Discurso no Senado Federal

DADOS DA INFRAERO REFERENTES AS COMPANHIAS AEREAS INADIMPLENTES COM O GOVERNO. SUCATEAMENTO DA FROTA DE AVIÕES BRASILEIROS.

Autor
João Rocha (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: João da Rocha Ribeiro Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • DADOS DA INFRAERO REFERENTES AS COMPANHIAS AEREAS INADIMPLENTES COM O GOVERNO. SUCATEAMENTO DA FROTA DE AVIÕES BRASILEIROS.
Aparteantes
Bernardo Cabral, Carlos Patrocínio.
Publicação
Publicação no DSF de 16/02/1996 - Página 2066
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • ANALISE, DEFICIT, TESOURO NACIONAL, RELAÇÃO, INADIMPLENCIA, EMPRESA PRIVADA, ESPECIFICAÇÃO, RECOLHIMENTO, TARIFA DE EMBARQUE, EMPRESA DE TRANSPORTE AEREO.
  • CRITICA, LEGISLAÇÃO, BENEFICIO, DIVIDA, EMPRESA DE TRANSPORTE AEREO, OPOSIÇÃO, JUROS, CREDITO AGRICOLA.
  • SUGESTÃO, CONTA VINCULADA, COMPENSAÇÃO, TARIFA DE EMBARQUE, EMISSÃO, PASSAGEM AEREA, GOVERNO.
  • DENUNCIA, EMPRESA DE TRANSPORTE AEREO, AMBITO REGIONAL, FINANCIAMENTO, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), AUMENTO, PREÇO, PASSAGEM AEREA.
  • PROTESTO, DISPARIDADE, PREÇO, PASSAGEM, BRASIL, COMPARAÇÃO, VIAGEM, EXTERIOR.

O SR. JOÃO ROCHA (PFL-TO. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, trago à consideração deste Plenário e da Nação brasileira uma questão que me intriga: o déficit do Tesouro Nacional, os percalços com os quais se depara o Governo na captação e distribuição dos recursos aos segmentos estruturais da sociedade, em contraste com a sua condescendência no que se refere à dívida continuada de certas empresas para com os cofres públicos.

Falo, pois, a respeito das dívidas das companhias aéreas para com a Infraero, para com o Governo Federal, decorrentes do recolhimento das tarifas de embarque a que procede tais empresas, devendo estas tarifas, por força de lei, ser repassadas ao Erário, conforme preceitua a Portaria nº 256, de 28 de junho de 1994.

Ocorre que, lamentavelmente, essa pecúnia recolhida, à guisa de taxa de embarque, não vem sendo repassada ao Tesouro Nacional há mais de dois anos.

Antes, conforme demonstrativo da própria Infraero, 19 empresas aéreas nacionais estão inadimplentes para com o Governo, posição dada em outubro de 1995, importando a soma de R$213.282.184,80.

Ademais, Srs. Senadores, é estarrecedor admitir que a própria legislação vigente, se, por um lado, fixa prazo para recolhimento de tais tarifas ao cofres públicos, por outro, amparada e até mesmo incentivada pela inadimplência, vez que confere às empresas aéreas o direito de obter acordo de parcelamento com juros compensatórios de 1% ao mês, pro rata die, respeitando-se ainda a carência de um ano para a atualização monetária, de acordo com o art. 6º, da Lei nº 6009/73 e art. 16, do Decreto nº 89.121/83, e Lei nº 8.880/94.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, aí está uma verdadeira alavanca que impulsiona a dívida e beneficia o devedor. Enquanto o rigor dos juros reais de 24%/ano mais a correção monetária castigam segmentos outros que alicerçam a economia brasileira, como é o caso da agricultura, entre outros, instaura-se "o paraíso da dívida", no que toca às companhias aéreas brasileiras.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, o déficit de 19 empresas de transporte aéreo para com o Governo Federal, de cerca de US$214 bilhões, foi parcelado, em 1995, em 96 meses, sem a inflação do primeiro ano, a juros, repito, de 12% ao ano. Um negócio que consideramos inter familiae, ou seja, de pai para filho.

