Discurso no Senado Federal

REVISÃO DOS VENCIMENTOS DOS SERVIDORES PUBLICOS EM JANEIRO. COMENTARIOS A REFORMA ADMINISTRATIVA.

Autor
Humberto Lucena (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Humberto Coutinho de Lucena
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SALARIAL.:
  • REVISÃO DOS VENCIMENTOS DOS SERVIDORES PUBLICOS EM JANEIRO. COMENTARIOS A REFORMA ADMINISTRATIVA.
Aparteantes
Jefferson Peres, Josaphat Marinho.
Publicação
Publicação no DSF de 15/02/1996 - Página 1963
Assunto
Outros > POLITICA SALARIAL.
Indexação
  • DIREITOS, FUNCIONARIOS, AUMENTO, VENCIMENTO, DATA BASE.
  • INCONSTITUCIONALIDADE, CONCESSÃO, GRATIFICAÇÃO, MILITAR, AUSENCIA, RECIPROCIDADE, BENEFICIO, FUNCIONARIO CIVIL.
  • CITAÇÃO, LEI FEDERAL, FIXAÇÃO, DATA BASE, FUNCIONARIO PUBLICO.
  • COMENTARIO, INCLUSÃO, PROPOSTA, ORÇAMENTO, DESPESA, AUMENTO, FUNCIONARIO PUBLICO.
  • CRITICA, REFORMA ADMINISTRATIVA, EXTINÇÃO, ESTABILIDADE, FUNCIONARIO PUBLICO.

O SR. HUMBERTO LUCENA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, abordo, hoje, um assunto que já foi objeto de vários pronunciamentos neste plenário. Refiro-me à questão que se tornou tão polêmica, embora me pareça muito simples, do reajuste ou não dos vencimentos dos servidores públicos civis e militares da União, na data base de 1º de janeiro de 1996.

Inicialmente, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, lembro que, ao longo de minha vida parlamentar, como Deputado estadual, Deputado federal e Senador, é a primeira vez que ouço essa dúvida.

A Constituição Federal, no seu art. 37, X, diz:

      "- a revisão geral da remuneração dos servidores públicos, sem distinção de índices entre servidores públicos civis e militares, far-se-á sempre na mesma data;

Acontece que, ultimamente, não só neste Governo, mas nos governos anteriores, iniciou-se um processo de discriminação dos servidores civis, em favor dos servidores militares. Criaram-se várias gratificações para os militares, sob o argumento de atender às suas justas reivindicações salariais.

Sou daqueles, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que até admitem que devemos nos debruçar sobre essa Proposta de Emenda Constitucional, para efeito de distinguir a remuneração dos civis da dos militares, tendo em vista a diferença de atividades que exercem. Vale salientar que, de um modo geral, os militares, até pela sua própria condição de ser, devem dedicar-se, integralmente, ao serviço do Estado.

Entretanto, enquanto não se mudar a Constituição, não se podem dar gratificações aos militares, a título de reajustes indiretos, e negar o mesmo percentual aos servidores civis. Isso fere frontalmente a Constituição Federal.

Por sua vez, a Lei nº 7.706, de 1988, estabelece claramente, em seu art. 1º, que:

      "a partir de 1989 o mês de janeiro será considerado data base das revisões dos vencimentos, salários, fundos e proventos dos servidores civis e militares da Administração Federal Direta, das Autarquias, dos extintos Territórios Federais e das fundações públicas."

Ao que me consta essa lei não foi revogada. Tanto que vem sendo religiosamente cumprida a cada ano que passa.

O Sr. Josaphat Marinho - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Pois não, nobre Senador.

O Sr. Josaphat Marinho - E V. Exª pode acrescentar, nobre Senador Lucena: essa lei que fixou a data base em janeiro foi modificada em vários dos seus dispositivos seguidamente, mas o dispositivo que fixou a data permaneceu.

O SR. HUMBERTO LUCENA  - Nobre Senador, agradeço a V. Exª pela contribuição valiosíssima, pois é um jurista eminente, consagrado nesta Casa e fora dela.

