Discurso no Senado Federal

APELO AO GOVERNO NO SENTIDO DA ADOÇÃO DE MEDIDAS URGENTES EM PROL DOS MUNICIPIOS BRASILEIROS, TENDO EM VISTA SUA CAOTICA SITUAÇÃO FINANCEIRA. DESPREPARO DE ADMINISTRADORES NA CONDUÇÃO DOS NEGOCIOS MUNICIPAIS.

Autor
Carlos Bezerra (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MT)
Nome completo: Carlos Gomes Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.:
  • APELO AO GOVERNO NO SENTIDO DA ADOÇÃO DE MEDIDAS URGENTES EM PROL DOS MUNICIPIOS BRASILEIROS, TENDO EM VISTA SUA CAOTICA SITUAÇÃO FINANCEIRA. DESPREPARO DE ADMINISTRADORES NA CONDUÇÃO DOS NEGOCIOS MUNICIPAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 15/02/1996 - Página 1993
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.
Indexação
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO FINANCEIRA, MUNICIPIOS, INSUFICIENCIA, ARRECADAÇÃO, TRIBUTOS.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), RELAÇÃO, INADIMPLENCIA, MUNICIPIOS.
  • IDENTIFICAÇÃO, PLANO, REAL, SITUAÇÃO FINANCEIRA, MUNICIPIOS.
  • SOLICITAÇÃO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, AUXILIO, BENEFICIO, MUNICIPIOS.

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os municípios, juntamente com os Estados, formam a base constitucional da nossa República. Assim, para que a nossa República seja realmente sólida, é indispensável que a sua base também seja sólida, que os municípios sejam prósperos e bem organizados.

Se formos analisar, sob o prisma financeiro, a situação dessa base da nossa República, iremos verificar estar ela carcomida e corroída. A situação financeira da maioria dos nossos municípios é caótica, constituindo-se o calote em instrumento usual no trato das contas públicas.

De acordo com dados da Secretaria da Receita Federal, em 1994, seiscentos e trinta e oito municípios brasileiros arrecadavam menos de quinhentos reais por mês, 49,5% dos municípios mineiros, ou seja, cerca de quatrocentos municípios, sobreviviam unicamente com os recursos que lhes eram repassados pelo Fundo de Participação dos Municípios. Com pequenas variações, essa porcentagem se repete em vários outros Estados da Federação. E, na medida em que novos municípios são criados, o volume de recursos destinados a cada um mais diminui, pois o bolo a ser divido permanece o mesmo, aumentando apenas aqueles que dele se servem.

Um outro dado que assusta é aquele que diz respeito à inadimplência: matéria publicada em O Globo, em 05 de novembro do ano passado, informava que 59% dos municípios brasileiros interessados em empréstimos da Caixa Econômica Federal não podiam recebê-los, por estarem inadimplentes com instituições financeiras ou por não terem prestado contas de convênios assinados com o Governo Federal. Em razão disso, a CEF, que dispunha de um bilhão de reais para obras de saneamento, não os podia repassar às prefeituras, por falta de municípios qualificados a receber esses empréstimos.

Se, após a promulgação da Constituição de 1988, os municípios brasileiros tiveram ganhos substanciais de arrecadação, após a implantação do Plano Real, essa arrecadação foi reduzida. Essa realidade é reconhecida pelo próprio Ministro da Fazenda, no voto de Nº 162/95, que ensejou a criação do Programa de Apoio à Reestruturação e ao Ajuste Fiscal de Estados:

      "

      Com a significativa redução da inflação decorrente da implantação do Plano Real, reduziram-se também drasticamente as receitas nominais decorrentes de aplicações financeiras, as quais vinham sendo utilizadas por muito estados para custear despesas correntes, inclusive despesas de pessoal. Simultaneamente, com o fim da corrosão inflacionária que erodia despesas fixadas em termos nominais, os vencimentos e salários do funcionalismo público, como os dos demais trabalhadores brasileiros, passaram a manter seu valor real, elevando desta forma o peso das folhas salariais."

Mais adiante, afirma o Ministro:

      "Nos primeiros nove meses de 1995, o resultado fiscal dos Estados e Municípios revelou 'déficit primário de 0,3% do PIB - fato inusitado nos últimos cinco anos - e déficit operacional equivalente a 2,7% do PIB".

Nessas circunstâncias, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, creio ser chegada a hora de se tomarem medidas no sentido de resolver o problema financeiro dos municípios. Não podem eles continuar na penúria em que se encontram, sem dinheiro para investir em infra-estrutura e sem condições de obter financiamentos, penalizando assim justamente o cidadão comum, aquele que mora nas periferias e mais necessita da ação pública no saneamento básico e que nada tem a ver com o problema de caixa da sua prefeitura.

