Pronunciamento de Eduardo Suplicy em 26/02/1996
Discurso no Senado Federal
PREOCUPAÇÕES COM A CONDUÇÃO DA POLITICA ECONOMICA E COM A DEFINIÇÃO DAS TAXAS DE JUROS E SUAS REPERCUSSÕES NA ECONOMIA.
- Autor
- Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
- Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
- PREOCUPAÇÕES COM A CONDUÇÃO DA POLITICA ECONOMICA E COM A DEFINIÇÃO DAS TAXAS DE JUROS E SUAS REPERCUSSÕES NA ECONOMIA.
- Publicação
- Publicação no DSF de 27/02/1996 - Página 2373
- Assunto
- Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
- Indexação
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- APREENSÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, DESEQUILIBRIO, EXPANSÃO, TAXAS, JUROS, MANUTENÇÃO, VALOR, CAMBIO, EFEITO, DISPARIDADE, CRESCIMENTO, RECEITA, DESPESA, ESPECIFICAÇÃO, ENCARGO, DIVIDA INTERNA, DIVIDA EXTERNA.
- CRITICA, POLITICA FISCAL, OPÇÃO, GOVERNO, AUXILIO, BANCOS, CONTRADIÇÃO, DISCURSO, SOLIDARIEDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
O SR. EDUARDO SUPLICY (PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho externar a preocupação sobre a condução da política econômica e, sobretudo, a preocupação sobre a condução da definição das taxas de juros, sua repercussão sobre a economia e sobre a execução financeira. E o faço diante dos resultados do Tesouro Nacional, tanto relativos ao ano de 1995, quanto relativos ao primeiro ano de 1996.
1. A taxa de juros é, hoje, o principal sintoma dos desequilíbrios que a política de estabilização provoca na economia. A sustentação da sobrevalorização cambial, que continua sendo a principal âncora do Plano Real, depende da manutenção de elevadas taxas de juros visando a refrear o nível de consumo e, com isto, equilibrar a balança comercial; a atrair capital externo de curto prazo para financiar o déficit da conta de serviços e a suprir o mercado de dólares, o que impede a desvalorização do real ou mantém o seu grau de valorização acima do que ocorreria de outra forma.
2. Se essa taxa de juros consegue sustentar a sobrevalorização cambial, de um lado, por outro ela corrói o equilíbrio fiscal do Governo, alternativa plausível que permitiria uma trajetória de estabilização com responsabilidade social. A taxa acumulada de remuneração média dos títulos federais (LBC-LFT-LTN-BBC), de 30 de junho de 1994 a 31 de janeiro de 1996, alcançou aproximadamente 100%, enquanto a taxa de inflação gerou em torno de 48,28% (INPC) no mesmo período. Como resultado, a dívida mobiliária do Governo Federal (Tesouro + Bacen) junto ao mercado saltou de R$58,4 bilhões, em janeiro de 1995, para nada menos do que R$103,12 bilhões, em dezembro.
O dólar, que era vendido no mercado livre a Cr$2.750,00 (R$1) no dia 30 de junho de 1994, despencou para R$0,94, no dia 04 de julho, e valorizou-se apenas 4,11% até 1º de fevereiro, quando foi vendido a R$0,9786. Esse é o parâmetro fundamental que norteia as decisões do Governo em seu programa de estabilização. As políticas monetária e fiscal ajustaram-se a esses parâmetros, resultando no maior rombo dos anos 90. O Governo Federal fechou 1995 com um déficit de R$10,78 bilhões, sendo o principal responsável por esse resultado o gasto de R$14,9 bilhões com juros (da dívida interna e externa). Somando-se ao déficit dos Estados, o dos Municípios e das estatais, temos um déficit global do setor público da ordem de R$32,22 bilhões, correspondentes a 4,9% do PIB. Esse é o resultado operacional.
Sr. Presidente, isso nos preocupa e vamos fazer um levantamento para verificar em que medida está o Governo Federal atendendo à resolução do Senado Federal, segundo a qual só pode haver pagamento de serviços da dívida externa se houver superávit primário correspondente.
4. O impacto da política de estabilização é ainda agravado pelas medidas do Governo na área tributária. O Governo fez aprovar no ano passado leis que alteram o imposto de renda de pessoas físicas, reduzindo o grau de progressividade desse tributo, e de pessoas jurídicas, reduzindo suas alíquotas sem alterar substancialmente as isenções concedidas. Como resultado, tivemos queda de arrecadação em janeiro, principalmente no que se refere ao Imposto de Importação, devido à política de Comércio Externo, e ao imposto sobre a renda de pessoas jurídicas.
Técnicos e consultores da Receita Federal estão procedendo a estudos e avaliações, redimensionando a previsão de arrecadação para 1996. O Governo deverá acentuar a ênfase em sua política cambial a fim de conseguir a estabilização, podendo agravar desequilíbrios até aqui verificados.
