Discurso no Senado Federal

APRECIAÇÃO DE RELATORIO DO MINISTERIO DA SAUDE, INTITULADO: 'PRINCIPAIS REALIZAÇÕES DO MINISTERIO DA SAUDE, EM 1995.' ELOGIOS A ATUAÇÃO DO DR. ADIB JATENE NAQUELA PASTA. COLAPSO DO SISTEMA DE SAUDE PUBLICA DO PAIS.

Autor
Odacir Soares (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: Odacir Soares Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • APRECIAÇÃO DE RELATORIO DO MINISTERIO DA SAUDE, INTITULADO: 'PRINCIPAIS REALIZAÇÕES DO MINISTERIO DA SAUDE, EM 1995.' ELOGIOS A ATUAÇÃO DO DR. ADIB JATENE NAQUELA PASTA. COLAPSO DO SISTEMA DE SAUDE PUBLICA DO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 12/03/1996 - Página 3924
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • ANALISE, RELATORIO, AUTORIA, MINISTERIO DA SAUDE (MS).
  • ELOGIO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, ADIB JATENE, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), CORRELAÇÃO, DOTAÇÃO ORÇAMENTARIA, CRISE, SAUDE PUBLICA.

         O SR. ODACIR SOARES (PFL-RO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, encaminhado ao meu gabinete por incumbência do Exmº Sr. Ministro Adib Jatene, veio-me às mãos o relatório intitulado "Principais Realizações do Ministério da Saúde em 1995".

         O referido documento é acompanhado de três artigos da lavra de Adib Jatene sob os títulos de : "Contribuição não é imposto" (Folha de S. Paulo, 06/01/96); "Financiamento da Saúde" (O Estado de S. Paulo, 08/01/96) e "Chega de Culpar o Governo" (Jornal do Brasil, 08/01/96).

         Tanto o relatório, quanto os três artigos retratam com veemente dramaticidade o impasse que vem aviltando, ao extremo, a saúde pública do Brasil.

         Em razão disso, entendo ser imperativo o registro que hora farei das impressões e reflexões em mim suscitadas pelo exame de tais documentos.

         Minha atenção foi logo requisitada para o austero despojamento do formato gráfico do documento em epígrafe, posto em contraste com a exuberância de recursos gráficos exibidas pelas publicações congêneres de outros órgãos públicos. Efetivamente, neste particular, o relatório do Ministério da Saúde em sua apresentação, iguala-se a qualquer despretensiosa apostila, editada nos meios escolares.

         A despeito disso e - quem sabe? - por causa disso, o documento logra produzir impacto favorável e positivo, já que desperta a atenção de quantos o manuseiam para o estado de penúria em que se encontra o órgão coordenador da saúde pública no Brasil.

         Já por aí, começa-se a vislumbrar o drama de Adib Jatene em seu primeiro ano de gestão ministerial.

         Isso dito, Sr. Presidente, passo aos comentários sobre o relatório em si, assim como sobre os artigos do Dr. Jatene que, sob vários aspectos, o complementam e o enriquecem.

         Com efeito, enquanto o relatório cinge-se à linguagem fria e impessoal, aplicada a enumerar fatos e a realçá-los com a álgida objetividade dos dados estatísticos, os artigos de Jatene, pelo contrário, projetam com intensidade as reações e as emoções do homem público e do profissional competente ante a indiferença daqueles que relutam em identificar, na saúde dos brasileiros, uma prioridade inadiável.

         Algumas informações veiculadas pelo relatório merecem ser sublinhadas porque muito contribuem para a compreensão dos problemas que comprometem nosso sistema de saúde.

         O setor privado desse sistema é responsável pelo atendimento de apenas 20% da população brasileira, recaindo sobre o setor público, a cobertura do atendimento de cerca de 80% da população, vale dizer, do segmento majoritário dos que não dispõem dos recursos necessários para fazer face às despesas com a própria saúde.

         Essa é a primeira das informações que precisam ser devidamente ponderadas, para que se possa aferir, por exemplo, o valor irrisório das verbas que o orçamento da União destina à saúde do povo brasileiro.

         Não menos significativa é a informação de que toda a dinâmica do Ministério da Saúde, em 1995 "concentrou-se no esforço pela consolidação do Sistema Único da Saúde (SUS) e, sobretudo, pela recuperação da credibilidade do setor.

         Para bons entendedores, isso significa que no ano de 1995, em que pese o discurso governamental repassado de preocupações sociais, a saúde pública do Brasil continuou na UTI. O máximo que por ela pôde fazer o renomado cardiologista convocado pelo governo para reanimá-la, foi tentar estancar a fraudulenta e já crônica sangria dos recursos que lhe são destinados.

         Daí, o conjunto de medidas voltadas para a melhoria da gestão do sistema em suas esferas federal, estadual e municipal. Daí, a luta sem trégua contra as fraudes e irregularidades.

         Daí, o penoso esforço pela adequação do financiamento do sistema, buscando nele imprimir a racionalidade indispensável para que as ações pudessem cumprir-se com o mínimo de desperdício e o máximo de controle.

