Discurso no Senado Federal

SOLIDARIEDADE AO POVO MATO-GROSSENSE, HAJA VISTA O BLOQUEIO DE RECURSOS QUE DEVERIAM SER MENSALMENTE DESTINADOS AO ESTADO DO MATO GROSSO. CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROJETO DE LEI 4.555, DE 1994, APROVADO NA CAMARA DOS DEPUTADOS, QUE DISPÕE SOBRE O PISO SALARIAL DE MEDICOS E CIRURGIÕES-DENTISTAS E DA OUTRAS PROVIDENCIAS. COMENTARIOS AO ARTIGO DO JURISTA SAULO RAMOS, PUBLICADO NA COLUNA TENDENCIAS E DEBATES, DO JORNAL FOLHA DE S.PAULO, EDIÇÃO DE 6 DE MARÇO, INTITULADO TCU QUER CONCORRENCIA SEM CONCORRENTES, REFERENTE A PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE RIO DOCE.

Autor
Sebastião Bala Rocha (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AP)
Nome completo: Sebastião Ferreira da Rocha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DE MATO GROSSO (MT), GOVERNO ESTADUAL. POLITICA SALARIAL. PRIVATIZAÇÃO.:
  • SOLIDARIEDADE AO POVO MATO-GROSSENSE, HAJA VISTA O BLOQUEIO DE RECURSOS QUE DEVERIAM SER MENSALMENTE DESTINADOS AO ESTADO DO MATO GROSSO. CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROJETO DE LEI 4.555, DE 1994, APROVADO NA CAMARA DOS DEPUTADOS, QUE DISPÕE SOBRE O PISO SALARIAL DE MEDICOS E CIRURGIÕES-DENTISTAS E DA OUTRAS PROVIDENCIAS. COMENTARIOS AO ARTIGO DO JURISTA SAULO RAMOS, PUBLICADO NA COLUNA TENDENCIAS E DEBATES, DO JORNAL FOLHA DE S.PAULO, EDIÇÃO DE 6 DE MARÇO, INTITULADO TCU QUER CONCORRENCIA SEM CONCORRENTES, REFERENTE A PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE RIO DOCE.
Aparteantes
Ademir Andrade, Mauro Miranda.
Publicação
Publicação no DSF de 20/03/1996 - Página 4439
Assunto
Outros > ESTADO DE MATO GROSSO (MT), GOVERNO ESTADUAL. POLITICA SALARIAL. PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, POPULAÇÃO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), OCORRENCIA, BLOQUEIO, RECURSOS, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL (FPE), DESTINAÇÃO, REGIÃO.
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, SENADO, URGENCIA, VOTAÇÃO, PROJETO DE LEI, REGULAMENTAÇÃO, PISO SALARIAL, MEDICO, DENTISTA.
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, SAULO RAMOS, JURISTA, ANALISE, CRITICA, RESOLUÇÃO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), IMPEDIMENTO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), PARTICIPAÇÃO, LICITAÇÃO, REDE FERROVIARIA FEDERAL S/A (RFFSA).

O SR. SEBASTIÃO ROCHA (PDT-AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, agradeço o tratamento que tive em Mato Grosso, na cidade de Cuiabá, durante o final de semana passado, onde estive para participar de atividades partidárias, principalmente de uma assembléia da Juventude Socialista do PDT.

Naquela cidade, pude sentir de perto as dificuldades por que passa o Estado de Mato Grosso, que tem à frente do Governo Estadual o Governador Dante de Oliveira. Neste momento, manifesto a minha solidariedade ao povo matogrossense haja vista o bloqueio de recursos, tanto do ICMS quanto do FPE, que deveriam ser mensalmente destinados ao Estado de Mato Grosso, o que deixou aquele Estado numa situação muito difícil, inclusive para o pagamento dos servidores.

Sei que os Senadores, os Deputados Federais e Estaduais do Estado de Mato Grosso estão tomando todas as providências, assim como o próprio Governador Dante de Oliveira e toda sua equipe de Governo no sentido de tentar reverter essa crise que atinge o Estado, que pertence a nossa grande Amazônia.