Não se trata, Sr. Presidente, Srs. Senadores, absolutamente de prevenção alguma contra o segmento empresarial de que se está falando. Não se trata de colocar na "berlinda" as companhias aéreas pelo simples prazer de fazê-lo. Trata-se de um apelo ao bom senso.

É inadmissível e injustificável o tratamento diferenciado a diversos setores produtivos do cenário nacional. Como pode o Governo Federal "dar-se ao luxo" de rolar, nas condições ora apontadas, dívidas, quando ele próprio conta com um considerável déficit do Tesouro? E mais: é vultoso o gasto anual dos órgãos públicos com passagens aéreas a serviço. Nada, por conseguinte, é mais lógico do que os valores em débito por essas companhias serem abatidos na aquisição de bilhetes aéreos pelo próprio Governo, que paga de pronto àqueles que não lhe pagam há anos. Por que não haver uma conta de compensação, Sr. Presidente, Srs. Senadores?

Na verdade, o montante devido e "rolado", como vimos por longos 96 meses, está sendo objeto de uma espécie de apropriação indébita, como ocorre com o Imposto de Renda da pessoa física, porque as companhias aéreas são simplesmente um agente de repasse do Tesouro Nacional. E o que é pior: amparadas pela própria lei. É fato incompreensível, aviltante e injusto, que merece uma reflexão acurada, com vistas à devida reformulação.

Ademais, é princípio fundamental em Direito: "Quando se incompatibilizam a lei e a justiça, prefira-se esta em detrimento daquela." A normal legal merece reparos.

Estaremos apresentando um projeto de lei tentando corrigir essas distorções, Sr. Presidente.

O Fundo Aeronáutico, sabe-se, não movimenta recursos bastantes para os fins a que se propõe. Estão deficitárias as esquadrilhas da Força Aérea Brasileira por falta de peças e outros componentes. O próprio Presidente da República utiliza uma aeronave com mais de 30 anos de vida útil, também, como se propala pela imprensa, em estado precário.

Há, inclusive, Sr. Presidente, unidades federativas, cujas capitais não dispõem de um aeroporto condigno, a exemplo do meu Estado do Tocantins. Palmas, sua capital, tem, em vão, pugnado pela sua necessária transformação de um "precário campo de pouso" em um modesto aeroporto.

O Sr. Carlos Patrocínio - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOÃO ROCHA - Com muito prazer, nobre Senador Carlos Patrocínio.

