Discurso no Senado Federal

CRITICAS AS RELAÇÕES ENTRE AS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS PRIVADAS E O BANCO CENTRAL. O USO DOS RECURSOS DO PROER.

Autor
Lauro Campos (PT - Partido dos Trabalhadores/DF)
Nome completo: Lauro Álvares da Silva Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • CRITICAS AS RELAÇÕES ENTRE AS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS PRIVADAS E O BANCO CENTRAL. O USO DOS RECURSOS DO PROER.
Publicação
Publicação no DSF de 19/03/1996 - Página 4359
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, PRESIDENTE, DIRETORIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), AUSENCIA, FISCALIZAÇÃO, BANCOS.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, UTILIZAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, PROGRAMA DE ESTIMULO A REESTRUTURAÇÃO E AO FORTALECIMENTO AO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL (PROER), OBJETIVO, AUXILIO FINANCEIRO, GESTÃO, FRAUDE, BANQUEIRO.

O SR. LAURO CAMPOS (PT-DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, parece-me que o Banco Central escolheu um bode expiatório sobre o qual lançar todo o conteúdo negativo da ação daquele órgão.

Há quanto tempo venho acusando o conluio espúrio entre presidentes e diretores do Banco Central e bancos, instituições privadas de crédito e financeiras.

Quantos ex-diretores e ex-presidentes do Banco Central saíram de lá, de uma pobreza e de uma modéstia financeira bem recentes, para serem donos de bancos privados?

Acusamos aqui um conluio, uma sintonia fina entre o Presidente do Banco Central, o Diretor Cláudio Mauch e, pelos jornais, o Diretor Alkimar Moura, dizendo todos que a fiscalização do Banco Central cometera erros, cometera falhas; que a direção do Banco Central era culpada pela não apuração dos desvios, dos crimes cometidos pela rede bancária privada; rede bancária que, neste País "midázico", neste País "bancocrático", exibia até há tão pouco tempo as delícias de sua lucratividade exuberante contra o crescimento negativo do PIB, o aumento do desemprego, o aumento da prostituição infantil.

Nadando sobre tudo isto, pairava a rede bancária privada, apresentando na década perdida 14.000% de retorno, como foi apregoado em uma página inteira de jornal, por um dos bancos contemplados com esta agiotagem oficiosa.

Enviarei, nesta semana, ao Presidente do Banco Central, Gustavo Loyola, e ao Diretor da Fiscalização daquela instituição, o Sr. Cláudio Mauch, os documentos que me foram encaminhados dos Estados Unidos e do México e que mostram que a coisa vai de mau a pior.

No início dos anos 70, o então Ministro Mário Henrique Simonsen anunciava que havia descoberto uma fórmula que poderia ser exportada para evitar as crises, para socorrer as empresas que se encontravam em má situação financeira. Qual foi essa fórmula mágica que o Sr. Ministro Mário Henrique Simonsen havia descoberto? Que pólvora era essa que S. Exª havia descoberto e que usou fartamente? Os recursos do Tesouro eram repassados, através do BNDES, a uma empresa ainda não falida, para que ela comprasse uma empresa insolvente, uma empresa em concordata ou uma empresa falida. Assim, uma empresa incorporando com recursos públicos uma outra empresa, obviamente o câncer não se espalhava, ficava ali retido naquele estágio inicial.

Pois bem, estou encaminhando, repito, ao Presidente do Banco Central e ao Diretor de Fiscalização estes documentos, a fim de que não venham dizer que apenas acusamos; estamos alertando que esse sistema utilizado, em que se baseia o Proer, é altamente perigoso.

Não há dúvida de que o banco que se beneficia de uma injeção do Proer tem de pagar juros sobre essa quantia que recebe para adquirir outro banco já saneado; mas também não há dúvida de que esses recursos serão aplicados com alta rentabilidade, resultado da diferença entre a taxa de juros desse dinheiro aplicado pelo banco beneficiado com o Proer e aquilo que ele vai pagar ao Banco Central, quer seja Selic, quer seja TR mais 5%.

Portanto, é preciso mostrar que está havendo uma concentração da rede bancária brasileira com a compra de bancos falidos, semifalidos, mal administrados ou criminosamente administrados por outros que se supõe sejam saudáveis e estejam em capacidade financeira e moral de comprar esses ativos saneados, por meio de recursos públicos, do povo.

Tenho aqui uma série de documentos que me foram enviados pelo United States Attorney`s Office, Southern District of Florida, Miami, Florida, 33132-211, a Kendall Coffey, United States Attorney. Em um desses documento, com mais de quarenta páginas fica claro, transparente que pessoas pertencentes a Union Bancarie Privée, um banco que se associa ao Excel para, recebendo do Proer, apropriarem-se do Banco Econômico, da Bahia.

Estas pessoas, que pertencem à cúpula desse banco suíço, estão sendo processadas nos Estados Unidos - é este o documento que estou encaminhando para o Banco Central. Members of organization inclued: Jean-Jacques Handali é o primeiro desta lista; Account Director of the CBI-TB with Union Bancaire Privée, Genebra, Suíça, Michael Lee; Account Director with CDI-TBF, Albert Fhammah e Gary Kaminsky, todos eles beneficiados diretamente pelo Proer e acusados de estarem fazendo operações de lavagem, laundry, de dinheiro nos Estados Unidos e de estarem diretamente relacionados com o tráfico de entorpecentes naquele país.