Neste momento, quero prestar a minha solidariedade e fazer um apelo ao Governo Federal para que considere a proposta de Mato Grosso e que, dentro do mais breve espaço de tempo, possa desbloquear os recursos a que constitucionalmente o Estado tem direito.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, outro tema que pretendo abordar na tarde de hoje diz respeito ao Projeto de Lei nº 4.555/94, aprovado em 13 de dezembro, de 1995, na Câmara dos Deputados, do nobre Deputado Nilson Gibson, que dispõe sobre o piso salarial de médicos e cirurgiões-dentistas e dá outras providências.

O projeto aprovado no ano passado altera o estabelecido na Lei nº 3999, de 15 de dezembro de 1961, conhecida como lei do médico, que fixou o piso salarial dos médicos e dentistas em três salários mínimos. Esse parâmetro, no entanto, tornou-se inútil e inaplicável nos dias de hoje, uma vez que a atual Constituição Federal proíbe a fixação de qualquer valor vinculado ao salário mínimo nacional, muito embora essa Lei de 1961 nunca tenha sido revogada.

O objetivo desse projeto que foi aprovado na Câmara e está tramitando no Senado é, entre outros, evitar controvérsias danosas que vinham ocorrendo nos tribunais em relação ao art. 4º da lei do médico, pois esse artigo restringia apenas a pessoas físicas ou jurídicas de direito privado a obrigação de pagar o salário profissional da categoria.

Para sanar essas controvérsias, o art. 1º, do Projeto aprovado na Câmara estabelece um piso salarial de R$1.091,16 a partir de dezembro de 1995 e de R$1.337,32 a partir de junho de 1996 para todos os profissionais médicos e cirurgiões-dentistas, qualquer que seja o empregador, privado ou público.

Sr. Presidente, a aprovação desse projeto na Câmara exigiu um esforço e uma mobilização muito grandes das entidades de classe locais e nacionais e só foi possível graças a um acordo de Lideranças. É esse esforço que estamos solicitando ao Senado da República. É preciso que as Lideranças dos Partidos nesta Casa se reúnam e definam uma estratégia, para que se vote esse projeto o mais rápido possível. A aprovação dele se reveste de caráter social muito grande e trará muitos benefícios a toda sociedade brasileira, pois a maioria da população só tem acesso aos serviços dos profissionais que atuam na rede pública de saúde, justamente os que têm os salários mais indignos. Todos somos testemunhas do caos que atinge o setor público da saúde em todos os Estados da Federação.

Embora todos saibamos muito bem o quanto é grave a crise que atualmente atinge a área de saúde, talvez a maior da nossa História, não há dúvida de que dentre os inúmeros problemas hoje existentes no setor, tais como a crônica carência de recursos para a saúde, o sucateamento dos hospitais públicos, a falta de material e de medicamentos, que impede a prestação dos serviços essenciais à população, destaca-se o da proletarização de profissionais médicos e odontólogos, cujos salários não são proporcionais à extensão e à complexidade do trabalho que executam.

Os profissionais da área de saúde, em virtude de seus atuais salários, têm de se desdobrar, trabalhando em dois, três empregos, para conseguir viver com o mínimo de dignidade e assegurar o sustento de suas famílias.

Os médicos e odontólogos necessitam receber salários condignos com a alta responsabilidade de suas funções, pois lidam com a vida, com a saúde de milhares de pessoas. Esses profissionais exercem atividades que exigem permanentemente estudo, atualização, pesquisa, pois os avanços na Medicina e na Odontologia ocorrem em ritmo cada vez mais acelerado e exigem constante reciclagem.

O projeto de que tratamos deu entrada no Senado há pouco tempo, encontra-se na Comissão de Assuntos Sociais e tem como Relator o nobre Senador Lúcio Alcântara. Sua aprovação pelos membros desta Casa do Congresso Nacional trará, como dissemos, enormes benefícios a duas das mais importantes categorias do Brasil de hoje.

Não podem prestar boa assistência à população brasileira profissionais que recebem salários tão vergonhosos. A criação de um piso básico para os vencimentos de médicos e cirurgiões-dentistas é um grande passo para a melhoria do atendimento aos que necessitam prevenir doenças ou recuperar a saúde, pois o profissional bem remunerado tende a trabalhar muito melhor.

O Sr. Ademir Andrade - V. Exª permite-me um aparte?

O SR. SEBASTIÃO ROCHA - Ouço o eminente Senador Ademir Andrade.