Prosseguindo, Sr. Presidente, ressalte-se entretanto que não existia, nem existe, para janeiro de 1996, nenhuma norma legal que defina os critérios ou índices de reajuste dos servidores na revisão que, de conformidade com o disposto na citada lei, deveria ter lugar naquela data.

Um aspecto incontestável, porém, do ponto de vista jurídico, é o de que a data base está fixada na lei.

O Sr. Jefferson Peres - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouço com prazer V. Exª.

O Sr. Jefferson Peres - Senador Humberto Lucena, embora eu esteja de acordo com V. Exª, entendo que existe uma armadilha legal que condena a todos nós, Parlamentares, infelizmente, ao silêncio em relação ao aumento dos servidores. Como os nossos subsídios são atrelados aos deles, toda vez que aumentarem os vencimentos dos servidores da União nossos subsídios aumentarão na mesma data e no mesmo percentual. Todas as vezes que defendermos reajuste para eles estaremos, querendo ou não, defendendo reajuste para nós. É isto que me impede de falar sobre o assunto.

O SR. HUMBERTO LUCENA - V. Exª alega uma razão ética, para não falar sobre o assunto.

Penso de modo diferente. Até porque, nobre Senador, o reajuste previsto, inclusive no Orçamento, é de 10%, o que pouco acrescentaria aos R$4,7 mil líquidos que estamos recebendo. Em verdade seriam mais R$470 mensais.

O Sr. Jefferson Peres - Mas sempre nos expõem à maledicência.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Mas não é por isso que vamos nos calar, em defesa da grande maioria dos servidores públicos, pois somos um mínimo dentro dessa categoria. O fato é que não há como se deixar de reconhecer que os que trabalham para o Estado - são seus servidores - têm pleno direito a um reajuste de remuneração, na sua data-base.

Por outro lado, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há que se considerar, como eu dizia antes do aparte final do nobre Senador Jefferson Peres, que o montante de recursos para cobrir o reajuste dos servidores públicos civis e militares está na proposta orçamentária da União que, se ainda não é lei, pelo menos nesse ponto não foi alterada.

Quero, portanto, desta tribuna, fazer um apelo veemente ao Senhor Presidente da República, ao Sr. Ministro da Fazenda e a outras autoridades, no sentido de que façam justiça àqueles que trabalham para o Estado.

Querer-se transformar o servidor público em bode expiatório, Sr. Presidente, nunca deu certo. Não deu certo no Governo Jânio Quadros, não deu certo no Governo Collor e não dará certo no Governo de Fernando Henrique Cardoso.

Quando faço essa colocação, adianto-me sobre um assunto que vou trazer em breve à tribuna desta Casa: a reforma administrativa. Não se trata, agora, apenas de negar ao servidor público o seu reajuste. Mas de muito mais. O que se quer, Sr. Presidente, de modo claro, é extinguir a estabilidade do servidor público. Servidores que fizeram concurso, estão aí há quinze ou vinte anos e, de uma hora para outra, poderiam ser postos na rua, considerados talvez como excedentes, ineficientes ou algo semelhante, quando V. Exª e a Casa sabem que a lei do Regime Jurídico Único tem dispositivos que estabelecem que, para qualquer caso que diga respeito à irregularidades na vida do servidor, deve-se instaurar uma sindicância e depois um inquérito administrativo.

Portanto, há um caminho para se dispensar legalmente o servidor. Não há de ser de forma arbitrária, sobretudo num país como o nosso, onde o Estado ainda exerce uma grande influência na política. Se acabarmos com a estabilidade do servidor, sobretudo dos que têm o seu direito adquirido, então, Sr. Presidente, ele vai ficar à mercê da perseguição política, senão do Governo Federal que, nesse particular, tem mais isenção, mas dos governos estaduais e dos governos municipais.