O déficit recorde é agravado quando analisamos os principais gastos do Governo. Além das cifras significativas com pagamento de encargos da dívida, o Governo desembolsou ainda somas importantes para socorrer setores mais afetados pelas taxas de juros desproporcionalmente elevadas. O montante gasto com o Proer não atinge diretamente o Tesouro Nacional por se tratar de recursos do Banco Central; mas este certamente apresentará péssimo desempenho em seu balanço anual, o que atinge indiretamente o caixa federal porque o resultado semestral é repassado ao Tesouro. Devemos somar ainda a renegociação de dívidas do setor rural e dos Estados; na fila encontram-se os usineiros.
Além de tornar a arrecadação menos justa, com redução de progressividade para pessoas físicas e redução de alíquotas para pessoas jurídicas, o perfil dos gastos do Governo foi na direção de maior concentração da renda. Enquanto a sociedade como um todo paga os custos elevados da taxa de juros, o Governo vem socorrendo setores por ele privilegiados em detrimento dos gastos com uma política social voltada para a cidadania e contra a exclusão.
Se compararmos a execução financeira de janeiro de 1995 - receitas e despesas (pessoal, encargos e restos a pagar) - com a de janeiro de 1996, vamos observar alguns fatos importantes que gostaria de ressaltar - e vou juntar como anexo o Resultado Fiscal do Tesouro em janeiro de 1996 comparado ao de janeiro de 1995.
Em primeiro lugar, observamos pequeno crescimento das receitas, 3%, que foi suplantado pelo grande aumento, 56%, nas despesas. Os itens que mais cresceram foram encargos da dívida (271%) e restos a pagar (1.408%). Houve alguns itens que apresentaram crescimento negativo, como as liberações vinculadas em menos 6%.
Mas é interessante ressaltar que, em que pese às despesas terem crescido 56%, não foram os itens pessoal e encargos sociais os que mais contribuíram para isso, pois pessoal e encargos sociais cresceram 39%. É um crescimento considerável, mas o que mais cresceu foram os encargos da dívida, sendo que os relativos à dívida interna cresceram 221%, e os encargos sobre a dívida externa cresceram de R$1 mil para R$206 milhões em janeiro de 1996; os restos a pagar cresceram 1.408%, e as operações oficiais de crédito, 6.499%. Ou seja, a opção de política econômica do Governo está centrada numa política monetária em que a taxa de juros é estratosférica e constitui o ponto central.
Trata-se de política nociva que incentiva a entrada no País de uma avalanche de moedas estrangeiras que aumentam, por conseguinte, a oferta de reais no mercado, fazendo com que o Governo se veja obrigado a vender seus títulos para enxugar esse acúmulo de reais. Como resultado, temos o crescimento da dívida interna e o aumento tão significativo da taxa de juros - assistimos ao cachorro correndo atrás do rabo.
Seria importante uma reversão desse caminho. Seria importante que o Governo viesse a efetuar uma política orçamentária séria, implementando políticas de geração de emprego, de combate à evasão e à sonegação fiscal; que houvesse maior seriedade no trato da coisa pública. Penso que, então, o Governo teria instrumentos para reduzir mais efetivamente a taxa de juros no curto e no médio prazos.
Gostaria de ressaltar ainda, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que, infelizmente, as palavras que o Presidente Fernando Henrique Cardoso tem pronunciado no Exterior não traduzem, efetivamente, sua política interna. No México, o Presidente Fernando Henrique ressaltou a ética da solidariedade.
"Precisamos revitalizar os valores essenciais do humanismo, da razão sábia, da tolerância. Esses são, por excelência, os balizadores da legitimidade moderna. É necessário o engajamento real do Governo e da sociedade contra a corrente do individualismo exacerbado e niilista, que conspira contra a própria noção de identidade nacional."
Não foi à toa que Veríssimo, em sua coluna de sexta-feira do Jornal do Brasil, bem interpretou que o Presidente Fernando Henrique, diante de tais declarações no Colégio do México, filiar-se-ia à Oposição assim que retornasse a Brasília. Infelizmente a previsão de Veríssimo não se tornou realidade. O Presidente Fernando Henrique, no México, falou, sim, da ética da solidariedade; mas, chegando ao Brasil, continua com a prática - pelo que estamos percebendo - da ética da solidariedade àqueles que procederam de forma a canalizar recursos extraordinários para salvar instituições financeiras, como o Banco Econômico e o Banco Nacional.
Agora temos um conhecimento melhor dos procedimentos daqueles que administraram o Banco Econômico, o Banco Nacional e outras instituições, objetos de absorção por órgãos como a Excell e o Unibanco, que estão recebendo isenções fiscais e créditos subsidiados para realizar essa operação, na forma como espelha a Revista Veja na reportagem "O golpe do balanço fraudado".
O referido artigo denota que, ao longo dos últimos dez anos, houve uma forma de fraudar balanços ou demonstrações financeiras. O Banco Central, que, nesse período, teve nove Presidentes, não examinou adequadamente as instituições em causa, e os próprios auditores que analisaram as demonstrações financeiras do Banco Central afirmam que não sabiam dos fatos.
Sr. Presidente, o Ministro Pedro Malan e o Presidente do Banco Central, Gustavo Loyola, aqui reiteraram que o Proer não foi criado para ajudar bancos ou banqueiros, mas os correntistas. No entanto, a ética da solidariedade do Governo Fernando Henrique Cardoso tem sido aos que procederam indevidamente.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.