O Sr. Ademir Andrade - Senador Sebastião Rocha, gostaria de dizer que me somo às preocupações de V. Exª. Tenho questionado a saúde pública no País, inclusive o fiz quando o Ministro Adib Jatene esteve nesta Casa, porque entendo que estamos cometendo um grande erro. O Sistema Único de Saúde foi um bom empreendimento criado pela Constituição de 1988, que dá a todo cidadão direito de assistência à saúde, independentemente de ter, ou não, carteira assinada e de contribuir para a Previdência. Entretanto, o que estamos observando é que ao longo dos anos, de 1988 para cá principalmente, o processo tem sido o de liquidar a saúde pública no Brasil, o processo tem sido o de estimular a privatização da assistência à saúde. O próprio Ministro mencionou, naquela ocasião, que 80% dos recursos da saúde pública estão sendo pagos aos hospitais e laboratórios privados. Quer dizer, desestimulou-se a saúde pública. Hoje o médico recebe pelo serviço que presta, ou seja, a sua remuneração depende do número de consultas e de operações realizadas, fala-se muito sobre isso no Ministério. Logo, passou o tempo em que o médico recebia um salário decente - a época do SESP. Trabalhava exclusivamente num emprego durante todo o período, atendia bem à população e sabia que, no fim do mês, receberia um salário digno, decente. E veja bem: isso no tempo da ditadura, do regime militar. Veio a democracia e, com ela, o Sistema Único de Saúde, mas parece que a onda do neoliberalismo, a onda de privatizar tudo neste País levou também à privatização da assistência à saúde, ou seja, hoje se presta assistência à população por intermédio das empresas privadas de saúde e não do serviço de saúde pública. A manutenção desses salários insignificantes, desonrosos, indignos, para a categoria de profissionais de saúde é talvez uma estratégia no sentido de acabar definitivamente com a saúde pública em nosso País. O Sistema Único de Saúde está permitindo a municipalização e a estadualização da saúde. Então os hospitais municipais e estaduais poderão receber diretamente do Sistema Único de Saúde. É uma saída também, mas quero ver de onde vai sair dinheiro para custear isso quando a municipalização e a estadualização da saúde ocorrerem em todo o País, pois o Ministério da Saúde terá de pagar também aos hospitais públicos municipais e aos estaduais diretamente. Ora, muitos prefeitos e muitos governadores procuram evitar essa medida para terem o comando do assistencialismo, que é comum. Isso está se tornando uma caixa sem fundo. Penso que se deveria manter o Sistema Único de Saúde, o direito universal à assistência à saúde e acabar com o sistema de pagar por procedimento, por consulta, por produção. Saúde não é mercadoria; saúde é direito do cidadão e dever de todos os profissionais de saúde. Então, é necessário que se façam mudanças, porque está havendo roubos, falcatruas na iniciativa privada. Até organismos públicos podem fazer relatórios irreais, e é o que sempre acontece. Então, é preciso mudar. O grande erro é pagar ao profissional da saúde por procedimento. Nesse sistema haverá sempre, cada vez mais, enfraquecimento, isto é, piores condições para o médico que trabalha no setor público e, evidentemente, melhores condições para o que trabalha no setor privado. É isso que precisa ser definitivamente corrigido no Brasil. É necessário ter coragem para fazer essa mudança. Aí é que está, repito, o grande erro e todo o problema de saúde em nosso País.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA - Considero procedentes e justas as manifestações de V. Exª, Senador Ademir Andrade. Espero - acredito que esse é o desejo de todos nós - que o Ministério da Saúde possa realizar ainda este ano a Conferência Nacional de Saúde, na qual todos esses temas que estamos levantando, inclusive as preocupações de V. Exª com relação ao pagamento por procedimento, possam ser reestudados, buscando-se outra fórmula para remunerar os profissionais da saúde, que não sejam essas decorrentes dos procedimentos prestados, entendemos que isso irá contribuir certamente para que os médicos tenham um melhor desempenho e que a população possa ser melhor assistida, o que não acontece hoje.

O Sr. Mauro Miranda - Permite-me V. Exª um aparte.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA - Tem V. Exª a palavra.

