogar na miséria milhões de brasileiros. É possível, portanto, dosar a mão. Essa gente precisa entender que é preciso ter sensibilidade. Ao lado de arrumar as contas públicas, de enfrentar o déficit público, de combater a inflação, é necessário ver o lado social que V. Exª reclama com muita justeza. Os meus cumprimentos pelo pronunciamento de V. Exª, que demonstra mais uma vez que a classe política no Brasil está atenta.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Muito grato a V. Exª, nobre Líder Jader Barbalho. O apoio que me oferece é tanto mais expressivo, porque indica que não defendo um ponto de vista estritamente pessoal, mas reflito uma preocupação coletiva. Este é o problema. As observações que hoje faço, eminentes Senadores, visam também a despertar a atenção para que outros bancos, outras organizações bancárias que se constituíram em situação assemelhada à do Unibanco, não pretendam adotar plano equivalente. É preciso atentar-se ao problema do resguardo da paz social. É o que foi aqui muito salientado no debate anterior.

Hoje, quero ressaltar, concluindo, que empresas beneficiadas financeiramente pelo Poder Público, não podem pretender desenvolver-se com o sacrifício dos assalariados.

O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Eduardo Suplicy - Também desejo cumprimentá-lo por trazer o assunto do desemprego e da baixa remuneração de trabalhadores e o tratamento pouco equitativo. Na hora de se prover recursos como os do Proer a instituições financeiras, o Governo age rápido. O Governo também age rápido - e esta é uma informação que nos deve preocupar - quando libera recursos para empresas. O BNDES, por exemplo, segundo informa a imprensa, não tem tido a preocupação, na hora de promover a modernização de empresas e o financiamento para equipamentos, de fazer com que essas empresas dialoguem com as respectivas representações de trabalhadores sobre como agir para preservar ou aumentar o nível de emprego. O BNDES tem como principal fonte de seu orçamento o Fundo de Amparo ao Trabalhador, porque 40% da arrecadação do FAT, constituída pelo PIS/PASEP, é o grosso do montante de recurso de que dispõe. A Imprensa tem revelado que os recursos têm sido colocados sem que haja efetivamente essa preocupação. Tem havido, inclusive, muitos casos de financiamento em que o resultado é a considerável diminuição de oportunidade de emprego. Nesses últimos dias, o Governo tem falado sobre a diminuição dos encargos sociais como uma maneira de reduzir o custo de contratar trabalhadores. É preciso que se pense bastante sobre essa proposição e se verifique até que ponto avançar. Estou inteiramente aberto para estudá-la, mas é necessário prudência. Quando da Constituição de 1988, embora não tenha participado de sua elaboração, soube que uma das preocupações dos constituintes foi a de procurar que houvesse contribuições de fontes diversas, tais como faturamento, valor adicionado, folha de pagamento e, eventualmente outras, para as receitas do Governo. Por que se pensou nisso? Economistas como a Deputada Maria da Conceição Tavares têm salientado que, àquela época, levou-se em consideração a necessidade de se pensar em fluxos diversos de renda, para evitar um agravamento da recessão. Isso porque muitas vezes um governo deve ter fontes de arrecadação diferentes, já que a atividade econômica pode ter efeitos diferentes seja sobre a folha de pagamento numa fase do ciclo, sobre o valor adicionado, sobre as vendas ou, ainda, sobre o valor da propriedade, que constitui um outro fator gerador de receita, seja através do IPTU ou do Imposto Territorial Rural e assim por diante. Por outro lado, quando se analisam propostas de diminuição de encargos sociais, é preciso ter-se em conta as repercussões no seu todo. E, caso se queira avançar rumo à flexibilização de preços e, sobretudo, de salários, é preciso se pensar em como proteger aqueles que têm uma remuneração tão irrisória, senão zero, em nosso País. Por essa razão é que eu gostaria de salientar a importância de se conseguir o pleno emprego, a melhor distribuição da renda e o ataque à miséria, a proposição de uma renda de cidadania, de uma renda de existência, de uma renda básica ou de uma renda mínima garantida a todos cidadãos brasileiros. Muito obrigado.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Todas as particularidades de seu aparte, nobre Senador, merecem consideração no trato geral do problema, a que estamos fazendo referência.

A Srª Marina Silva - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Ouço V. Exª com prazer.