O Sr. Josaphat Marinho - Permite-me V. Exª outro aparte, nobre Senador Humberto Lucena?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouço com prazer o aparte do nobre Senador Josaphat Marinho.

O Sr. Josaphat Marinho - Nobre Senador Humberto Lucena, atente no seguinte: a Constituição permite fixar uma data-base comum para servidores civis e militares. A lei fixou. A lei não foi alterada neste ponto. Se o Governo não quer manter este regime, proponha a revogação da lei, mas assuma a sua responsabilidade de cumprir a ordem jurídica enquanto ela estiver em vigor.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Muito bem! V. Exª tem toda a razão.

E volto a me fixar novamente na data-base para reajuste dos servidores civis e militares, inclusive para voltar às considerações do aparte do nobre Senador Jefferson Peres, e lembrar à Casa que, poderíamos perfeitamente fazer - quem sabe - uma reforma constitucional estabelecendo um outro critério para reajuste dos subsídios dos Senadores e Deputados. O reajuste poderia ser reajustado através de outro critério, contanto que não ficássemos inibidos de defender os direitos dos servidores, porque há uma vinculação entre a sua remuneração e a dos Srs. Deputados e Senadores.

Mas, Sr. Presidente, já falava sobre a reforma administrativa e volto a ela. Acredito que temos que lutar pela preservação dos direitos adquiridos. Essa história de se dizer que o direito adquirido não vale contra à Constituição, é uma tese inaceitável - está ali o maior jurista desta Casa, o Senador Josaphat Marinho. Se fosse assim, então, avalie o que não aconteceria, por exemplo, também com a vitaliciedade dos magistrados. De repente viria uma reforma constitucional acabando com a vitaliciedade, atingindo inclusive os atuais Ministros do Supremo Tribunal Federal, dos demais Tribunais Superiores, dos Tribunais Estaduais e assim por diante, e voltaríamos ao arbítrio do tempo dos atos institucionais, quando foram suspensos todos os direitos, inclusive a vitaliciedade da magistratura e a imunidade dos Parlamentares.

Acho que não é por aí, Sr. Presidente. Devemos e podemos perfeitamente enxugar o Estado, cortando as gorduras. Isso deve ser feito. Os Governadores, de um modo geral, estão nessa direção, inclusive o do meu Estado, o Governador José Maranhão. Agora mesmo, S. Exª acabou de exonerar, em um processo de saneamento das finanças, iniciado por Ronaldo Cunha Lima, vários assessores do Estado, buscando verba para investimentos. Que se faça, então, um programa de demissões voluntárias, de incentivos financeiros às aposentadorias etc, e quem sabe se possa rever aquele dispositivo, aprovado pela generosidade dos Constituintes de 1988, que deu estabilidade a quem não fez concurso e que tinha cinco anos na data da sua promulgação, sujeitando aqueles servidores a um concurso de provas e títulos. Mas retirar a estabilidade de quem fez concurso público, de quem completou o estágio probatório de 2 anos, de quem é efetivo, Sr. Presidente, isso não é possível!

Estou dizendo, aqui, o que disse pessoalmente ao Senhor Presidente da República, na semana passada, durante uma audiência com Sua Excelência. Acredito que devemos encontrar outros meios e modos de fazer uma reforma administrativa, para enxugar a máquina do Estado, para diminuir as despesas de pessoal, de custeio, mas por outros caminhos, respeitando os direitos daqueles que servem ao Estado, porque não são só os Militares, Diplomatas, Fiscais da Receita que servem ao Estado, servem ao Estado todos aqueles que estão nos quadros do funcionalismo público federal, estadual e municipal.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. concluo afirmando que chegou a hora de fazer justiça aos servidores públicos que fazem parte de uma categoria que merece também um lugar ao sol na nossa sociedade. Não é possível que se queira manter a dignidade do servidor público denegrindo-se diariamente, a sua imagem, como se ele fosse o culpado por tudo de ruim que ocorre no Brasil.

Era o que tinha a dizer Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/02/1996 - Página 1963