Discurso no Senado Federal

OTIMISMO EM RELAÇÃO AO PLANO REAL.

Autor
João França (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RR)
Nome completo: João França Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • OTIMISMO EM RELAÇÃO AO PLANO REAL.
Publicação
Publicação no DSF de 13/03/1996 - Página 3985
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, ECONOMIA, PAIS, DEFESA, REDUÇÃO, JUROS.

              O SR. JOÃO FRANÇA (PMDB-RR) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o controle da inflação, o crescimento da economia, o superávit no Balanço de Pagamentos e o alto nível de reservas internacionais, verificados ao final de 1995, ensejam uma postura otimista em relação ao Plano Real, conduzido pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso. No entanto, existe hoje um verdadeiro consenso na opinião pública nacional, que o Governo insiste em ignorar, condenando as elevadíssimas taxas de juros impostas pelas autoridades econômicas.

              Efetivamente, Sr. Presidente, as taxas de juros, no patamar em que estão, preocupam desde o grande empresário até o assalariado, o aposentado e o pensionista. E, ao contrário do que podem pensar alguns dos nossos dirigentes, tal preocupação, da parte do cidadão comum, não é motivada por ímpetos consumistas, que se consubstanciem na aspiração por crédito facilitado, por pagamento a longo prazo, por gasto acima das possibilidades.

              Não! O cidadão brasileiro, já calejado por sucessivas crises econômicas e pelo baixo poder aquisitivo do salário, não conhecendo, embora, as complexas leis que regem o mercado financeiro, tem consciência de que os juros altos, mais do que encarecerem a compra a prazo, ameaçam a estabilidade econômica, a atividade produtiva e o emprego.

              Eis aí um caso típico em que se deve aplicar o adágio Vox Populi Vox Dei. Resta dizer, caso as autoridades econômicas ainda resistam, que o clamor popular encontra eco nos meios empresarial e acadêmico, os quais vêm advertindo para os excessivos e sufocantes gastos representados pelo pagamento dos juros reais da dívida pública.

              Os números, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, são expressivos. Basta dizer que, no período de um ano, compreendido entre novembro de 1994 e outubro de 1995, o Governo Federal, os Governos estaduais e as estatais gastaram 34 bilhões de reais para rolar a dívida em títulos do mercado. Trata-se de um gasto três vezes maior do que o registrado pelo Banco Central em 1994, levando à conclusão de que a política dos juros altos, conforme assinalou o consultor e economista Flávio Nolasco, ouvido pelo jornal O Globo, não prejudica apenas empresários e comerciantes, mas as próprias contas do Governo.

              "É um ciclo vicioso. O juro alto contém a demanda e segura a inflação, mas aumenta a dívida mobiliária", afirma Nolasco. O economista Luís Fernando Lopes, igualmente ouvido pelo periódico, é peremptório: "Esse cenário é insustentável a médio prazo".

              Evidentemente, não se podem ignorar os êxitos obtidos pela equipe econômica do Governo Fernando Henrique na implantação do Plano Real. Em variados aspectos o plano de estabilização superou as expectativas. A inflação, em 1995, ficou na marca de 22%, e ainda assim o País registrou um crescimento de 4,5%. O Balanço de Pagamentos fechou com superávit de 13 bilhões de dólares, e as reservas internacionais alcançaram a expressiva marca de 51 bilhões e 800 milhões de dólares.

              Esses números, porém, devem ser examinados com cautela. Há que se destacar, inicialmente, a forma como obtivemos o superávit no Balanço de Pagamentos. A abertura comercial e a redução de alíquotas, que tanto favoreceram as importações, refletiram-se diretamente no resultado da balança comercial.

              Com superávit de 10 bilhões de dólares, em 1994, a balança apresentou, ao final do ano passado, déficit de três bilhões de dólares. Contribuiu para tanto, além do festival de importações, o pequeno volume de vendas ao mercado externo, como conseqüência do câmbio valorizado. Assim, coube ao Brasil, em 1995, registrar a maior queda, em volume de exportações, dentre todos os países da América Latina.

              A conta de transações correntes apresentou um déficit espantoso, em torno de 18 bilhões de dólares, financiado, com sobras, com o superávit de 31 bilhões de dólares na conta de capitais. A diferença elevou ainda mais o nível de nossas reservas internacionais, que atingiram, como salientei anteriormente, quase 52 bilhões de dólares.

