Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS SOBRE A ESTABILIDADE E A CONJUNTURA ECONOMICA E SOCIAL DO BRASIL.

Autor
João Rocha (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: João da Rocha Ribeiro Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE EMPREGO. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • COMENTARIOS SOBRE A ESTABILIDADE E A CONJUNTURA ECONOMICA E SOCIAL DO BRASIL.
Aparteantes
Carlos Patrocínio, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 09/03/1996 - Página 3807
Assunto
Outros > POLITICA DE EMPREGO. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • COMENTARIO, PLANO, REAL, POSIÇÃO, CONFIANÇA, AMBITO NACIONAL, AMBITO INTERNACIONAL, OPORTUNIDADE, URGENCIA, CRIAÇÃO, EMPREGO.
  • APOIO, LIVRE NEGOCIAÇÃO, EMPRESARIO, SINDICATO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CONTRATO DE TRABALHO, CARATER PROVISORIO, EFEITO, CRIAÇÃO, EMPREGO.
  • CRITICA, DECISÃO, TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST), SUSPENSÃO, CONTRATO, MOTIVO, INCONSTITUCIONALIDADE, PREJUIZO, DIREITOS, TRABALHADOR, OPOSIÇÃO, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT).
  • NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, REDUÇÃO, ENCARGO TRABALHISTA, PREPARO, ECONOMIA, COMPETIÇÃO INDUSTRIAL, ABSORÇÃO, ECONOMIA INFORMAL.

O SR. JOÃO ROCHA (PFL-TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo hoje a tribuna desta Casa para fazer comentários breves sobre a estabilidade e sobre a conjuntura econômica e social que atravessamos em nosso País. Porém, o enfoque mais direto deste discurso refere-se aos "contratos provisórios de trabalho", que foram firmados recentemente entre empregadores e trabalhadores.

Por mais que se queira negar, não se pode deixar de admitir que o Plano Real levou o Brasil a recuperar a sua respeitabilidade tanto interna quanto externamente. Em nível local, os resultados são majoritariamente favoráveis, os números são claros e as pesquisas de opinião dão ao Governo Fernando Henrique significativa aprovação. Em nível internacional, a imagem do Brasil é de credibilidade, e, em todos os fóruns internacionais, os elogios à nova política econômica são inquestionáveis. Relembrando palavras do eminente economista Mário Henrique Simonsen, "pela primeira vez em 15 anos a política macroeconômica passou a ter sujeito, predicado e objeto direto".

É oportuno recapitular aqui neste plenário os dados, fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, sobre o desempenho da economia nacional nos primeiros doze meses do Governo Fernando Henrique Cardoso.

Segundo o Instituto, a renda per capita brasileira cresceu cerca de 28% em dólares e atingiu US$4.345 no ano passado, com um ganho de 2,74% acima da inflação, em real. O Produto Interno Bruto cresceu 4,2%, e, segundo a mesma fonte, atingiu a cifra de U$677 bilhões.

Diante desses resultados, o Brasil firma, indiscutivelmente, a sua posição como a segunda maior economia das Américas e um dos mais importantes mercados emergentes do mundo, ao lado da China, da Índia e dos chamados Tigres Asiáticos.

É certo que o Governo Federal precisa fazer novos e importantes ajustes no Plano de Estabilização Econômica para continuar garantindo o equilíbrio da economia e o sucesso do Plano Real. Sem dúvida alguma, daqui para a frente, o grande desafio será a dinamização do mercado de trabalho e a criação de empregos suficientes nas indústrias nacionais. Nesse sentido, vale relembrar que sindicalistas e empresários de São Paulo já deram o primeiro passo para reduzir o impacto de um possível descontrole nos níveis de emprego do País, cujo agravamento seria, sem dúvida alguma, muito perigoso para o equilíbrio social e para a normalidade econômica.

