Discurso no Senado Federal

PERSPECTIVA DE INSTALAÇÃO DA FABRICA RENAULT DE AUTOMOVEIS NO ESTADO DO PARANA.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDUSTRIAL.:
  • PERSPECTIVA DE INSTALAÇÃO DA FABRICA RENAULT DE AUTOMOVEIS NO ESTADO DO PARANA.
Publicação
Publicação no DSF de 19/03/1996 - Página 4358
Assunto
Outros > POLITICA INDUSTRIAL.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNADOR, ESTADO DO PARANA (PR), ISENÇÃO FISCAL, INSTALAÇÃO, INDUSTRIA AUTOMOBILISTICA.

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB-PR. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, como paranaense, não posso, neste momento, deixar de registrar o meu entusiasmo pela instalação da fábrica de automóveis Renault ao meu Estado.

Não tomei conhecimento disso oficialmente, mas pela imprensa. Eu li na revista Veja que o nosso Governador descia de um avião de carreira vindo diretamente da França, dando, segundo literalmente a revista, "soquinhos no ar" de alegria.

Preocupa-me a instalação dessa fábrica no Estado, porque o Paraná, no fim do ano, teve que tomar emprestado da Companhia de Energia Elétrica, com garantia de ações, US$120 milhões para pagar a folha do décimo terceiro.

Preocupa-me mais quando leio, no jornal O Estado de S. Paulo de domingo, que "o Estado poderá garantir o investimento, em troca de 40% do capital da Renault, caso a iniciativa privada não queira participar do pool, que deverá contribuir com R$300 milhões para ajudar a montadora francesa a realizar o projeto". Segundo o Secretário de Planejamento do Paraná, esse dinheiro sairia do FDE, Fundo de Desenvolvimento Econômico, que existe há mais de 30 anos e hoje possui uma carteira com R$1,3 bilhão.

Sr. Presidente, pouco antes de eu assumir o Governo, meu antecessor foi obrigado a fechar o Banco de Desenvolvimento do Estado, porque este financiava, através de participação acionária, empresas multinacionais que se instalavam na cidade industrial de Curitiba. Esses R$1,3 bilhão que estão depositados hoje no Fundo de Desenvolvimento Econômico do Banco do Estado do Paraná são os créditos podres da liquidação do Banco de Desenvolvimento do Estado do Paraná. Nosso banco não tem mais que US$36 milhões por mês, o que é rigorosamente insuficiente para viabilizar esse financiamento.

Mas não fica por aí O Estado de S. Paulo: o Secretário retornou ontem da França. Foram recebidos ao som da Marselhesa - Allons enfants de la Patrie, le jour de gloire est arrivé, que coisa maravilhosa -, por cerca de 300 pessoas. O Governador Jaime Lerner disse não ter dúvidas de que o empresariado paranaense vai participar do pool de investidores. E os assessores explicaram que o Estado do Paraná não participará necessariamente como acionista. O Secretário informa - e isso nos explica o jornal O Estado de São Paulo - que os empréstimos para formação de capital de empresários privados que queiram participar do empreendimento da Renault serão fornecidos pelo Fundo de Desenvolvimento do Estado do Paraná, sem juros ou correção monetária, e terão o prazo de sete anos, ao fim dos quais as ações confiadas ao Estado poderão ser vendidas na Bolsa. Sr. Presidente, isso significa empréstimo a juros negativos.

Os jornais vão mais além: na Gazeta do Povo vemos que, afinal de contas, o investimento não é de R$1 bilhão, mas de R$760 milhões; R$610 milhões para construção da fábrica e os restantes R$150 milhões para uma rede de duzentas concessionárias em todo o País. Mais: a Renault calcula que vai receber do Estado do Paraná cerca de U$200 milhões em subsídios: a doação do terreno da infra-estrutura e a doação de um terminal no Porto de Paranaguá.

Fico aqui a perguntar-me como o Brito e o Paulo Afonso de Santa Catarina não descobriram ainda uma maneira de burlar a Lei nº 8.666, que proíbe qualquer espécie de doação de bens públicos, a não ser através da correspondente e legal licitação pública, e a título de transferência de domínio real de direito de uso ou de concessão por um determinado tempo.

Fica, de um lado, a minha alegria de a Renault ter escolhido o Paraná, perto do Porto de Paranaguá. A fábrica se situará a 65km do Porto e recebe ainda a possibilidade de ter o crédito de ICMS de todo o investimento de capital. Isso me parece excelente. E se aproveita de um projeto que se chama bom emprego fiscal, que é um diferimento no pagamento do ICMS por quatro anos. A Renault se situará perto do Porto de Paranaguá, porque será uma fábrica essencialmente exportadora; logo, ela não vai pagar ICMS na venda. O que ela vender no mercado interno terá um diferimento de quatro anos, e contra esse diferimento o crédito de todos os insumos dos automóveis exportados, insumos adquiridos no mercado nacional, fundamentalmente de São Paulo

Talvez o nosso Governador não tenha acompanhado a tramitação de um projeto de reforma tributária, o qual obriga os Estados a devolverem em dinheiro o ICMS creditado na compra dos insumos, quando da exportação de mercadorias por quaisquer empresas brasileiras.

Vemos, então, que, na verdade, quando o Governador do nosso Estado desembarcou no Aeroporto Afonso Pena "dando soquinhos no ar" de alegria, conforme a Veja, e ao som da Marselhesa, nós estávamos tendo, de certa forma, o Paraná invadido pela Renault e financiando de maneira integral o empreendimento de uma estatal francesa, com recursos que certamente só poderão ter uma fonte, porque outra fonte não existe: a venda das excepcionalmente bem administradas e lucrativas estatais paranaenses.

Hoje todos cantam no meu Estado a glória dessa conquista, mas penso que caberia a mim fazer o registro desse absurdo neste momento, para que não tenha que me calar mais tarde, porque não falei agora.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/03/1996 - Página 4358