         Os cidadãos que lêem os jornais e os que acompanham, por outras fontes, o desempenho do probo e competente Ministro da Saúde sabem que, neste campo da assepsia e reanimação orgânica do setor saúde, ele operou verdadeiros milagres. Sabem, também que, malgrado a escassez de recursos, que continua flagelando o setor, ele manteve vivo o sistema, chegando mesmo a desenvolver algumas ações conjuntas de inegável importância, tais como:

         - programas destinados a ampliar o Contingente de Agentes Comunitários de Saúde, que somavam 29.098 em 1994 e chegaram a 40.000, em janeiro de 1996;

         - programa de suplementação alimentar;

         - programa de saneamento básico (abastecimento d'água, esgotamento sanitário, coleta e tratamento de lixo, sobretudo em 598 municípios, sobretudo do Norte ao Nordeste;

         - programa nacional de imunização (pólio, difteria etc..), com cobertura superior a 95%;

         - fortalecimento do Conselho Nacional de Saúde e estímulo ao fortalecimento dos Conselhos Estaduais e Municipais de Saúde e outras mais.

         Todos sabemos, porém, que isso é muito pouco.

         Todos verificamos, com incontida inquietude, que os parcos recursos da saúde, são destinados, em sua quase totalidade, a custear a prestação de serviços emergenciais, pouco sobrando para o desenvolvimento de ações consagradas à medicina preventiva, sobretudo ao saneamento básico, à educação sanitária, à imunização, ao combate à desnutrição e à melhoria das condições de higiene em que vive nossa população carente.

         Ninguém ignora - embora haja quem finja ignorar - que a insuficiência de recursos constitui a causa fundamental da crise que afeta nosso combalido sistema de saúde.

         Entre os que fingem ignorar, há os que ousam até afirmar que recursos não faltam. Falta organização. Falta, sobretudo, controle que impeça o escoamento dos recursos pelo ralo das fraudes e irregularidades.

         O Dr. Adib Jatene em seus três artigos responde com veemência que não, e após revelar o montante dos gastos nacionais com saúde - R$ 25 bilhões assim distribuídos: R$ 15,8 bilhões pelo Ministério da Saúde; R$ 2 bilhões pelos Estados e Municípios; R$ 10 bilhões pelo setor privado e de convênios ( o que em seu todo, representa não mais que R$ 150 por habitante/ano), ele liqüida o assunto apontando o ridículo desse dispêndio, comparando-o com o de outros países.

         Cito aqui o artigo do Dr. Jatene, publicado em O Estado de S. Paulo de 08/01/96 - sobre "Financiamento da Saúde":

         "A França, que tem um terço da nossa população, gasta ao redor de US$ 100 bilhões (1.800/hab./ano).

         O Canadá, com cerca de um sexto da nossa população, gasta perto de US$ 55 bilhões (1.900/hab./ano).

         Austrália, com perto de 20 milhões de habitantes, gasta US$ 26 bilhões, o dobro do nosso gasto na área federal. Isso para não citar os Estados Unidos, que, com 260 milhões de habitantes, gastam mais de US$ 800 bilhões ao ano...

         Portanto, considero a afirmativa de que recursos não faltam ao setor, o que falta é administração e controle, uma leviandade por quem não se deteve na análise mais elementar da situação e repete frases feitas sem nenhum fundamento."

         E conclui, S. Exª:

         Para oferecer atendimento universal, igualitário e com eqüidade, falta, como se depreende das comparações que fizemos, soma considerável de recursos".

         Sr. Presidente, Srs. Senadores, o relatório do Ministro Jatene, assim como os artigos de S. Exª aqui comentados, põem a descoberto um dos aspectos mais contraditórios de nossa realidade político-social contemporânea.

         Um dos mais destacados expoentes das ciências médicas deste país é convocado pelo Governo para salvar do colapso o nosso combalido e enfermiço sistema de saúde.

         Após debruçar-se sobre o enfermo e identificar na insuficiência de recursos a causa principal da crise que o corroe, sai a campo o Ministro, a lutar por mais recursos sem os quais não será possível soerguer o SUS.

         Veio a batalha do CPMF, na qual os adversários mais ardilosos foram os sonegadores de sempre, que, invocando argumentos os mais sibilinos, tudo fizeram para boicotar a proposição que restabelecia aquele imposto, pois este era impossível ser sonegado.

         O Ministro ganhou a batalha, mas até agora, por razões que escapam a seu entendimento e ao da maioria dos brasileiros, ele não pôde colher os frutos de sua vitória.

         O episódio encerra um lado melancólico e outro reconfortante. Na verdade é deprimente ver um ministro do porte de Adib Jatene, de pires na mão, mendigando recursos para poder salvar a saúde dos brasileiros, sobretudo dos mais pobres e desassistidos.

         Por outro lado, é sumamente edificante, vê-lo persistir nessa luta, nela envolvendo o seu prestígio e sacrifício de seus interesses pessoais, em favor dos mais fracos, e em benefício dos quais ele não hesitou em brandir esta percuciente apóstrofe:

         " Os recursos não têm como ser obtidos dos pobres. Só podem sair daqueles que tiveram a ventura de conseguir acumular patrimônio e recursos que devem servir para reduzir a desigualdades e não para aprofundar as diferenças.

         A História já nos ensinou que a desigualdade social é a grande geradora de conflitos entre parcelas favorecidas e desfavorecidas da população. Todo esforço deve ser feito para reduzir as desigualdades. A convivência da opulência com a miséria só pode resultar em tragédia." (Financiamento da Saúde - Adib Jatene, O Estado de S. Paulo, 08/01/96)

         Concluindo, Sr. Presidente, ouso dizer que a sociedade em todas as suas esferas, segmentos e poderes, precisa, com urgência, dar ouvidos aos clamores desse denodado batalhador da causa da saúde.

         É o que penso. Obrigado


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/03/1996 - Página 3924