Discurso no Senado Federal

A GRAVE QUESTÃO DO DESEMPREGO NO PAIS.

Autor
Humberto Lucena (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Humberto Coutinho de Lucena
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESEMPREGO.:
  • A GRAVE QUESTÃO DO DESEMPREGO NO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 14/03/1996 - Página 4040
Assunto
Outros > DESEMPREGO.
Indexação
  • GRAVIDADE, CRESCIMENTO, DESEMPREGO, DEFASAGEM, AUMENTO, ATIVIDADE ECONOMICA, CRITICA, GOVERNO, REDUÇÃO, PROBLEMA, EFEITO, TECNOLOGIA, RENOVAÇÃO, ECONOMIA.
  • COMENTARIO, ALTERAÇÃO, RELAÇÃO, TRABALHO, ACORDO COLETIVO DE TRABALHO, SINDICATO, METALURGICO, EMPRESARIO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), TRABALHO TEMPORARIO.
  • ATENÇÃO, TRIBUTAÇÃO, MICROEMPRESA, RELAÇÃO, CRESCIMENTO, ECONOMIA INFORMAL.
  • DADOS, DESEMPREGO, AGRICULTURA, EFEITO, REDUÇÃO, AREA, CULTIVO.
  • CRITICA, DIFERENÇA, INDICE, DESEMPREGO, DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATISTICA E ESTUDOS SOCIO ECONOMICOS (DIEESE), INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE).
  • SUGESTÃO, CRIAÇÃO, AGENCIA NACIONAL, EMPREGO, ALTERAÇÃO, SEGURO-DESEMPREGO, IMPLEMENTAÇÃO, CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO, MELHORIA, TREINAMENTO, ESPECIALIZAÇÃO, MÃO DE OBRA, UTILIZAÇÃO, SETOR PRIVADO.
  • NECESSIDADE, REFORMULAÇÃO, POLITICA EXTERNA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, REFORMA AGRARIA, OBJETIVO, CRESCIMENTO ECONOMICO.

O SR. HUMBERTO LUCENA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho hoje à tribuna para me pronunciar sobre a grave questão do desemprego em nosso País. Um tema que já foi alvo de outras intervenções aqui nesta Casa, inclusive do nobre Líder do PFL, Senador Hugo Napoleão, vazadas na mesma preocupação, e que já mereceu até uma consideração especial do próprio Presidente da República, quando em discurso, no dia 9 de fevereiro último, proclamou ser 1996, para o seu governo, "o ano do emprego".

Sem dúvida, já foram trazidas ao conhecimento deste Plenário muitas e pertinentes informações a respeito desse problema, e muitas sugestões para sua solução ou redução foram aqui apresentadas. Mas me permito hoje repisar este tema, trazendo novos dados, que confirmam toda a sua dramaticidade e reiteram a urgente necessidade de se encontrar uma política mais efetiva para a geração de empregos em nosso País.

Com efeito, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em recente pesquisa, realizada em conjunto pela revista IstoÉ e a empresa Toledo & Associados, tratada em matéria de capa no seu número 14 de fevereiro último, a qual teve duração de vários meses, abrangendo todas as regiões do País, 41% dos entrevistados elegeram o desemprego como prioridade absoluta, dentre um grande elenco de questões a serem enfrentadas pelo governo. Confirmando os resultados de pesquisa semelhante, elaborada pelo Instituto Gallup, que sobre o problema apresentou resultado praticamente idêntico.

Na verdade, a reação de nossa sociedade não poderia ser outra. Afinal, o Brasil convive hoje com um imenso exército de cerca de 3,4 milhões de desempregados, que se agiganta ainda mais se a eles somarmos 1,6 milhão de novos postulantes a vagas de mercado de trabalho, a cada ano. Com o que se pode ter uma clara idéia da enorme complexidade da questão. Não sendo sem razão que me tomo de grande surpresa e inquietação ao saber das argumentações de autoridades econômicas tendentes a minimizá-la.