Os nossos contratos provisórios, apesar de terem sido suspensos temporariamente, merecem elogios e devem ser considerados como uma medida louvável e de repercussão bastante positiva para aumentar a criação de novos postos de trabalho. Todavia, os mais pessimistas afirmam que eles ferem direitos trabalhistas consagrados, tais como a carteira assinada, aviso prévio e multa sobre o FGTS em caso de demissão, além de atropelar sumariamente a legislação vigente.

Infelizmente, o Procurador-Geral do Trabalho e o Presidente do Superior Tribunal do Trabalho entenderam que o acordo inicial contraria as normas constitucionais e da Consolidação das Leis do Trabalho. Entretanto, eles não apresentam qualquer proposta que seja capaz de afastar o drama do desemprego, que já começa, neste início de 1996, a bater à porta das casas de milhares de brasileiros.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, diante da tragédia do desemprego, temos de considerar que os pontos que desobrigavam o empregador de recolher o FGTS, que eliminavam a multa de 40% sobre o Fundo em caso de demissão, que estabeleciam a redução da contribuição ao INSS e o não recolhimento das tais contribuições ao INCRA e ao SEBRAE, assim como a dispensa do registro do contrato em carteira não podem ser analisados e avaliados isoladamente, ou seja, dissociados da questão maior, que é o aumento do desemprego, sem dúvida alguma uma questão estrutural determinante.

Infelizmente, muita gente ainda não foi capaz de perceber que as relações trabalhistas nos países de economia mais avançada vêm mudando radicalmente desde o final da Segunda Guerra Mundial. Essas mudanças têm acontecido de maneira acelerada justamente em virtude do avanço tecnológico nessas economias, da necessidade de se alcançar novos patamares de produtividade, das pressões por modificações constantes na divisão internacional do trabalho e, hoje, mais do que nunca, em virtude da globalização econômica mundial e da formação dos grandes blocos de comércio internacional.

O Sr. Romeu Tuma - Senador João Rocha, V. Exª me permite um pequeno aparte?

O SR. JOÃO ROCHA - Com todo prazer, Senador Romeu Tuma.

O Sr. Romeu Tuma - Desculpe-me interromper o seu importante discurso. V. Exª traz à Casa um problema bastante sério, que é o fortalecimento do segmento econômico, a estabilização, a redução da inflação, mas com um aspecto um pouco selvagem, que é a possibilidade do crescimento do índice de desemprego. Cumprimento V. Exª por isso. Ontem, falei com o Senador Beni Veras, Presidente da Comissão de Assuntos Sociais. Apresentei um requerimento para que aquela Comissão e esta Casa, agora fortalecida pelo discurso de V. Exª, comecem a discutir, no sentido de ajudar as autoridades do setor do Ministério do Trabalho a encontrar soluções jurídicas, a fim de que se possa ter algumas alternativas para que a mão-de-obra possa ser empregada sem tantas vantagens que hoje são permitidas por lei. Não podemos infringir os dispositivos legais sob pena de, amanhã, termos uma série de processos prejudicando até aqueles que pretendem abrir novas portas para as suas indústrias, com a perspectiva desses convênios, desses acordos e desses contratos. Também não podemos apoiar a quebra da ordem jurídica brasileira. Eu pediria que V. Exª me ajudasse nesse sentido e discutisse o assunto no Senado Federal. Muito obrigado.

O SR. JOÃO ROCHA - Agradeço o aparte de V. Exª, nobre Senador Romeu Tuma. Estarei ao lado de V. Exª, como os demais Senadores desta Casa, para buscar a solução que todos aguardamos, que é a geração de novos empregos e a reativação da atividade produtiva em nosso País.

Continuando, Sr. Presidente, estão, portanto, completamente equivocados aqueles que só querem ver a árvore ignorando o bosque e, o que é pior, com suas miopias prejudicam a modernização do País. A bem da verdade, o Brasil não pode mais ficar atrelado ao passado, praticando uma política paternalista de emprego e de trabalho, respaldada por uma legislação caduca e mofada, filha do Estado Novo e herdeira da Carta del Lavoro, a CLT dos tempos já remotos do ditador Benito Mussolini.