O Sr. Mauro Miranda - Estou ouvindo com muita atenção o pronunciamento de V. Exª e o endosso plenamente, assim como o aparte do Senador Ademir Andrade. Entendo que está na hora de aprovarmos a emenda, apresentada na Câmara, ao projeto que institui a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, segundo a qual esses recursos serão destinados, única e exclusivamente, aos hospitais públicos e filantrópicos. Muitas pessoas estão falando que vai haver imediatamente uma correção sobre os valores cobrados pelos hospitais privados, o que será um desastre total, com a continuação do caos na saúde. O Senado deve, quando o projeto voltar a esta Casa, dar apoio para que os recursos da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira sejam destinados, única e exclusivamente, aos hospitais públicos e filantrópicos.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA - Agradeço a contribuição de V. Exª, Senador Mauro Miranda, e espero que tenhamos oportunidade de votar em breve essa emenda no Senado e definirmos o futuro dessa Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, já aprovada em primeiro turno nesta Casa.

Ao concluir meu pronunciamento, Sr. Presidente, peço que seja registrado nos Anais do Senado um artigo do jurista Saulo Ramos publicado na coluna Tendências e Debates, da Folha de S. Paulo, do dia 6 de março, sob o título "TCU quer concorrência sem concorrentes", que se refere à Companhia Vale do Rio Doce. Ele inicia o seu artigo dizendo textualmente que continua "atento às barbaridades jurídicas da República". Desta vez, o atentado foi contra a Companhia Vale do Rio Doce, impedida, na visão de Saulo Ramos, de participar do leilão de privatização da Rede Ferroviária Federal, através de resoluções interpretativas baixadas pelo Tribunal de Contas da União, que, na opinião do jurista, não lhe cabe fazer e pelas quais ficou entendido que as empresas estatais, para participarem da compra de outras que vão ser privatizadas, necessitam de autorização legislativa, segundo o disposto no art. 37, inciso XX, da Constituição Federal.

Ou seja, o próprio Governo, quando lhe convém, ignora a famigerada Lei nº 8.031, de 1990 (Estatuto das Privatizações), que nada mais é do que a autorização outorgada pelo Legislativo, de forma absolutamente irrestrita, para que o Executivo faça o que bem entender com as estatais. Aliás, o Congresso Nacional tem o dever de revisar essa autorização - apresentei projeto de lei nesse sentido -, pois não podemos abrir mão de nossa participação no processo decisório de atos que podem comprometer o patrimônio público de forma tão acintosa.

O que está em jogo é ainda mais grave: pretende-se impedir que uma empresa de direito privado, controlada pela Vale do Rio Doce, participe da licitação da RFFSA, deixando, "convenientemente, um grupo americano nadar de braçadas numa concorrência sem concorrentes". Segundo consta expressamente no voto do Relator, Ministro Carlos Átila, "em face de notícias veiculadas na imprensa", com a finalidade de proibir a participação de empresa considerada estatal no processo de privatização - e neste conceito de empresa estatal entra tudo que tiver ligação direta ou indireta com a União -, a Vale do Rio Doce, segundo esse entendimento, não poderia ter subsidiárias, que a própria Lei das S.A. qualifica como controladas, participando de processos de privatização.

É oportuno lembrar que a Companhia Vale do Rio Doce é a maior transportadora de minério de ferro da face da terra, portanto, uma das maiores interessadas no patrimônio da RFFSA, mas está ironicamente impedida de poder comprá-la por um desvio de atribuição do Tribunal de Contas da União, que deve apenas - e já não é pouco - tomar conta do que se faz com o dinheiro público e, em matéria de legalidade, não pode passar da apreciação dos atos de admissão de pessoal.

Outro fato mais grave do que o processo do TCU, motivado pelo "Tribunal da Imprensa", é que o impedimento da controlada da Companhia Vale do Rio Doce foi encaminhado diretamente ao BNDES, sob pretexto de interpretação constitucional normativa, quando a esse Tribunal está reservado o dever de representação ao poder competente, se apurada irregularidade.

Portanto, mais uma vez peço que fique registrado nos Anais desta Casa o artigo de Saulo Ramos. E quero dizer que a privatização da Vale do Rio Doce é um dos temas que vão servir de base para o próximo encontro da bancada parlamentar da Amazônia, que será realizado em Imperatriz, no Estado do Maranhão, nos próximos dias 28 e 29 de março. Esperamos que a bancada da Amazônia possa fechar questão contra a privatização da Vale do Rio Doce.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/03/1996 - Página 4439