Essas autoridades, provavelmente no afã de salvaguardar a imagem positiva do Plano Real, cujo mérito na radical debelação do processo inflacionário não se discute, têm, nesse sentido, apresentado o desemprego como sendo uma decorrência natural da reestruturação do mercado, diante das novas condições impostas pela intensificação da abertura de nossa economia nos últimos cinco anos. Procuram dar a entender que a acentuada queda do nível de emprego em nosso País se vincularia sobretudo a desocupações localizadas em determinados ramos da atividade econômica, mercê da evolução tecnológica, principalmente no setor industrial, e da busca de aumento de eficiência pelas empresas. Jogando-se a responsabilidade pelo grande desemprego que nos assola sobre o chamado "desemprego estrutural" ou "tecnológico". De modo que as dispensas forçadas de pessoal não teriam, em última instância, tanta importância assim, pois se trataria de movimentações de caráter apenas conjuntural, que, de qualquer maneira, viriam a se acomodar em prazo médio.

No entanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, está a me parecer que o problema não deve ser visto por esse ângulo apenas, uma vez que grande parte do nosso desemprego, na verdade, escapa desse enquadramento, não só porque exprime as dificuldades próprias do neocapitalismo, permeado de profundas contradições e desigualdades sociais, mas por ser também reflexo mais imediato da forma como se vem conduzindo o plano de estabilização.

Evidentemente, não me passa despercebido que o chamado "desemprego estrutural" afeta hoje em dia todas as economias do mundo, espelhando a grande contradição dialética entre o avanço técnico e tecnológico que caracteriza a III Revolução Industrial e a ocupação de mão-de-obra. Um dispensando a outra, de forma acentuada, com destaque para os países desenvolvidos, em que os progressos naquela área são evidentemente mais fortes. Tanto que as conclusões do Fórum de Davos, na Suíça, recentemente encerrado, nos dão conta da existência atual de 800 milhões de desempregados e subempregados em todo o mundo, o equivalente a mais de 13 vezes a nossa PEA (População Economicamente Ativa), calculada hoje em 60 milhões.

Na verdade, com poucas exceções, a grande maioria dos analistas dessa área considera que esse tipo de desemprego é uma conseqüência inevitável do chamado "crescimento sem emprego". O incremento positivo da capacidade produtiva não mais levaria, como antes, a um maior número de pontos de trabalho, detectando-se desse modo praticamente o "fim do emprego", pelo menos no conceito tradicional.

No Brasil, esse processo estaria mais que confirmado, a partir de vários levantamentos realizados pelos pesquisadores do assunto. Segundo o Professor Márcio Pochmann, do Centro de Estudos Sindicais e da Economia do Trabalho da Unicamp (Universidade de Campinas), São Paulo, no período entre 1993 e 1995, a atividade econômica cresceu ao redor de 15%, mas o número de empregos aumentou tão-somente 2%. E, se na década de 70, cada ponto percentual de aumento do Produto Interno Bruto nosso garantia, segundo o mesmo pesquisador, um crescimento de 0,40% no emprego, no intervalo entre 1993 e 1995 essa relação simplesmente já declinara para 0,13%.

No entanto, mesmo com o impacto desse processo sobre o nível de ocupação de mão-de-obra em nosso País, as estatísticas correspondentes ao nosso desemprego não seriam tão gritantes como as que hoje se registram. Como diz a matéria da revista IstoÉ, antes citada, o desemprego decorrente da nova situação que o plano de estabilização nos trouxe, particularmente como conseqüência de medidas altamente restritivas na área do crédito, como juros altíssimos, não encontra paralelo na história de nosso País. Sendo muito mais sério do que se pode imaginar ou anunciar, a par de que se generalizou por todos os setores da economia, com seus efeitos mais contundentes por se fazerem sentir ainda em toda a sua plenitude.*

Creio, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como ainda anteontem dizia aqui, ao falar sobre o Nordeste, que tudo isso decorre de certas distorções do plano econômico que está em vigor, o chamado Plano Real, na sua concepção mais de caráter neoliberal, num governo que é sobretudo de inspiração socialdemocrata. Então, algumas dessas distorções deveriam que ser rapidamente corrigidas, para que nós pudéssemos fazer com que o Plano Real realmente tivesse um caráter plenamente socialdemocrata.