Considero, portanto, uma verdadeira falta de visão diante do mundo que existe hoje à nossa frente a defesa de princípios completamente ultrapassados e que impedem que a economia brasileira possa competir em pé de igualdade com países modernos no disputado mercado internacional.

É preciso que se diga também que os vultosos investimentos em qualidade e produtividade que as indústrias precisam realizar anualmente continuam esbarrando em jornadas de trabalho diárias e semanais, completamente irracionais, e em encargos sociais e trabalhistas extremamente onerosos para os empresários. Assim, qualquer pessoa de bom-senso sabe que, seguramente, a tão almejada dinâmica econômica do País não passa por aí. Essa seria, sim, a dinâmica do retrocesso, e não do progresso.

Justiça seja feita: o Presidente Fernando Henrique percebe isso, o Ministro do Trabalho também percebe, os trabalhadores e os empresários que firmaram os primeiros contratos perceberam mais cedo ainda. E, agora, com a suspensão, só resta apelar para a lucidez das centrais sindicais, do conjunto das entidades empresariais e da classe política para encontrar uma saída que todos considerem mais legítima para enterrar de vez a ultrapassada CLT, ou, mais claramente, estabelecer um meio termo entre a idéia inicial e a legislação atual, que não serve mais.

O Sr. Carlos Patrocínio - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador João Rocha?

O SR. JOÃO ROCHA - Com prazer, nobre Senador Carlos Patrocínio.

O Sr. Carlos Patrocínio - Nobre Senador João Rocha, comungando das mesmas preocupações de V. Exª, encaminhei requerimento à Mesa para convocação do eminente Ministro do Trabalho, Dr. Paulo Paiva, a este plenário. Como assevera V. Exª, urge que providências sejam tomadas no sentido de um programa de geração de empregos. Isso passa, inexoravelmente, por modificações substantivas na já anacrônica Consolidação das Leis do Trabalho, de 1943. V. Exª faz justiça quando evoca a preocupação do Presidente da República e também do Ministro do Trabalho por esse programa de geração de empregos e renda em nosso País. Entendemos que é necessária uma participação política e a procura de mecanismos jurídicos para que não se esbarre no rigor da Justiça. Portanto, eminente Senador, é muito importante o assunto que V. Exª traz à apreciação de seus Pares nesta manhã. Estaremos juntos e apelamos para o bom-senso e a boa vontade de todos os Parlamentares do Congresso para que, de pronto, procuremos os mecanismos necessários para um amplo programa de geração de emprego como fator principal de consolidação do Plano Real e da estabilidade econômica do nosso País.

O SR. JOÃO ROCHA - Muito obrigado, Senador Carlos Patrocínio.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o País precisa realmente de uma definição rápida sobre o assunto. A intenção do Governo é clara e tem como objetivo ampliar os postos de trabalho, e não o contrário. A grande meta é, portanto, a de colocar no mercado formal quem se encontra no informal e quem simplesmente está em idade de trabalhar e não tem nenhuma atividade. Dessa maneira, nada mais justo do que a tentativa inicial de redução de cerca de 30% dos encargos trabalhistas, que ajudaria muito na diminuição do chamado "Custo Brasil". A contrapartida seria, portanto, a criação de milhares de novos postos de trabalho.