              O ingresso de capitais externos, em larga escala, deve-se, naturalmente, às elevadíssimas taxas de juros reais que vêm sendo praticadas em nosso País. O patamar de nossas reservas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, poderia ser festejado, se não implicasse um alto risco para nossa economia. Afinal, o Brasil vem pagando juros reais acima de 20% ao ano, enquanto aplica tais reservas, no mercado externo, a uma taxa de 3% pelo mesmo período.

              A esse propósito, cabe citar editorial do jornal Folha de S. Paulo, de 12 de janeiro do corrente, intitulado Juros Incompreensíveis. Diz a matéria:

    "(...) A entrada líquida de 1 bilhão e 300 milhões de dólares apenas nos sete primeiros dias úteis deste ano demonstra que a remuneração do capital financeiro no Brasil está muito mais alta do que seria necessário para equilibrar o balanço de pagamentos.

              Em face do volume atual de reservas do País -- continua --, fica claro que a diferença entre os juros internos e os oferecidos no mercado internacional é muito superior à que o mercado exigiria para compensar o risco de investir no Brasil".

              A observação do editorialista, Sr. Presidente, Seªs e Srs. Senadores, confirmou-se plenamente semanas depois, bastando dizer que a entrada do capital estrangeiro, no mês de janeiro, somou 3 bilhões e 200 milhões de dólares. Deve-se esclarecer, a bem da verdade, que o Governo brasileiro, embora tardiamente, reconheceu o perigo. Assim, anunciou uma série de medidas, logo a seguir, com o objetivo de desestimular o ingresso excessivo dos investimentos estrangeiros, especialmente do capital especulativo. São medidas moderadas, que, no entanto, demonstram a disposição das autoridades econômicas de corrigir as distorções apontadas. 

              Abordamos até aqui, ainda que rapidamente, as dificuldades com que se defronta o Governo brasileiro diante das taxas de juros elevadas. A questão, porém, interessa de perto, e diretamente, a todos os segmentos da sociedade brasileira. Compreende-se, dessa forma, o artigo do empresário Herbert Levy, da Gazeta Mercantil, publicado em 19 de dezembro do ano passado, em que transparecem os sentimentos de ira e de desabafo.

              O empresário inicia seu artigo com uma afirmação categórica:

              "De todos os erros contra a economia cometidos pelo Governo, nenhum se compara, em efeitos desastrosos, à taxa de juro. Ela continua nos dando uma notoriedade indesejável no plano internacional: o Brasil é recordista mundial nessa matéria. (...) Esse é um caminho tão inaceitável e desastroso que o próprio setor bancário não agüentou, e agora enfrentamos a mais grave crise bancária dos últimos tempos".

              Após citar a sensibilidade social do Presidente Fernando Henrique Cardoso e do Ministro José Serra, Levy procura uma resposta para suas colocações:

              "Será que ignoram os efeitos arrasadores desse recorde em todas as classes? Os recordes de insolvências e de desemprego, e ainda outros, o arrasamento de toda a economia rural, cujos desempregados atingem ou ultrapassam a cifra de um milhão, em um ano!".

              Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o povo brasileiro, após conviver por tanto tempo com o fantasma da inflação -- no momento sob controle, mas ainda não exorcizado em definitivo --, tem agora pesadelos diários com outro ente que teima em assombrar nosso cenário econômico: o desemprego. Recente pesquisa, encomendada pela revista ISTOÉ, revelou ser o desemprego, hoje, a preocupação número um da população brasileira.

              O Plano Real, inobstante seus êxitos, que fizemos questão de destacar, deve ser revisto em alguns aspectos, especialmente no que tange aos juros altos, que representam grave perigo para as pequenas e médias empresas e, conseqüentemente, para uma política de geração de empregos.

              Concebe-se que as autoridades econômicas queiram atrair o capital externo. Concebe-se, igualmente, que pretendam, com a prática dos juros elevados, inibir a demanda e, dessa forma, conter a inflação. Só não se concebe, e não se pode admitir, é que as empresas brasileiras sejam sufocadas pelos juros, que a insolvência se torne generalizada e que o mercado ponha na rua milhões de brasileiros que precisam e querem trabalhar e prover o sustento de suas famílias, motivo por que encareço às autoridades governamentais urgente revisão da sua política de juros.

              Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/03/1996 - Página 3985