Assim, uma em quatro famílias brasileiras, conforme a referida pesquisa, já possui pelo menos um desempregado dentro de casa. E a relação aumenta para 50% dos lares nas regiões menos favorecidas, como o Norte e o Nordeste, com a média nacional de desempregados se ampliando e passando a girar em torno de 1,4 pessoas por família. Praticamente o dobro do verificado no início da década, ou seja, algo como se um terço da força de trabalho familiar estivesse desativado, ao se considerar o padrão demográfico de 4,2 membros por família.

Trata-se, portanto, de um fenômeno que está a exigir uma ação de governo, como disse antes, muito mais eficaz do que as recentes medidas por ele tomadas, como, por exemplo, a liberação de financiamentos via BNDES, da ordem de R$3 bilhões a R$5 bilhões, com o objetivo de dirimi-lo. Sem dúvida, trata-se de reação positiva do governo, sem condições de imediata factibilidade, e previamente comprometida com a referida visão oficial de desemprego localizado. Mas, a medida veio quando o problema já ganhava contornos altamente preocupantes. Os recursos do programa, por sua vez, ainda inexistem, pois deverão provir das privatizações da Vale do Rio Doce e da Light, que até agora não foram realizadas* - saliente-se o debate que se trava no Congresso contra a privatização da Vale do Rio Doce. *E, por fim, são recursos que se destinam a setores da indústria, em que as dispensas independem de estímulos para reduzi-las, acontecendo dentro do processo de busca do aumento de produtividade, com as vagas não sendo reabertas por meio do aumento dos negócios.

Enquanto isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o nosso mercado de trabalho, como não poderia deixar de ser, começa a ser fortemente modificado, num processo objetivo de mudanças, que, como costuma acontecer nesses casos, vem acompanhado de graves inconvenientes de caráter jurídico-constitucional. Como foi o caso do recente acordo celebrado pelo Sindicato dos Metalúrgicos da Cidade de São Paulo e empresários do setor, com vistas à contratação temporária de trabalhadores, sem carteira assinada e dispensando vários outros dispositivos legais de proteção a que estes têm direito, corretamente embargado pelo setor judiciário, pretendendo-se, agora, um projeto de lei regulando o trabalho temporário.*

Nesse particular, sabemos pela imprensa, que publica diariamente a tramitação do assunto na área do Governo, que o Sr. Ministro do Trabalho está terminando um anteprojeto de lei, a ser encaminhado ao Senhor Presidente da República, para que Sua Excelência, depois de examiná-lo, submeta-o ao Congresso, justamente criando a figura do contrato temporário de trabalho. É preciso que esse contrato seja visto com reservas, pelo menos por enquanto, porque o que se diz é que ele seria elaborado ao arrepio da própria Constituição Federal. Há certos aspectos relacionados com os direitos sociais dos trabalhadores que só podem ser realmente objeto de alteração mediante reforma do texto constitucional e não por meio de simples projeto de lei ordinária.

Ou, ainda, outras movimentações de cunho similar, envolvendo micro e pequenas empresas. Um universo que deveria merecer, isso sim , todo um acompanhamento e atenção especiais por parte do Governo, por toda a sua potencialidade econômica, sobretudo em se tratando do aumento do nível de emprego. Pois, afinal, constituem elas um total de 4.5 milhões de unidades produtivas em todo o País, sendo responsáveis por 7 milhões de vagas de trabalho formais e, estimativamente, de outras 21 milhões em termos informais. Um universo para o qual corre, inevitavelmente, a maioria dos que são descartados do mercado de trabalho, em busca de abrir o seu próprio negócio, mas sucumbindo diante de toda a sorte de dificuldades, em termos da enorme sobrecarga de impostos e encargos trabalhistas, com o que uma microempresa enfrenta um custo de até 50% com sua folha de pessoal, diferentemente das grandes, em que o custo se situa apenas em 7%. Não sendo, então, fato surpreendente o aumento enorme da chamada economia informal ou subterrânea em nosso País.*

A esse propósito, Sr.Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desejo informar à Casa que, conforme requerimento que fiz, já aprovado pelo Plenário, deverá ser incluído na Ordem do Dia, dentro de pouco tempo, projeto de minha autoria que aloca R$1 bilhão, proveniente do FAT - Fundo de Amparo ao Trabalhador - da Caixa Econômica Federal, sendo que R$300 milhões serão destinados a financiamento de taxistas e R$700 milhões destinados a financiamento de microempresários de todo o País. Sei que os microempresários representam o segmento da economia produtiva mais responsável pela absorção da mão-de-obra no País.

