Discurso no Senado Federal

DEFESA DA APROVAÇÃO DA PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO 26/95, DE INICIATIVA DE S.EXA., QUE PRORROGA A VIGENCIA DA LEI ORÇAMENTARIA PARA O EXERCICIO FINANCEIRO SEGUINTE.

Autor
Humberto Lucena (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Humberto Coutinho de Lucena
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ORÇAMENTO.:
  • DEFESA DA APROVAÇÃO DA PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO 26/95, DE INICIATIVA DE S.EXA., QUE PRORROGA A VIGENCIA DA LEI ORÇAMENTARIA PARA O EXERCICIO FINANCEIRO SEGUINTE.
Publicação
Publicação no DSF de 11/10/1995 - Página 782
Assunto
Outros > ORÇAMENTO.
Indexação
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, PRORROGAÇÃO, VIGENCIA, LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTARIAS (LDO), EXERCICIO FINANCEIRO SEGUINTE.

O SR. HUMBERTO LUCENA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o orçamento público identifica-se de tal maneira com as democracias modernas que sua história confunde-se com a origem do Estado de Direito. A observação, feita por Nitti, é anotada por Jurandir Coelho em seu livro Teoria e Processo do Orçamento, em que cita ainda o célebre Gladstone: "O orçamento tem sua raízes mergulhadas na própria vida dos povos".

Gladstone, vale lembrar, definiu o orçamento como um "ato político por excelência". Disse-o a com autoridade de quem foi chefe do Partido Liberal Britânico, Ministro das Finanças e quatro vezes Primeiro-Ministro, tendo utilizado, nessa condição, a lei orçamentária para promover numerosas reformas de caráter político e social. "Não há fenômeno que não ocorra na vida da comunidade que não repercuta nos seus dois campos conformados, de receitas e despesas", asseverava.

Nas sociedades modernas, como se pode constatar, firmou-se o princípio inglês de que o povo, que suporta as despesas, tem o direito de limitá-las e de autorizar a decretação e a cobrança das rendas públicas. Mais do que isso, o orçamento assumiu um papel preponderante na vida do Estado e das comunidades: deixou de ser simples previsão de receitas e prestação de contas para caracterizar-se como essência do planejamento, que define a ação dos governantes, impõe limites, estabelece prioridades e procura de obter o máximo de resultados com o mínimo de gastos.

No Brasil, a lei orçamentária, sistematizada e organicamente consistente, só apareceria em 1830, com a eficácia para o biênio seguinte, embora já estivesse prevista na Constituição desde 1824. Ao longo de nossa história, a peça orçamentária tem sido interpretada freqüentemente de forma equivocada; pior ainda, tem sido, em determinadas ocasiões, conscientemente deturpada, com o objetivo de atender a interesses menores, em detrimento do interesse coletivo.

Governos, políticos e, enfim, toda a sociedade conscientizaram-se de que um novo salto evolutivo se impõe para que o orçamento público não apenas seja aperfeiçoado e melhor controlado, mas torne-se um instrumento eficaz de alavancagem do desenvolvimento e da promoção de justiça social.

Essa constatação explica, por exemplo, o envio ao Congresso Nacional, pelo Executivo, de projeto anual que reforma a Lei de Diretrizes Orçamentárias. Explica, também, a Proposta de Emenda à Constituição, de nº 26, de 1995, que submeti à apreciação desta Casa, que prorroga a vigência da Lei Orçamentária para o exercício financeiro seguinte, quando não for ela aprovada até o término da sessão legislativa.

Sabemos todos que a disposição sobre o orçamento é uma das mais importantes prerrogativas do Congresso. Entretanto, por motivos diversos, às vezes somos incapazes de votá-lo em tempo hábil, o que dá margem a situações no mínimo esdrúxulas. Um claro exemplo dessas situações é o orçamento do corrente ano, que somente foi encaminhado pelo Executivo no apagar das luzes da última sessão legislativa - mais precisamente no dia 29 de dezembro do ano passado.