O Sr. Carlos Patrocínio - Nobre Senador João Rocha, V. Exª traz à apreciação deste Plenário uma matéria de suma importância. Esses privilégios são concedidos, como V. Exª bem assegura, através de dispositivos legais. Sabemos que existe o Fundo Aeronáutico para cuidar dos aeroportos, melhorando-os, e também para que a Força Aérea Brasileira tenha condições de reparar sua esquadrilha. Temos observado que nada disto tem acontecido. O nobre Senador acaba de frisar que algumas unidades federadas não dispõem de um aeroporto ou uma pista de pouso compatível com suas necessidades. Quero afirmar a V. Exª que há seis anos tento que se iluminem a pista do aeroporto de minha cidade, Araguaína, no Estado do Tocantins, onde todo dia aterrisa um vôo doméstico, sempre lotado. Por lá já passaram aeronaves Boeing, da Varig, e aviões da Riosul. Ainda não consegui o meu intento, nobre Senador. Também lutamos por esse aeroporto de Palmas, e aqui cabe ressaltar que o Estado de Tocantins, não obstante o número de aeronaves que trafega rumo ao norte do nosso País e rumo a nações da América do Norte, não tem uma pista iluminada para dar socorro a um avião que possa, eventualmente, apresentar alguma pane. Por outro lado, o mais grave: a esquadrilha da Força Aérea Brasileira está totalmente sucateada. Tive ocasião de solicitar informações ao Exmº Sr. Ministro da Aeronáutica, Brigadeiro Lélio Lôbo, por ocasião da sua vinda à Comissão de Economia, quando tratávamos do assunto Sivam. E discutíamos se não seria necessário recursos para que o Ministério da Aeronáutica deixasse de praticar o canibalismo. Hoje, no Ministério da Aeronáutica, às vezes, desmonta-se duas ou três aeronaves para se tirar uma outra da pane, já que não se consegue fazer a necessária reposição de peças naquela instituição. Fui à Antártida num avião Hércules, aliás, um avião muito importante para o Brasil. Estávamos em Punta Arenas, na Terra do Fogo, Chile, quando ocorreu uma pane Hércules e tivemos que requisitar dois aviões, o primeiro para nos fornecer a peça de que necessitávamos e o segundo para dar auxílio, com uma outra peça, ao avião que nos havia socorrido. O Exmo. Sr. Ministro da Aeronáutica afirmou-nos que vai haver recursos no decorrer deste ano para que possa a Aeronáutica deixar de praticar esse canibalismo. Mas o fato é que temos uma frota totalmente sucateada. Aliás, não sei nem quantos jatos Mirage temos ainda, modernos, de tecnologia francesa. Ao que sei, já acabaram quase todos, entre aqueles que, como V. Exª sabe, estão baseados em Anápolis. Portanto, é muito importante o pronunciamento de V. Exª, porque o Fundo Aeronáutico não está cumprindo com o seu desiderato, com a sua função, e está servindo para conceder privilégios às companhias aéreas. Não quero estender muito o meu aparte, nobre Senador, para não tirar o brilhantismo do discurso de V. Exª, mas existe um problema também que nunca consegui entender - vou começar a estudar essa matéria, para ver se entendo alguma coisa -: as companhias aéreas cobram aqui dentro do nosso País as tarifas mais altas do mundo, quando as viagens internacionais são bem mais baratas, ou seja, fazendo com que o brasileiro vá gastar o seu dinheiro em Miami, Nova Iorque, Washington, na Europa e alhures. Não há, com isso, incentivos ao turismo em nosso País e, conseqüentemente, o dinheiro possa circular aqui. E ainda há as tais das linhas regionais, que são mais caras ainda. Portanto, esta é uma coisa que eu ainda não pude entender: não há incentivo para que possamos fazer o turismo interno. Sabemos que esses países do G-7 são poderosos do ponto de vista industrial, mas tenho a certeza e a convicção de que a maior indústria desses países é a do turismo. Nós poderíamos também agilizar a implantação dessa indústria no nosso País, mas não temos o incentivo necessário, que deveria partir, principalmente, de tarifas mais baratas internamente. Portanto, fica aqui o meu apoio à palavra de V. Exª e, mais uma vez, espero que o Ministério da Aeronáutica, pelo menos, consiga fazer um balizamento noturno numa das pistas de pouso da capital do meu estado, Tocantins, porque há seis anos luto por isso, mas nunca consegui, nobre Senador. Muito obrigado.

O SR. JOÃO ROCHA - Nobre Senador Carlos Patrocínio, o aparte de V. Exª acrescenta e valoriza muito o nosso pronunciamento.

O Sr. Bernardo Cabral - Senador João Rocha, concede-me V. Exª um aparte?

O SR. JOÃO ROCHA - Com muito prazer, Senador Bernardo Cabral.

O Sr. Bernardo Cabral - Quero aproveitar o que acaba de dizer o Senador Carlos Patrocínio para confirmar o que tisna, o que embota o turismo no nosso País. É rigorosamente verdadeiro o que se passa. Hoje, os amazonenses saem de Manaus para Miami e voltam a Manaus ou vão de Manaus a Cancun, no México, e voltam, com sete dias de hospedagem em bons hotéis, com uma passagem que sai mais barata do que Manaus-Rio-Manaus, ou mesmo que Manaus-Salvador-Manaus. Já não quero falar nem no estado da nossa eminente Senadora Emilia Fernandes, que ficaria mais distante, pois Manaus fica num ponto e Porto Alegre em outro. Veja como V. Exª tem razão quando aborda um assunto dessa natureza. Já identifiquei que a linha coordenada do seu discurso é uma veemente, uma candente reclamação para com o descaso que se impõe ao nosso País nessa matéria. Observe como se conjugam as duas coisas: um Senador que representa Tocantins, como Carlos Patrocínio, há seis anos vem reclamando uma pista de pouso a ser construída em seu Estado. Não é possível que se faça ouvidos de mercador em um País continental como o nosso, sem trazer uma alternativa para o nosso orçamento. Qual é essa alternativa? O turismo. O que é o turismo? Uma indústria sem chaminés, sem poluição. De modo que peço permissão para me acoplar ao discurso de V. Exª dando-lhe esse pálido apoio.