Pois bem, Sr. Presidente, nessa área dá-se hoje um fenômeno compreensível, mas não menos preocupante. Proliferam-se agora diversas cooperativas de mão-de-obra especializada, oferecendo seus serviços às micro e pequenas empresas, porém dispensando qualquer vínculo empregatício, aumentando assim a avalanche de empregos temporários, sem carteira assinada. Uma comunidade de verdadeiros "bóias-frias" urbanos, inclusive na área financeira, sem que se tenha qualquer garantia de que a economia de custo por trabalhador venha a ser investida em novas contratações.

Aliás, esse é o ponto mais questionável nesse processo de redução dos encargos trabalhistas. Por oportuno, devo dizer que na Europa, onde o desemprego chegou às raias das taxas mais elevadas do mundo industrializado, tem-se tentado reduzir o impacto do fenômeno não só através da redução das jornadas de trabalho, mas também por meio da diminuição do custo do emprego. Mas, com base na experiência francesa, a redução dos encargos trabalhistas não tiveram o efeito desejado. Segundo Thomas Coutrot, assessor econômico do ministro do Trabalho da França, as empresas daquele país teriam se beneficiado dos menores custos sem que novas vagas surgissem. Elas teriam conseguido, conforme sua análise, em média, uma poupança 20% maior do que normalmente necessitariam para investir e crescer, mas ainda assim os empregos não apareceram.*

E a propósito, na França, poucos dias antes de deixar o Governo de Portugal, o ilustre ex-presidente Mário Soares, com a sua experiência e talento político, anunciava ao mundo que, a seu ver, o neoliberalismo iria marchando celeremente para a decadência e citava a França como exemplo principal para se ater à perspectiva histórica, de que realmente o sistema que iria dominar o mundo para solucionar o problema das grandes massas, seria o da social democracia.

Vejamos mais alguns dados sobre o nosso desemprego. Durante o mês de janeiro, somente no ABC paulista, segundo os sindicatos dos metalúrgicos da área, a cada hora cerca de 4,5 trabalhadores perderam o emprego. Aquele mês terminou com 3.500 dispensas, engordando a lista que já é de 133 mil demitidos. Não se tendo qualquer dado mais consistente, como dizem alguns, de que grande parte desse pessoal tenha sido em sua maioria absorvido pelo setor de Comércio e Serviços. E contrapondo-se ainda mais à argumentação do desemprego localizado, temos a situação da absorção da mão-de-obra na agricultura. Se considerarmos que cada cinco hectares cultivados exigem em média o concurso de um trabalhador/ano, a redução da área plantada estimada em 2,3 milhões de hectares, por conta das dificuldades impostas pela política econômica ao setor - a chamada "âncora verde" - encontram-se hoje desempregadas nada menos de 460 mil pessoas. Em São Paulo, por exemplo, o setor agrícola deve ofertar na próxima colheita 18 mil empregos a menos, de acordo com os dados da Secretaria da Agricultura. Em Pernambuco, por sua vez, nas áreas de plantio de cana-de-açúcar, ofertam-se hoje menos de 130 mil empregos, quando nos anos 80 esse número girava em torno de 200 mil. E em Goiás, mesmo com o aumento da produção agrícola da ordem de 35%, nos últimos anos o desemprego aumentou em torno de 40%.

Esses números, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não são apenas projeções de quem deseja maximizar o problema para efeito político. São resultados de estudos proficientes, elaborados por instituições de renome no País, cujas metodologias de trabalho se conflitam com a usada por instituições oficiais como, por exemplo, o IBGE.