O orçamento de 1995 foi, portanto, encaminhado com atraso ao Congresso - mas ainda no exercício precedente. Dispondo o Governo de 15 dias úteis para sancioná-lo, e não o desejando fazer às carreiras, o que seria leviano, ocorreu um indesejável hiato na utilização dos recursos, porquanto, atendido o princípio da anualidade, ficava impedida a liberação dos duodécimos.

Com o orçamento de 1994 foi pior, pois sua votação só aconteceu em novembro. Os recursos orçamentários foram utilizados em parcelas de duodécimos, o que caracteriza uma situação completamente irreal, e o País foi administrado à base de improvisos e subterfúgios.

Esses exemplos, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não incriminam o Legislativo. Lembraria que no ano passado vivemos a expectativa e os desdobramentos da implantação de um plano econômico, da realização de eleições gerais, e, em conseqüência, da iminente mudança de governo.

Poderia citar, entre as causas desses atropelos, o fato de ter o Executivo enviado três versões da peça orçamentária, em ocasiões distintas no mesmo exercício - o que naturalmente implicava reiniciar todo o processo de apreciação e votação.

Convocado por esta Casa, o Ministro do Planejamento, José Serra, compareceu a este Plenário, quando condenou enfaticamente a liberação de duodécimos da receita orçamentária - expediente utilizado quando a proposta não é votada em tempo hábil. Seria absurdo pretender que a vida do País se repetisse, mês a mês, como ocorrera no exercício anterior, argumentou. 

O Ministro tem razão, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. Entretanto, aponta uma alternativa perigosa, que consistiria em aprovação por decurso de prazo - um expediente que nega a instância legislativa e nos remete à época dos governos autoritários.

A solução que proponho, de prorrogar a vigência do orçamento de um exercício para outro, com a devida atualização dos valores, não é certamente a ideal. Ideal é que o Orçamento seja votado em tempo hábil, após a manifestação de amplos segmentos da sociedade, e que reflita a participação de todos os brasileiros que sonham com um futuro melhor, com a redução das desigualdades e com o aperfeiçoamento das instituições democráticas.

A Proposta de Emenda à Constituição que apresentei à Casa, no sentido de prorrogar para o exercício seguinte o Orçamento do exercício anterior se a sua proposta não tiver sido votada até o último dia do exercício, é a restauração da norma que vigorou na Constituição de 1946. Ela está sendo relatada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania pelo eminente Senador Bernardo Cabral. Não é a solução ideal, mas é alternativa melhor à utilização dos duodécimos; é alternativa, também, ao expediente tirânico do decurso de prazo. Esse recurso, deve-se ter em mente, poderia ser obtido com manobras de obstrução, ou pela apresentação de inúmeras versões da peça orçamentária, impossibilitando ao Congresso Nacional o cumprimento de tão importante prerrogativa.

Ao pedir a atenção, o empenho e a manifestação favorável da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e do próprio Plenário para tão importante Proposta, devo manifestar minha crença na adoção de novos critérios para dispor sobre a peça orçamentária, para que, efetivamente, se transforme ela num instrumento de promoção da cidadania, eliminando desperdícios, gerando riquezas e reduzindo as desigualdades.

No momento, Sr. Presidente, Srs. Senadores, em que voltar a vigorar na Constituição Federal a norma de 1946 a que já me referi, certamente não só o Executivo terá todo o empenho em que a sua Proposta para o exercício seguinte seja votada no Congresso, como as Lideranças, de um modo geral, e os Srs. Congressistas, nas duas Casas, farão por onde agilizar o andamento da proposta orçamentária, a fim de que não se repitam no ano seguinte as dotações do ano anterior, com graves prejuízos para o andamento da administração, sobretudo, tendo-se em vista que o Governo, mais do que hoje, ainda, passará, cada vez mais, a utilizar-se dos créditos suplementares.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/10/1995 - Página 782