A Srª Marina Silva - Com sensibilidade, V. Exª está tratando o tema que envolve preocupações de cunho social, como pessoas que ficariam sem renda, sem condições de sobrevivência, o que seria um prejuízo para o conjunto da sociedade. Não se pode imaginar uma sociedade desenvolvida, com crescimento econômico, se a grande maioria da população não tem como sobreviver, não tem poder de compra; enfim, os prejuízos alcançariam todos a longo prazo. Peço licença a V. Exª para fazer para fazer alusão a uma parábola muito interessante. No início da colonização dos Estados Unidos, um pai de família, que ali estava desbravando o território, saiu para cidade, a muitos quilômetros de distância, para comprar mantimentos. Ficaram apenas a mãe e duas crianças, uma de um ano e outra de dois anos. Ocorre que a mãe foi cortar lenha e foi picada por uma serpente. Compreendendo que ia morrer pelo veneno da serpente, correu para casa e começou a assar pão em grande quantidade, para deixar em local onde as crianças pudessem alimentar-se e não morrer de fome antes que o pai chegasse. Acontece que a temperatura do fogão, o suor e o trabalho fizeram com que expelisse o veneno da serpente. Dessa forma, a mãe, tentando salvar os filhos indefesos e inocentes, conseguiu salvar-se a si mesma nesse processo. É isso que falta no Brasil. É isso que falta em nossa cultura. Ninguém quer salvar-se enquanto salva outras pessoas. Os segmentos da sociedade mais favorecidos, o Governo enfim, fazem vistas grossas para a questão social, achando que estão salvando uma elite e que essa elite é responsável por todo o processo produtivo. Mas esquecem-se que a melhor forma de salvar essa própria elite seria dando uma parcela de contribuição na área social, principalmente no que se refere à questão do desemprego. Era essa a minha contribuição, talvez quebrando o nível das análises econômicas que estão sendo feitas aqui neste plenário.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Valiosa contribuição a nobre Senadora Marina Silva acaba de trazer ao debate.

O Sr. Humberto Lucena - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Josaphat Marinho?

O SR. JOSAPHAT MARINHO - Pois não, nobre Senador Humberto Lucena.

O Sr. Humberto Lucena - Cumprimentando V. Exª pelo seu pronunciamento, informando que dentro de poucos dias também estarei na tribuna para versar sobre o tema, sobretudo depois que o PMDB, a nível nacional, recebeu o resultado de pesquisa realizada pelo Instituto GALLUP, onde se revela o que todos já sabiam: que o desemprego é o principal problema que aflige hoje o povo brasileiro. Afirmo a V. Exª o seguinte: o que está faltando na política econômica atual, que tem um cunho altamente neoliberal talvez por conta da coligação feita para a eleição do Senhor Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, é uma pitada de socialdemocracia, para que o social e não apenas o econômico - também seja uma preocupação maior, como bem colocou o nobre Líder Jader Barbalho. No que tange à questão do Unibanco, a que se refere precipuamente o discurso de V. Exª, lembraria que a responsabilidade maior não é propriamente do Unibanco - sabe V. Exª -, mas do Banco Central, que é quem comanda todo esse processo de fusão, de incorporação de bancos. Quando isso acontece, o Banco Central faz uma série de exigências aos bancos. Digo isso porque, no caso dos bancos dos Estados da Paraíba e do Piauí, que foram liquidados extrajudicialmente no Governo Collor e depois reabertos a duras penas, não existia àquela época o Proer e, portanto, os bancos não podiam nem fazer o programa de demissões voluntárias. As demissões foram compulsórias mesmo. O Banco Central fez determinadas exigências para a reabertura dos bancos. No caso da Paraíba, por exemplo, exigiu que dos 1.200 empregados só se mantivesse 300. Portanto, a grande responsabilidade é do Banco Central. E nos demais casos, quanto ao desemprego de um modo geral no País, ninguém desconhece que isso é fruto da política econômica que aí está, que é necessária para o combate à inflação mas cujas medidas restritivas ao crédito estão levando grande parte das empresas brasileiras à concordata e à falência e, portanto, à dispensa em massa de trabalhadores em todo o Brasil. Fazem-se necessárias, então, algumas providências que já comentamos aqui, para que se pense não apenas no combate à inflação mas também na volta do crescimento econômico, na distribuição de renda e no salário digno para o trabalhador brasileiro.

O SR. JOSAPHAT MARINHO - O aparte de V. Exª, nobre Senador Humberto Lucena, é tanto mais próprio porque desperta a atenção do Banco Central para o que lhe possa caber de responsabilidade, no assunto de que se trata.

Sr. Presidente, no momento em que V. Exª lembra que o tempo se esgotou, quero declarar à Casa, agradecendo-lhe a atenção, que o discurso se encerra, e se encerra inspirado nas palavras da nobre Senadora Marina Silva: todos, certamente, confiamos em que, como aconteceu com aquela mulher nos Estados Unidos, em que o calor do fogo expeliu o veneno do seu corpo, aqui o calor da solidariedade possa espancar a ameaça crescente do desemprego.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/02/1996 - Página 1379