Objetivamente o problema é o seguinte: enquanto pelo Dieese - Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Econômicos - e pela Fiesp - Federação das Indústrias de São Paulo - o percentual de desempregados em relação à PEA gira hoje em torno de 13%, o IBGE apresenta a taxa correspondente de 5,09%, que há anos vem balizando os números do Governo. Resultado esse que decorre do fato de que para essa instituição oficial qualquer pessoa que estivesse prestando qualquer tipo de serviço na semana anterior a da pesquisa, mesmo um simples "bico", como se diz, até por um único dia é considerada ocupada.

Entretanto, superficialidades metodológicas à parte, o fato incontestável é o de que hoje 58% da massa de trabalhadores brasileiros com carteira assinada estão à margem do mercado de trabalho, configurando um incomensurável exército de desempregados e subempregados, cujo impacto negativo sobre nosso mercado interno não pode ser jamais desprezado ou minimizado.

As saídas para tal situação, na verdade, existem e dependem muito mais de decisões da política econômica que se voltem realmente para elas. Não se pode, por exemplo, negar que o Brasil, como diz o economista Pedro Paulo Martoni Branco, Diretor-Executivo da Fundação Seade - Sistema Estadual de Análise de Dados - de São Paulo, que nosso País encontra-se em plena construção. Fato que lhe propicia a capacidade de promover atividades maciças de geração de empregos. O que, diante da falência financeira do Estado brasileiro, incapacitado, portanto, de acumular recursos para grandes obras públicas, implica a necessidade de se reformular urgentemente a matriz econômica do País, abrindo-se oportunidades de intervenção do setor privado, sob regulação criteriosa do setor público, sobretudo em alguns serviços de utilidade pública. Sem mencionar a urgente e imperiosa necessidade de que o Estado exerça um controle e uma fiscalização muito mais eficazes sobre a intermediação financeira, para evitar que fraudes, como a do Banco Nacional, possam desviar anonimamente preciosos recursos, cujas aplicações produtivas e de caráter eminentemente social terminem por ser seriamente prejudicadas.

Há ainda outras medidas de caráter compensatório, em relação ao impacto do desemprego, que urgem ser implementadas. A sugestão mais objetiva nesse sentido é a de que se crie o quanto antes um grande agência pública nacional de geração de emprego, calcada em modificações substantivas e eficientes nos programas de seguro-desemprego, bem como a implementação do contrato coletivo de trabalho. E, além disso, a implementação de um amplo programa de treinamento de mão-de-obra, que permita uma maior qualificação de nosso trabalhador, dando-lhe melhores condições de absorção pelo mercado de trabalho nos quadros atuais de avanços tecnológicos.

Sr. Presidente, nesse particular os recursos privados poderiam incentivar o crescimento de nossa economia nessa fase difícil em que nos encontramos.

Diante das reformas constitucionais já realizadas, sobretudo no campo econômico, que abriram melhores condições para investimentos estrangeiros de risco no País, insisto, Sr. Presidente, obstinadamente, na aprovação do projeto de minha autoria, que já teve o apoio do Senado e está na Câmara, que admite a aplicação no País dos títulos de conversão da dívida externa, sobretudo nas regiões menos desenvolvidas, como o Nordeste, o Norte e o Centro-Oeste, ou mesmo nas demais. A Câmara está debruçada sobre esse assunto. Acredito que assim teríamos recursos suplementares para o custeio do nosso processo de desenvolvimento.

Retomando o meu pronunciamento, certamente, as projeções que se fazem sobre as possibilidades de redução do nosso desemprego não são nada otimistas. De acordo com o ex-Ministro Maílson da Nóbrega, o nosso setor financeiro, por exemplo, em ritmo acelerado de informatização, deverá estar empregando apenas 300 mil pessoas na virada do século, contra 1,1 milhão que mantinha em 1985.

Há pouco tempo, o Banco do Brasil, para enxugar a sua máquina administrativa, teve de fazer a chamada demissão voluntária de 15 mil funcionários. Agora, a Caixa Econômica Federal anuncia que fará o mesmo.