Além disso, Sr. Presidente, merece aplausos a tentativa de não permitir que fiscais do Governo multem empresas que, de comum acordo com os seus empregados, estabeleçam controle simplificado da jornada de trabalho. Espero que nos novos debates essa questão volte a ter relevância e seja decidida favoravelmente sob o ângulo da flexibilização.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, a taxa de desemprego no País fechou em 4,64% em 1995. Todavia, deteriorou-se a qualidade do mercado de trabalho. A proporção das pessoas ocupadas que trabalham com carteira assinada foi de 48,39% em 1995, contra 49,24% em 1994. O percentual dos trabalhadores que atuam sem certeira foi de 24,09% em 1995, contra 23,7% em 1994. Por outro lado, os que estão no mercado por conta própria chegam a 22,02% contra 21,79% em 1994. Vale ressaltar que, em 1989, segundo a mesma fonte, 58,26% dos trabalhadores atuavam no mercado de trabalho com carteira assinada. Os técnicos do IBGE alertam que, apesar de o desemprego ter decrescido de 5,06% em 1994 para 4.64% em 1995, a tendência é que ele aumente ao longo do ano de 1996.

Para o IBGE, a taxa de desemprego registrada no ano de 1995 representa, em números absolutos, 786 mil pessoas sem ocupação, em um total de quase 17 milhões, que formam a população economicamente ativa das seis principais regiões metropolitanas do País, onde a pesquisa foi realizada. Os dados revelam ainda que a menor taxa de desemprego - 3,41% - encontra-se no Rio de Janeiro, onde a economia informal é a mais intensa e a mais dinâmica em termos de crescimento.

Outro dado importante mostra a precariedade do mercado de trabalho brasileiro como um todo. Para o ano de 1995, a proporção de pessoas ocupadas na indústria apresentou taxa de 19,51%, que foi o mais baixo registro desde o ano de 1983.

Em relação ao rendimento do trabalhador, cuja referência vai até o mês de novembro de 1995, houve um crescimento de 13,9% em comparação com o mesmo mês de 1994, levando em consideração a média nacional.

Em relação ao Brasil como um todo, a pesquisa mostra ainda que o salário dos trabalhadores com carteira assinada cresceu 3%, comparando-se o ano de 1995 com 1994. Em contrapartida, os que atuam sem carteira assinada tiveram aumento de 16%, e os que trabalham por conta própria, 25%.

A conclusão que tiramos, Sr. Presidente e Srs. Senadores, é que existem distorções significativas no universo do mercado de trabalho brasileiro, apesar do nível relativamente baixo da taxa de desemprego, fixada, em 1995, como já vimos, em 4,64%.

Assim, em virtude da presença desses elementos estáveis, que podem evoluir inesperadamente para um comportamento desorganizado e colocar em xeque a normalidade social, é preciso prevenir agora para não ter de remediar amanhã.

Atingir níveis parecidos de desemprego da população economicamente ativa aos ostentados hoje pela Argentina, por exemplo, seria uma verdadeira temeridade. Assim, numa economia como a nossa, bem mais complexa e de densidade industrial bem mais elevada e sofisticada, uma ocorrência dessa natureza poderia representar uma ameaça permanente à estabilidade política e institucional que estamos mantendo com muito cuidado. Por isso, devemos tratar os nossos pontos vulneráveis com doses fortes de ações preventivas concretas e imediatas. Suprimir um emprego é muito fácil. O difícil, e sobretudo muito caro, é criar um novo emprego. Daí é que o tema do emprego, juntamente com a modificação da atual legislação trabalhista, aparece como um dos maiores desafios para a sociedade brasileira. Acompanhando essas mudanças, encontramos inevitavelmente o terreno da livre negociação entre empresários e trabalhadores, que é o verdadeiro lugar onde as grandes diferenças são acertadas. É nesse terreno, onde os níveis de regulamentação serão discutidos e delimitados livre e democraticamente, que haveremos de estabelecer o grande pacto entre o capital e o trabalho.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, temos uma responsabilidade muito grande com o futuro do País, e esse futuro está diretamente ligado ao sucesso do Plano Real. Se a estabilidade econômica continuar garantida, tudo bem; se não, voltaremos aos velhos tempos da anarquia e da desmoralização.

É preciso voltar a colocar logo na mesma mesa de negociação os empregados e os empregadores. São eles os atores mais dinâmicos do processo econômico e social que está sendo construído em nosso País.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/03/1996 - Página 3807