O SR. JOÃO ROCHA - O aparte de V. Exª também valoriza sobremaneira o nosso pronunciamento, pois V. Exª é um Parlamentar da região Norte do País, da região amazônica sofrida.

O que mais nos preocupa, nobres Senadores Carlos Patrocínio e Bernardo Cabral, é que, no caso específico do nosso estado, Tocantins, a distância de Brasília a Araguaína é de aproximadamente mil e duzentos quilômetros. Essa região era atendida por vôos comerciais da VASP e da VARIG, com passagens a um preço alto, mas até certo ponto acessíveis. Posteriormente, como muito bem colocou o Senador Carlos Patrocínio, companhias regionais começaram a fazer essas linhas. Descobriram um filão novo: essas companhias regionais são financiadas pelo BNDES, com recursos do Tesouro e elas não têm controle sobre o preço das tarifas. O que elas fazem então? Por exemplo, se pela VARIG uma passagem Brasília/Araguaína, hipoteticamente, custa R$500, nas companhias regionais pode chegar a custar até R$1 mil.

Para que V. Exª possa conhecer a realidade, há, ainda, mais um fato verdadeiro, qual seja, uma passagem Brasília/Porto Nacional, que corresponde a um percurso em linha reta de mais ou menos 700 quilômetros, custa exatamente R$486. No entanto, nos pacotes turísticos que estamos vendo anunciados todos os dias, uma passagem Brasília/Miami/Brasília, com direito a sete noites em hotéis de três ou quatro estrelas, também custa mais ou menos R$480.

O que sentimos, portanto, é que ao invés de a região Norte ser privilegiada no seu tráfego aéreo, ela é penalizada. O Tocantins hoje é um estado superpenalizado, pois é basicamente servido por empresas regionais que usufruem de financiamentos federais através do BNDES, cobrando-nos o dobro do preço de uma passagem Paris/Nova Iorque, que a American Airlines, hoje, está colocando no mercado a um preço médio de R$286.

Nobres Senadores, além do elevadíssimo custo das passagens aéreas nacionais, mais especificamente em nosso estado, o Tocantins, o passageiro paga, também, a tarifa de embarque. Essa tarifa sofre apropriação indébita, porque trata-se de um dinheiro recebido de imediato pelas companhias aéreas e repassado ao Governo no transcurso de oito longos anos, 96 meses.

O Governador de nosso estado precisa realizar obras de infra-estrutura, de saneamento, de energia...

O SR. PRESIDENTE (Casildo Maldaner) - Senador João Rocha, V. Exª dispõe de dois minutos para encerrar o seu pronunciamento.

O SR. JOÃO ROCHA - Pediria um pouquinho de paciência a V.Exª, porque já estou concluindo.

Citamos o exemplo do Tocantins: para viabilizar essas obras de infra-estrutura o Governo está colocando recursos à disposição do estado por intermédio da Caixa Econômica Federal. O governo estadual só tem direito ao limite, parece-me, de R$30 milhões para pagar em 36 meses, mais correção e juros de 2% ao mês. Estamos colocando as disparidades, Sr. Presidente, que existem no tratamento das regiões e nos tipos de atividades empresariais neste País.

Efetivamente, Sr. Presidente, são distorções como essas que minam nosso processo de estabilização da economia. A sabedoria do homem do campo ilustra bem essa questão: "Se pela porta da frente abastecermos de roldão um paiol com mantimentos, que pelas portas dos fundos são retirados aos poucos, não haverá colheitas e trabalho bastantes para mantê-lo abastecido."

Por hora, dou-me por satisfeito por trazer esse assunto à reflexão e prometo voltar com novos fatos concretos. Temos que mostrar ao País que precisamos acabar com a disparidade e com o tratamento diferenciado que, normalmente, prejudica apenas a região mais carente, a região Norte do País.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/02/1996 - Página 2066