Se isso ocorre nas instituições oficiais de crédito, o que se pode esperar que aconteça aos bancos particulares? Contudo, há os que ainda acreditam que, não obstante essa dificuldade a própria indústria nacional em avançado estado de modernização tecnológica, poderá vir a reduzir o desemprego no futuro. Assim pensa Horácio Piva, da Fiesp, para quem a tendência de que nossa economia venha entrar em um vínculo virtuoso em pouco tempo, com as empresas competitivas criando novas riquezas para o País, com a conseqüente geração de crescimento e de emprego.

É uma assertiva, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que não se pode aceitar de pronto, sobretudo, num mundo onde a máquina, cada vez mais, substitui o homem e, portanto, a indústria é automatizada.

Meu ponto de vista é o de que essa última posição reflete muito mais a nossa realidade. O Brasil, assim como seus parceiros do time chamado doe "países baleias", como a Índia, Austrália, China, etc, certamente não poderá se arvorar em ganhar a batalha da competitividade com os países desenvolvidos, em termos de padrões produtivos de bens e serviços sofisticados. Mas, quase com certeza, podemos dizer que a ele está reservado um lugar de destaque na produção de bens populares, que deverão ser a tônica das concorrentes de mercado, em futuro breve.

Nesse sentido é que se destaca, a meu juízo, a necessidade de que se parta imediatamente para uma reformulação em nossa política exterior, em que o Estado, diferentemente do que apregoam os setores neoliberais, deve também empreender um grande esforço regulador. Pois está claro que um aumento substancial de nossas exportações deve ser perseguido, particularmente com vistas ao seu reflexo positivo sobre o nível de emprego.

E aí entra novamente a questão das ZPEs, das Zonas de Processamento de Exportação, criadas no Governo José Sarney, as quais até agora não instaladas neste País.

E ainda a esse respeito, devo reportar-me ao economista, Deputado Federal Delfim Netto, que, em recente artigo para a Gazeta Mercantil, afirmou: "Em condições normais de pressão e temperatura, deveríamos ter exportado, em 1995, mais de US$52,5 bilhões (20% a mais do que em 1994, com todos nosso parceiros), e não apenas US$46,5 bilhões. Esses US$6 bilhões adicionais teriam criado empregos para cerca de 150 mil pessoas (um homem/ano para cada US$40 mil dólares exportados)". Com que ele critica a severa restrição de crédito que o Governo foi obrigado a promover para manter o câmbio altamente valorizado, reduzindo nossa taxa de crescimento de 6% para 4%, em 1995, que teria determinado, no final das contas, o desemprego de cerca de 880 mil pessoas.

De modo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que, mesmo sem ser economista, me parece claro que todo um conjunto de medidas, como as que mencionei antes, e outras, eivadas na criatividade que sempre demonstramos possuir, devem ser rapidamente implementadas para se encontrar uma saída eficaz para o nosso desemprego.

Como disse no início, o próprio Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, tem-se dado conta da gravidade extrema dessa situação. E quero crer que Sua Excelência, com toda sua formação social-democrata, não deve ter perdido de vista a necessidade de reverter o quanto antes esse quadro, tomando todas as medidas que se façam necessárias para isso. Mas, sobretudo, espero que Sua Excelência não deixe de entender que, para se reduzir o desemprego entre nós, faz-se necessário, fundamental, mudar os rumos da política econômica, particularmente no sentido de se aumentar substancialmente o crescimento econômico, pois, mesmo considerando o impacto inevitável do referido desemprego tecnológico, tudo está a indicar que temos ainda bastante campo para aumentar, nos termos tradicionais, a nossa oferta e demanda globais, que permitam elevar mais rapidamente a procura por mão-de-obra.

Em suma, Sr. Presidente, esse é o quadro que está aí e que temos que mudar rapidamente, porque se é importante, não podemos negar isso, que o Governo tenha êxito, como está tendo, no plano econômico, não haveremos de desejar que a crise se acentue no campo social, sobretudo, repito, num Governo que é de inspiração social democrática.

Sr. Presidente, para que medidas importantes sejam tomadas para contornar essa situação, para que não se agrave o desemprego, entre outras medidas apontaria, além das que sugeri, a retomada com decisão política do verdadeiro processo de reforma agrária no País.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/03/1996 - Página 4040