Encaminharei, preventivamente, esse material ao Banco Central do Brasil a fim de que, daqui a 6 meses, um ano, não venham dizer que não sabiam de nada, que foram os últimos a saber. Por exemplo, o Banco Nacional estava simplesmente produzindo dinheiro escritural, ex nihil, dinheiro escritural falso, entre outras coisas.

De modo que eu ainda espero que esse material precioso, cujo levantamento devo à colaboração do jornalista Rubens de Azevedo Lima, a quem agradeço pelo trabalho, uma vez bem usado pela fiscalização do Banco Central do Brasil, ainda possa servir para deixar de premiar criminosos, deixar de premiar falsários, deixar de confiar recursos públicos, porque provenientes, em parte, dos depósitos compulsórios recolhidos ao Banco Central, portanto, pertencente aos depositantes, ao povo brasileiro, e que esse Proer afirma estar cuidando.

Quando se diz que a preocupação do Governo é salvar os depositantes, há que se verificar, também, a preocupação de salvar banqueiros. Não querem salvar apenas depositantes. Prova é que o Banco Central negocia com outro banco, com outro banqueiro, fornece a esse banqueiro recursos do Proer, aumenta a concentração bancária e, obviamente, aquele banqueiro que praticou crimes, aquele banqueiro que deveria estar na cadeia, devido à morosidade do Banco Central, pôde preservar o seu patrimônio, pôde escafeder-se com parte dele para a Europa, para as Bahamas ou para as Ilhas Cayman. Todos sabemos disso.

Não há dúvida de que existe proteção aos pequenos depositantes, mas os pequenos depositantes teriam até - digamos - R$30 mil, se o seguro viesse a ser posto em prática, para se defender contra a erosão bancária, contra a falência dos bancos.

Portanto, os grandes beneficiários são os banqueiros que compram a parte boa dos bancos postos à venda, aumentando enormemente o seu patrimônio, e que têm um amparo, uma proteção, um benefício milhares de vezes maior do que os pobres depositantes, em cujo nome se salvam os banqueiros.

Gostaria também de chamar a atenção para o fato de que, mesmo vindo aqui ao Senado, não se sabe perfeitamente quanto do Proer e de outras fontes já foram aplicados nesse trabalho de salvação de bancos. Dizem uns que são R$9.200.000.000,00; outros afirmam que esse valor já passou dos R$15.000.000.000,00; outros ainda admitem que já ultrapassou os R$20.000.000.000,00 o dinheiro que está sendo empregado nesse serviço, não totalmente esclarecido. E a Comissão Parlamentar de Inquérito deverá, necessariamente, pesquisar esse assunto e trazê-lo à tona.

Quem garante que depois desses 33 bancos que se encontram em situação de intervenção ou de insolvência, a que se refere o Presidente do Banco Central, não virão mais outros? Será que não acontecerá aqui o que ocorreu nos Estados Unidos, que, na última década, tiveram dois mil bancos falidos e, entre 1932 e 1935, cinco mil bancos falidos? Quem garante que a nossa crise não seja tão profunda que irá, como um vórtice incontível, devorar grande parte dos nossos bancos? O nosso sistema bancário tem apenas 230 bancos, contra, por exemplo, o sistema bancário norte-americano, que tem pelo menos 12 mil. Eles têm 12 mil bancos, o nosso tinha 230, agora são 18 bancos a menos; desses, grande parte são de pequenos bancos comerciais.

Essa é a colaboração que trago, para que o Banco Central, que tem confessadamente a sua diretoria de fiscalização altamente deficiente, possa, desta vez pelo menos, abrir os olhos e impedir que essa gangue internacional se aproprie, com recursos nossos, de um banco brasileiro em crise.

Conheço o serviço de fiscalização, porque ele fiscaliza, também, os milhares de consórcios que faliram neste País. Comprei um consórcio de um Gol, um modesto Gol, em cinqüenta meses. Depois de pagar trinta prestações, passaram de cinqüenta para setenta e nove parcelas. Paguei as setenta e nove prestações; dei dezenas de lances; fui cinco vezes à fiscalização do Banco Central para saber como andava aquele consórcio. Pretendia comprar apenas um Gol, que estava ao alcance do meu cargo e do meu vencimento de professor universitário. Mas, como outras centenas de companhias de consórcio, o meu também faliu. E cinco vezes fui ao Banco Central, que me garantiu que não havia nada com o Consórcio Nasser. Disseram-me: "Está tudo tranqüilo, o senhor vai receber. A fiscalização encontra-se lá."

E a irresponsabilidade continua a ser o traço fundamental de uma instituição, em cujas mãos se concentram maiores poderes do que na mão de 41 Senadores juntos, porque basta, por exemplo, que o Diretor da Carteira de Câmbio e Comércio Internacional do Banco Central resolva que o dólar passe a valer R$0,50, como ele disse que iria fazer, para que a economia brasileira seja completamente destruída por um ato de insânia, por um ato que só pode partir de cabeças oligofrênicas.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/03/1996 - Página 4359