Se o Governo Federal se dispõe a socorrer, com bilhões de reais, banqueiros falidos e espertalhões; se a União se propõe ajudar Estados também em situação financeira difícil, com linhas especiais de crédito, por que não aplicar as mesmas premissas de socorro também aos municípios? Quando o Governo dá socorro a banqueiros maus administradores está ele premiando a má conduta e a desonestidade na administração de um serviço de interesse público. Ao socorrer, porém, um município sem recursos, está ele investindo na melhoria do padrão de vida de toda uma população, pois esses recursos se destinarão à implantação de redes de esgoto, ao fornecimento de energia elétrica e água encanada e à educação fundamental.

Por isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, reputo da maior importância e conveniência que a União dispense aos municípios brasileiros o mesmo tratamento dado aos Estados; afinal, como bem reconheceu o Ministro da Fazenda, o mesmo problema que afeta os Estados também prejudica as contas municipais. Também os municípios precisam recuperar suas finanças, enxugar seus quadros de pessoal e tornar sua administração mais eficiente.

Por mais candente e convincente que fosse a minha voz nesta tribuna, não seria ela suficiente para convencer o Executivo da necessidade de adoção dessas medidas de socorro. Por isso é que proponho uma união nacional de vereadores e prefeitos em torno da defesa dessas medidas. O precedente dos governadores endividados que conseguiram arrancar recursos do governo para reestruturar as finanças de seus Estados é um bom exemplo do que a união de forças pode fazer para alcançar objetivos, ainda que difíceis. Se os administradores de dois ou três municípios pleitearem isolados esses recursos é quase certo que não os conseguirão, mas se um terço ou metade dos prefeitos e vereadores de um Estado se unirem, a sua força coercitiva será muito maior e alguma resposta positiva por certo obterão.

A Resolução do Senado que tornou possível o programa de socorro aos Estados permite que tratamento idêntico seja dado aos municípios; basta que o Conselho Monetário Nacional tenha com eles a mesma boa vontade que teve com os Estados e lhes dê tratamento idêntico.

Um dos problemas mais sérios a rondar as administrações municipais por esse nosso imenso Brasil é, sem dúvida, a falta de preparo de prefeitos e vereadores na lida com as coisas da administração pública. Para muitos deles, saneamento básico, orçamento, verbas públicas, prestação de contas são grandes interrogações que continuarão incógnitas durante toda a sua gestão. Surge daí uma indagação: sabedor dessas limitações e dificuldades, não seria mais conveniente que o Governo Federal adotasse como programa de governo a promoção de cursos práticos de administração municipal para ajudar esses prefeitos? Se formos esperar que esses administradores aprendam por si, o seu mandato finda antes que isso aconteça, e muitos municípios continuarão encalacrados em problemas. O Governo Federal, entretanto, tem como agir nesse campo, através, quem sabe, da Secretaria de Planejamento. Como repassador usual de dinheiro para os municípios, torna-se ele co-responsável pelo sucesso ou fracasso dessas administrações.

Por outro lado, uma iniciativa desse gênero insere-se perfeitamente naquele zelo pelo bem público que deve caracterizar qualquer administrador responsável e bem intencionado, e irá contribuir de maneira efetiva para que os recursos distribuídos a municípios não sejam dilapidados nem gastos de forma irregular, por desconhecimento do que deve ser feito.

Se assim agir, o Governo Federal estará cuidando para que aquela base sobre a qual cresce e se desenvolve a nacionalidade seja sólida, para que os nossos municípios sejam mais bem administrados e, principalmente, para que aqueles problemas que afetam as populações mais carentes e necessitadas sejam resolvidos.

Só fiscalizar a aplicação dos recursos não basta; deixar que os administradores municipais respondam aos tribunais de contas não é suficiente. É mais prático transmitir-lhes os rudimentos básicos da administração pública. É mais eficiente indicar-lhes o caminho a trilhar na condução dos negócios municipais.

Por isso, ao tempo em que apelo ao Governo Federal, para que socorra os municípios combalidos financeiramente, proponho-lhe prestar ajuda aos administradores das prefeituras para que saibam, ao menos, o mínimo a ser feito na condução dos negócios municipais, para que não haja desperdício nem desvio de recursos e para que cumpram aquelas obrigações que são próprias de cada prefeitura.

Tenho certeza de que, se isso for feito, de forma silenciosa e eficiente, iniciar-se-á no Brasil a verdadeira revolução que mudará a feição da administração pública em nosso País e que trará para os municípios épocas de mais progresso e menos corrupção.

Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/02/1996 - Página 1993